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Tráfego Aéreo

Gargalo no ar

Mais de cinco anos após o acidente com o voo 1907 da gol, pilotos ainda reclamam dos serviços ATC no Brasil e pedem que país busque referências nos EUA e na Europa para encontrar soluções




No meio do trajeto entre o aeroporto de Guarulhos e o Galeão, o controlador de voo do Rio de Janeiro nos ordena executar órbita de espera. Pouco antes, já havíamos mudado nosso planejamento, depois de o APP nos avisar que estavam trocando a cabeceira em uso. Transfeririam as operações da 15 para a 28. Começo a ficar preocupado com o combustível, considerando que temos apenas o disponível para executar 15 minutos de espera e, então, retornar para Guarulhos. Minutos mais tarde, o controlador de voo nos informa que serão necessárias mais três órbitas de espera. Falo para o copiloto responder que não teremos condições. Após um pouco de silêncio no rádio, o controlador libera nosso voo para prosseguir na aproximação".

Esse depoimento foi publicado recentemente na revista Flying pelo comandante Les Abend, que voa Boeing 777 pela American Airlines. Seu artigo traz alguns detalhes da operação sobre solo brasileiro, e aponta algumas deficiências do controle de tráfego aéreo. Em seu texto, o comandante Les Abend faz ressalvas importantes: "Nos Estados Unidos, cumprimos o perfil das cartas de aproximação do modo como estão publicadas. Já no Brasil, a confusão é grande. O controlador de voo autoriza descer 'via', mas acaba determinando altitudes e velocidades. Ou seja, na maior parte das vezes, não cumpre o que está previsto na carta STAR. No meu voo, fiquei em dúvida sobre a altitude autorizada e acabei nivelando a aeronave em um nível de voo superior ao autorizado. Quando tentei confirmar qual seria a correta instrução, simplesmente não consegui, pois o controlador atendia a outro voo, só que utilizando uma linguagem mais de bate-papo do que de fraseologia padrão. E em português. Nossa consciência situacional do que acontecia ao nosso redor era nula", desabafou Abend.

O relato do piloto norte-americano alimenta uma discussão que já se estende por alguns anos no Brasil, a adequação da infraestrutura de controle de tráfego para a atual demanda do transporte aéreo do país. Desde o acidente com o voo 1907 da Gol Linhas Aéreas, em 29 de setembro de 2006, quando um Boeing 737-800 e um jato executivo Embraer Legacy 600 se tocaram em pleno voo, o assunto preocupa sobremodo operadores nacionais e internacionais. Nos últimos meses, porém, as queixas de pilotos e controladores de tráfego aéreo parecem ter se intensificado. A seguir, reproduzimos algumas das mais constantes reclamações dos operadores seguidas de soluções utilizadas em países mais desenvolvidos.

ESPERAS EM ÓRBITA
O comandante Les Abend teve sorte em sua órbita de espera, dizem alguns pilotos brasileiros de linha aérea, que pedem para não se identificar. Não faz muito tempo, um deles, diante de uma situação parecida, acabou retornando a Guarulhos para reabastecer. Sim, um voo que teria duração de 35 minutos acabou levando mais de uma hora e nem sequer foi concluído até o seu destino final. Os relatos dos pilotos dão conta de que esse tratamento vem se tornando padrão em situações de degradação, principalmente àquelas decorrentes de condições meteorológicas adversas. E o pior, argumentam os aeronautas, é que alguns aeroportos são coordenados, ou seja, requerem uma autorização do CGNA (Centro de Gerenciamento de Navegação Aérea) para serem utilizados como alternativa. "Resumindo, o aeródromo de alternativa constante no plano de voo, utilizado para o cálculo de autonomia, pode não ser aquele para o qual o piloto terá de prosseguir", revela um controlador de voo, que também prefere não se identificar.


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PERGUNTAS AO DECEA
Essas queixas têm procedência? Por que isso vem acontecendo e o que está sendo feito para evitar essas situações?
Por ocasião do voo com mau tempo, em vez de prosseguir para o aeródromo alternativo, alguns pilotos optam por aguardar melhorias das condições meteorológicas para prosseguir para o pouso. Porém, independentemente do julgamento dos pilotos por aguardarem ou seguirem para a alternativa, essa parada no fluxo do tráfego aéreo leva ao congestionamento da área de Controle Terminal (TMA) onde está localizado a aeródromo afetado. Assim, é necessário que os controladores realizem desvios e determinem esperas a fim de prover segurança às aeronaves na área. Eventualmente, pode ocorrer o direcionamento das aeronaves para aeródromos diferentes daqueles constantes no plano de voo e um dos motivos para essa ocorrência é a própria capacidade dos aeródromos de receberem aeronaves.

COMUNICAÇÃO DIFÍCIL
O problema da comunicação é preocupante, reclamam os pilotos. Segundo eles, são necessárias mais frequências e uma melhor divisão dos setores - talvez até por uma questão de falta de controladores. "É difícil conseguir que o controlador responda a alguma solicitação quando há muitos voos sendo atendidos ao mesmo tempo. Os desvios meteorológicos, que deveriam ser solicitados aos controladores, acabam sendo executados antes da liberação, justamente porque não se consegue falar com o órgão de controle a tempo", queixam-se os pilotos. O inglês dos controladores brasileiros é outro entrave, conforme se viu no artigo da Flying. "Chega-se ao ponto de pilotos brasileiros traduzirem as solicitações de colegas estrangeiros. Certa vez, em Guarulhos, um Airbus A340 da South African arremeteu quando estava na final para pouso da pista 27L. O piloto de um Boeing 747-400 da British Airways, que pousava logo atrás do SAA, perguntou ao controlador se, na possibilidade de uma arremetida, ele deveria seguir o que estava publicado na carta aérea ou executar outra rota de forma a prover melhor separação com o A340. O controlador pediu para o piloto repetir o questionamento e não entendeu de novo. Um piloto brasileiro traduziu a solicitação, mas a Torre Guarulhos preferiu não se pronunciar. O piloto da British acabou desistindo de saber a resposta para seu questionamento e disse no rádio: 'Forget about it!' (esqueça o assunto)", relata um piloto, que pede para não ter seu nome divulgado.

PERGUNTAS AO DECEA
O nível do inglês dos CTA do Brasil precisa melhorar? Como e quando isso aconteceria?
Os controladores de voo que atuam em setores onde há tráfego aéreo internacional são submetidos a avaliações anuais. De acordo com a recomendação da OACI (Organização da Aviação Civil Internacional), o nível mínimo a ser alcançado é o 4, em uma escala que vai de 1 a 6. Hoje, nossos controladores encontram-se neste patamar de proficiência, que é o considerado por aquela organização, como suficiente para manter a operação em níveis adequados de segurança. Além disso, há investimentos para que o uso desse idioma, por parte dos controladores, possa sustentar o diálogo com pilotos estrangeiros cujo idioma nativo não é o da língua inglesa.

BURACOS NEGROS
Entre boa parte dos tripulantes técnicos que voam no Brasil parece não haver dúvidas de que, mesmo depois do acidente com o Boeing 737 da Gol em 2006, o serviço de controle de tráfego aéreo continua apresentando falhas crônicas de comunicação e de cobertura radar, especialmente nas regiões Norte e Nordeste. Na área do estado do Amazonas, para a qual convergem diversos voos que vão e voltam dos Estados Unidos, a confusão é grande, dizem os pilotos. Segundo eles, ninguém consegue escutar claramente as orientações do controlador de voo, ou ele simplesmente não atende ao voo. As "pontes", termo utilizado quando um piloto transmite ao controle as intenções de outro voo, são comuns na área de jurisdição do Centro Amazônico (Cindacta 4), órgão de controle ACC responsável por todas as operações na região Norte do país, afirmam pilotos que voam sobre essa região. "A falta de cobertura radar também é um fato corriqueiro. Não é difícil escutar o controlador de voo trabalhando à moda antiga, solicitando aos voos seus estimados sobre os fixos de notificação compulsória nas aerovias", relata um comandante de linha aérea. Como ferramenta de segurança para evitar colisões frontais em aerovias de mão dupla, não resta alternativa aos pilotos senão voar em modo "offset", ou seja, programa-se no computador da aeronave voar uma milha ou mais à direita do eixo da rota.

PERGUNTAS AO DECEA
O que vem sendo feito para solucionar essa situação e quando esse tipo de reclamação deixará de acontecer?
Não há nenhuma área sobre o território continental brasileiro sem cobertura radar na faixa de altitude utilizada pela aviação comercial. A cobertura de comunicações cobre toda a área do espaço aéreo sob a responsabilidade brasileira e conta, ainda, com frequências secundárias que servem como alternativas. Durante a execução do cronograma de manutenção preventiva dos equipamentos técnicos do DECEA, é possível perceber que existem algumas falhas técnicas que são de natureza esporádica, como ocorre como todo equipamento eletrônico e que, por ocorrerem inadvertidamente, são corrigidas por equipes de manutenção que estão permanentemente de sobreaviso. Em função disso, todos os setores de controle possuem frequências secundárias, inclusive de alta frequência (HF), que servem como alternativas para pilotos e controladores. É importante também esclarecer que o fato de o controlador solicitar estimadas para determinados fixos não signifi- ca a ausência de cobertura radar e, sim, mais uma redundância de procedimento para garantir a segurança das operações aéreas.


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Problemas nacionais

EXAGERADAS SEPARAÇÕES
Brasil, Uruguai e Argentina ainda despontam como países em que o controle de tráfego aéreo exige separações exageradas entre aeronaves. Recentemente, conforme relato de um piloto, o Controle Resistência (Argentina) não autorizou dois aviões voarem no mesmo nível, com separação de 40 milhas náuticas entre um e outro, sendo que o jato da frente estava mais veloz. Para os argentinos, a separação tem de ser de 80 milhas náuticas e não menos do que 10 minutos entre um avião e outro. Situação semelhante acontece na área de controle do Centro Montevidéu, que exige que Ezeiza (Argentina) e o Centro Curitiba (Cindacta 2) entreguem a eles os aviões com separação mínima de 10 minutos. Se não for possível conseguir essa separação, os controladores de voo são simplesmente obrigados a solicitar órbitas aos voos quando nivelados, muitas vezes recusadas, já que o plano de voo não prevê esperas em rota, somente no alternado. "Consumir combustível em órbitas durante o trajeto em voo nivelado degrada substancialmente a segurança da operação na medida em que o piloto deixa de ter uma reserva ideal para eventuais mudanças de pista, arremetidas e o pouso em aeroporto de alternativa", constata um comandante de linha aérea.

As separações entre voos no Brasil também são extremas. Muitos controladores de voo são novatos e, mesmo sem experiência, já trabalham em áreas vitais de controle de tráfego aéreo, como os Cindactas (Centros Integrados de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo), que são os órgãos ACC responsáveis pela vigilância radar e controle das aeronaves que estão voando em rota. Na prática, afirmam os pilotos, os comandos "reduza a velocidade" e "vetoração para sequenciamento" tornaram-se obrigatórios no dia a dia de controladores brasileiros de tráfego aéreo. "Mas é claro que não se pode atribuir a responsabilidade por essa situação exclusivamente ao serviço de controle de tráfego aéreo. A falta de infraestrutura no solo acaba 'emperrando' as operações. Faltam, por exemplo, pistas de táxi para saída rápida a partir da cabeceira 27L em Guarulhos (SP). Todo avião que pousa só pode livrar a pista pela taxiway Golf, o que acarreta em demora na liberação da área de movimento. Por isso, o espaçamento tem que ser maior. A distância reduzida entre as duas pistas de Guarulhos também impede que um controlador libere uma decolagem se um avião que está pousando na outra pista paralela já passou o fixo de aproximação final. Isso no Brasil, pois nos Estados Unidos e na Europa, o fluxo de tráfego aéreo é tratado de outra forma, até como uma forma de cooperação do serviço de controle para com a economia de combustível e menos emissões de poluentes na atmosfera", pondera outro piloto da aviação regular.

PERGUNTAS AO DECEA
É possível obter esse aumento de produtividade nas operações, com redução das separações e outras medidas? Quando isso vai acontecer?
Todos os controladores de voo que atuam no DECEA são capacitados para suas funções, independente do tempo de serviço. Todos são formados pela Escola de Especialistas de Aeronáutica, em Guaratiguetá (SP), e, posteriormente, realizam um estágio de aperfeiçoamento no Instituto de Controle do Espaço Aéreo (ICEA), em São José dos Campos (SP), onde treinam todos os tipos de situação em simuladores de controle do espaço aéreo. O Brasil já possui, hoje, aproximadamente 7 mil profissionais envolvidos diretamente no tráfego aéreo, entre controladores e especialistas em comunicação, operação de estações, meteorologia e informações aeronáuticas. Entre os controladores, o número está acima de 4 mil, entre civis e militares. Em 2011, foram formados 300 controladores e a expectativa para 2012 é de 261.

Em paralelo, há o investimento em novos equipamentos e sistemas, como Sistema Avançado de Gerenciamento de Informações de Tráfego Aéreo e Relatório de Interesse Operacional, o Sistema Sagitário. Capaz de processar dados de diversas fontes de captação como radares e satélites e consolidá-los em uma única apresentação visual para o controlador de voo, o software permite, por exemplo, a sobreposição de imagens meteorológicas sobre a imagem do setor sob controle, para acompanhar, por exemplo, a evolução de mau tempo em determinada região do país. Os planos de voo também podem ser editados graficamente sobre o mapa possibilitando inserção, remoção e reposicionamento de pontos do plano e cancelamento de operações, o que permitirá ao controlador acompanhar melhor a evolução do que estava previamente planejado para o voo. Além disso, etiquetas inteligentes, por meio de cores diferentes de acordo com o nível de atenção para o cenário, indicam informações essenciais para o controle de tráfego aéreo. Já operacional nos quatro CINDACTA, o Sagitário se destaca ainda pelo uso preferencial do mouse, uma linguagem visual de fácil entendimento e uma preocupação até com o contraste entre as cores, o que facilita o trabalho dos controladores e torna a operação mais segura.

Os resultados desses investimentos já começaram a ser alcançados. Um exemplo é a ampliação do número de tráfegos simultâneos na área do Serviço Regional de Proteção ao Voo de São Paulo (SRPV-SP). No início de 2010, eram 30 aeronaves controladas ao mesmo tempo. Em 2012, será atingida a capacidade de 60 tráfegos simultâneos. Ressalta-se, ainda, que somente entre 2000 e 2010 foram investidos R$ 3,3 bilhões, sendo R$ 1,5 bilhão somente a partir de 2008. E, apesar de um crescimento anual no tráfego aéreo acima de 10% em 2009, a OACI realizou uma auditoria no sistema de controle do espaço aéreo brasileiro e o classificou dentre os três melhores no mundo. De acordo com o órgão, ligado às Nações Unidas, o Brasil atingiu 95% de conformidade em procedimentos operacionais e de segurança.


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Entre os próximos passos está a implantação do conceito de controle baseado na perfomance das aeronaves (Performance Based Navigation), que permitirá uma menor separação entre as aeronaves, com aumento significativo do número de tráfegos simultâneos em áreas de grande volume de tráfego aéreo. O sistema já entrou em operação na área do Rio de Janeiro, mas sua implantação total depende também das aeronaves e da capacitação dos pilotos civis, que precisam estar aptos a realizarem este tipo de procedimento. Além disso, há estudos no sentido de diminuir a separação longitudinal na aproximação final em áreas terminais, das atuais 5 milhas náuticas, para 3 milhas náuticas, mas é necessário esclarecer que a redução da separação numa final para pouso também dependerá de um adequado treinamento dos pilotos.

CONFUSÃO COM NOVAS CARTAS
O Departamento de Controle do Espaço Aéreo vem editando novas cartas aéreas para os principais aeroportos do país. Tal medida, porém, em vez de ajudar, tem causado confusão entre aviadores e controladores de voo. "Um mesmo nome de carta STAR para todas as cabeceiras de um aeroporto não ajuda em nada o piloto, principalmente quando se tem muita carga de trabalho no cockpit por conta de mudanças de pista em uso, o que torna necessária a aceleração dos trabalhos para um novo briefing da aproximação", explica um dos pilotos ouvidos por AERO. Nos Estados Unidos, ele explica, uma STAR atende a duas cabeceiras numa mesma carta aérea. "Existe um único fixo para distribuição dos tráfegos. Nele, há instrução para o piloto cruzar a uma determinada altitude, se for pousar por uma cabeceira, ou para cruzar em altitude mais elevada, se for fazer a aproximação para a cabeceira mais distante. A partir de lá, o voo passa a ser vetorado pelo radar até a aproximação final. Para as outras pistas, muda-se o nome da carta STAR".

A confusão gerada pela edição de inúmeros procedimentos de saída e chegada, aliada à criação de novos fixos em aerovias, que praticamente têm os mesmos nomes, tem levado muitos controladores de tráfego aéreo a sugerirem aos pilotos que enviem seus relatórios de perigo (Relper) ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa). Na aerovia UZ44, entre o Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo, existem os fixos PUBTA, PUBTI, e PUBTU, reclamam os pilotos. Como se pode notar, a única diferença está nas vogais. Para os pilotos estrangeiros, a dificuldade de pronuncia é ainda maior. Em outro exemplo, os pilotos queixam-se dos fixos da aerovia UZ36, que passa por Salvador, cujos nomes também são praticamente iguais: PABOM, PABOP e PABOG. A questão aqui é que alguns acidentes na aviação comercial foram causados justamente pela confusão gerada por nomes parecidos de fixos ou auxílios à navegação. A pergunta que os pilotos se fazem é por que não se trabalhar como no exterior. "Lá os nomes das cartas de saída e de chegada são os mesmos há décadas. Veja o caso da STAR FLIPR para Miami. Mesmo com a criação de novas aerovias, os fixos recebem nomes bem diferentes, justamente para não causar qualquer tipo de mau entendimento na instrução dada pelo serviço ATC aos aviadores", lembram os pilotos.

PERGUNTAS AO DECEA
O DECEA tem conversado com os pilotos sobre isso? tais queixas procedem? o que é possível ser feito para resolver essa situação?
Antes de implantar mudanças no controle do espaço aéreo, o DECEA emprega sua metodologia de Tomada de Decisão em Colaboração (CDM), que intensifica a troca de informações entre todos os envolvidos no processo e torna o resultado fruto de um consenso colaborativo e não unilateral. Isso é válido para, por exemplo, instruções normativas relativas a cartas de saída, chegada e de rota. quanto aos novos nomes dos fixos, não constam reclamações formais de incidentes ocorridos ou descontentamento por parte dos usuários relacionados com os nomes dos fixos de posição das cartas de rota brasileiras.

Soluções internacionais

ROTAS DIRETAS
Na Europa e nos Estados Unidos, é quase um lema entre os controladores de voo a autorização de proas diretas com o intuito de poupar o combustível das aeronaves e, por tabela, poluir menos o meio ambiente. Não é difícil, por exemplo, um controlador do Centro Miami (ARTCC) receber um voo do controle de San Juan (Porto Rico) e o liberar para voar com proa direta da posição FLIPR, que está inserida no ponto médio da aproximação STAR FLIPR TWO, para pouso no Aeroporto Internacional de Miami. Resumindo, o voo, a 900 milhas náuticas do seu destino, recebe a autorização para voar praticamente com rumo direto da perna do vento. Para os voos que decolam de aeroportos norte-americanos, também não há segredo. Em solo, o piloto normalmente recebe a autorização para cumprir uma determinada saída e aguardar o nível de cruzeiro 10 minutos após a decolagem. Alinhado na pista, o controlador da torre orienta uma proa, seguir em frente ou executar uma curva, e libera a decolagem. Assim que o voo chama o Tracon, recebe uma pequena vetoração e, em pouco minutos, é liberado voar com o rumo direto para um fixo na aerovia. Importante: as transmissões são altas e claras e os controladores atendem aos voos na primeira chamada.


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OPERAÇÕES SIMULTÂNEAS
Nos Estados Unidos, os controladores de voo também trabalham com menos espaçamento longitudinal entre as aeronaves que se aproximam para duas pistas paralelas com menos de 760 metros de separação, exigidos pela Oaci (Organização da Aviação Civil Internacional) para operações simultâneas. Se o aeroporto estiver operando em condições visuais, o serviço de aproximação final (Tracon - Air Traffic Control) alinha duas aeronaves lado a lado. Apenas pergunta ao voo se está com o outro à vista. Para dar certo, basta que o piloto de cada aeronave reduza a velocidade adequadamente antes de interceptar o alinhamento final, evitando, assim, ultrapassar o eixo do Localizador, no ILS. As raras vezes em que os controladores de voo norte-americanos enfrentaram problemas graves com quase colisões e acionamento de manobras evasivas orientadas pelos equipamentos embarcados de TCAS, os aviões envolvidos eram de companhias estrangeiras cujas tripulações deixaram para reduzir a velocidade da aeronave na última hora, culminando em "overshoot" do eixo de aproximação.

Antes de o Aeroporto Internacional de Frankfurt inaugurar a sua terceira pista paralela - a quarta do complexo -, os controladores de voo alemães também operavam aproximações simultâneas para duas pistas paralelas com menos de 760 metros de separação longitudinal, mas separavam os aviões por altitude. Como isso era feito? Muito simples. Para uma mesma pista, o aeroporto operava dois equipamentos de aproximação para ILS: um deles orientava aproximações para que as aeronaves tocassem a pista no início dela; o outro equipamento trazia os voos um pouco mais altos, para tocarem o solo um pouco mais à frente, numa cabeceira deslocada, que recebia uma numeração diferente (uma cabeceira tem a designação 25L e a outra, 26, por exemplo). Antes de iniciar a aproximação, o piloto era informado em qual das cabeceiras iria pousar e, normalmente, o controlador de voo sempre reservava a pista inteira para o pouso de jatos mais pesados. Talvez a operação de dois equipamentos de ILS numa mesma cabeceira seja uma boa solução para Guarulhos, que hoje não opera pousos simultâneos justamente pela falta de maior distanciamento entre suas duas pistas paralelas (09R/27L e 09L/27R). Contudo, para que uma operação desse tipo possa ser executada de maneira adequada, os controladores de voo têm de ser experientes e possuir boa noção de performance das aeronaves. Além disso, os pilotos precisariam cumprir à risca as orientações do serviço ATC, principalmente quanto à velocidade empregada na aproximação.

ENTRADAS E SAÍDAS RÁPIDAS
No Aeroporto Internacional de Londres - Heathrow, é comum observar autorizações para alinhamentos de duas aeronaves de médio porte na mesma pista, sendo que uma ingressa pela cabeceira e a outra um pouco mais à frente, numa intersecção. Esta última inicia a decolagem e, assim que deixa o solo, a que está alinhada na cabeceira recebe a autorização para iniciar a corrida. Assim, diminui-se o tempo de espera em solo, o congestionamento, os atrasos e o consumo exagerado de combustível. Do mesmo modo, os controladores de tráfego aéreo britânicos reduzem o espaçamento entre aeronaves no pouso e, muitas vezes, emitem orientações com os termos "land after", ou seja, liberam a aterrissagem avisando ao piloto que ele irá pousar depois de um determinado voo. E não é difícil observar uma aeronave cruzando a cabeceira enquanto outra acaba de livrar a pista em uso.

PILOTOS OBEDIENTES
Importante ressaltar que as coisas funcionam bem na Europa porque os pilotos também seguem à risca o que os controladores de tráfego aéreo orientam. Se pedem para voar com 210 nós, não é 200 e nem 220, mas os exatos 210 nós. Além disso, não se reduz velocidade com muita antecedência. Em aeroportos como o de Heathrow, há especificação em carta aérea para que o piloto mantenha 160 nós até quatro milhas antes da cabeceira. O avião aproxima-se configurado (trem baixo e full flaps), mas com a velocidade "escravizada" em 160 nós até a aproximação final. E se o piloto não cumprir essa norma, certamente receberá um "puxão de orelhas" do controlador de voo, passível de reporte oficial.

SISTEMA NEXTGEN
A FAA (Federal Aviation Administration) quer melhorar ainda mais o trabalho de controladores de voo e dos pilotos nos Estados Unidos. Já está em debate no Congresso a liberação de uma verba de US$ 15 a 20 bilhões para implantação do sistema NextGen (Next Generation Air Transportation System), para o serviço de controle de tráfego aéreo. As velhas antenas de radares deixarão de existir e o serviço passará a ser executado com base em sinais de satélites do tipo GPS. Como o sistema de posicionamento global já oferece uma indiscutível precisão para as aeronaves que têm o equipamento embarcado, o serviço ATC também ganhará em confiabilidade e assim os controladores de voo terão ferramentas para autorizar proas diretas. A implementação do sistema em todo o território norte-americano deverá acontecer até 2025, mas ainda deve passar pela aprovação do Congresso, principalmente no que diz respeito ao orçamento. Não obstante, ainda há outros debates pela frente, já que todos os aviões deverão estar equipados com o sistema ADS-B (Automatic Dependent Surveillance - Broadcast), o que trará despesas adicionais a alguns operadores. "Não vemos como custo, mas um investimento na medida em que os voos poderão partir de Boston ou Nova York e voar com proa direta de destinos na Flórida ou no Caribe, sobre o oceano", destaca J. Randolph Babbitt, diretor da FAA. A companhia JetBlue está trabalhando em parceria com a administração federal de aviação nos EUA, oferecendo suas aeronaves para os voos de teste. Outros 35 jatos mais antigos já estão recebendo o equipamento ADS-B para que toda a frota possa interagir com o sistema NextGen, cujos equipamentos serão fornecidos pela Honeywell com designação "4-Dimensional Flight Trajectory-Based Operations". A empresa, que é líder na fabricação de sistemas de gerenciamento de voo, promete que os voos irão cumprir rotas mais adequadas, ao mesmo tempo em que os controladores de voo poderão evitar congestionamentos nos aeroportos, melhorar o fluxo dos tráfegos e aumentar a capacidades das terminais. "Tanto o piloto quanto o controlador de voo deverão diminuir seu workload, sem a necessidade frequente de reduções de velocidade e descidas intermediárias durante aproximação (steps). Teremos menos necessidade de vetorações e as aproximações serão mais diretas com menos gasto de combustível", garante Chad Cundiff, vice-presidente de Crew Interface Products, na Honeywell Aerospace.

A FAA calcula que, somente em 2010, conseguiu trazer para as companhias aéreas norte-americanas uma economia de combustível da ordem de US$ 229 milhões, o que representa uma redução de apenas 1% no gasto anual. Com a implementação do NextGen, a economia será bem maior. "Na área terminal de Houston, por exemplo, a FAA calcula que os voos voarão 648 mil milhas a menos por ano, com redução de 31 mil toneladas em emissões de CO2 na atmosfera", prevê Babbitt.


Por: Giuliano Agmont
Publicado em 21/05/2012, às 13h28 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45


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