Além da venda de mais de 1.000 aeronaves, a 50ª edição do principal salão aeronáutico do mundo marca o lançamento do Boeing 787-10 e da família Embraer E2, o burburinho em torno dos Bombardier CSeries e a passagem baixa do Airbus A350
O mais importante evento da aviação mundial apresentou em sua 50ª edição números recordes. Em 2013, o Paris Air Show teve um público estimado de quase 180.000 pessoas e mais de 139.000 profissionais, que circularam por 52.000 m² de espaços cobertos, 340 chalés e 43.000 m² de exibição estática ocupados por 2.215 expositores. Nos primeiros cinco dias do Salão Aeronáutico de Le Bourget, foram assinados mais de US$ 150 bilhões em contratos com pelo menos 1.079 aviões encomendados e 447 opções de compra. Foram 682 aviões de corredor único, 400 regionais, 290 widebodies e 154 turboélices. No total, 682 aviões a mais do que em Farnborough 2012, um número que será difícil de superar nas próximas edições do Paris Air Show.
Antes do evento, circulavam especulações dando conta de possíveis produtos que poderiam ser lançados no mercado. A lista de boatos naqueles dias era encabeçada pela Boeing e a possível revelação de uma nova variante do 777, assim como o de uma versão mais longa do 787.
O gigante norte-americano ficou com o terceiro lugar em encomendas durante a feira de Paris. Recebeu 342 pedidos de aeronaves correspondentes a um valor equivalente a US$ 66 bilhões. Os aviões mais vendidos foram os 737, tanto as versões NG quanto os novos MAX, cuja entrega foi adiantada em quatro meses, ou seja, ainda em 2017. A companhia de leasing CIT assinou uma ordem de compra de 30 jatos 737 MAX 8, por US$ 3 bilhões.
Já a companhia aérea de baixo custo Ryanair, que possui 303 aviões Boeing 737NG em sua frota, fez uma compra de mais 175 dessas aeronaves, avaliadas em US$ 15,6 bilhões, representando a maior venda já feita pela Boeing a uma empresa europeia. A companhia aérea irlandesa recebeu seu primeiro 737-800 em 1999 e hoje conta com a maior frota da Europa, operando mais de 1.600 voos diários. O anúncio realizado pela Boeing e a Ryanair faz com que as encomendas de aviões 737 superem as 11.000 unidades, com mais de 3.400 aviões ainda por entregar.
Os boatos sobre um novo Dreamliner se confirmaram e, no segundo dia do evento, a Boeing recebeu todas as atenções com o lançamento do terceiro membro da família, o 787-10. Um total de 102 encomendas mais opções foram assinadas por companhias aéreas como Singapore Airlines, British Airways e United Airlines, além de empresas de leasing como ALC e GECAS. O 787-10 representará uma forte concorrência à família Airbus A350 e a Boeing pretende manter-se como líder do mercado de bijatos widebody, posição que conquistou com a família 777. A nova aeronave terá um alcance de 12.965 km (7.000 nm), suficiente para cobrir mais de 90% das rotas operadas por esse tipo de avião, e terá capacidade para 300 a 330 passageiros.
"O 787-10 será o avião comercial mais eficiente e econômico da história e apresentará o conforto típico dos Dreamliner", disse Ray Conner, diretor da Boeing Commercial Airplanes. "O novo -10 será 25% mais eficiente do que os atuais aviões do seu tamanho e 10% mais eficiente do que qualquer avião que a concorrência possa apresentar no futuro", acrescentou o executivo. A Boeing espera iniciar a montagem final do 787-10 em 2017, com a primeira entrega planejada para 2018.
Já o modelo 777, mesmo depois de vários anos de grandes encomendas, contiuou dando o que falar em Le Bourget neste ano de 2013, pois a Qatar Airways anunciou a aquisição de nove 777-300ER e opções para mais sete. É importante lembrar que a companhia aérea baseada em Doha conta com uma frota de 35 jatos 777, incluindo 22 777-300ER, nove 777-200LR e quatro cargueiros 777F. Outra empresa que fez pedidos do 777 foi a Korean Airlines, que encomendou seis 777-300ER, além de cinco 747-8 Intercontinental.
Bombardier CSeries
O fabricante europeu ficou com o primeiro lugar em encomendas na 50º edição do Paris Air Show, registrando pedidos de 466 aviões avaliados em US$ 68,7 bilhões. Esses números incluem memorandos de entendimento para 225 aeronaves por US$ 29,4 bilhões e encomendas firmes de 241 jatos, por US$ 39,3 bilhões.
Embora a expectativa de que o Airbus A350 viesse a ser o best-seller do evento, a estrela do ano foi a já bem-sucedida família A320, e sua nova versão, o A320neo. Nos quatro primeiros dias do show, a Airbus recebeu encomendas de seis companhias aéreas para 371 unidades desse produto, composto pelas variantes A319, A320 e A321, que garantiu mais de US$ 37,8 bilhões à conta da empresa. Das 371 aeronaves, 88 foram A320ceo (versão atual), o que demonstra que esse modelo continua operando em níveis aceitáveis pela indústria. Os aviões restantes, com o novo motor (neo) foram encomendados por companhias aéreas como EasyJet, Lufthansa, Spirit Airlines e Syphax Airlines, além de empresas de leasing como a Hong Kong Aviation Capital e ILFC.
Le Bourget não foi palco apenas de assinaturas de pedidos. Companhias aéreas como Air New Zealand e Latam Airlines Group receberam cada uma delas um A320 equipado com os novos sharklets, que têm como finalidade o aumento da economia de combustível. Em uma cerimônia liderada por John Leahy, diretor de Aeronaves Comerciais da Airbus, a empresa entregou o 200º A320 à Latam, pintado nas cores da TAM. "Confiamos que a bem-sucedida família A320 continuará sendo uma parte fundamental da estratégia da Latam para o seu crescimento. Nosso compromisso é consolidar a nossa associação com a Latam, um dos maiores grupos de companhias aéreas do mundo", disse Leahy, antes de entregar as chaves do avião à empresa.
Até hoje, a Latam encomendou 380 aviões à Airbus e já tem mais de 250 em operação, sendo a maior operadora de A320 na América Latina e uma das maiores do mundo. LAN e TAM, agora Latam, mantêm relacionamento com a Airbus desde 1998. "O A320 tem sido um elemento chave para o crescimento da companhia e para o seu êxito na América do Sul", avaliou Roberto Alvo, vice-presidente de Funções Corporativas do Latam Airlines Group.
A TAM também tem encomendas do A350 XWB, que voou pela primeira vez apenas três dias antes do Salão de Le Bourget (leia mais na reportagem da p. 20). A Airbus conseguiu cumprir a meta que havia se proposto desde o início deste ano, deixando uma ótima impressão e criando, inevitavelmente, um contraste bastante significativo em relação ao controverso programa do seu rival Boeing, com o demorado 787 Dreamliner. Durante o evento, o A350XWB, que fez passagens baixas na feira, obteve 69 encomendas e compromissos e quatro novos clientes, por um valor de US$ 21,4 bilhões.
Apesar das dificuldades pelas quais passa atualmente, o grupo Air France-KLM realizou o primeiro pedido do evento. Foram 25 modelos A350-900, pelo valor de US$ 7,2 bilhões. A Singapore Airlines aumentou sua encomenda atual com 30 unidades do A350-900 adicionais. Da mesma forma, a norte-americana United Airlines realizou um novo pedido de 10 jatos A350-1000, aumentando a sua encomenda para 35 unidades e transformou os 25 pedidos anteriores da versão A350-900 para o A350-1000, de maior tamanho, destinados a substituir os Boeing 777 que possui na sua frota. Finalmente, a companhia aérea Sri Lankan assinou um compromisso de compra de quatro A350-900, além de seis A330-300.
Já o maior avião comercial do mundo, o A380, recebeu 20 encomendas da Doric Lease Corporation, uma das maiores companhias de leasing de aviões da indústria, por um valor de US$ 8 bilhões, e duas da Lufthansa.
Embraer E-Jets "E2"
A surpresa em Le Bourget ficou por conta da Embraer, que obteve 365 encomendas, ficando com o segundo lugar no ranking do Paris Air Show 2013. Além disso, o presidente e CEO da empresa, Frederico Fleury Curado, anunciou oficialmente o lançamento dos E-Jets "E2", cujos três membros da família serão conhecidos como E175-E2, E190-E2 e E195-E2.
Com a introdução dessa nova versão, a Embraer procura manter a liderança no mercado dos aviões de 70 a 120 assentos sob uma plataforma tecnológica que permitirá as companhias aéreas operar os aviões com níveis de eficiência "nunca vistos antes".
Após o anúncio da nova família, Curado confirmou um pedido de 100 modelos E-175-E2 para 80 passageiros, com opção para mais 100 por um valor de US$ 9,4 bilhões, feito pela regional norte-americana SkyWest, que será a cliente de lançamento da nova família. A empresa de leasing ILFC assinou uma carta de intenção de compra por 100 aviões E190-E2 para 97 passageiros e E195-E2 com 118 assentos.
De acordo com o presidente da Embraer, o E175-E2 será equipado com motores Pratt & Whitney PW1700G e deverá entrar em serviço em 2020, enquanto os E190/195-E2 terão motores PW1900G. O modelo maior entrará em serviço na primeira metade de 2018.
A principal concorrente da Embraer, a canadense Bombardier, que não conseguiu apresentar seu tão esperado e adiado CS100 em Le Bourget, investiu num chalé totalmente dedicado à família CSeries, com um mockup da cabine de passageiros. Apesar dos adiamentos e do desapontamento dos visitantes por não poder ver a aeronave, a Bombardier anunciou que durante o mês de junho cinco novos clientes se somaram ao programa CSeries: três são confidenciais e os outros são a Braathens Aviation e a Korean Air, que assinou uma carta de intenção para 30 aviões.
Durante o salão francês, a Bombardier assinou a venda de 10 jatos CS100 para a nova companhia aérea britânica Odyssey Airlines, por um valor de US$ 628 milhões.
No que se refere aos CRJ, a companhia aérea nigeriana ArikAir será a primeira empresa do seu país a operar o CRJ1000, após o fabricante canadense anunciar a venda de três desses jatos, além de quatro turboélices Q400NG, por US$ 297 milhões à empresa africana, que atualmente voa com jatos CRJ900 e dois Q400NG. Por outro lado, a Bombardier Business Airplanes obteve várias vendas dos seus mais recentes jatos executivos: a VistaJet, operadora exclusiva de aviões Bombardier, fez uma encomenda de 10 modelos Global 8000 e a australiana AVWest adquiriu quatro Global 7000 e dois Global 8000.
A320 da TAM com sharklets
No segundo dia do evento em Le Bourget, a Bombardier anunciou uma encomenda de três turboélices Q400 NextGen para 76 passageiros e sete opções da companhia aérea norte-americana Horizon Air, por um valor de US$ 98 milhões. Com essa encomenda, a frota de Q400 NextGen da empresa de Seattle chegará a 51 exemplares, a maior frota desse modelo no mundo. Já para o consórcio franco-italiano ATR, o Paris Air Show 2013 foi o melhor de toda a sua história, pois recebeu encomendas para 173 aviões, sendo 83 firmes e 90 opções, por um valor de US$ 4,1 bilhões, o que garante a sua produção até o ano 2016. A América Latina teve um papel importante nas negociações: o grupo Avianca-Taca recebeu o primeiro dos 15 ATR 72-600 destinados a substituir os Fokker 50 e assinou com o fabricante uma sociedade para a criação de um centro de treinamento de pilotos em Bogotá, Colômbia, que estará disponível aos 30 operadores de ATR na região.
A companhia aérea brasileira Passaredo encomendou 20 aviões ATR 72-600, com opção para mais 10. O mercado brasileiro já encomendou 59 dessas aeronaves desde 2010.
O consórcio ítalo-russo SuperJet International, por sua vez, formalizou a entrega de um Sukhoi SuperJet 100 (SSJ100) à companhia aérea mexicana Interjet, o primeiro cliente latino-americano a adquirir o modelo. O jato transportará 93 passageiros com um pitch - espaço entre as fileiras medido entre um ponto qualquer de uma poltrona delas e o mesmo da mais próxima - de 86,3 cm (34 pol). Os dois primeiros aviões estão sendo entregues e os seguintes serão a razão de um por mês, até concluir a encomenda de 30 unidades, no final de 2014.
Durante o Salão, a chinesa Comac e a canadense Bombardier assinaram um acordo para compartilhar determinadas áreas de desenvolvimento comuns ao C919 e ao CSeries. Posteriormente, espera-se "otimizar" a competitividade de ambos os programas, aproveitando as economias dos dois países para melhorar os custos e a participação do mercado de ambas as companhias.
Como já é costume, a aviação militar marcou presença em Le Bourget. Contudo, pela primeira vez, a Força Aérea dos Estados Unidos não esteve presente no evento, deixando um vazio, tanto na área estática quanto nas demonstrações de voo.
Fabricantes como Eurofighter e Finmeccanica mostraram seus melhores produtos, mas a grande surpresa ficou por conta da Embraer que, pela primeira vez, apresentou no Paris Air Show o A-29 Super Tucano. Outro produto brasileiro que chamou a atenção foi o do transporte KC-390, graças ao anúncio de colaboração entre a Embraer e a Boeing para incremento das estratégias de vendas.
No mercado de asas rotativas, o destaque ficou por conta da Bell. Além de anunciar melhorias nas especificações técnicas no programa 525 Relentless, no que se refere à velocidade, alcance e carga útil, além de maior peso máximo de decolagem e desempenho de voo otimizado, o fabricante norte-americano anunciou o seu retorno ao mercado dos helicópteros leves monomotores, com um novo produto para o mercado entry-level, ainda sem nome. A aeronave de cinco assentos deverá realizar seu primeiro voo em 2014 e a certificação tão rapidamente quanto possível. A velocidade será de 230 km/h (125 kts), alcance de 665 km (420 nm) e carga útil de 610 kg. O próximo Paris Airshow será de 15 a 21 de junho de 2015.
Enrique Perrella, De Le Bourget
Publicado em 11/07/2013, às 07h55 - Atualizado em 11/11/2014, às 11h34
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