Delineamos as estratégias da FAB para garantir marcação cerrada nos céus do país durante o maior evento esportivo do mundo
Entre os preparativos mais complexos para a Copa do Mundo, que começará em junho próximo, e os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em agosto de 2016, está a criação de zonas de exclusão aéreas, nas quais os sobrevoos de aeronaves estarão proibidos. É uma medida de segurança que visa evitar atentados terroristas e incidentes aéreos nos locais de grande concentração de turistas e atletas. Esse tipo de iniciativa já foi posta em prática nos Jogos de Londres, em 2012, com grande sucesso. Na ocasião, oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB) acompanharam o trabalho dos britânicos. No Brasil, será uma experiência de proporções ainda maiores, envolvendo 12 cidades-sede espalhadas por todo o território nacional – bem menos complexa será a proteção dos céus do Rio nos Jogos Olímpicos. Não que o país seja alvo de atentados, mas, diante dos atuais riscos globais e de suas consequências, todo o cuidado será pouco. A primeira experiência real desse gênero para a FAB foi a Rio+20, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que reuniu 43.000 participantes de 193 nações, em 2012. Depois vieram a Copa das Confederações, em junho de 2013, seguida da visita do Papa Francisco, em agosto do mesmo ano. Em todos esses eventos, caças e helicópteros estiveram de prontidão.
Para a Copa, os procedimentos foram aprimorados. Haverá aeronaves no ar nas proximidades das zonas de exclusão em torno dos estádios a partir de uma hora antes até quatro horas depois dos jogos. Para que tudo funcione dentro dos planos, foi criado pelo Estado-Maior das Forças Armadas (EMFA), em conjunto com o Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (Comdabra), um planejamento centralizado no qual a Aeronáutica colocará em estreita colaboração seu Comando Geral de Operações (Comgar) e com seu Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea). De acordo com o major-brigadeiro-do-ar Antonio Carlos Egito do Amaral, chefe do Estado-Maior do Comando Geral de Operações Aéreas (Emgar), a centralização vai colocar cada aeronave no lugar e na hora em que for necessária. “Melhoramos nossos índices de acerto, aprimoramos a performance dos pilotos e reduzimos o tempo de reação da defesa aérea”, explica o brigadeiro.
A exemplo do que foi feito com as seis cidades-sede da Copa das Confederações, na Copa do Mundo a FAB irá designar um de seus oficiais como Coordenador de Defesa Aérea (CDA) para cada uma das 12 cidades-sede. A coordenação geral ficará em Brasília, no Centro de Operações Aéreas (COA). Cada CDA vai ter sob a sua responsabilidade o espaço aéreo nas zonas de exclusão, gerenciando até as aeronaves das polícias militares e civis nestas áreas, além de cuidar da logística do transporte de tropas. De acordo com a FAB, até junho de 2014 cada um dos controladores designados para esse tipo de operação deve somar 200 horas de experiência nos cenários desenhados para a Copa do Mundo.
As zonas de exclusão no entorno dos estádios serão ativadas nos dias de jogos (leia mais no box ao lado). Além do controle radar da FAB, as aeronaves designadas para as missões estarão divididas de acordo com o tipo de ameaça detectada. Os únicos a portar mísseis serão os Northrop F-5M, enquanto os Embraer AT-29 Super Tucano e os helicópteros Sikorsky H-60L Black Hawk e Mil AH-2 Sabre só empregarão armamento de tubo.
Uma ameaça de alta performance a ser interceptada por um F-5M pode ser uma aeronave a jato que invada o espaço aéreo brasileiro, enquanto os helicópteros cuidariam de uma ameaça de baixa performance, como um ultraleve ou paraglider que, desavisadamente, tente sobrevoar um dos estádios enquanto as restrições estiverem em vigor. Para complementar esse trabalho serão empregados os Embraer E-99, aeronaves de Alerta Aéreo Antecipado e Controle (AEW&C) de fabricação nacional com radar e sistemas suecos, para cobertura de radar contra intrusos a baixa altitude.
O que são as zonas de exclusãoOs limites laterais e verticais das áreas reservadas, restritas e proibidas Divididas nas categorias Reservada, Restrita e Proibida (respectivamente chamadas de áreas Branca, Amarela e Vermelha), serão espaços concêntricos de segurança que terão o tráfego aéreo monitorado ao redor dos locais dos jogos da Copa do Mundo e das Olimpíadas do Rio. Aeronaves que adentrarem estas zonas sem prévia autorização estarão sujeitas às Medidas de Policiamento de Tráfego Aéreo (MPTA) da FAB. Tais medidas incluem interceptação, escolta e, em último caso, até mesmo abate, se as instruções forem desobedecidas ou houver claro risco à segurança. As zonas de exclusão terão suas coordenadas geográficas definidas antecipadamente em Notificações aos Aeronavegantes (Notam) e deverão permanecer ativas a partir de uma hora antes e até quatro horas após o final de cada jogo ou disputa. Áreas Reservadas (Branca) Nestes locais os limites laterais e verticais (flight level) serão os mesmos das Áreas de Controle Terminal (TMA) das localidades onde ocorrerão os eventos da Copa e das Olimpíadas. Exemplo: na TMA São Paulo o limite é de 77 km (42 milhas náuticas), porém, são adicionadas mais 46 km (27 milhas náuticas) quando a rota corta a região coberta pelo Aeroporto de Viracopos, em Campinas. Áreas Restritas (Amarela) Terão limites laterais de 13 km (7 milhas náuticas) de raio a partir do estádio de futebol ou dos locais de eventos olímpicos, com altitudes de cobertura definidas pelos limites superiores das TMAs das respectivas localidades. Áreas Proibidas (Vermelha) Terão limites laterais de 7,5 km (4 milhas náuticas) de raio a partir do estádio de futebol ou dos locais de eventos olímpicos, com altitudes de cobertura definidas pelos limites superiores das TMAs das respectivas localidades. |
Apesar de a FAB estar se adequando a este cenário de missões simultâneas, as interceptações não representam novidade para a Aeronáutica. Desde a década de 1980, foram executadas dezenas de interceptações sobre o espaço aéreo brasileiro. Nas fronteiras, corriqueiramente aeronaves Super Tucano realizam interceptações, afugentando ou forçando o pouso de aeronaves invasoras carregando drogas. A mais célebre interceptação ocorreu em 3 de junho de 1982, durante o conflito das Falklands/Malvinas, quando dois F-5 da Base Aérea de Santa Cruz interceptaram um bombardeiro britânico Vulcan que tivera problemas em seu reabastecimento em voo. Os britânicos haviam acionado o transponder em código 7700, indicando emergência, e rumavam para o Galeão.
Procedimentos obrigatóriosTodas as aeronaves dentro desses espaços aéreos devem respeitar as regras Em caso de interceptação
Em caso de falha de comunicação Antes de entrar em uma Área Branca (Reservada)
Dentro de uma Área Branca
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Problemas de fonia impediam os controladores brasileiros de confirmar quem se aproximava. Com um conflito armado em curso no Atlântico Sul, o então Centro de Operações Militares (CPoM) do Cindacta I, em Brasília (DF), não arriscou. Para a surpresa da tripulação do Vulcan, acostumada a treinar com as forças da Otan, a interceptação por uma dupla de F-5 da esquadrilha “Pif-Paf de Espadas” (2º Esquadrão do 1º GavCa) ocorreu sobre o Atlântico, a cerca de 160 km (100 milhas) do Rio de Janeiro. Há atenuantes. Quando Santa Cruz foi acionada, a dupla de F-5 se preparava para uma missão de treinamento de tiro na Restinga da Marambaia. O resultado foi um belo susto no visitante. Assim como antes, o objetivo da FAB se mantém o mesmo, evitando que qualquer ameaça chegue perto dos estádios para estragar a festa.
Aeronaves em prontidãoA Aeronáutica vai empregar seus aviões e helicópteros de acordo com os níveis de ameaça detectados, classificados como alto, médio ou baixo | |
Northrop F-5M Tiger II Hoje o único vetor de interceptação disponível na FAB, a versão modernizada do veterano F-5 será encarregada das missões que exigirem alto desempenho. Será a única aeronave equipada com mísseis (Derby ou Piranha). Ainda que seja um avião de projeto obsoleto, a modernização do sistema de aviônica e armamento dará ao avião condições de cuidar de qualquer ameaça aérea. Existem 57 unidades em operação, incluindo a versão de treinamento. | Embraer A-29 Super Tucano Turbo-hélice de ataque leve já empregado em combate, o Super Tucano será encarregado das missões de média performance. Equipado com duas metralhadoras FN Herstal de 12 mm, o avião brasileiro poderá interceptar outros turbo-hélices de médio e pequeno portes, além de helicópteros. Entre as versões A (ataque leve) e B (treinamento e controle aéreo avançado), existem 99 aparelhos em operação. |
Sikorsky H-60L Black Hawk e Mil Mi-35M Hind (AH-2 Sabre) As interceptações de baixa performance, contra aeronaves leves e outros helicópteros, ficarão sob a responsabilidade dos helicópteros Black Hawk e Hind da FAB. As 16 unidades de H60-L Black Hawk são empregadas comumente em missões de salvamento e combate na região amazônica. Já os nove, entre os 12 Mil Mi-35M AH-2 adquiridos da Rússia, são os únicos helicópteros de ataque legítimos da Aeronáutica, podendo lançar foguetes e mísseis. Ambas as aeronaves podem receber equipamentos de visão noturna. | Embraer E-99 Baseado no Embraer ERJ-145, o E-99 é uma aeronave de Alerta Aéreo Antecipado e Controle (AEW&C) que vai dar cobertura de radar contra intrusos se aproximando a baixa altitude. A Aeronáutica possui cinco destas aeronaves que, se empregadas em conjunto, vão dar uma excelente cobertura ao monitoramento dos radares em terra durante a Copa e as Olimpíadas. |
Mais recentemente, neste início de 2014, o voo 904 da American Airlines pousou em Manaus após ser escoltado por caças F-5EM da FAB. Segundo informações da Aeronáutica, durante 17 segundos o código transponder 7500, referente à interferência ilícita apareceu na tela do Centro Brasília. O Sistema de Controle do Tráfego Aéreo, conforme orientação do SISDABRA (Sistema de Defesa Aeroespacial Brasileiro), considerou a ameaça real. Segundo fontes do Comando da Aeronáutica, no momento do alerta, a hipótese era a de que o piloto havia digitado brevemente o código para comunicar as autoridades sobre o sequestro, tendo em seguida alterado o código para evitar que o sequestrador percebesse que o código 7500 havia sido inserido. O temor era maior por envolver uma aeronave de origem americana, já que os Estados Unidos são um alvo prioritário para grupos extremistas.
Interceptações de baixa performance ficarão sob a responsabilidade dos helicópteros
Após o alerta, o avião, que estava sendo monitorado pelo controle Brasília, passou imediatamente para a subordinação da Defesa Aérea, sendo tratado como prioridade e situação de perigo. Imediatamente, as autoridades aeronáuticas foram acionadas e todos os procedimentos de alerta passaram a funcionar, já que havia risco de sequestro. A presidente Dilma Rousseff não chegou a ser informada durante o evento e a ordem para a decolagem do F-5 e do pouso em Manaus partiu do comandante da Aeronáutica, Juniti Saito. O Boeing 767 que partiu do Rio de Janeiro com destino a Miami, pousou numa posição remota do Aeroporto Eduardo Gomes, em Manaus, e, após uma verificação da Polícia Federal, o avião foi liberado para seguir viagem. A Aeronáutica abriu uma investigação para verificar por que o código 7500 foi inserido no voo 904. A American Airlines, em nota, não comentou o que teria levado a indevida inserção do código de interferência ilícita, se houve ação do piloto ou falha do avião.
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Por André Vargas
Publicado em 26/02/2014, às 00h00
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