Conferência da Oaci discute propostas para o futuro do transporte aéreo global
Não haverá novo acidente sem explicação como o ocorrido com o Boeing 777 da empresa Malaysian Airlines, o voo MH 370. A proposta, que tem como objetivo reparar a tragédia, alvo da operação de busca e salvamento com recorde tanto de participação de países quanto de custos, será um dos principais temas emergentes de segurança de voo a ser debatido durante a Segunda Conferência de Alto Nível de Segurança Operacional (HLS), a ser realizado em Montreal, no Canadá, neste mês de fevereiro de 2015.
A Organização de Aviação Civil Internacional (Oaci) completou 70 anos de existência em 2014 dedicados principalmente à melhoria da segurança das operações aéreas em todos os países signatários da Convenção de Chicago de Aviação Civil Internacional, assinada em 7 de dezembro de 1944, com participação do Brasil. A conferência se volta para o futuro ao trabalhar na elaboração de recomendações para a 39a Assembleia promovida pela entidade, prevista para acontecer em 2016.
A primeira conferência HLS foi realizada em 2010, com sucesso. Teve como principal objetivo a elaboração e implantação do Sistema de Segurança Operacional do Estado (SSP) e do Sistema de Gerenciamento da Segurança Operacional (SGSO), alvos do “anexo 19”, publicado em 2013, como uma das recomendações da conferência, endossada pelo conselho da Oaci e base para a elaboração da atualização do Plano Global de Segurança Operacional da Aviação (GASP).
Além dos tópicos emergentes, a agenda da reunião é composta de temas de interessante, tais como o programa de segurança operacional do estado, a proposta de proteção de informação de segurança operacional, o intercâmbio de informações de segurança e a cooperação regional.
A proposta de proteção de informação de segurança operacional está em discussão na Oaci desde 2003
Os países-membro da Oaci deverão implantar um SSP voltado para ações governamentais de melhoria da segurança das operações aéreas, como determina os requisitos do “anexo 19”. Para acompanhar essa implantação e facilitar o trabalho dos países, a Oaci acabou de lançar uma ferramenta de análise (Gap Analysis), disponível neste link (http://www.icao.int/safety/istars/pages/intro.aspx), que busca prover um método de análise padronizado, bem como prepara os países para as auditorias que serão realizadas a partir de 2016. Foi o que expôs John Ilson, chefe da seção de Operações de Voo da Oaci, responsável pela coordenação técnica do evento.
A proposta de proteção de informação de segurança operacional é um projeto antigo, em discussão na Oaci desde 2003, que, em função do mau uso desse tipo de informação, já estava incluído na base do “anexo 13” da Oaci como um de seus apêndices. Porém, faltava uma proposta de texto de comum acordo entre todos.
Esse foi o trabalho de uma força-tarefa especial de proteção da informação, que contou com participação brasileira com uma proposta amplamente debatida não só pelos governos como também pela indústria. No caso do Brasil, esse trabalho levou à redação do parágrafo 2o, do Art. 88-I, da Lei 12.970, de 8 de maio de 2014, protegendo somente as notificações voluntárias de ocorrências na aviação, liberando o acesso às demais fontes de informações de voo.
Um dos pilares para a implantação tanto do SSP quanto do SGSO é o intercâmbio de informações de segurança operacional, pois ambas as estratégias de melhoria da segurança são baseadas em dados e suas análises para propor ações de mitigação de risco e gerir seus resultados.
Esse mecanismo é largamente utilizado nos Estados Unidos pelo Grupo de Segurança Operacional da Aviação Comercial (CAST), com mais de 15 anos de existência e premiado com o Troféu Robert J. Collier em 2008. As informações utilizadas para elaborar os projetos de mitigação de risco são extraídas do Sistema de Análise e Intercâmbio de Informações de Segurança da Aviação (ASIAS, na sigla em inglês), sem a identificação da fonte das informações, criado e suportado financeiramente pela FAA. Na mesma linha, a IATA concebeu o seu programa de coleta e análise de informações, chamado FDX, em uso no Brasil por todas as empresas-membro da associação.
A proposta em discussão na Conferência, segundo explica John Illson, é tornar a Oaci um organismo internacional reconhecido mundialmente e com alta credibilidade para concentrar as informações a nível mundial e prover, por meio dos grupos regionais, as análises que direcionarão os projetos locais de melhoria da aviação.
Para disseminar essas estratégias e informações, desde 2010, a Oaci criou os Grupos Regionais de Segurança Operacional (RASG), sendo o pioneiro o da região pan-americana, instituído em 2008, sem o suporte formal da agência internacional. Sua estrutura, baseada na parceria governo-indústria, é composta de um órgão executivo e equipes de trabalho, as quais são responsáveis pelo relatório anual de segurança da região, ações de treinamento e segurança operacional da aviação, que varia conforme a região.
Atualmente, cinco grupos regionais situados na África, Ásia, Europa, Oriente Médio e Américas estão em funcionamento. O estágio de maturidade varia de acordo com o local, pois nem todos possuem uma participação efetiva da indústria ou dos países da região. A seu favor, pode-se registrar que é uma ação de longo prazo e de coordenações estratégicas, o que levará alguns anos até sua consolidação. Só para ilustrar, em 2014, foi realizada na ilha Curaçao, a 5a Reunião Pan Americana de Alto Nível de Segurança Operacional, reunindo representantes de governos da região, com a presença pela primeira vez do Canadá.
Finalmente, como um dos tópicos emergentes – e em função do acidente nos céus da Ucrânia, com o Boeing 777 da Malaysian Airlines, voo MH 17 –, foi criada uma força-tarefa voltada para impedir que acidentes ocorram pela falta de informações sobre o risco nos espaços aéreos em zonas de conflito. Suas conclusões serão debatidas, pois ficou demonstrado, com perdas de vidas, que o problema existe.
A ideia é distribuir, com base no sistema Notam, informações sobre o processo de análise de risco. Hoje, somente a FAA possui uma página na web com dados sobre áreas de conflito ou espaços aéreos nos quais não há garantia da segurança operacional, prevista na Convenção de Chicago.
Por Carlos Eduardo Pellegrino
Publicado em 23/01/2015, às 00h00
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