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Deu quase tudo certo

O balanço estatístico do transporte aéreo durante a Copa do Mundo da FIFA no Brasil


Três aeroportos do Rio registraram 1.731 pousos e decolagens no dia seguinte à final da Copa, sendo 880 no Galeão, cujo recorde era de 715 movimentos, no encerramento do Pan de 2007

O gerenciamento do espaço aéreo e dos aeroportos provocou apreensão entre as autoridades aeronáuticas civis e militares. Temendo um novo caos aéreo, como o de 2006, desta vez diante de milhares de turistas estrangeiros, o governo optou por adotar uma série de restrições que engessaram a aviação, em especial a geral. Porém, ao final dos 32 dias do maior evento esportivo já organizado no Brasil, os resultados indicam que não houve maiores turbulências, tanto no ar quanto em solo.

Nos 15 aeroportos das 12 cidades-sede não foram registrados atrasos significativos. De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o índice de pontualidade foi de 92% (com tolerância para até 30 minutos de atraso). Foram transportados cerca de 8,8 milhões de passageiros nesse período, informou a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), que congrega as quatro maiores empresas do setor. “Criamos um ambiente cooperativo importante envolvendo o Centro de Gerenciamento da Navegação Aérea (CGNA)”, afirmou o presidente da entidade, Eduardo Sanovicz.

Segundo o Decea, entre domingo (13/07), dia da final da Copa do Mundo, e segunda-feira (14/07), o Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro registrou cerca de 1.200 movimentos aéreos, somando pousos e decolagens. Somente no dia seguinte à final os três aeroportos da cidade acumularam 1.731 movimentos, sendo 880 no Galeão, o dobro da média diária do aeroporto, que é de 400 a 450, e superior ao recorde da decisão da Copa da África do Sul, em Joanesburgo, com 807 movimentos num dia. Com padrão de decolagem simultânea nas pistas 10 e 15 do Galeão, o Decea conseguiu aumentar a capacidade de decolagem de 30 para 45 decolagens por hora, chegando a atingir o pico de 52 movimentos por hora.

Na área de segurança, o trabalho foi intenso. Foram empregadas 77 aeronaves de asas fixas e rotativas em 114 ações de reconhecimento e vigilância que somaram 2.800 horas de voo, informou a Força Aérea Brasileira (FAB). Só os helicópteros da Airbus (Helibras) operados pela Aviação do Exército (AvEx) somaram 700 horas voadas. Delegações oficiais e chefes de estado foram atendidos em 279 operações nos aeroportos, com um tempo médio de espera de 30 minutos, informou o CGNA. Não houve registro de acidentes e incidentes nos aeroportos das cidades-sede da Copa.

Na aviação executiva, empresas como a Líder Aviação precisaram montar uma força-tarefa para atender à demanda tanto de fretamento como de atendimento aeroportuário. Presente em todas as cidades-sede do mundial, a empresa mineira prestou atendimento a 620 aviões, que realizaram mais de 6.200 pousos e decolagens e transportaram quase 50.000 passageiros durante a Copa. “Já na área de fretamento de aeronaves, popularmente conhecida por táxi-aéreo, fretamos mais de 100 voos durante o mundial. Os principais destinos foram as cidades-sede do torneio, sobretudo o Rio de Janeiro”, explica a superintendente Junia Hermont, da Líder.

A falta de espaço nos hangares do aeroporto do Galeão, aliás, obrigou a adoção do chamado “Hangar a Céu Aberto”, uma solução criativa que permitiria acomodar até 130 aeronaves executivas simultaneamente. Equipes estrangeiras trazidas pela C-Fly Aviation e pela Jet Aviation fizeram 520 movimentações por towing em um sistema que dispunha os aparelhos com “asas coladas” ao ar livre. No último final de semana, o pátio chegou a receber 100 aeronaves, com valor médio de US$ 40 milhões cada. Ao todo, cerca de 300 aeronaves foram atendidas. Em outros locais a saída foi procurar aeroportos alternativos. Situado a 120 km de Belo Horizonte, o aeroporto Brigadeiro Cabral, em Divinópolis, abrigou 42 aeronaves executivas e de táxi-aéreo em 8 de julho, dia do fatídico jogo entre Brasil e Alemanha no Mineirão.

Copa no ar

Os números do mundial entre 06 de junho e 20 de julho

8,8 milhões de passageiros transportados por Avianca, Azul, Gol e TAM
103.847 voos domésticos e internacionais aprovados pela Anac
80% de taxa média de ocupação
92% de pontualidade (tolerância de até 30 minutos)
90% dos movimentos concentrados nos 15 aeroportos das cidades-sede
Nenhum acidente ou incidente registrado nos aeroportos das 12 cidades-sede

Fontes: Abear, Cenipa, CGNA, Decea

Aeronaves no chão

Apesar de tudo ter corrido melhor do que o esperado, quem atua na aviação geral reclamou, principalmente por causa das restrições nas janelas dos slots. Qualquer atraso poderia gerar multas de R$ 7 mil a R$ 90 mil. “Diante das restrições do governo, só voou quem não tinha como ficar no chão”, afirmou Ricardo Nogueira, diretor da Associação Brasileira de Aviação Geral (Abag). Na prática, os usuários da aviação executiva se desdobraram para conseguir se adequar às restrições operacionais impostas nos aeroportos, ao tempo de espera nos pátios e até mesmo ao cumprimento das normas temporárias vigentes durante o evento. Segundo Nogueira, diante dos pátios vazios de alguns aeroportos que costumam receber aeronaves particulares e táxis-aéreos, como Salvador e Fortaleza, na segunda semana do mundial, o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) chegou a liberar mais slots. Em parte também pela pressão dos operadores, que reclamaram junto ao CGNA. “Não se confirmou o cenário pessimista do governo”, disse.

Para os operadores de helicóptero, principalmente na cidade de São Paulo, a Copa representou prejuízo. Um Notam (sigla em inglês para “Aviso aos Aeronavegantes”) determinou a criação de uma “área marrom” de 18,5 km (10 mn) ao redor do estádio do Itaquerão e sobre parte da cidade, proibindo as operações de asas rotativas (exceto as previamente autorizadas) três horas antes e cinco horas após o início das seis partidas disputadas em São Paulo. O mesmo valeu para o Maracanã, no Rio de Janeiro. “Só no estado de São Paulo a estimativa é que deixamos de faturar até R$ 12 milhões”, reclama Jorge Faria, presidente da Associação Brasileira de Pilotos de Helicóptero (Abraphe). Como a janela de restrição era de oito horas, proprietários ou passageiros que quisessem voar nesses dias eram obrigados a cumprir as missões antes dos jogos ou voltar no dia seguinte. Nos jogos de 23 de junho e 1º de julho, foi impossível voar a partir das 13 horas. “Fomos penalizados”, afirmou.

Na avaliação de gente que voou durante a Copa, houve pontos positivos e negativos na operação de jatos executivos e helicópteros. A maioria reconhece que as restrições obrigaram muitos a ficar no solo, o que evidenciou a existência de gargalos importantes na infraestrutura aeroportuária do país, sobretudo nos pátios de permanência para a aviação geral. Mas os pilotos também consideram que, sem as restrições, o sistema não teria funcionado a contento, e tecem elogios ao trabalho do Decea. Uma sugestão que alguns deles deixam é que as autoridades retomem o prazo de 30 dias para solicitação de slots em aeroportos controlados, facilitando o planejamento. Eles dizem que, com o encerramento da Copa, o sistema retornou ao padrão anterior, liberando a solicitação de slots apenas com 25 horas de antecedência ao voo, o que trouxe de volta incertezas e apreensão aos operadores em relação a transtornos e até cancelamentos.

Por André Vargas
Publicado em 30/07/2014, às 00h00 - Atualizado às 19h10


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