AERO Magazine
Busca

Grandes Ensaios da AERO

Um jato versátil: Voamos com exclusividade o Pilatus PC-24

Primeiro jato de negócios concebido para operar em pistas não pavimentadas, o novo PC-24 tem o melhor bagageiro de sua categoria


Amaro Aviation
Amaro Aviation

Manhã nublada e fria de terça-feira. Chego ao São Paulo Catarina Aeroporto Executivo Internacional (SBJH), em São Roque, no interior paulista, para a demonstração do Pilatus PC-24.

A aeronave pertence a Amaro Aviation e está hangarada em um dos aeroportos mais bem equipados para receber a aviação de negócios do país. Com uma belíssima sala VIP, além de academia e apartamentos para descanso de tripulantes ou passageiros, a infraestrutura aeroportuária é capaz de receber operações visuais e por instrumentos (VFR/IFR) durante 24 horas por dia e realizar atendimento para voos internacionais, infelizmente, com restrições de dias e horários.

Encontro-me na sala VIP com o comandante Igor Bueno, diretor de Operações da Amaro Aviation, e tomamos um café acompanhado de biscoitos (por sinal, excelentes!). Em seguida, prosseguimos para o avião. Chegando à aeronave, realizamos uma minuciosa inspeção externa, atentos a algumas peculiaridades deste verdadeiro “jipão do ar”.

Inspeção externa

Pilatus PC-24
PC-24 conta com design simples e com soluções eficientes para operação em pistas curtas e não pavimentadas | Foto: Edmundo Ubiratan/AERO Magazine

De superfícies lisas, as asas contam com cinco painéis na parte posterior de cada lado, os quais auxiliam os ailerons durante as curvas, atuam como speed brakes (freios aerodinâmicos) em voo e lift dumps (redutores de sustentação) após o pouso.

O ar sangrado do motor garante o aquecimento do bordo de ataque, evitando a formação de gelo, o que acontece de modo automático. Já o estabilizador horizontal da cauda conta com o sistema boot, que infla uma superfície emborrachada capaz de quebrar e desprender placas de gelo da superfície aerodinâmica.

Pilatus PC-24
Estabilizador horizontal da cauda conta com o sistema boot, que infla uma superfície emborrachada capaz de quebrar e desprender placas de gelo da superfície aerodinâmica | Foto: Edmundo Ubiratan/AERO Magazine
Pilatus PC-24
Compartimento para armazenar alguns pertences da aeronave, fica próximo da raiz da asa Foto: Edmundo Ubiratan/AERO Magazine
Pilatus PC-24
A roda de nariz é equipada com “chapéu”, que deve ser instalado para as operações em pistas não pavimentadas | Foto: Edmundo Ubiratan/AERO Magazine
Pilatus PC-24
Painel para abastecimento single-point é equipado com comandos eletrônicos que permitem pré-ajustar a quantidade de combustível | Foto: Edmundo Ubiratan/AERO Magazine
Pilatus PC-24
No nariz da aeronave, localiza-se a baia de aviônicos, a bateria número um e uma garrafa de oxigênio | Foto: Edmundo Ubiratan/AERO Magazine

Próximo à raiz da asa esquerda, há um pequeno compartimento próprio para armazenar alguns pertences da aeronave, como funil, lata de óleo, calços, copo para dreno e assim por diante.  

No nariz da aeronave, localiza-se a baia de aviônicos, a bateria número um e uma garrafa de oxigênio. Seguindo com a checagem externa, deparo-me com o acesso de serviço do Quick Toilet Unit (QTU) – o veículo rebocador necessário para drenagem de detritos sanitários e abastecimento do líquido do lavatório da aeronave – e, para minha surpresa, o sistema opera a vácuo, uma excelente inovação da Pilatus para essa categoria de jatos. Ao contrário dos sistemas de caixa séptica de outras aeronaves com o perfil do PC-24, o mecanismo a vácuo impede que o mau odor suba para a cabine.  

Próximo à raiz da asa direita, encontramos o painel para abastecimento single-point, equipado com comandos eletrônicos por meio dos quais é possível pré-ajustar a quantidade de combustível desejada, além de fazer o “destanqueio”. A aeronave também pode ser abastecida sobre as asas. 

Contornando a asa, encontramos a bateria número dois, próxima ao bordo de fuga, com um sistema de desconexão. Ela é responsável pela partida dos motores. Aliás, como a aeronave não conta com uma unidade auxiliar de potência (APU, na sigla em inglês), quando não for possível fazer uso de um gerador de energia elétrica (GPU), o motor direito pode fazer essa função no solo (com redução da rotação em 50% em relação à marcha lenta, ou Idle, garantindo baixo nível de ruído sem empuxo), o que é muito útil em pistas desprovidas de suporte. Com essa função, que usa o ar sangrado do motor, é possível resfriar previamente a cabine da aeronave, além de alimentar sistemas elétricos e deixar o cockpit pronto para o voo. Para selecionar essa função no painel da aeronave, após a partida, o piloto deve acionar a opção Quiet Power Mode (QPM), a qual mantém um funcionamento reduzido do motor direito.

Bagageiro e cabine

Dando continuidade ao turn around, chegamos ao acesso do bagageiro, que é aquecido e pressurizado, com uma porta de acesso e funcionamento automático. Trata-se de um compartimento de 1,25 metro de largura por 1,30 metro de altura, o maior da categoria, capaz de carregar até duas motocicletas do tipo scooter – esse é o grande diferencial da aeronave em relação aos concorrentes.

Com um payload disponível de 2.500 libras ou 1.134 quilos, o PC-24 pode transportar no bagageiro (com configuração extensível até a cabine de passageiros) 715 libras ou 324 quilos em uma área de até dois metros cúbicos e meio, com tanque cheio. Há três configurações possíveis para o carregamento de carga e bagagem, que podem ser acessadas durante o voo. 

O trem de pouso principal da aeronave conta com duas rodas sendo do tipo trailing link capaz de suavizar até o pouso mais duro. A roda de nariz é equipada com um pneu um pouco mais largo do que aqueles usados pela maioria das aeronaves e conta com uma espécie de “chapéu”, que deve ser instalado para as operações em pistas não pavimentadas. 

Finalizamos a inspeção externa e ingressamos na cabine. Por se tratar de uma aeronave certificada para operações single-pilot, a lógica do sistema é toda integrada, a fim de reduzir a carga de trabalho dos pilotos e aumentar a segurança de voo.

PC-24
Interior do PC-24 da Amaro Aviation é configurado com oito assentos e priorizou cores neutras e clássicas

O sistema com referência inercial da Honeywell conta com quatro telas de 12 polegadas cada, visão sintética, autothrottle, navegação vertical, cartas eletrônicas e uma trackball, que faz as vezes de um mouse e navega um cursor por três telas. Além disso, localizado no console central, há um painel com funcionamento por toques na tela (touchscreen) capaz de trocar frequências de rádio, transponder, entre outras funções. 

Atrás do cockpit, a aeronave dispõe de uma galley equipada com compartimentos para alojar bebidas e alimentos, além do assento do QTU, que é embutido e privativo. No embalo da tecnologia, os comandos de luzes da cabine e entretenimento são feitos via conexão wi-fi (acessado por endereço http da rede interna do avião) por meio de telefone celular ou tablet.

A cabine de passageiros desta aeronave conta com oito assentos, quatro deles em forma de club seat em uma dimensão de 7,01 metros de comprimento por 1,55 metro de altura e 1,69 metro de largura. Méritos para o acabamento interno e as poltronas: um jato de negócios de alto nível, que pode operar como um turbo-hélice.

O voo

Pilatus PC-24
O cockpit batizado de Pilatus ACE inclui um Sistema de Visão Sintética, Autothrottle, Planejamento Gráfico de Voo, Sistema de Prevenção de Colisão de Tráfego (TCAS II) e capacidade de orientação de Desempenho do Localizador com Vertical (LPV).

Vento calmo, temperatura de 19 graus Celsius e 1.021 hectopascais de pressão atmosférica, partimos para a decolagem na pista 12 do Catarina, de 2.125 metros, mais que suficiente para o PC-24, que exige apenas 893 metros para decolar com peso máximo (ao nível do mar, com temperatura padrão e em pista pavimentada)

Um detalhe interessante sobre a operação é que os pilotos, mesmo já certificados, precisam de um treinamento prévio específico para operações em pistas não preparadas. Somos cinco pessoas a bordo com 3.500 libras de combustível, resultando em 16.194 libras o peso de decolagem, quase 100% para o peso máximo, que é de 18.300 libras. 

Alinhamos para a decolagem e começamos a acelerar, procurando usar as 6.840 libras de empuxo produzidas pelos motores Williams FJ-44 4A. Após 50% de N1, o autothrottle assume o comando da aceleração e ajusta a potência necessária para a decolagem, automaticamente.

Pilatus PC-24
Após 32 minutos, atingimos o nível de voo de 41 mil pés (FL410), subindo com uma velocidade standard de 200 nós (Kts) ou Mach 0.60 | Foto: Amaro Aviation

Devido ao tráfego aéreo, demoramos um pouco para iniciar nossa subida até o nível de cruzeiro e, após 32 minutos, atingimos o nível de voo de 41 mil pés (FL410), subindo com uma velocidade standard de 200 nós (Kts) ou Mach 0.60. Ao atingir esse nível, nosso peso cai para 15.198 libras e iniciamos a aceleração até Mach 0.72. O fuel flow neste momento é de 1.000 libras e a velocidade verdadeira de ar (TAS), de 412 nós (Kts), com uma temperatura externa de 59 graus Celsius negativos.

Desacoplo o piloto automático e início alguns comandos de ailerons. Embora seja uma asa pequena e relativamente enflechada, considero os comandos um pouco pesado. Efetuando o check de cruzeiro nos sistemas da aeronave, chegamos até o de combustível. O sistema faz o balanceamento automático dos tanques, que tem a capacidade de 5.964 libras.

Reduzimos a velocidade para o regime de longo alcance e o consumo de combustível cai para um fuel flow de 820 libras. A velocidade para esse consumo é de Mach 0.62 com uma velocidade (TAS) de 375 nós (Kts) a uma temperatura de 58 graus Celsius negativos.

Descida e pouso

Pilatus PC-24
No regime de longo alcance e o consumo de combustível era de fuel flow de 820 libras e velocidade de Mach 0.62

Livramos o FL410 em descida para o pouso no Catarina, no peso máximo de pouso. O “jipão a jato” necessita de apenas 724 metros de pista, com temperatura padrão e ao nível do mar. Procedimento com performance de navegação requerida (RNP) da pista 12 programado, damos início à aproximação pelo waypoint JH004. Nosso peso de pouso é de 14.600 libras, resultando em velocidades Vapp de 106 Kts e Vref de 96 Kts, que devem ser consultadas no checklist se o proprietário não tiver comprado o pacote de performance oferecido para o sistema de gerenciador de voo (FMS) – em minha opinião, poderia ser uma função standard em vez de ser vendida à parte.

O vento é calmo e a temperatura está em 21 graus Celsius. Cruzamos a cabeceira e o PC-24 toca suavemente a pista na marca de mil do Catarina. Após o toque, as 10 placas sobre as asas se abrem, produzindo o lift dump.

Mesmo sem ser equipada com reversores de empuxo, o uso dos freios não se faz necessário com tanta intensidade. Realizamos o back track pela pista e, ao estacionar no pátio, testamos o recurso do motor, transformado em APU, suficiente para gerar energia e refrigeração para a aeronave.

O preço do Pilatus PC-24 fica em torno 8.9 milhões de dólares. Com peso máximo de decolagem, saindo de São Paulo, o novo jato alcança todas as cidades do Nordeste e Manaus, no Amazonas.

Operação em pistas não pavimentadas

O PC-24 já vem certificado para operações em pistas não pavimentadas, devendo o comandante consultar o Número de Classificação de Pavimentos (PCN) da pista desejada, assim como, o manual de performance da aeronave.

Cada avião tem um Número de Classificação de Aeronaves (ACN, na sigla em inglês). Somente aeronaves que tenham ACN menor ou igual ao PCN da pista podem pousar nela ou decolar dela sem causar danos ao pavimento. Para as operações em pistas não pavimentadas, a roda de nariz recebe uma espécie de capa, para evitar que detritos soltos na pista atinjam a barriga ou o motor da aeronave.

* Publicado originalmente na AERO Magazine 330 · Nov/2021

Galeria

Pilatus PC-24

Pilatus PC-24

Pilatus PC-24

Pilatus PC-24

Por Felipe Milani, de São Roque
Publicado em 27/05/2024, às 16h00


Mais Ensaios