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Intermodalidade

Metrôs, trens urbanos, ônibus, monotrilhos, autoestradas. As lições de Europa, Estados Unidos, Ásia e Oceania na construção de acessos rápidos e fáceis para chegar e sair de aeroportos



Deixe o carro em casa, não se preocupe com a conta do estacionamento, faça o seu check-in, e boa viagem!". A mensagem tem como destinatários os milhares de moradores do Reino Unido que utilizam transporte aéreo regular. Tal orientação só é possível graças à invejável malha ferroviária do país, que interliga os principais destinos da ilha com a tradicional pontualidade britânica. Em tempos de privatização de aeroportos e debates em torno de gargalos infraestruturais no Brasil, a intermodalidade ganha relevância, e tende a entrar na pauta de discussões. Ir e vir de aeroportos com segurança, rapidez e comodidade é uma necessidade tão premente quanto acomodar passageiros em terminais planejados e pousar e estacionar aeronaves em pistas e pátios bem dimensionados. Os exemplos de aeroportos de Europa, Estados Unidos, Ásia e Oceania, que mostramos a seguir, podem e devem guiar as autoridades brasileiras em suas decisões.



Uma linha de metrô, com estações nos cinco terminais de passageiros do Heathrow, em Londres, oferece desembarque nos principais cartões-postais da cidade, incluindo South Kensigton e Piccadilly Circus

LINHAS EXPRESSAS
O passageiro que desembarca no Aeroporto Internacional de Londres - Heathrow encontra diversas opções para prosseguir ao centro da cidade ou mesmo aos bairros mais próximos do subúrbio. Uma linha de metrô (Undergroun ou Tube por lá), com estações nos cinco terminais de passageiros, oferece desembarque nos principais cartões-postais da cidade, incluindo South Kensigton e Piccadilly Circus, onde também se concentra a maioria dos hotéis de boa categoria. "Só os trens do metrô não seriam suficientes para atender à demanda, mesmo porque a população utiliza o transporte no seu dia a dia, o que determina um movimento acima da média pela manhã e no final da tarde", lembra Normand Boivin, chefe de operações do terminal. Por isso, Londres também oferece uma linha de trem expresso (Heathrow Express), que parte do aeroporto e tem ponto final na estação central de Paddington, sem paradas intermediárias; e o trem metropolitano (Heathrow Connect), que também segue para Paddington, faz algumas paradas em bairros a sudoeste da capital inglesa.

Gatwick, o segundo maior aeroporto de Londres, também é bem servido em linhas de trens, incluindo a expressa (Gatwick Express), que liga o terminal aeroportuário à outra grande estação de trens, senão a mais importante de Londres, a Victoria Station. Os trens partem a cada 15 minutos e a viagem sem escalas dura aproximadamente 30 minutos. Já o aeroporto de Stansted oferece o serviço do Stansted Express, um trem expresso que parte de uma estação localizada no subsolo do terminal de passageiros e cumpre uma viagem de 46 minutos para a estação de Liverpool Street. O quarto maior aeroporto londrino, o Luton, não conta com estações de trem, mas os usuários do transporte aéreo dispõem de um serviço de ônibus regular, que opera entre cinco horas da manhã e meia-noite, a cada 10 minutos, interligando o aeroporto à estação Luton Airport Parkway. De lá, o passageiro segue para a capital em viagens com duração média de 25 minutos - o serviço se estende até Brighton (sul de Londres) e Bedford (norte de Luton). Há, ainda, um serviço de ônibus que parte do aeroporto de Luton para a estação Milton Keynes, que é servida pelos trens pertencentes à companhia inglesa Virgin Atlantic.

Saindo da região de Londres, o turista também encontra boa mobilidade em outros importantes aeroportos da Grã-Bretanha. Em Manchester, é possível embarcar em trens das companhias TransPennine Express e Northern Rail, que conectam o aeroporto a pelo menos 100 destinos localizados ao norte da Inglaterra. Já na Escócia, quem desembarca no Aeroporto Internacional de Glasgow Prestwick, conta com serviço regular de trens que partem para o centro metropolitano a cada 30 minutos em jornadas com duração média de 50 minutos.

CONEXÕES FÁCEIS
A facilidade que tem um passageiro para se deslocar de ou para um aeroporto não é exclusividade do Reino Unido. Os maiores terminais aeroportuários do mundo contam com uma estação de trem, de metrô, ou as duas juntas. Nos complexos mais antigos, que foram erguidos sem esse recurso, as autoridades oferecem serviços regulares de ônibus para conexões rápidas às estações mais próximas. Os principais aeroportos do mundo oferecem boas opções de acesso aos seus usuários, sem deixar de contar com gigantescos bolsões de estacionamento destinados a veículos automotores. É fácil lembrar, por exemplo, do Aeroporto Internacional de Newark Liberty, em Nova Jersey (EUA), onde o passageiro que desembarca pode utilizar o serviço de monotrilhos "AirTrain", que opera 24 horas por dia e oferece conexões para estação de trens do NJ Transit, com serviço regular para a cidade de Nova York e pontos de interesse em Nova Jersey.

Retornando à Europa, em Roma, na Itália, o turista desembarca no Aeroporto Internacional Leonardo da Vinci e pode chegar rapidamente à chamada Cidade Eterna. São 35 quilômetros de distância, mas o "estresse" fica reservado apenas para o trajeto já no coração do centro da capital italiana, em meio à buzinação, às lambretas e ao típico falatório em tom mais alto do povo italiano. Até chegar a essa loucura, o passageiro não tem qualquer tipo de dificuldade, já que ele encontra no aeroporto a estação de trens do Leonardo Express, que parte a cada 30 minutos, entre 6h37 e 23h37, para a estação de trens Termini, de Roma. Há, ainda, outra linha de trem metropolitano, que atende às estações Tiburtina, Fara Sabina e Orte. Os que chegam de madrugada não precisam se preocupar com os valores vultosos cobrados pelo serviço de táxi. Na ausência do serviço de trens, o aeroporto disponibiliza ônibus, que tem como ponto final as estações de trem servidas pelas composições durante o dia.

O QUE O USUÁRIO DO AEROPORTO PRECISA É DE FACILIDADE PARA SE LOCOMOVER, REGULARIDADE E PREÇOS ACESSÍVEIS

Na Alemanha, o Aeroporto Internacional de Munique, eleito o melhor da Europa pela pesquisa de opinião inglesa Skytrax, não é só bem servido em autoestradas, mas, também, em linhas de trem. São duas: a S1 e a S8, que cumprem o trajeto de 28 quilômetros em aproximadamente 45 minutos. Há estações localizadas no edifício central de embarque, e uma segunda, junto aos prédios administrativos e bolsões de estacionamento. Havia o projeto para construção de uma terceira estrada de ferro, que teria a operação de trens de alta velocidade, chegando a 400 km/h, e que cumpririam o trajeto para o centro de Munique em apenas 10 minutos. Com custo inicial estimado em ?1,85 bilhão, a obra foi descartada em março de 2008. Para as autoridades alemãs, não havia a necessidade de se implantar uma linha de trens-bala, já que o serviço disponível cumpria a tarefa satisfatoriamente, com bastante conforto. "O que o usuário do aeroporto precisa é de facilidade para se locomover, regularidade e preços acessíveis", destaca Michael Kerkloh, presidente e chefe-executivo da Flughafen München GmbH (FMG), empresa de capital privado responsável pela administração do aeroporto.


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DESAFIOS BRASILEIROS

A presidente, Dilma Rousseff, e o ministro das Cidades, Aguinaldo Ribeiro, anunciaram em abril último investimentos da ordem de R$ 32,7 bilhões em obras de mobilidade urbana no país, destinados a preparar as grandes cidades para atender ao aumento na demanda gerada por ocasião da Copa do Mundo de 2014. O programa inclui a modernização viária, ampliação da malha de metrôs e ferrovias urbanas e a compra de veículos e equipamentos. Até agora, a União desembolsou R$ 11,4 milhões, o que significa um investimento de apenas 16,3% do total previsto para esse período: R$ 1,4 bilhão. Para diversos analistas do setor, o retrato das obras da Copa do Mundo que a comitiva brasileira apresentou à Fifa está bem longe da realidade. Novas estações de metrô, Veículos Leves sobre Trilhos (VLT) e corredores de ônibus estão sem projetos enquanto muitas licitações estão atrasadas. O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, levou à Suíça uma nova versão da chamada "matriz de responsabilidade", o pacote de obras da Copa. No documento algumas das obras previstas em janeiro de 2010 foram excluídas. Paralelamente, os atrasos na construção dos estádios e nas obras dos aeroportos deverão gerar gastos adicionais da ordem de R$ 720 milhões, que são referentes às despesas de implantação de turnos extras nos canteiros das obras. O montante seria suficiente para se construir uma nova arena.


EXEMPLO PARA O MUNDO
No continente asiático, três aeroportos disputam acirradamente o primeiro lugar no gosto dos milhares de usuários que preenchem anualmente a pesquisa da Skytrax. E todos investiram pesado em megaconstruções com o intuito de prover um alto nível de mobilidade a seus usuários. Quem desembarca no Aeroporto Internacional de Incheon, localizado a 38 quilômetros de Seul, encontra uma estação de trens monumental, com desenho arquitetônico futurista, de onde partem trens com destino à capital sul- coreana e para o aeroporto mais antigo, o Gimpo, que atende a voos domésticos e algumas poucas linhas internacionais. O passageiro tem duas opções oferecidas pelo serviço Arex: com partidas a cada 30 minutos, o trem chega a Seul em 43 minutos, em viagens sem paradas intermediárias; ou com partidas a cada seis minutos, cujas composições realizam o trajeto em 53 minutos com escalas em estações suburbanas das linhas do metrô. O usuário do aeroporto de Incheon conta, ainda, com uma grande autoestrada (Expressway 130), servida por quatro faixas de rolamento em cada sentido, que foi construída especialmente para facilitar o deslocamento entre a capital e o aeroporto. Na ligação entre a ilha de Yeongjong e o continente, um verdadeiro cartão-postal: a Grande Ponte Yeongjong, inaugurada em 2000, com 4.420 metros de extensão, considerada a maior ponte suspensa do mundo.



Aeroporto Internacional de Incheon, localizado a 38 quilômetros de Seul, possui estação de trens monumental, com desenho arquitetônico futurista, de onde partem comboios com destino à capital sul-coreana e ao aeroporto doméstico Gimpo

No Aeroporto Internacional Chek Lap Kok, de Hong Kong (China), temos um verdadeiro exemplo do que se espera no quesito intermodalidade. Há uma grande estação de ônibus (Airport-Mainland Coach Station), que ocupa uma área de 230 m² no subsolo (Level 3) do Terminal 2 e oferece 36 baias para estacionamento de veículos, que partem para mais de 90 destinos em 320 viagens diárias. O usuário também pode seguir para cidades vizinhas, como Shenzhen e Macau, em balsas, que atracam no SkyPier, uma estação de conexão com o sistema de trens automáticos APM (automatic people mover), que interligam os terminais de passageiros. "Quem vai viajar por Chek Lap Kok pode realizar o check-in e o despacho da bagagem no momento do embarque nas balsas", ressalta Stanley Hui Hon- chung, chefe-executivo do aeroporto. O mesmo sistema pode ser utilizado por quem embarca na cidade de Hong Kong no serviço de trem do Airport Express, que realiza o trajeto para o terminal em 24 minutos, com desembarque na estação final "Asia World-Expo", inaugurada em 20 de dezembro de 2005, por ocasião da feira internacional.

Em Changi, o aeroporto que atende Cingapura e também disputa o primeiro lugar no gosto dos entrevistados pela pesquisa inglesa Skytrax, quem desembarca pode seguir para o centro da cidade, distante 20 quilômetros, por excelente autoestrada, a East Coast Parkway, construída especialmente para atender ao sítio aeroportuário. O serviço regular de ônibus para Cingapura parte da estação Changi Airport MRT com acesso rápido a partir dos três principais terminais de passageiros. Há também o serviço de trens, o Mass Rapid Transit (MRT), cujas composições têm parada no subsolo, em área média entre os terminais 2 e 3. O trem tem ponto final na estação Tanah Merah, onde o passageiro encontra conexão para diversas linhas de trens intermunicipais

PRÓXIMOS 30 ANOS
Em Auckland, na Nova Zelândia, as autoridades aeroportuárias já estão preocupadas com o aumento na demanda projetada para os próximos 30 anos. O aeroporto não conta com linhas de trens, mas oferece uma boa estrutura em estradas de rodagem. "Até 2041, as obras de revitalização não serão suficientes para atender ao aumento no volume de passageiros e de carga aérea. Será necessária uma solução multimodal", avalia Joan Withers, diretora-executiva do aeroporto. Um memorando de entendimento já foi assinado pela Agência de Transporte de Auckland (NZTA), a empresa de transporte ferroviário KiwiRail e a empresa Auckland International Airport Ltd., que administra o aeroporto, com o intuito de levar adiante o projeto para construção de linhas férreas partindo dos terminais de passageiros e de carga aérea em direção a estações de linhas de trens já existentes na cidade. A intenção é facilitar não só o acesso dos usuários do aeroporto a diversas partes do continente, mas também facilitar o escoamento de mercadorias de importação e exportação. Por isso, o chamado "Rail loop" é considerado vital para a estratégia governamental de aumentar a mobilidade, propiciando ao mesmo tempo maior crescimento econômico na região. "A nossa meta é ter os trens de passageiros partindo a cada 15 minutos do aeroporto", adianta Withers.

Robert Zwerdling | | Fotos Divulgação
Publicado em 14/06/2012, às 07h57 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45


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