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Conheça as opções do Governo Lula para a compra de novos aviões presidenciais

Governo Lula estuda mudanças na frota de aviões da FAB utilizada pelo Brasil no transporte presidencial e de autoridades


Atual avião presidencial foi adquirido pelo presidente Lula e chegou ao Brasil em 2005 - Ricardo Stuckert/PR
Atual avião presidencial foi adquirido pelo presidente Lula e chegou ao Brasil em 2005 - Ricardo Stuckert/PR

O governo Lula avalia suspender os planos para a compra de novos aviões presidenciais como consequência do corte de gastos. Ainda assim, a Força Aérea Brasileira (FAB) teria como alternativa a conversão de um dos A330-200 para a versão VIP, como foi realizado no passado com um dos KC-137.

Por ora, o governo mantém a intenção de substituir o atual VC-1, um A319 destinado a missões VIP, mas segue avaliando as opções, sobretudo em relação ao prazo. Na melhor das hipóteses, a nova aeronave estaria disponível entre 2026 e 2027.

Há exatos 20 anos, o governo brasileiro confirmou a compra do atual VC-1, substituindo o veterano KC-137, derivado do Boeing 707, que acumulava 18 anos de serviço ativo na Força Aérea Brasileira.

A troca da frota presidencial se justificava pela idade avançada do KC-137 destinado ao transporte presidencial. O 2401 (leia 24-Zero Uno) foi adquirido da Varig e entregue para a FAB em julho de 1986, mas se tratava de um avião usado por quase duas décadas no transporte de passageiros e com tecnologia bastante ultrapassada já quando entrou em serviço.

Após o fim da produção do 707, a FAB passou a enfrentar grandes dificuldades na manutenção da frota de quatro KC-137, que se agravou no caso do 2401, que chegou a sofrer uma pane grave enquanto transportava o então vice-presidente Marco Maciel, em dezembro de 1999.

Nos três anos seguintes, a Presidência da República passou a fretar aviões da Varig e da TAM para deslocamentos oficiais ao exterior, mas o custo elevado e a baixa disponibilidade de locação das empresas aéreas comprometiam a agenda oficial. 

Após detalhados estudos, foi escolhido o Airbus A319, em sua versão ACJ, que oferecia uma configuração de cabine destinada ao transporte de chefes de Estado, com uma ampla suíte, sala de reunião e uma área para transporte da comitiva oficial. Na ocasião, a disputa envolveu o Boeing 737BBJ, derivado do 737-700, mas que foi preterido por questões técnicas e políticas.

Naquele momento, o governo Lula se alinhava a parcerias estratégicas com a França, tornando o modelo da Airbus um natural vencedor. A compra foi confirmada pelo Congresso brasileiro e envolveu um contrato de offset, por conta do qual a Airbus e seus parceiros deveriam investir no Brasil um valor equivalente ao da venda do avião.

Aerolula

Alckmin e Lula
O atual vice-presidente brasileiro, Geraldo Alckmin, na disputa de 2006 chegou a firmar que venderia o então recém-incorporado VC-1 para poupar recursos públicos

Embora tenha sido uma compra bastante polêmica, o avião chegou ao Brasil no ano seguinte e foi batizado de Santos Dumont pela FAB, em virtude da proximidade do centenário do primeiro voo do 14-Bis. Mesmo tendo recebido o nome de um herói nacional, o ACJ, oficialmente VC-1 na FAB, ganhou o pejorativo apelido de Aerolula e foi uma das armas da oposição na eleição de 2006.

Em um país acostumado com um sem-fim de problemas estruturais e deficiências básicas em saúde, moradia, segurança pública e educação básica, somado aos exorbitantes gastos com a máquina pública, foi natural enfrentar a resistência de diversos setores à compra de um avião presidencial. 

Ao assumir seu terceiro mandato em 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a avaliar a troca do avião presidencial. O argumento principal passou a ser o curto alcance do VC-1, que não consegue voar sem escalas entre Brasília e a maioria dos destinos na Europa e sofre restrições de peso quando voa direto para os Estados Unidos.

Meses antes, o então presidente Jair Bolsonaro havia adquirido dois Airbus A330-200, usados, para serem convertidos no futuro para o padrão MRTT, adicionando capacidade multifunção, inclusive de reabastecimento em voo. 

Sem orçamento para tornar o A330 em um real KC-30, a designação oficial dos dois aviões na FAB, uma das principais utilizações passou a ser o transporte oficial. Ainda que sem contar com configuração VIP, mantendo exatamente o padrão usado pela Azul, com classe executiva e econômica, sua maior capacidade e alcance justificaram seu uso em diversos deslocamentos do presidente Lula e sua comitiva.

KC-30
Os dois A330 da FAB já foram usados em deslocamentos oficiais da Presidência

Ainda no ano passado, o comandante da Aeronáutica, o tenente-brigadeiro Marcelo Kanitz Damasceno, avaliou com a Presidência as opções de compra no mercado para um avião de maior capacidade. Interlocutores da FAB e do Palácio do Planalto consultados por AERO Magazine afirmam que na ocasião foi oferecido como a melhor opção a compra de mais um A330-200 usado, que seria transformado em avião presidencial.

Ainda foi avaliada a viabilidade operacional de converter um dos atuais KC-30 para o transporte VIP, sem perder a futura capacidade MRTT. Todavia, essa opção foi descartada pela limitação que ela impõe ao uso do avião nas missões de rotina da FAB, como ocorreu por décadas com o 2401.

Pane no México

Após a pane do VC-1 na Cidade do México, quando o avião permaneceu por 4h30min em órbita, o presidente Lula afirmou em uma live com o deputado Guilherme Boulos que esperou “um milagre de Deus para que o avião não caísse”. Dez dias depois, em entrevista à rádio O Povo, no Ceará, Lula voltou a comentar o caso e afirmou: “Desse problema tiramos uma lição. Nós vamos comprar não apenas um avião, mas é preciso comprar alguns aviões”.

A intenção é ampliar a frota destinada à Presidência, com um avião de maior capacidade e alcance, assim como do chamado escalão avançado (Escav), composto por ministros de Estado e funcionários de altos postos do governo. 

Embora atualmente o Grupo de Transporte Especial (GTE), unidade destinada ao transporte de autoridades do Governo Federal, tenha uma frota considerável, composta pelos A319, E190, ERJ 145 e Legacy, a elevada demanda de transporte obriga diariamente o governo a adquirir passagens em empresas aéreas para atender os deslocamentos oficiais.

Supostamente, a compra de mais aviões permitiria reduzir os custos. Outro argumento para substituição dos aviões é a elevada idade de toda a frota do GTE, que acumula mais de 20 anos de idade média. Os VC-99A, derivados da plataforma ERJ, foram adquiridos do espólio da Rio Sul, enquanto os seis VC-99B/C foram recebidos a partir de 2006. 

Até o momento o governo brasileiro não bateu o martelo para a compra de novos aviões oficiais, incluindo um ou mais destinados ao transporte do presidente. A escolha deverá seguir um critério técnico, com a provável vitória do Airbus A330-200 por questão de padronização da frota e por conta do aspecto político, que em uma análise fria, sempre será no final o fiel da balança. 

Os Competidores

Mercado oferece diversas opções para atender as necessidades do Governo Brasileiro, entre modelos usados e aeronaves novas. Assim, preparamos um material que permite comparar os potenciais aviões disponíveis, seus prós e contras.

A330
  • Airbus A330-200 
    Modelo similar ao já operado pela FAB  

    Pontos positivos: mantém a padronização operacional e reduz os custos da frota, além disso, tem uma ampla oferta de unidades usadas no mercado, que oferece custo de aquisição competitivo.  
    Pontos negativos: pesa o fato de serem aviões com elevado número de ciclos e exigirem uma conversão posterior a compra, o que amplia os prazos e adiciona custos e riscos.

  • ACJ330neo
    ACJ330neo
    O novo A330neo em sua versão corporativa oferece até 243 metros quadrados de cabine e consumo de combustível até 12% inferior aos antecessores
    Airbus ACJ A330neo 
    É a versão atual do A330, com novos motores e alguns refinamentos aerodinâmicos e de cabine 

    Pontos Positivos: Comparado ao A330-200, o atual A330-900 oferece um consumo de combustível 12% inferior e custos de manutenção até 5% menores, assim como taxa de despacho de 99%. Com 243 metros quadrados de área útil é possível configurar até seis zonas de cabine, incluindo suíte presidencial com chuveiro, salas de reunião e espaço para transporte da comitiva oficial. O alcance médio é de 18.334 quilômetros, com 25 passageiros a bordo, e autonomia superior as 21 horas. Em configuração de maior densidade, com área para comitiva, o alcance deverá ser na média de 11.000 quilômetros, suficiente para voar para qualquer país das Américas, Europa e grande parte da África. Uma das vantagens é adquirir um avião que poderá ser configurado de fábrica pela Airbus e seus parceiros, como a Lufthansa Technik, permitindo controle de custos e de cronograma. 
    Pontos negativos: Elevado custo de aquisição, com valor superando os R$ 2 bilhões*.
  • ACJ350
    ACJ350
    O ACJ350 oferece mais de 300 metros quadrados de cabine, permitindo instalação de uma completa suíte presidencial, similar a existente em grandes hoteis do mundo
    Airbus ACJ A350 
    Derivado do mais novo avião de grande capacidade da Airbus, o ACJ A350 é o avião oficial, por exemplo, da Alemanha, oferecendo uma das maiores cabines do mercado

    Pontos positivos: Considerando o A350-1000 são impressionantes 308 metros quadrados, que oferece até oito zonas de cabine, incluindo uma ou duas suítes presidenciais, sala de reunião, escritório presidencial, assim como área de transporte para comitiva. O consumo de combustível é até 25% inferior aos competidores diretos, como a primeira geração do Boeing 777 e A330. Segundo a Airbus, a primeira revisão estrutural só ocorre com 12 anos de serviço, o que permite reduzir consideravelmente o custo de manutenção. No caso do A350-800 o alcance, com 25 passageiros, é de 20.550 quilômetros, suficiente para voar para grande parte do mundo sem escalas. 
    Pontos negativos: o elevado custo de aquisição. O A350 é o mais caro avião comercial do mercado, sendo superado apenas pelos futuros 777-9, que ainda não estão em serviço. Evidentemente que o valor final difere da tabela oficial, mas mesmo sem configuração VIP o avião deve superar com facilidade a casa de R$ 2,5 bilhões*.

  • Boeing 787
    Boeing BBJ 787
    Interior do BBJ 787 oferece capacidade para suíte com chuveiro e lavatório com amplo espaço privativo
    Boeing BBJ 787
    O único avião novo da Boeing capaz de atender aos requisitos da FAB, visto que o 777-200/-300 está fora de linha e o 777X não está certificado. O 787 foi escolhido como avião presidencial de diversos países por sua boa capacidade e alcance

    Pontos positivos: No caso do 787-9 a área útil disponível é de 249 metros quadrados, com até oito zonas de cabine, incluindo até duas suítes presidenciais completas. O 787-8 oferece alcance de 18.450 quilômetros, o que virtualmente permite decolar de Brasília e voar para qualquer destino do mundo, exceto Japão e uma pequena parte da China. 
    Pontos negativos: O custo de aquisição do 787 e sua posterior transformação para o padrão VIP supera os R$ 3 bilhões*. Além disso, toda a conversão é feita por terceiros, em parceria com a Boeing, exigindo assim um contrato adicional, que agrega maior tempo na liberação por se tratar de uma aquisição pública e adiciona maiores prazos. Pesa ainda o baixo alinhamento ideológico do governo Lula com os Estados Unidos.

  • Boeing 777 Japão
    O Japão é um dos operadores do 777-300ER em versão VIP | Foto: Koku Jieitai/JASD
    Boeing 777
    As versões clássicas do 777 foram selecionadas por diversos países, como o Japão que trocou seus dois 747-400 pelo Triplo Sete 

    Pontos positivos: O 777 conta com dezenas de aeronaves usadas disponíveis no mercado e com baixo custo de aquisição. Em configuração VIP oferecem até 9 zonas de cabine e alcance superior aos 20.000 quilômetros.
    Pontos negativos: Embora seja possível adquirir aviões usados no mercado, a maioria conta com elevado número de horas de voo e seu custo de conversão e prazos podem se tornar limitantes para os objetivos do governo brasileiro.

  • Outras opções 
    Embora existam outros modelos, como o A340, 767, 747-8 e até mesmo jatos russos, é pouco provável que qualquer um deles seja analisado pela FAB e pelo Governo Brasileiro. No caso dos modelos ocidentais são versões fora de linha, sendo o 747-8 a opção mais cara e que ainda exige uma grande infraestrutura operacional. No caso de aeromaves russas não existe nenhum avião de longo curso sequer em produção, o que exigiria a reabertura da linha de montagem para atender um eventual contrato brasileiro. 
    * Considerando o dólar acima de R$ 5,50

Por Edmundo Ubiratan
Publicado em 26/11/2024, às 15h00


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