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Carlos Eduardo Pellegrino, diretor da Anac

Ensino precisa melhorar


Sindicato Nacional dos Aeroviários

Os problemas no processo de formação aumentam na proporção em que cresce a demanda por cursos de pilotagem. Apesar dos esforços da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) em aperfeiçoar o processo, que é o mesmo há décadas, o conflito de interesses entre a agência, as escolas e os aeroclubes torna lenta a tomada de decisões. Uma das polêmicas gira em torno da proposta de criação de um modelo padronizado de ensino, que obriga escolas e aeroclubes a adotar um manual de instrução e procedimentos. A ideia é que aeroclubes tenham sistemas tanto de gerenciamento de segurança operacional (incluindo o manual sobre o tema) como de gerenciamento financeiro. Para os instrutores, será exigido treinamento inicial e periódico. De acordo com a Anac, a mudança segue exigências da Icao (International Civil Aviation Organization) e coloca a instrução aérea brasileira em um novo patamar. Dirigentes de aeroclubes alegam que os custos adicionais serão superiores à renda anual gerada pelas associações. Para a Anac, a aplicação das normas deve distinguir definitivamente o que é um aeroclube do que é uma instituição de ensino, separando lazer e instrução. Ou seja, o aeroclube deverá voltar a ter sua função de clube de voo. Para muitos alunos, a mudança será positiva se tornar mais profissionais a gestão dos recursos e a instrução de voo. "Passo dias tentando marcar uma hora de voo, mas o telefone do aeroclube vive ocupado. Alegam que não tem horas de voo suficiente para todos", reclama José Eduardo, que está concluindo o curso de PC (piloto comercial). Já o diretor de um aeroclube do interior paulista, que preferiu não se identificar, acha que a Anac cria empecilhos para favorecer as escolas de aviação: "Elas têm mais recursos". A Anac rebate a crítica dizendo que, de acordo com o atual Regulamento Brasileiro da Aviação Civil, as regras e os custos são similares para aeroclubes e escolas. Mas acrescenta que existem escolas que já trabalham dentro de normas do Anexo 1 da Icao, levando vantagens competitivas. Edmir Gonçalvez, sócio da EJ Escola de Aviação, concorda: "Seguimos as mesmas regras que um aeroclube, a diferença é que nossos alunos contam com alguns diferenciais que são valorizados pelo mercado". Segundo a Anac, as universidades que oferecem cursos ligados à área de aviação civil continuam sendo fiscalizadas pelo MEC (Ministério da Educação), no entanto, caso a faculdade queira garantir a seus alunos os créditos necessários para a formação de piloto, deverão seguir as mesmas normas aplicadas em aeroclubes e escolas de aviação. Para os pilotos-alunos, o embate entre Anac, escolas e aeroclubes não tem sido produtivo. A maioria continua criticando o custo para formação, que varia de 50 mil a 80 mil reais. "Hoje pagamos um dos cursos mais caros do mundo e estamos distante de uma formação adequada", critica Ricardo Santos, aluno do curso de PP. Na entrevista a seguir, o diretor de Operações de Aeronaves da Anac, Carlos Eduardo Pellegrino, fala sobre as polêmicas e os desafios envolvendo a formação de pilotos no Brasil.

AERO MAGAZINE - Por que a formação de pilotos é tão cara?
CARLOS EDUARDO PELLEGRINO -
A formação do piloto não é fácil nem barata em nenhum país do mundo. Como profissão, ela requer habilidades psicomotoras que restringem o acesso de candidatos. Com relação ao custo, ele será sempre dependente do custo da aeronave, do combustível e da manutenção para que seja um serviço sustentável.

Muitos aeroclubes e escolas criticam o modelo de ensino brasileiro, que exige uma série de voos e matérias consideradas exageradas. Há planos de revisar esse modelo?
- O modelo de ensino brasileiro é o mesmo utilizado no mundo todo, pois segue os padrões previstos pela Icao. Mesmo nos Estados Unidos, os padrões de horas de voo são os mesmos. Ele é voltado para qualquer tipo de piloto, seja ele profissional ou amador. A Anac pretende implantar em parceria com o mercado a formação por competência, o que trará maior qualidade à formação profissional, voltada para o mercado de trabalho. Hoje, temos uma parceria com o Prominp (Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural) para melhorar a qualidade na formação do piloto de helicóptero que voa offshore. Outra ação tem como objetivo a implantação do sistema integrado de formação PP, PC, MULTI e IFR, em inglês ab-initial. Por último, estamos estudando a implantação de programas MPL (Multicrew Pilot License, ou Licença para Piloto de Tripulação Múltipla) no Brasil. Foram realizadas pesquisas no Canadá, Estados Unidos e na Europa com essa finalidade.

Por que não fazer uma revisão mais profunda do modelo?
Porque teremos sempre os alunos de finais de semana, que querem apenas um lazer. As novidades serão voltadas para aqueles que escolhem a profissão de aviador.

E incorporar as novas tecnologias à formação?
A formação básica do piloto tem que dar suporte às ferramentas que poderão ser utilizadas em caso de falhas. Numa falha de GPS, por exemplo, como são feitos os cálculos? Os computadores manuais, presentes em cada pasta de navegação, fornecem a resposta, sendo fundamental para o voo seguro.

Uma das principais reclamações dos aviadores é o longo período para emissão das carteiras. O que tem sido feito para desfazer mais esse gargalo da aviação?
A Anac centralizou e informatizou todo o seu processo de habilitação para aumentar a capacidade de processamento. Ocorre que o volume de solicitações triplicou. Estamos colocando mais opções para facilitar a vida dos pilotos. Aproveito, aliás, para deixar um pedido aos pilotos: que conheçam os prazos da Anac, previstos na Carta de Serviço. Temos recebido duas ou mais solicitações de um mesmo usuário para a mesma ação. Também é importante que façam sua solicitação de forma digital pelo nosso portal. É mais prático e rápido.

"Estamos estudando a implantação de programas de licença para piloto de tripulação múltipla"

Boa parte da frota dos aeroclubes é composta por modelos ultrapassados, a maioria com mais de 40 anos de uso. Isso vai mudar?
Não há nenhuma proposta em curto prazo. Mas estamos estudando algumas possibilidades, já que não há indústria nacional capaz de prover tal aviação primária.

Qual a posição da Anac em relação ao projeto de lei que permite a contratação de pilotos estrangeiros no Brasil?
A Anac cumpre a lei, não a elabora.

Edmundo Ubiratan
Publicado em 08/12/2011, às 15h05 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45


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