Condomínios aeronáuticos seduzem proprietários de aeronaves no Brasil com a oferta de comodidade e baixos custos operacionais aliados à infraestrutura de lazer para toda a família
Vale Eldorado, em Atibaia, São Paulo |
Os condomínios aeronáuticos se multiplicam no Brasil. Conceito importado dos Estados Unidos, onde a aviação geral é pujante, eles se tornaram um fenômeno que ganha cada vez mais força entre proprietários de aeronaves. A comodidade já seria motivação suficiente para um aviador querer morar ou ter uma casa de veraneio ao lado de uma pista de pouso. Outras razões, porém, ajudam a explicar essa corrida de "pilotos-proprietários" aos condomínios aeronáuticos. Sim, lá eles estão livres dos altos custos de hangaragem e da falta de espaço dos aeroportos públicos. Mas há um fator determinante por trás dessa tendência: os donos de aviões querem dar asas para sua paixão sem abrir mão da convivência de suas famílias e pessoas próximas. Na prática, todos aproveitam, e isso vale para a mulher (ou o marido, se a esposa for aviadora), os filhos, os parentes e os amigos, que têm à disposição uma infraestrutura de clube ou de refúgio campestre com espaço para o avião.
No Brasil, não há dados oficiais com o número exato de condomínios aeronáuticos, mas esse tipo de empreendimento vem atraindo investimentos. "Tornou-se um excelente negócio", entusiasma-se Flavius Neves, idealizador do condomínio Costa Esmeralda, localizado em Porto Belo, Santa Catarina. O empreendimento foi construído em uma antiga fazenda de palmito e hoje reúne 170 lotes em torno de uma pista de 1.300 metros com capacidade para receber grandes jatos executivos. "Quando comecei, pedi um empréstimo e muita gente torceu o nariz. Mas hoje, depois de cinco anos, já foram vendidos mais de 140 lotes e temos pelo menos 70 aeronaves hangaradas aqui", diz Neves.
Depois de pousar seus Cirrus, Phenom, King Air ou mesmo ultraleves, os proprietários de lotes no Costa Esmeralda se reúnem em volta da piscina para, claro, falar sobre a paixão pela aviação e a experiência recompensadora que é voar. Grandes empresas também já enxergam nos condomínios aeronáuticos uma boa oportunidade para fazer negócios. A Embraer e a TAM Aviação Executiva já fizeram apresentações para vender aeronaves aos condôminos. "No ano passado, a Embraer vendeu dois Phenom 100 aqui", conta Neves.
O sucesso do Costa Esmeralda é tanto, que seu idealizador já planeja dois novos lançamentos, um em Natal, no Rio Grande do Norte, e outro em Florianópolis, capital catarinense. "Ainda estão em fase de projeto e as obras devem iniciar em um ano. Essa é uma tendência que deve crescer cada vez mais no Brasil", diz Neves.
O empresário Sergio Franco, idealizador da Adventure Sports Fair, também enxerga nos condomínios aeronáuticos um negócio promissor. Ele trabalha para lançar em breve um community fly-in na cidade de Socorro, no interior de São Paulo. "Era para ter sido um negócio entre amigos, que compartilhariam uma pista de pouso, mas as conversas evoluíram e o projeto cresceu. Será um condomínio aeronáutico nos moldes de um empreendimento imobiliário", revela o piloto e consultor Danilo Calixto Besser, que participa do projeto. "A principal diferença em relação aos condomínios tradicionais é que o condômino terá a opção de comprar uma casa com hangar integrado e receber a escritura do imóvel".
Costa Esmeralda, em Porto Belo, Santa Catarina |
ENTRE AMIGOS
Um dos residenciais pioneiros do Brasil foi o Condomínio Aeronáutico Vale Eldorado, localizado em Atibaia, em São Paulo. Com uma pista de pouso de 800 metros, foi idealizado ainda na década de 1980 com a intenção de reunir os amantes da aviação. Segundo João Carlos Leme Ribeiro, administrador do condomínio e um dos fundadores do empreendimento, a ideia do Vale Eldorado é democratizar a aviação. "Aqui todos convivem em harmonia. Tem o pessoal do Trike, da aviação experimental, e até algumas aeronaves mais avançadas", afirma João Carlos, proprietário de um Conquest 180.
Como a maioria dos condôminos do Vale Eldorado, o empresário William Breder tem a aviação como hobby. "Comecei com o Trike, depois passei para o ultraleve até adquirir o primeiro Cirrus SR 20 e, agora, o SR 22. Fui buscar esse avião na fábrica, em Duluth, nos Estados Unidos, e voei com ele até o Brasil acompanhado do piloto da fábrica, o comandante Copini. Foram 36 horas de voo até Jundiaí", conta, orgulhoso. Piloto privado, Breder voa entre 75 e 100 horas por ano.
"Vou almoçar em Ubatuba, Itanhaém, Americana e Piracicaba. É mais o prazer de voar do que um objetivo de ir para algum destino específico", diz. Mas, além da praticidade de ter uma pista de pouso praticamente no quintal, dispor de um hangar em casa também reduz os custos de operação. "Enquanto no Campo de Marte, para deixar o avião ao ar livre, teria de desembolsar cerca de R$ 1.500 por mês, aqui eu tenho meu próprio hangar", afirma Breder.
#Q#O consultor Sebastião Pimentel tem um Cessna 170, de 1956, no hangar de casa. Quando a reportagem da AERO Magazine visitou o condomínio, a aeronave passava por uma manutenção de motor. Mas nem isso impedia Pimentel de fazer alguns voos. "Aqui, todos são amigos. Se o seu avião não puder voar, sempre tem algum amigo para te levar junto", conta.
A maioria dos condôminos é formada por pilotos privados que têm a aviação como hobby. A comunidade aeronáutica, no entanto, reúne também alguns pilotos profissionais apaixonados por todo o universo da aviação. É o caso do comandante Cesar Pulschen, que já voou por Varig, Vasp, Gol, ABSA e atualmente opera na aviação executiva. Aficionado por aeronaves antigas, Pulschen tem um PT-19, de 1942, um PA11, de 1949, um Cessna 170, de 1954, e um biplano N3N, de 1940. "Meu prazer é restaurar e manter os aviões na forma original. Todos estão em condições de voo. Viajo muito para ir a encontros de aviões antigos", afirma o comandante, que tem uma casa com hangar no Vale Eldorado desde 2000.
Reserva Real, em Belo Horizonte, Minas Gerais |
HÍPICA E GOLFE
Além dos apaixonados pela aviação, alguns novos condomínios apostam também em um público mais variado. Em Minas Gerais, próximo a Belo Horizonte, está em construção o condomínio Reserva Real, que contará com uma hípica, campo de golfe, quadras de tênis e completa estrutura de lazer. Para atender aos moradores, o empreendimento terá uma pista de pouso de 1.600 metros a 2.300 pés de elevação com balizamento noturno. "Será um aeródromo com operações VFR, pois a proximidade com o aeroporto de Confins impede o procedimento IFR", afirma o coronel da reserva e consultor aeronáutico do empreendimento, comandante José Luiz Paoliello.
No condomínio Reserva Real, a pista e os hangares serão de uso exclusivo dos condôminos e foi pensada como uma alternativa em relação aos aeroportos da capital mineira. "O nosso objetivo é atender à demanda por estacionamentos de aeronaves. Além da oferta restrita, o preço é muito alto. Vamos atender aos clientes que não têm onde guardar a aeronave", diz o comandante.
Os hangares do condomínio terão capacidade para cerca de 50 aeronaves, mas poderão ser ampliados conforme a necessidade. E o comandante já avisa: será vetada a comercialização dos hangares para quem não tiver uma propriedade dentro do Reserva Real. A pista deverá ser inaugurada no primeiro semestre de 2014 com capacidade de impacto de até 20 toneladas. "Vamos atender a toda a gama de aviões executivos que operam no Brasil", afirma.
FROTA CRESCENTE
Em todo o Brasil, há diversos outros condomínios aeronáuticos que surgiram nos últimos anos, como o Quintas Ponta do Sol, em Minas Gerais; o Fazenda Bonanza, a Fazenda Royal (Itapetininga) e Fazenda Ipuã (Caçapava), todos em São Paulo; a Estância Teimoso (Campos Largo), no Paraná, entre outros. Para o vice- presidente da Abag (Associação Brasileira de Aviação Geral), Ricardo Nogueira, esse é um reflexo do crescimento da aviação no país e da falta de investimentos em infraestrutura para acompanhar a nova demanda.
Segundo dados da Abag, publicados no Anuário Brasileiro de Aviação Geral, o Brasil possui mais de 13 mil aeronaves em operação e esse número vem crescendo rapidamente. Desde 2007, a frota brasileira teve um crescimento de 20%. "As pessoas estão procurando alternativas aos aeroportos públicos, que estão saturados", afirma Nogueira.
Colaborou Giuliano Agmont
Texto E | Fotos | Vinícius Casagrande
Publicado em 14/05/2013, às 05h37 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45
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