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Basta fazer o MRO

Não existe avião velho, apenas mal mantido e pouco econômico

Julgar uma aeronave por sua estética ou pela modernidade de sua cabine pode ser um erro




Não se deve julgar a “juventude” de um avião por sua estética externa ou mesmo a modernidade de sua cabine. E, muito menos, associar um grau maior de segurança ao voar o “avião do ano”.

De qualquer modo, muitas companhias aéreas, que não podem substituir suas frotas no mesmo ritmo de algumas asiáticas milionárias, fazem intervenções periódicas de caráter “cosmético”, modernizando assentos, iluminação, decoração interna das cabines e até inovando em comunicação visual, alterando a pintura externa e, eventualmente, os próprios emblemas e logotipos da empresa. 

É difícil estabelecer uma regra rígida para rotular um avião comercial como sendo “velho”: as diretrizes básicas para decidir se ele pode continuar a prestar serviços rentáveis e seguros -  uma vez aceitos por seus passageiros – se resumem aos custos de manutenção para mantê-lo disponível, sem acarretar atrasos ou cancelamento de voos, e outra modalidade de manutenção: a econômica, ou o quanto ele deixa de ter lucratividade, descontado o custo do combustível por passageiro e a disponibilidade de peças e componentes necessários para mantê-lo em voo. 

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Concorde: válvulas termo-iônicas 

 Podemos chegar a um ponto em que o número de intervenções de manutenção (tanto em mão de obra como peças de reposição) e o consumo de combustível atinjam um ponto que torne inviável a continuidade das operações de um “veterano” com seus 20 ou mais anos de idade. 

Um exemplo emblemático pode ser encontrado em uma aeronave que, mais que qualquer outra, representou um avanço revolucionário da indústria aeronáutica: o supersônico (SST) anglo-francês “Concorde”. Numa época já de aviônicos digitais, ele dependia ainda das antigas válvulas termo-iônicas e seus motores Bristol eram adaptações de consumo altíssimo de combustível. O que explica os custos milionários de uma passagem de ida – muito maior que o de primeira classe dos 747 cujos voos sobre o Atlântico Norte já faziam parte da rotina. Não fossem os motivos mais que  justos para desativar os SST da British e da Air France, suas peças de reposição teriam de ser fabricadas em oficinas, pois nunca chegaram a ocupar prateleiras de almoxarifados das aéreas e dos fabricantes – lógico que a inexistência de uma população maior de SST foi a responsável pela lacuna, porém o exemplo não perde a validade.

A fonte da juventude e sensação de segurança para os mais céticos é garantida pelos órgãos de regulação em muitos países que estão se mostrando cada vez mais sensíveis ao peso dos anos em aeronaves comerciais: a FAA norte-americana exige inspeções muito mais frequentes para os velhinhos das frotas comerciais, mesmo quando operando nas cores das mais tradicionais e renomadas aéreas internacionais.

Encontrar um avião com 20, 25 ou mesmo 30 anos de uso não deve causar surpresa: Boeing e Airbus fabricam produtos para uma vida útil que vai muito além. Não existe termo de comparação mesmo com o mais moderno carro de passseio que, após 5 anos de uso é considerado superado em muitas partes do mundo. O que uma fuselagem aeronáutica tem de sofrer ao suportar ciclos e mais ciclos de pressurização (um dos principais da fadiga do material) e turbulências e o esforço contínuo dos motores desenvolvendo cerca de 75% de sua potência (ante uns 25% para veículos terrestres) faz com que a fabricação de uma aeronave (da mais simples de um aeroclube a um jumbo) possa ser considerada superdimensionada.

É preciso admitir que chega um ponto em que o investimento em manutenção (muito mais frequente do que em modelos novos) as peças de reposição necessárias para garantir a disponibilidade de operação e, ainda mais importante, os galões de combustível à mais para o cumprimento confiável de cada viagem, apelam para o bom senso de uma administração confiável: chegou a hora de aposentá-lo em definitivo ou vendê-lo em  mercados secundários menos exigentes (ou até subsidiados).

Todas as companhias aéreas entre as que figuram no ranking mundial tem seus planos para a sucessão de suas ferramentas de lucro. Aeronaves de curto e médio alcances como aquelas das famílias Boeing 737 e Airbus A320 sofrem maior desgaste, devido à exaustiva sucessão de decolagens e pousos diários, do que os imponentes widebody que fazem apenas uma travessia transoceânica no mesmo período. Como o calendário de longevidade de uma aeronave é marcada muito mais pelo numero de ciclos (uma decolagem e um pouso) que acumula, o plano de aposentadoria não varia. 

Não existe avião velho, mas, sim, mal mantido. Isso combinado com a queda natural de eficiência diante da evolução natural em economia de combustível e redução de emissões poluentes e nível de ruído - próprios à própria dinâmica da tecnologia aeronáutica – decretam sua despedida de uma frota comercial.  

Por Ernesto Klotzel
Publicado em 01/09/2017, às 12h00 - Atualizado às 09h58


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