Lançado em 2008, o Phenom 100 firmou a Embraer no segmento Very Light Jet e segue em produção, mesmo com redução nas entregas
Em serviço há 17 anos, o Phenom 100 consolidou a Embraer na aviação de negócios e consolidou sua marca no segmento de Very Light Jets (VLJ), redefinindo os padrões da categoria ao oferecer desempenho superior, soluções inéditas e custo operacional competitivo.
Mesmo com a redução no volume de entregas nos últimos anos, o Phenom 100 continua em produção e preserva sua relevância no segmento de jatos executivos leves, impulsionando também o mercado de aeronaves usadas. Prova de sua atualidade, mesmo quase duas décadas após o lançamento da linha, o mais recente modelo, o Phenom 100EX, foi premiado pela Aviation Week com o Program Excellence Awards 2024, na categoria OEM System Design and Development.
No início dos anos 2000, o conceito de Very Light Jet, criado pelo Eclipse, que prometia jatos de negócios de pequena capacidade e com custo inferior a US$ 1 milhão, gerou uma corrida no setor.
De um lado, fabricantes estabelecidos ou startups — em uma época em que esse termo sequer era utilizado — anunciavam projetos revolucionários, que prometiam romper paradigmas e estabelecer um novo patamar na aviação de negócios. De outro, as autoridades temiam que a categoria pudesse levar a uma corrida pelo “primeiro jatinho”, o que traria dificuldades consideráveis no gerenciamento do tráfego aéreo, no movimento dos aeroportos e no treinamento de pilotos.
Os projetos apresentados iam desde aeronaves inspiradas em caças até jatos leves com itens de conforto inéditos, como toilette completo, passando por soluções pouco ou nada criativas, como versões reduzidas de modelos já existentes.
Quando a Embraer ingressou oficialmente no mercado de aviação de negócios, a solução foi lançar uma versão executiva do ERJ 135, batizada como Legacy. Com as boas perspectivas de crescimento dos VLJ, a Embraer oficializou, em 2005, sua primeira família de aviões projetada para a aviação de negócios: o Phenom 100 e o Phenom 300, que disputariam os segmentos VLJ e Light Jet, respectivamente. Embora o Phenom 300 tenha se tornado referência no segmento, liderando há 13 anos as vendas globais, o Phenom 100 ganhou espaço como avião de entrada, sendo uma opção aos biturboélices.
O Phenom 100 foi originalmente certificado pela Anac em 9 de dezembro de 2008, em plena crise financeira. Desenvolvido em um período de grande crescimento global, o Phenom 100 teve sua certificação e posterior entregas ocorrendo logo após a crise do subprime nos Estados Unidos.
Apesar das dificuldades iniciais, o Phenom 100 rapidamente conquistou espaço no mercado, chegando a desbancar modelos consolidados, sobretudo o Premier I/A e o Citation Mustang.
Na ocasião, a Beechcraft, que ainda não fazia parte do grupo Textron, havia saído na frente com o Premier, lançado nos anos 1990, já apostando no potencial da categoria VLJ e Light Jet. Mesmo maior que o Phenom 100 e comportando até sete passageiros (contra cinco do modelo brasileiro), seu alcance de aproximadamente 830 milhas náuticas é quase 350 nm a menor que o Phenom 100 –, compensando com uma leve vantagem em velocidade.
Já a Cessna lançou o Mustang na esteira do potencial do VLJ nos anos 2000, com as primeiras entregas ocorrendo em 2007, totalizando expressivos 45 aviões, quase dois anos antes da Embraer. Todavia, alguns diferenciais do Phenom 100, como o lavatório, logo tornaram a competição bastante acirrada, impactando diretamente as vendas da Cessna.
Para efeito de comparação, no ano de 2008, a Cessna entregou 101 unidades do Citation Mustang. No ano seguinte, esse número subiu para 125, antes de reduzir para 73 em 2010. Já o Phenom 100 atingiu 97 entregas em 2009 e 100 em 2010. Na sequência, apenas em 2011 e 2012 o Mustang obteve melhor resultado, até sair de linha em 2017 com apenas sete entregas.
A resposta da Cessna veio com o Citation M2, que trouxe uma cabine mais espaçosa, com lavatório, e adicionou uma série de recursos e capacidades inexistentes no Mustang, em uma clara resposta ao Phenom 100.
A reação do mercado foi imediata: enquanto, a partir de 2014, o modelo brasileiro havia estabilizado as entregas abaixo de 20 unidades anuais, com apenas 10 no ano passado, o M2 teve picos acima de 40 entregas, enquanto o M2 Gen 2 teve seu menor resultado em 2024, com 22 aviões entregues.
A resposta da Cessna ao Phenom 100 mostra que, mesmo após 20 anos desde o seu lançamento, o modelo segue bastante atual, apesar da venda de aviões novos estar abaixo do seu auge.
Três meses após o início das entregas, em março de 2009, a Embraer anunciou um recall dos dez primeiros Phenom 100, com o objetivo de corrigir falhas na unidade de controle dos flaps. O problema estava na forma como o indicador de flap exibia informações aos pilotos, divergindo da posição real dos dispositivos, o que poderia levar a falhas em voo. Segundo a diretiva complementar da FAA, a agência de aviação civil dos EUA, não eram autorizadas operações com full flap durante o pouso, exceto em casos de contaminação da pista por neve.
No ano seguinte, o Phenom 100 sofreu ao menos seis incidentes durante o pouso, incluindo duas excursões de pista – ambas no Brasil – e estouro de pneus nos Estados Unidos. Após uma série de avaliações, a Embraer desenvolveu uma nova unidade de controle de freios, responsável por receber e interpretar os sinais eletrônicos dos pedais e enviá-los para o atuador hidráulico. Além disso, também foram realizadas algumas melhorias no software do avião, visando evitar eventuais falhas na atuação dos freios.
Além de ter passado por alguns recalls, ao longo dos anos, o Phenom 100 se tornou a base de evolução da família, agregando uma série de novidades que, posteriormente, acabavam sendo adicionadas ao Phenom 300.
Em 2016, durante o EAA AirVenture, em Oshkosh, a Embraer lançou o Phenom 100EV, apresentando uma série de melhorias, como a nova aviônica Prodigy Touch Flight Deck, baseada no Garmin G3000, e um motor Pratt & Whitney Canada PW617F1-E de 1.730 libras de empuxo.
Um dos destaques do Phenom 100EV foi a melhoria na velocidade de cruzeiro, que chegou aos 405 nós, e um incremento de até 15% no empuxo disponível em aeroportos elevados e com altas temperaturas, o que equivale a mais alcance e menor tempo de subida. O alcance também foi ampliado, passando para 1.178 milhas náuticas (2.182 km), com quatro passageiros e reservas NBAA IFR.
Sua maior velocidade e desempenho superior em condições de altas temperaturas e em aeroportos a grandes altitudes visavam atender especialmente o mercado da América do Norte, como operadores do Meio-Oeste dos Estados Unidos e do México. A versão EV também trouxe melhorias no interior, como um novo perfil do corredor para aumentar o espaço e tomadas reposicionadas com carregador USB. E, na ocasião do lançamento, havia onze opções de design interior, inclusive no lavabo privativo.
Em outubro de 2023, a Embraer lançou o Phenom 100EX, que adicionou algumas melhorias na suíte de aviônicos como parte do Prodigy Touch, ainda baseado no Garmin G3000, mas com a adição do FlightStream 510, aproximação estabilizada, previsão de tesoura de vento (windshear) e radar com varredura 3D automática, previsão de raios e granizo.
O maior destaque foi a incorporação do Runway Overrun Awareness and Alerting System (ROAAS), um sistema inovador projetado para aumentar a segurança e evitar excursões de pista. Na cabine de passageiros, um novo design permitiu um quinto assento lateral e um assento certificado para decolagem e pouso no toalete, mesmo na configuração básica.
Ao longo de 2024, a Embraer realizou a entrega de um Phenom 100EV e nove Phenom 100EX. Ainda que distante dos números do Citation M2 Gen 2, que obteve um total de 22 entregas no ano passado, o modelo brasileiro ainda segue competindo em igualdade com o HondaJet, que teve apenas onze entregas no mesmo período.
Embora o programa do HondaJet tenha surgido antes mesmo da família Phenom, a Honda Aircraft iniciou as entregas do seu primeiro jato de negócios apenas em 2016. No entanto, ao longo de quase uma década, pôde avaliar o desempenho dos competidores, sobretudo do Phenom 100. Assim, ofereceu ao mercado uma aeronave com uma série de melhorias, incluindo maior espaço interno, o que ajudou a conquistar o espaço anteriormente ocupado pelo jato brasileiro e representou, por vários anos, um forte competidor ao M2.
Embora o Phenom 100 tenha reduzido, nos últimos anos, seu volume de entregas no Brasil, a frota nacional soma 116 aeronaves, incluindo a entrega recente, o equivalente a mais de um quarto da frota global.
Além disso, modelos usados têm despertado o interesse de operadores de táxi aéreo, em especial de empresas de propriedade compartilhada. Um dos argumentos está na boa relação custo-benefício, oferecendo acesso a um jato muito leve, com boa capacidade e alcance, além de itens pouco comuns na categoria, como lavatório, aliado à depreciação estável.
As perspectivas futuras do Phenom 100 como modelo de linha dependem da resposta do mercado. Atualmente, com apenas dez entregas em 2024 e onze em 2023, o Phenom 100 está longe do desempenho do irmão maior, que, apenas no ano passado, entregou 65 aviões, ante 63 em 2023.
Fontes na Embraer consultadas por AERO Magazine garantem que o Phenom 100 seguirá em produção pelos próximos anos, atendendo a um nicho específico de mercado e sendo uma plataforma segura para inovações da família Phenom. Por outro lado, analistas acreditam no bom potencial dos usados, em especial no Brasil, mas mantêm um olhar cético quanto à viabilidade de manter em linha uma aeronave que tem sustentado dez entregas anuais.
Independentemente do futuro da linha de produção, o Phenom 100 consolidou seu papel na aviação de negócios, oferecendo um equilíbrio entre custo, desempenho e inovação, mantendo um público fiel, especialmente no segmento de aeronaves usadas. Seu impacto não se limita aos modelos da Embraer, mas também influenciou a evolução da categoria Very Light Jet como um todo.
Por Edmundo Ubiratan
Publicado em 19/05/2025, às 10h00
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