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Por que as empresas aéreas constantemente enfrentam prejuízos e dificuldades no Brasil?

Os fatores econômicos e estruturais que afetam a lucratividade das companhias aéreas no Brasil


A aviação brasileira enfrenta um cenário complexo com descompasso entre receitas em reais e despesas em dólares - Airbus
A aviação brasileira enfrenta um cenário complexo com descompasso entre receitas em reais e despesas em dólares - Airbus

Uma pergunta frequente que me fazem é: por que as empresas aéreas estão constantemente em prejuízo e, muitas vezes, acabam quebrando? Esse cenário, especialmente no Brasil, não se deve apenas à má administração, já que muitos gestores dessas empresas são altamente competentes, competitivos e eficientes

Não podemos eleger a má gestão como principal causa. Contudo, fatores estruturais e econômicos, como o alto custo de leasing das aeronaves e o descompasso entre receitas em reais e despesas em dólares, estão no centro do problema.

O transporte aéreo é uma atividade de capital intensivo, onde os gestores têm pouco controle sobre variáveis externas. Além disso, há uma pressão constante, seja do governo, seja da sociedade, para que os preços das passagens sejam reduzidos.

Historicamente, analisando os últimos 20 anos, a tarifa média das passagens aéreas no Brasil não conseguiu acompanhar a inflação acumulada no período. Por exemplo:

  • Em 2020, o preço médio da tarifa foi de R$ 376,61, representando uma queda em relação a 2019, quando o valor médio era de R$ 439,89.
  • Já em 2022, houve um aumento para R$ 644,50, o maior valor desde 2011, mas ainda longe de reajustar a inflação.
  • Em setembro de 2023, o ticket médio atingiu R$ 747,66, o maior desde 2009. Esse aumento, no entanto, só ocorreu devido ao superaquecimento da economia após a pandemia de COVID-19, que impactou diversos setores.

Esse período de aquecimento econômico foi absolutamente fundamental para a sobrevivência das empresas aéreas, que sofreram grandes prejuízos durante a pandemia, quando as operações ficaram praticamente paralisadas. A recuperação foi apoiada por renegociações e acordos recentes, incluindo a atuação do governo federal. Recentemente, medidas como a renegociação de passivos fiscais de empresas como Azul e Gol ajudaram a reduzir dívidas acumuladas durante a crise, oferecendo uma compensação parcial pelos efeitos devastadores da pandemia.

Por outro lado, a LATAM não participou dessas negociações com o governo devido ao fato de já ter feito sua reestruturação sob o Chapter 11 nos Estados Unidos antes desse momento. Esse processo trouxe custos significativos aos acionistas, que tiveram que trocar suas ações por participações destinadas aos credores. Apesar desse sacrifício, a LATAM conseguiu emergir como uma companhia com posição de dominância no mercado internacional, sustentada por um balanço robusto e uma forte capacidade de geração de caixa. Sua trajetória recente reflete o impacto da reestruturação, que, embora dolorosa para aos acionistas, foi essencial para garantir sua relevância e competitividade global.

Esses dados evidenciam que, em termos reais, as tarifas aéreas têm perdido valor ao longo do tempo. Esse cenário força as empresas a operar com margens cada vez mais apertadas, enquanto enfrentam custos crescentes.

Hoje, as empresas aéreas enfrentam desafios como a manutenção de uma ampla malha, pontualidade e frequência de horários, ao mesmo tempo que tentam manter preços baixos. O serviço a bordo, que já foi um diferencial, muitas vezes é reduzido ao essencial para equilibrar custos. O surgimento de companhias de baixo custo (low-cost) intensificou a competição, tornando o setor ainda mais desafiador.

Outro ponto crítico é o envelhecimento das frotas, que aumenta as ineficiências e reduz a competitividade ao longo do tempo. Para superar isso, os gestores precisam não apenas de uma administração financeira exemplar, mas de estratégias que garantam eficiência constante, sem comprometer a qualidade. O equilíbrio entre manter a qualidade e sobreviver financeiramente é o maior desafio do setor.

A trajetória de sucesso da TAM, empresa fundada por meu pai, Comandante Rolim Adolfo Amaro, foi marcada por um compromisso inegociável com a qualidade, em uma época em que isso ainda era viável. Hoje, o cenário mudou. Com o aumento da população e a complexidade das demandas, conectar pessoas em um país continental como o Brasil continua sendo um desafio, principalmente diante de uma renda per capita baixa e da falta de um novo marco regulatório para a aviação regional. 

Escrevi recentemente sobre os desafios da aviação regional no Brasil, destacando exemplos de sucesso nos Estados Unidos e na Índia que poderiam ser adaptados ao nosso contexto. No entanto, a falta de conectividade entre municípios estratégicos permanecem desafios significativos.

A aviação é, de fato, um setor desafiador, repleto de obstáculos. Apenas com paixão, resiliência, pés no chão e muita persistência é possível seguir adiante. Acreditamos que, no momento certo, as oportunidades chegarão, e continuaremos prontos para aproveitá-las, sempre com integridade e compromisso.

* Marcos Amaro é empresário, artista plástico e foi membro do conselho da TAM Linhas Áreas.
É sócio fundador e presidente do conselho da Amaro Aviation.

Por Marcos Amaro*
Publicado em 07/01/2025, às 17h00


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