O Hawker 400XP teve o peso máximo de decolagem aumentado e incorporou uma série de opcionais
Diferentes aeronaves costumam fazer sucesso graças às inovações contidas em seus projetos ou pela longevidade com que operam. No caso deste ensaio, esses dois fatores podem ser combinados.
A base do jato executivo Hawker 400XP voou pela primeira vez em agosto de 1978, com o nome de Mitsubishi MU300 Diamond 1. O projeto original foi desenvolvido pela divisão aeronáutica da Mitsubishi, que até então produzia turbo-hélices de asa alta equipados com motores Garrett. Uma série de melhorias foi incorporada ao projeto do MU300 e assim nasceu a versão Diamond 2, que voou pela primeira vez em 1984.
Nessa época, a Beechcraft, tradicional fabricante norte-americano de turbo-hélices e aviões a pistão, planejava entrar na faixa dos jatos leves. O caminho mais curto foi comprar o projeto e os direitos de fabricação dos japoneses. Apenas onze Diamond 2 foram produzidos antes da venda do projeto.
Rebatizado de Beechjet 400, o avião ganhou motores Pratt & Whitney Canada JT15D5, mais potentes, teve o interior redesenhado e foi produzido pela Beechcraft de 1986 até novembro de 1990, quando foi substituído pela versão Beechjet 400A.
O modelo 400A teve seu peso máximo de decolagem e teto operacional aumentados e o tanque de fuselagem foi reposicionado para aumentar o espaço interno da cabine de passageiros. O cockpit ganhou uma série de equipamentos novos da linha Collins Pro Line 4, com três tubos de EFIS coloridos, dois PFD (Primary Flight Display) e um MFD (Multi-Function Display), tendo como opcional o segundo MFD.
Até hoje foram fabricadas mais de 600 unidades a partir da base desenvolvida pela Mitsubishi, sendo 400 exemplares da versão 400A e 200 da versão militar — 180 aviões para a Força Aérea Norte-Americana (T-1 Jayhawk) e 20 para a Força Aérea Japonesa (T-400).
No ano passado [referente ao ano de 2004], a Raytheon decidiu reposicionar o jato dentro de sua linha de produtos. Desse modo, foi rebatizado Hawker 400XP e passou a oferecer uma série de opcionais como itens de fábrica. Mesmo assim, o preço do avião permaneceu inalterado e o peso máximo de decolagem aumentou em 200 libras.
O novo impulso na linha de montagem se deve ao aumento do número de encomendas para o modelo. Somente a NetJets, empresa que administra cotas de aeronaves compartilhadas (fractional ownership), encomendou 100 Hawker 400XP, 50 para serem operados nos Estados Unidos e outros 50 que irão voar na Europa.
Além de contar com uma frota já implantada, que opera em todo o mundo, e possuir uma cabine com capacidade para até nove passageiros bastante confortável, cujo formato da fuselagem oferece maior espaço para a cabeça e o ombro dos passageiros, o Hawker 400XP oferece ainda cinco anos de garantia para a aeronave e dois anos de garantia para o interior. As garantias incluem peças sobressalentes e mão de obra.
O novo 400XP também está equipado com uma suíte de aviônicos completa, com sistema de alerta de tráfego TCAS II (versão VII, exigida para voos RVSM), alerta de colisão com o terreno EGPWS e duplo FMS Collins com navegação vertical (VNAV).
Vamos voar o primeiro Hawker 400XP a operar no Brasil, o PT-UQF, que está com 70 horas totais e pertence a uma indústria química. O encontro acontece no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, no hangar da Líder Táxi Aéreo, representante brasileira da Raytheon Aircraft.
Na ocasião, fomos acompanhar um típico voo executivo — transportar um empresário paulista para Brasília (DF). O responsável pela operação do avião é o comandante Tadeu, acompanhado pelo comandante Schnorl, que tem mais de 1 500 horas em Beechjet e tem supervisionado a adaptação do comandante Tadeu ao 400XP.
Chegamos às 06h00 para preparar a aeronave, e Quebec-Fox já está na rampa. Sigo o comandante Schnorl durante a inspeção externa. Não há mudanças significativas, mas vale observar com mais cuidado a asa deste Hawker, que não possui ailerons. O comando de rolamento é feito por spoilers, que têm função dupla: comandam manobras de rolagem e atuam como freios aerodinâmicos (speed brakes).
No bordo de fuga, próximo à ponta da asa, existem pequenos compensadores de rolagem. Grandes flapes, do tipo Fowler, com quatro posições (0, 10, 20 e 30), ocupam praticamente toda a extensão do bordo de fuga das asas.
O acesso ao compartimento externo de bagagem fica localizado abaixo do motor esquerdo e seu tamanho é adequado para a operação típica da aeronave, com quatro passageiros. O bagageiro tem capacidade para 204 kg. Se a mala ou qualquer outro volume for muito grande, a solução é acondicioná-la no compartimento interno de bagagens, que fica junto ao toalete e pode carregar mais 159 kg.
O acesso à cabine de passageiros é feito por uma porta larga, com escada retrátil de dois degraus. O interior está configurado para sete passageiros, com duas poltronas no fundo viradas para a frente, uma configuração club seating (2+2) no centro da cabine e uma poltrona virada para trás, próxima à porta de acesso. O acabamento interno é muito bom, com poltronas em couro bastante confortáveis.
Uma galley básica (guarda-copos, água quente, compartimento térmico e lixeira) garante conforto extra aos passageiros. No fundo da cabine fica o toalete, bastante confortável, junto ao bagageiro interno do avião. A Raytheon retirou a janela do toalete no 400XP, o que reduziu sensivelmente o nível de ruído na cabine.
De modo geral, o conforto para os passageiros é bom em etapas de até três horas. O ângulo de recline das poltronas é muito bom, assim como o espaço disponível para as pernas, principalmente na parte dianteira da cabine. A aeronave ensaiada está equipada com um sistema de som ambiente opcional, com capacidade para seis CDs e controle remoto. O ar-condicionado do Hawker 400XP permite resfriar a aeronave sem a necessidade de aguardar a partida dos motores. Basta utilizar uma fonte elétrica externa.
O desempenho do 400XP também melhorou. O aumento em 200 libras no peso máximo de pouso significa carregar um passageiro a mais, por exemplo. Com capacidade máxima de payload (2 050 libras), essa aeronave tem um alcance de aproximadamente 870 milhas náuticas; na configuração de alcance máximo (1 550 milhas náuticas), é possível levar dois tripulantes e três passageiros.
Operando no peso máximo de decolagem, o Hawker decola de pistas a partir de 1 200 metros de comprimento. Para aterrissar com peso máximo de pouso, o 400XP exige uma pista de pelo menos 1 100 metros e uma Vref de 117 nós.
Uma característica que aumenta a flexibilidade operacional desse avião é a pequena diferença entre seu peso máximo de decolagem (16 300 libras ou 7 349 kg) e o peso máximo de pouso (15 700 libras ou 7 394 kg). Isso permite decolar com tanque cheio e realizar um pouso apenas 30 minutos depois.
A cabine de comando não é a mais moderna do mercado, mas é bem completa. Conta com três telas EFIS, a quarta delas opcional. Os dados para navegação são provenientes de dois computadores de bordo (FMC), e todo o planejamento de navegação é visualizado no MFD, que tem a capacidade de desenhar órbitas, arcos DME e curvas — mas é bom ressaltar que essas funções não estão disponíveis em alguns conjuntos de aviônica.
Os comandos dos sistemas e dos alarmes estão distribuídos pela cabine, e as luzes acendem quando determinado sistema é acionado. É uma filosofia inversa às atuais cabines escuras (dark cockpit), o que exige apenas uma rápida adaptação. Outro ponto importante é que os comandos HDG (heading ou rumo) e CRS (course ou curso) do Flight Director estão no painel central inferior.
O Hawker tem dois computadores independentes de Flight Director, e os painéis de acionamento estão fora do campo primário de visão do piloto; portanto, qualquer alteração deve ser feita nos dois painéis a fim de evitar que o sistema receba duas informações discrepantes.
O 400XP é certificado para operar com dois pilotos. O acesso ao banco é um pouco difícil, porém, um apoio de pé no painel central ajuda na manobra. Os cheques pré-voo são um pouco extensos, pois quase todos os sistemas são convencionais.
O motor fabricado pela Pratt & Whitney Canadá, modelo JT15D-5, tem potência térmica de 3 190 libras de empuxo, porém, está ajustado para 2 965 libras. Essa diferença aumenta a vida útil e a confiabilidade do motor, que tem um tempo entre revisões gerais (TBO) de 3 500 horas. O controle dos parâmetros do motor é feito pela HMU (Height Monitoring Unit). O sistema de combustível é composto por três tanques, dois nas asas e um central, com capacidade total de 733 galões americanos.
O sistema antigelo funciona com sangria de ar quente dos estágios de compressão do motor para as asas e tomadas de ar dos motores; o estabilizador horizontal é protegido por um sistema de aquecimento elétrico.
O jato está pronto para iniciarmos o voo. Às 7h30, damos a partida no motor. A partida é rápida, usando uma fonte externa. Abrimos o combustível ao atingir entre 8% e 10% de N2. A partida é muito fria e não ultrapassa os 350ºC — seu limite é de 700ºC por dois segundos. Acionamos, então, a bateria, que permite realizar partidas rápidas nos dois motores quando ela é a única fonte de energia.
Após a partida, iniciamos o taxiamento. O controle direcional é feito através dos pedais, que comandam o trem de nariz, 25 graus para cada lado. Uma amplitude extra, de mais 20 graus, é conseguida ao utilizar o freio diferencial e a potência assimétrica nos motores. O raio de curva é restrito e fica difícil manobrar em pátios e pistas apertadas.
Durante o taxiamento, são requeridos vários cheques: reverso, speed brake, anti-skid, jet pump, piloto automático, freios, transferência de combustível e alimentação cruzada, rudder boost e EFC. Isso exige uma grande atenção do piloto que não está realizando o taxiamento, enquanto o outro tripulante manobra a aeronave no solo.
Somos o número cinco para a decolagem. Rapidamente, a Torre São Paulo coordena as aeronaves que se aproximam e que estão prestes a decolar. Chega, então, a nossa vez. Estamos com peso de 15 000 libras, flapes 10, e teremos as seguintes velocidades: V1 = 105 nós; VR = 111 nós; e V2 = 118 nós.
Estamos alinhados, a potência de decolagem é de 99,3% de N1, e aceleramos rapidamente. O pitch inicial após a rotação é de 15 graus, mas a sensação é de ser mais acentuado. A razão de subida inicial é de 3 000 pés/minuto e, a 3 000 pés de altitude (400 pés acima do nível do solo), iniciamos a retração dos flapes, reduzimos a potência e aceleramos para 190 nós devido à restrição de velocidade do procedimento de subida. A velocidade normal de subida é de 220 nós. Conseguimos manter 2 500 pés/minuto até o FL 100 (10 000 pés), e depois a razão vai reduzindo até estabilizar em 1 500 pés/minuto acima do FL 200.
O Controle São Paulo nos instrui a chamar o Centro Brasília, já que nosso nível no plano de voo é o FL 280. A aeronave tem capacidade para operar em ambiente RVSM (com separação mínima vertical reduzida a 1 000 pés), porém, ainda não concluiu o processo de certificação, que é individual para cada matrícula.
Nesse início de manhã, o movimento é intenso na Terminal São Paulo, o que atrasa um pouco nossa liberação para o FL 330. Isso porque aeronaves que ainda não cumprem os requisitos RVSM podem voar nos níveis RVSM desde que autorizadas pelo controlador e com separação de 2 000 pés das demais aeronaves.
O teto de serviço do Hawker 400X é de 45 000 pés, porém, está limitado a 41 000 pés quando seu peso for superior a 14 000 libras. Após nivelarmos no FL 330, a velocidade é ajustada para Mach .76, com consumo aproximado de 580 libras de combustível por motor.
Após uma hora de voo, o ACC Brasília ordena nossa descida, inicialmente para o FL 200, a fim de interceptarmos a STAR Pura 2 para cumprir o procedimento de precisão ILS da pista 11. Iniciamos a redução de velocidade com 180 nós e posicionamos o flape em 10. Ao interceptar o Localizador, comandamos trem embaixo e flape 20; no marcador externo, ajustamos para flape 30.
O controle na final é um pouco diferente devido aos spoilers. Com vento de través, deve-se usar o pedal um pouco mais que o normal. Nossa Vref é de 107 nós. Mantemos velocidade de 112 nós na aproximação, a rampa do glide slope está cravada, o toque é na marca de 1 000 pés, e a frenagem é bastante eficiente, auxiliada pelo reverso.
Seguimos para o hangar da Líder após 1h20min de voo e 1 920 libras de combustível consumidas.
Aguardamos até as 16h30 para retornar a São Paulo, e a rotina se repete: embarque, partida, táxi, cheques de táxi etc. Uma coisa interessante é que nosso Hawker não tem farol de taxiamento; portanto, usamos o farol de pouso para esse fim. Tomando cuidado para evitar um possível superaquecimento, aguardamos para decolar no ponto de espera.
Temos V1 = 108 nós; VR = 112 nós; V2 = 118 nós; e 98,2% de N1. A diferença nos parâmetros se deve à elevação de Brasília e à temperatura externa de 28ºC. Após a decolagem, somos liberados diretamente para o FL 280, que atingimos em 18 minutos.
É preciso se acostumar com a ergonomia do compensador elétrico, que fica no manche, pois, no mesmo botão, estão os controles do stabilizer trim e do compensador de rolamento. Assim que nivelamos, o sistema de som é acionado, e seguimos na proa de Pirassununga (SP) com uma excelente trilha sonora. Após algum tempo, somos liberados a subir ao FL 360.
Nivelamos em 36 000 pés, estabilizados, com velocidade de Mach .77 e consumo aproximado de 560 libras por hora em cada motor. É final de tarde de verão e notamos o surgimento de várias formações. O controle do radar meteorológico é feito pelo CDU do FMS, e as informações são mostradas na tela do MFD. É possível controlar todos os rádios pelo CDU ou pela RTU.
Uma chuva forte cai sobre Congonhas e fecha o aeroporto para decolagens e aproximações, o que acaba causando um acúmulo de tráfego. Somos instruídos pelo Controle Brasília a orbitar sobre a cidade de Araraquara (SP) e imediatamente reduzimos a velocidade. Planejamos o procedimento no FMS e, após duas órbitas, somos liberados a tomar a proa de Grade, ponto de entrada na carta STAR de São Paulo.
Seguimos tranquilos na aproximação, usando o FMS para a navegação lateral e vertical. Já estabilizados no ILS, somos transferidos para a Torre São Paulo, que indica o pouso na pista 17L (esquerda), que está levemente umedecida. O comandante Tadeu conduz o Hawker tranquilamente na final, o flare é perfeito, toque suave, e imediatamente o piloto comanda o reverso e apoia os pés no freio. A desaceleração é suave, e livramos na interseção central, em direção ao hangar da Líder.
Após o voo, fica a certeza de que o Hawker 400XP atende bem a boa parte dos operadores de jatos leves, com uma relação custo-benefício bastante competitiva e uma plataforma já comprovada. Tem ainda uma boa rede de suporte no Brasil.
Atualmente, a linha de montagem deste modelo tem encomendas para os próximos cinco anos, o que indica que o projeto consagrado do 400XP continua agradando aos operadores, fato pelo qual tem sido permanentemente atualizado. Novos concorrentes têm surgido nos últimos anos, a maioria com projetos até mais modernos. Mas isso não parece incomodar o bravo samurai.
Fabricante | Raytheon Aircraft Company | ![]() ![]() ![]() |
Preço básico | US$ 7.117.465,00** | |
Motor | Pratt & Whitney JT15D-5 | |
Potência | 2.965 libras | |
Capacidade | 2 pilotos + 7/9 passageiros | |
Dimensões | Envergadura: 13,26 m Comprimento: 14,76 m Altura: 4,24 m Altura de cabine: 1,45 m Área da asa: 22,4 m² | |
Pesos | Peso básico operacional: 10.950 libras Peso máximo de rampa: 16.500 libras Peso máximo de pouso: 15.700 libras Peso máximo de decolagem: 16.300 libras Payload máximo: 2.050 libras (930 kg) Peso máximo de combustível: 4.912 libras | |
Desempenho | Velocidade de cruzeiro: 468 nós (865 km/h) Velocidade de cruzeiro econômico: 414 nós (476 mph) Distância de pouso (peso máx., ISA, nível do mar): 1.071 m Distância de decolagem (peso máx., ISA, nível do mar): 1.191 m Alcance máximo: 1.742 mn (3.226 km) Teto operacional: 45.000 pés |
*Publicado originalmente na AERO Magazine 130 · Março/2005
** Valor referente de 2005
Daniel Torelli
Publicado em 10/02/2025, às 15h31
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