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Entrevistamos o CEO da Cirrus, Zean Nielsen

Zean Nielsen conta, em uma entrevista descontraída, os planos da Cirrus e as perspectivas em torno da família SR e o Vision Jet


Zean Nielsen Nielsen assumiu como CEO em 2019 e desde então prepara a Cirrus para enfrentar novos desafios - Cirrus
Zean Nielsen Nielsen assumiu como CEO em 2019 e desde então prepara a Cirrus para enfrentar novos desafios - Cirrus

O atual CEO da Cirrus Aircraft, Zean Nielsen, recebeu a reportagem de AERO Magazine para uma conversa descontraída e falou das perspectivas em torno dos aviões da marca, incluindo a família SR e o Vision Jet. Nielsen assumiu como CEO em 2019, quando foi pessoalmente escolhido por Dale Klapmeier, um dos fundadores da Cirrus para liderar a empresa na nova década.  

  • AERO Magazine: Ao longo de quase três décadas, a família SR passou por uma série de melhorias, muitas vezes baseada no feedback dos proprietários. Ainda assim, os aviões essencialmente continuam os mesmos. A Cirrus já pensa em lançar uma nova geração? 

Zean Nielsen: O primeiro avião foi o SR20, seguido pelo SR22 e depois o SR22T. Agora, estamos na sexta geração, então tivemos várias mudanças em cada um dos modelos. Todos eles se atualizaram quando fazemos essas mudanças geracionais. Nem todos os recursos estão disponíveis em todos os níveis. Todo ano, temos umas mudanças pequenas, como mudanças de ano/modelo. De vez em quando, fazemos essas mudanças geracionais. Tivemos seis dessas ao longo dos anos. Atualmente, estamos na versão G6. 

  • Como a Cirrus trabalha nessas evoluções? Quanto das mudanças vêm de respostas dos pilotos-proprietários e quanto vem de engenharia?  

Temos uma filosofia muito centrada no cliente. Se olhar para outras empresas, a aviônica e o painel têm muitos botões. E aí, como você disse, os engenheiros amam. Todos os botões ficam bem aqui. Para um piloto normal isso não parece assustador, né? Se você é um cônjuge ou membro da família e se senta ao lado do piloto e vê todos esses botões, pensa: “Nossa, dá para dar muita coisa errada”. Mas, se parece com o seu iPhone, é mais familiar. Parece mais moderno, mais seguro. A ideia é que cada botão no cockpit tenha um propósito. Tem que ter um motivo.

  • Nessa experiência de simplificar, a Cirrus tem mantido a plataforma Garmin G1000 e suas respectivas evoluções. Alguns fabricantes optaram pelo G2000, que é ainda mais simples, visualmente falando. Como piloto, gosto muito do G1000, mas qual motivo de não ter controles touchscreen na tela, por exemplo?  

Se der para automatizar, a gente tenta. Se conseguirmos colocar na aviônica e deixá-lo mais fluída, tentamos. Queremos que seja fácil. Tentamos sempre ter um design focado no cliente. Precisa ter um propósito. Essa é a ideia do design das aeronaves do ponto de vista do usuário. Nós pensamos assim, usamos Garmin e sempre tentamos ter a última tecnologia no avião. Mas, se for só um pouquinho melhor que a versão atual, muitas vezes não é suficiente para pensarmos em trocar. Tem que ter uma diferença que valha a pena. É como o seu iPhone, quando você vai do iPhone 11 pro 12, talvez a câmera tenha melhorado um pouco. Isso não necessariamente é o suficiente para você trocar. Então tem que ter algo bem interessante para realmente incomodar o cliente com uma transição, porque eles vão ter de aprender um monte de coisas novas. Os botões podem não estar no mesmo lugar, o aplicativo e tudo que a gente inclui nele terá de ser atualizado. Então, tem de ter algo bem interessante. Talvez nós não tenhamos o último [lançamento] e o melhor toda vez, mas tentamos colocá-los em pacotes para que haja uma razão para mudar.

Nós pensamos assim, usamos Garmin e sempre tentamos ter a última tecnologia no avião. Mas, se for só um pouquinho melhor que a versão atual, muitas vezes não é suficiente para pensarmos em trocar.
  • Sobre mudanças, qual a diferença entre o SR22 tripá e o quadripá? 

Três pás e quatro pás [risos]. Apenas estilo.  

  • Apenas estilo? 

Sim, estilo. Parte do nosso trabalho é sempre tentar encontrar melhorias de segurança, de desempenho ou de design. Essa foi uma das que encaixa mais na parte do design. Claro, esperávamos conseguir um pouco mais de desempenho, mas [na prática] não foi muito.  

Cirrus SR22
  • Ao longo de muitos anos, a Cirrus sempre teve como argumento de vendas a relação entre carro e avião, por demonstrar simplicidade para o novo piloto-proprietário. Como surgiu essa ideia? 

Queremos trazer milhares de pessoas para a aviação, então precisa ser familiar. Precisa ser algo que você já fez antes. Todo mundo dirige um carro. Então, se pudermos fazer com que pareça e seja como dirigir um carro, todo mundo consegue entender. É algo que já fez antes. E comprar um avião tem que ser tão simples quanto comprar um carro. Manter um avião [deve ser] tão simples quanto manter o seu carro, financiar ou fazer o seguro deve ser simples como você faz com o seu carro. Então, o mistério desaparece e milhares de pessoas também vão fazer isso. É isso que estamos tentando fazer. Tentamos ter essa abordagem muito focada no cliente. Tem que ser fácil, tem que ser seguro, tem que ser conveniente e acessível. O avião não pode ficar subindo de preço indefinidamente. Estamos tentando nos certificar de que tudo que fazemos tem valor real e é acessível no final do dia.  

  • Quais as perspectivas e novidades para VisionJet, considerando as mudanças que ocorreram no mundo pós-pandemia e a maior procura por aviões de negócios, em especial jatos leves? 

Nós temos o costume de não falar sobre o futuro dos nossos produtos. Mas acabamos de lançar um radar aprimorado para VisionJet e adicionamos o Cirrus IQ. Ou seja, naturalmente, vamos continuar aprimorando a plataforma [do VisionJet]. É uma plataforma sensacional. Temos algo como 350 pedidos e reservas. Sempre que podemos, aperfeiçoamos o avião e vamos continuar fazendo isso. Ano passado, por exemplo, adicionamos Wi-Fi e a capacidade Hot and High, que é basicamente oferecer mais potência em condições de altitude elevada e intenso calor. 

  • Vocês mexeram no motor ou foi uma melhoria de software? 

Ambos, foi uma melhoria de software, mas teve algumas partes do motor que precisaram de upgrade, mas nada muito grande. 

  • Além dos aviões, quero aproveitar e falar sobre o Cirrus IQ. Como surgiu a ideia de criar um aplicativo que mantém o piloto conectado com o avião? E, na prática, quais benefícios o piloto tem com esse aplicativo? 

Sim, no último ano, lançamos o Cirius IQ, que basicamente é isto, um aplicativo. Se conhece a Tesla, você sabe que está sempre conectado com o carro. No nosso caso, o avião. Assim, você pode “acordá-lo” remotamente e ver coisas como quanto tem de combustível, óleo, oxigênio, sobre os serviços de manutenção, rede de parceiros, centros de treinamento e de serviço. Mesmo se precisar procurar um centro de treinamento ou de manutenção enquanto você está voando, tudo isso está disponível no app Cirius IQ. E nós acabamos de introduzir o mesmo recurso para o Cirrus Jet, que já vem com Wi-Fi. Estar sempre conectado é bem bacana.   

  • Outro programa recente é o Cirrus Private Pilot Program, voltado para novos pilotos, que adquiriram a série SR. Qual a vantagem de escolher uma instrução focada no Cirrus? 

O motivo pelo qual desenvolvemos o Private Pilot Program, investindo mais três anos de trabalho e quatro milhões de dólares de financiamento, tem a ver com os cursos atuais. Quando você tira sua licença de piloto, uma licença de piloto privado, você pode escolher [nos EUA], a Sporty's ou King Schools, ou outro tipo de programa de estudos. São programas maravilhosos, mas, quando você se inscreve, verá que um módulo poderá ser com um avião Cessna, outro módulo com um Diamond, e outro módulo pode ser com um Piper. Eles são todos diferentes. Digo diferentes estilo de voo, aviônicos, diferentes velocidades de decolagem. Você vai ter uma introdução a muitas coisas diferentes, mas você não vai ser um perito em um Cirrus. E você acabou de comprar um Cirrus. Então, nós queríamos casar os dois conceitos. Cada módulo será no Cirrus. Assim, você não está apenas aprendendo a voar, mas também está se tornando um expert nos aviões da Cirrus.

Sentimos que isso era importante para nós, que o piloto não só se torne piloto, mas que se torne um expert Cirrus.
  • Ou seja, o objetivo é formar um piloto que conheça profundamente o Cirrus desde o seu treinamento básico no piloto privado? 

Sim. Por exemplo, acho que a velocidade de aproximação em um Cessna 172 é entre 60 ou 70 nós. Isso é quase como a velocidade de estol para o Cirrus. Então, é importante que os nossos clientes tenham os hábitos certos desde o primeiro dia. Sentimos que isso era importante para nós, que o piloto não só se torne piloto, mas que se torne um expert Cirrus. A outra coisa é que queríamos que fosse mais previsível. Nós sempre brincamos que tirar a licença de piloto é como um divórcio. Você continua jogando dinheiro nisso e não sabe quando vai terminar. Se pudermos tornar isso mais previsível, se dissermos “ok, se você se dedicar três horas por semana, você termina nessa data”. Isso torna mais previsível se você apenas seguir a base do currículo. Se seguir o programa corretamente, sabe quando vai acabar. Outro ponto, cerca de 80% das pessoas que começam o piloto privado nunca terminam. Essa é uma estatística do setor. Se conseguirmos inverter isso, fazendo que 80% terminem em vez do oposto, acreditamos que a instrução estará muito melhor. Então, queríamos oferecer uma experiência de aprendizado diferente e que faça sentido para os nossos clientes. 

  • Vocês consideram que o cliente do Cirrus tem mais idade e não necessariamente facilidade com uso de tecnologias digitais?

Ao contrário de um jovem acostumado com internet, que já foi criado estudando em meios virtuais... Sim. Por exemplo, um jovem de 18 anos de idade, pode ficar sentado na escola e aprender durante oito horas seguidas. Porque ele está na escola, é o que ele faz todos os dias. Já uma pessoa de 50, 55 anos, aprende de uma forma diferente. Nós adultos aprendemos de forma diferente. Podemos precisar de conteúdo de treinamento em partes menores, treinamento mais prático, formas diferentes de aprender. Então todo o conteúdo é criado tendo em mente o aprendizado adulto em vez do aprendizado no início da infância. É apenas uma maneira diferente de pensar em se tornar um piloto. Outro ponto, quando você se inscreve pode escolher um professor. Temos 800 parceiros no mundo todo. Você pode escolher um professor perto de você para ser seu guia pessoal ou seu parceiro para ajudar nesta jornada, para dar aquele empurrãozinho para você não desistir no meio do seu treinamento.

Por Edmundo Ubiratan
Publicado em 26/10/2023, às 14h00


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