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Grandes Ensaios da AERO

Voamos no Citation CJ3 entre Congonhas e São Carlos

Com mais espaço interno e motores mais potentes, o Citation CJ3 é a expressão máxima da linha de jatos leves da Cessna


Paul Bowen e Ricardo Beccari
Paul Bowen e Ricardo Beccari

Estou no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, prestes a voar o Cessna CJ3, modelo certificado em 2004, que possui motores mais potentes, asas maiores e fuselagem mais longa do que seu antecessor, o Citation CJ2.

Além disso, o CJ3 também teve aumentado em 10% seu peso máximo de decolagem e seus dois motores Williams FJ44-3A, controlados de modo eletrônico pelo Fadec (Full Autho- rity Digital Engine Control), aumentaram a velocidade de cruzeiro em aproximadamente 12%. Assim, o CJ3 oferece uma cabine mais confortável, melhor desempenho e maior alcance. E ainda manteve sua capacidade de pousar em pistas curtas, com pouco mais de 1.000 metros.

O sucesso da família Citation Jet começou em 1989, ano em que foi lançado o modelo 525, visando a renovação da frota dos antigos Citation 500 e Citation I. A ideia é que o novo avião também fosse uma opção para os operadores de aeronaves turboélice que desejassem realizar a transição para um jato sem incremento do custo operacional, por um custo de aquisição abaixo das aeronaves a jato disponíveis à época no mercado.

Citation CJ3

Outro ponto importante é que uma análise dos voos mais típicos da aviação executiva feita pela Cessna demonstrou que, em média, eles tinham duração de duas horas e transportavam menos de três passageiros. Portanto, nem é preciso dizer que, em pouco tempo, o Citation Jet tornou-se sinônimo de um jato leve, confortável e de alto desempenho.

O CJ3 é atualmente a expressão máxima desta linha de jatos. O segredo de sua evolução é que o fabricante ouviu as reivindicações dos operadores de CJ1 e CJ2 e, assim, conseguiu melhorar ainda mais a plataforma do CJ. No final, isso resultou em uma aeronave com uma das melhores relações custo-benefício da indústria. Isso porque vários pontos que eram criticados pelos admiradores e pelos desafetos do CJ2 foram melhorados no CJ3.

O primeiro deles foi o espaço interno: o CJ3 tem praticamente o mesmo layout interno, porém, é aproximadamente 60 centímetros mais longo, o que melhorou o conforto para seus ocupantes.

Além disso, os novos motores Williams International FJ44-3A, com 2.780 libras de empuxo cada, proporcionam uma performance muito boa por causa de uma melhor relação peso-potência. A grande revolução de conceito no CJ3 consistia em produzir uma fuselagem leve e utili- zar o então recém-desenvolvido motor Williams FJ441A, de 1.900 libras. Esse motor é o desenvolvimento dos motores utilizados em mísseis de cruzeiro, e tem como características a simplicidade de construção e a confiabilidade.

Assim como os modelos da Cessna, os motores Williams cresceram conforme os operadores pediam aeronaves com as mesmas virtudes, porém, um pouco maiores. Assim foi desenvolvido o FJ44-2C, de 2.300 libras de empuxo.

O desafio da motorização para o CJ3 foi um pouco maior, pois houve a necessidade de um salto de potência para garantir que uma aeronave maior e mais pesada tivesse performance similar aos modelos mais leves.

CJ3 Motor
A porta principal de acesso à cabine, com escada retrátil, e
o bagageiro traseiro que impressiona pelo tamanho. Note o motor sem o recurso de Thrust Attenuator
Trem de pouso CJ3
Trem de pouso principal do CJ3 é equipado com o sistema de amortecimento trailing-link
CJ3 bagageiro do nariz
Bagageiro no nariz tem ótimo espaço para transportar material do avião e malas da tripulação

Por causa disso, foi introduzido no novo motor um sistema de Fadec que controla todos os parâmetros do motor. Esse sistema eletrônico impediu que o regime de idle (marcha lenta) no solo gerasse tração residual para empurrar a aeronave. Isso permitiu aos engenheiros a remoção do recurso Thrust Attenuator, que se trata de um defletor na exaustão do motor, presente nos modelos CJ1 e CJ2. No caso do CJ3, quando a aeronave está no solo com o motor em idle, o fluxo de exaustão dos motores é direcionado para o lado, anulando a tração residual.

Outra característica do CJ3 é que, por causa de seu peso e do regime baixo de idle, não há a necessidade de utilizar o freio durante o taxiamento.

A engenharia da Cessna quebrou a cabeça para garantir a similaridade do CJ3 com os demais modelos da família. Por isso, as semelhanças operacionais do CJ3 e do CJ2+ para os pilotos são muito grandes. Basicamente, o que melhorou foi a introdução do controle digital eletrônico dos motores, o Fadec, que facilitou a operação do motor, reduzindo a carga de trabalho na cabine no momento dos ajustes de potência para decolagem, subida e cruzeiro.

Ainda estão presentes os tradicionais switches da Cessna em um painel de sistemas localizado abaixo do painel principal. Mas este layout pode estar com os dias contados, uma vez que o novo CJ4, irmão maior e mais moderno da família, em fase de certificação, substituiu todas essas chaves por push-buttons. O CJ4 também promete maior automatismo de sistemas, aproximando-se ainda mais do conceito de dark cockpit.

A linha de aviônicos ProLine 21, outro ponto em comum entre os três modelos da família CJ, é uma plataforma fantástica, pois reúne as ferramentas necessárias para uma operação com baixa carga de trabalho, como um FMS completo e as informações dispostas de forma intuitiva nas telas do painel. Um recurso muito útil é a possibilidade de visualizar as cartas no MFD. Isto reduz a manipulação de papel na cabine, o que é muito importante principalmente em operações com um único piloto (single pilot).

Porém, um ponto que pode ser melhorado é a posição do painel de controle do piloto automático, assim como os bugs de Heading e Course (indicações de proa e curso selecionadas pelo piloto e projetadas no HSI da tela primária de voo) que ficam no painel central, abaixo do FMS.

O ideal seria que fossem instalados no glareshield que, no CJ3, também reúne o painel de alarmes. O avião ensaiado estava equipado com um GPS Garmin 500 equipado com sistema de backup de navegação. O GPS foi instalado no painel, abaixo dos painéis de controle dos rádios.

CJ3

Nosso encontro está marcado para o Hangar 1 da TAM Aviação Executiva, que representa a Cessna no Brasil. Nosso comandante é o Sérgio, que possui uma vasta experiência na família Citation. Depois de um breve briefing na sala VIP seguimos para a aeronave. Não temos muito tempo, pois a restrição com os slots em Congonhas não permitem muita margem para folga.

Como todos os membros da família, o CJ3 está pronto para voar muito rápido. Nosso plano de voo para São Carlos está autorizado pelo Tráfego São Paulo, por isso, embarcamos rapidamente e fechamos as portas. Agora, com a autorização do Solo, iniciamos a partida com auxílio da GPU (Ground Power Unit). A partida é rápida, toda controlada pelo Fadec.

Desconectamos a fonte externa e completamos o scan flow para configurar os sistemas elétrico e pneumático para nossa decolagem. Precisamos aplicar um pouco de potência a fim de quebrar a inércia da aeronave e começar a rolagem para o início do taxiamento. O steering é controlado pelos pedais e o taxiamento é preciso e suave. O Fadec cumpre seu papel no solo, pois tão logo reduzimos a potência, a aeronave tem a tendência de desacelerar.

Configuramos o flap em 15 graus para a decolagem e agora estamos no ponto de espera, aguardando o sequenciamento para a decolagem. Somos, então, autorizados a alinhar e decolar. O Sérgio comanda os manetes do motor à frente e o Fadec encarrega-se de fazer o ajuste para a potência de decolagem. Fico impressionado com a razão de aceleração. A diferença para o CJ2 é realmente impressionante.

Rodamos o avião muito curto, com aproximadamente 900 metros, e percebo que, mesmo sendo mais pesado, o CJ3 mantém velocidades muito similares às do CJ2, provavelmente por causa do aumento da asa e a consequente manutenção da relação de carga alar.

Também me impressiona o fato do avião rodar firme e manter uma razão inicial de aproximadamente 2.500 pés por minuto; e acelerando. Na altitude de aceleração, comandamos a retração dos flaps e, com um leve movimento no manete, reduzimos o motor para o regime de subida, tudo controlado pelo Fadec.

CJ3

O conforto é muito bom e o nível de ruído, bem baixo. Seguimos subindo e o CJ3 mantém-se firme com razão de subida de pouco mais de 2.000 pés por minuto sem perder velocidade. O voo para São Carlos é rápido. Seguimos em baixa altitude, no FL 220, e rapidinho já estamos falando com o Controle Academia e coordenando nossa descida.

É um belo dia de sol no interior de São Paulo e logo estamos em contato visual com a pista. Cancelamos o plano instrumento e prosseguimos a descida para a altitude de tráfego e ingresso no circuito. Como toda a família CJ, com sua “asa reta” (com pouco enflechamento), as velocidades de aproximação e distâncias de pouso são bem curtas. O CJ parece um planador na descida para a interceptação da final.

Com o motor em idle, a aeronave não quer desacelerar. Estabilizados na final com flaps 30 graus e 110 nós, pouco antes de cruzar a cabeceira, mantivemos o motor em idle e, um pouco mais para baixo, a aeronave entra no efeito solo que é bem efetivo por causa da maior envergadura e da asa próxima do solo. O toque acontece com aproximadamente 90 nós. O sistema de amortecimento trailing-link é muito bom e absorve toda a energia do toque. O sistema de freio é de carbono. O CJ3 não possui reverso, mas um sistema de Ground Flaps é acionado. Com ele, após o toque do trem de nariz no solo, o flap é comandado para 55 graus e desempenha dois papéis na quebra da sustentação para firmar a aeronave no solo: aumenta a eficácia dos freios e cria arrasto aerodinâmico para auxiliar na parada.

Depois de um breve tempo de solo, em São Carlos, seguimos para a fazenda do Broa, em Itirapina, para a sessão de fotos no solo e em voo. Repetimos todos os procedimentos, com a única diferença de que utilizamos apenas energia da bateria para a partida, assim o ciclo demora um pouco mais e as temperaturas durante a partida ficam um pouco mais quentes. Mesmo assim, permanecem ainda bem distantes do limite máximo.

Essa etapa é toda feita sem o piloto automático para sentir um pouco mais a aeronave. O CJ3 é bem gostoso de voar, tem comandos leves e necessita um pouco de adiantamento no compensador para não ter de fazer força no profundor. Em poucos minutos, ingressamos no circuito do Broa. Agora, a pista é um pouco mais curta e estreita, mas isso não é problema nenhum para o CJ. Prosseguimos com 110 nós na final, pois o avião é liso e desacelera pouco. Antes da cabeceira, reduzimos o motor e vamos para o toque.

A técnica recomendada para este freio a carbono é aplicar uma pressão constante e única nos pedais e deixar o anti-skid trabalhar. No começo é um pouco estranho, mas é possível perceber que é bem efetivo.

O pouso também é bem curto, parando a aeronave em aproximadamente 700 metros. Depois de algumas operações de arremetidas, pouso e decolagem, seguimos para o pátio, a fim de realizar as fotos no solo.

Neste instante, observo com mais cuidado o interior da aeronave. Realmente houve uma melhora sensível no espaço para as pernas dos passageiros do club-seat e dos assentos traseiros. Nosso avião está configurado com sete assentos e conta com um toalete na parte de trás da cabine de passageiros.

A iluminação é feita por LEDs e o jato possui sistema de telefonia via satélite. Mas uma diferença sensível em relação aos irmãos menores é o espaço do bagageiro traseiro, com capacidade suficiente para as malas de todos os ocupantes, mesmo que isso inclua aquelas grandes malas de golfe.

O bagageiro é tão fundo que o comandante Sérgio usa uma haste para ajudar a puxar as malas que ficam mais no fundo do compartimento. Além do bagageiro traseiro, a aeronave conta com um bagageiro no nariz e pode transportar as malas da tripulação e materiais do avião.

Como já estava satisfeito com o resultado do voo e com minhas anotações, resolvi vir para São Paulo longe do cockpit. Portanto, sentei-me no último banco, para curtir o conforto e ver o nível de ruído da cabine. Posso garantir que, mesmo no último assento, o ruído do motor não incomoda em nada.

Após um voo breve, estamos sobrevoando a região de Campinas, interceptando a Star para Congonhas. Encontramos chuva leve sobre o aeródromo, mas nada que pudesse atrapalhar a operação. Mais uma vez o pouso é tranquilo, com uma frenagem eficiente. Seguimos então para o hangar da TAM com nossa missão cumprida.

Em resumo, posso dizer que a plataforma do CJ é boa e atende a uma variada gama de operadores que necessitam de um avião simples, com custo operacional baixo e capaz de pousar em pistas curtas. Com o Citation CJ3, eles podem ter tudo isso e ainda mais um pouco de espaço.

*Texto publicado originalmente na edição 177 de AERO Magazine.
Republicado após adaptações e revisões.

Por Daniel Torelli
Publicado em 07/11/2023, às 14h00


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