Aeroportos brasileiros menos movimentados precisam de investimentos de R$ 2,4 bilhões para atenderem à futura demanda do turismo, segundo estudo da Abetar
Aeronaves da aviação geral no pátio do aeroporto de Londrina (acima); a pista e o terminal de Foz do Iguaçu (abaixo); e vista aérea de Porto Seguro (ao lado) |
O Brasil tem hoje 67 aeroportos voltados para o transporte regular de passageiros. É pouco para um país de 8,5 milhões de quilômetros quadrados e uma população que chegará a 200 milhões até 2015. A necessidade de ampliar essa rede com o objetivo de atender a uma demanda crescente é conhecida, mas o debate ganha nova dimensão na medida em que se aproximam os eventos esportivos de 2014 e 2016. Entre as soluções para incrementar o transporte aéreo está a utilização de aeroportos regionais, em paralelo à principal malha administrada pela Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária). À frente dos que apoiam a ideia, a Associação Brasileira das Empresas de Transporte Aéreo Regional (Abetar) encomendou um raio x de 174 localidades definidas como potenciais para integrar a rede de aeroportos em função de suas características socioeconômicas e turísticas. O Brasil possui hoje mais de três mil aeroportos, dos quais cerca de 750 são abertos ao público. O restante são aeroportos de uso privado ou públicos interditados.
Concluída sua primeira fase em 2011, o "Estudo para Adequação da Infraestrutura Aeroportuária nas Regiões de Interesse Turístico", da Abetar, conseguiu traçar um diagnóstico da infraestrutura atual dos pequenos aeroportos regionais incluídos na pesquisa. Os resultados estabelecem o que é preciso fazer para desenvolvê-los plenamente. "O estudo contemplou um horizonte de cinco anos - de 2009 a 2014. As análises apontam que devem ser investidos R$ 2,4 bilhões para a adequação da infraestrutura desses aeroportos, a fim de atender à demanda estimada para o período", explica Victor Rafael Rezende Celestino, diretor de relações institucionais e infraestrutura aeronáutica da Abetar.
Especificamente, os especialistas desejavam conhecer o crescimento da demanda em cada uma das 174 localidades e hierarquizá-las. Para isso, realizaram uma análise do movimento atual de passageiros, com base em dados oficiais das autoridades de aviação no Brasil. Para estimar o potencial de demanda, aplicaram um modelo econométrico (o cálculo estatístico da relação entre variáveis econômicas). O passo seguinte foi levantar as principais características físicas e operacionais dos aeroportos, tais como comprimento e largura de pistas de pouso e decolagem, áreas de terminais de passageiros, classe do sistema de proteção contra incêndio, entre outros.
A ausência de equipamentos relacionados à segurança liderou os problemas de infraestrutura. Na região Sul, por exemplo, Ponta Grossa (PR) e Lages (SC) despontaram com grande potencial de tráfego, mas carecem de sinalização. No Nordeste, os pesquisadores encontraram carência de sinalização em muito mais lugares: Teixeira de Freitas (BA), Paulo Afonso (BA), Canavieiras (BA), Caruaru (PE), Parnaíba (PI), São Raimundo Nonato (RN) e Mossoró (RN). Apesar de não apresentarem registro de passageiros em 2009, esses aeroportos também despontaram com grande potencial de tráfego na análise.
Aeroporto de Juazeiro do Norte (CE) |
Alguns aeroportos sofrem, ainda, com a falta de área para a construção de terminais de passageiros. Dessa forma, o estudo contemplou, além de custos de aquisição de equipamentos, os valores que seriam destinados a obras de ampliação e à manutenção. Finalmente, o estudo definiu as principais aeronaves críticas de projeto para operação naquelas localidades, com base nas características operacionais apresentadas nos respectivos Manuais de Planejamento Aeroportuário (Aiport Planning Manual).
Para os aeroportos de capitais, elegeu-se a aeronave Boeing 737-800. No estudo, a infraestrutura necessária para a operação das aeronaves críticas é primeiro comparada com a disponível atualmente para depois se avaliar quais seriam as intervenções específicas de cada aeródromo para sua adequação de acordo com a demanda futura.
O estudo também inclui a nova família de jatos regionais fabricados pela Embraer, os E-Jets, uma vez que existe uma demanda crescente para eles. Além dos aviões da Embraer, há uma tendência de companhias como Trip e Azul de comprar aeronaves ATR-42 e ATR-72. Assim, elas foram consideradas para algumas localidades.
#Q#Aeroporto de Lençóis, na Bahia, o primeiro do ranking de potencial de desenvolvimento; e o pátio de Bauru, em São Paulo, abaixo |
AEROPORTOS MUNICIPALIZADOS
A Abetar não pretende atuar diretamente na atração de investimentos, afirma Celestino. "Nosso papel é agir como facilitador entre os operadores dos aeroportos regionais e a SAC (Secretaria de Aviação Civil), com a finalidade de acesso ao FNAC (Fundo Nacional de Aviação Civil)", esclarece o diretor da Abetar. Os principais investimentos, de acordo com o levantamento da instituição, serão destinados à implantação de novas pistas ou ampliação de pistas existentes, bem como de pátios de aeronaves, terminais de passageiros, equipamentos de proteção contra incêndio, de inspeção de passageiros, de proteção ao voo, estacionamentos de veículos - além de infraestrutura básica, balizamento noturno e projetos de engenharia.
O trabalho aponta para um total de R$ 2,3 bilhões, o que equivale a cerca de R$ 460 milhões por ano nesse período. "A priorização de investimentos busca um equilíbrio de distribuição adequada dos recursos, homogeneamente, entre as localidades", consta no projeto. De olho em modelos estrangeiros de administração de pequenos aeroportos que deram certo, os especialistas defendem a descentralização dos regionais no Brasil. O modelo norte-americano foi um deles. "Tanto na Austrália quanto nos Estados Unidos e no Canadá, a medida que surtiu efeitos favoráveis no desenvolvimento aeroportuário regional foi a descentralização. Nesses três países, os aeroportos regionais são geridos pelos 'condados' - aqui, os municípios - ou estados - províncias", explica Dorieldo Luiz dos Prazeres, da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).
CHINA VEM DESCENTRALIZANDO BOA PARTE DE SEUS AEROPORTOS PARA QUE FIQUEM MAIS PRÓXIMOS DAS ADMINISTRAÇÕES LOCAIS
O engenheiro civil do ITA, Anderson Ribeiro Correia cita mais um exemplo. "Além da situação dos Estados Unidos, podemos mencionar a China, que vem descentralizando boa parte de seus aeroportos também, demonstrando que esses aeroportos devem ficar mais próximos das administrações locais". Em relação ao Brasil, ele acredita que várias prefeituras vêm buscando administrar aeroportos que atualmente são geridos pelo governo federal. "Cito São José dos Campos (SP) e Campos (RJ), que vêm empreendendo esforços para municipalizar os aeroportos em sua área de influência", diz Correia.
No último Simpósio de Transporte Aéreo (Sitraer 2011), Celestino e Prazeres apresentaram os exemplos dos sistemas aeroportuários norte-americano e canadense, com base no estudo que desenvolveram, intitulado A Atuação de Entidades Sem Fins Lucrativos na Gestão de Pequenos Aeroportos no Brasil. "No Canadá, o sistema aeroportuário regional se desenvolveu de forma sustentável em função da criação de entidades privadas sem fins lucrativos para gerir aeroportos deficitários", explica Prazeres. "Como entidades sem fins lucrativos não podem distribuir dividendos, os recursos são revertidos na provisão e expansão da infraestrutura, o que fortalece cada vez mais os aeroportos".
O professor da Universidade de Calgary, no Canadá, Alex de Barros, explica que um estudo realizado em 2004 pelo governo daquele país mostrou que "aproximadamente metade dos aeroportos regionais sob gestão local funcionava com déficit operacional e necessitava de aporte de recursos por parte das prefeituras para continuar funcionando". E enfatiza: "É importante lembrar que a população do Canadá corresponde a aproximadamente um quinto da população do Brasil".
Em todos os âmbitos, os brasileiros ainda têm muito trabalho pela frente até colocar em prática o uso os aeroportos regionais. Para respaldar a corrida - contra o tempo -, o estudo da Abetar deverá entrar em uma segunda fase complementar. Para isso, depende do interesse do governo federal. Os resultados obtidos até agora, porém, já estão sendo utilizados pela SAC como referência principal para levantamentos da instituição.
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Andrea Polimeno
Publicado em 23/01/2012, às 09h12 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45
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