As iniciativas por trás dos números positivos divulgados pelo NTSB no país com a maior frota de aeronaves leves do mundo
O National Transportation Safety Board (NTSB), o Cenipa norte-americano, acaba de anunciar as estatísticas preliminares de acidentes aéreos de 2013. A grande novidade é que houve uma substancial redução de ocorrências da aviação geral, cuja taxa de acidentes para 100.000 horas de voo foi de 5,85(1). Em 2012, essa taxa foi de 7,04.
Com mais de 250.000 aeronaves em operação na aviação geral, cerca de 20 vezes o tamanho da frota brasileira, depois de alguns anos com o número estável de acidentes em cerca de 1.500 casos por ano, o que aconteceu nos Estados Unidos? Houve uma ação efetiva ou somente um ano de sorte? Algo similar poderia ser aplicado no Brasil?
Há suspeitas de que contribuíram para esse bom resultado projetos em execução pelo Centro de Excelência para a Aviação Geral (Pegasas)(2), criado em 2012. Trata-se de uma parceria para aumentar a segurança operacional, a acessibilidade e a sustentabilidade da aviação geral norte-americana, liderada pela FAA e envolvendo universidades, fabricantes de aeronaves e associações da aviação, incluindo a Embraer.
Existem 12 projetos de melhoria de segurança operacional aprovados no Pegasas, dentre os quais três estão bem avançados e merecem acompanhamento: pavimentos aquecidos para aeroportos, indicador de ângulo de ataque e coleta e análise de informações de monitoramento de helicópteros.
Não faz parte do dia a dia de operadores brasileiros, mas quem já teve de pousar e taxiar num aeroporto no inverno, nos Estados Unidos, no Canadá ou mesmo na Argentina (Bariloche), sabe das dificuldades que o gelo provoca e o trabalho que dá manter o pátio limpo. Após uma nevasca, um aeroporto pode ter suas operações drasticamente impactadas, reduzindo a eficiência das operações, para mitigar o aumento do risco. A entrada constante de veículos removedores de neve e gelo, além de paralisar a pista, acrescenta um risco nas operações, o que levou ao estudo de outras técnicas de remoção.
Os métodos comumente utilizados na remoção são de alto custo, causam impactos indesejáveis no meio ambiente e consomem muita mão de obra. Dessa forma, o projeto está analisando o potencial de alteração das propriedades do pavimento utilizando materiais de mudança de fase (PCM), um produto já utilizado em outras indústrias, porém ainda não aplicado à infraestrutura aeroportuária. “O objetivo é reduzir ou eliminar o uso de anticongelantes ou equipamentos de remoção”, explica Peter Sparacino, gerente do Programa Pegasas pela FAA.
Outro projeto é voltado para quem passou algum susto numa base ou final para pouso mesmo em condições visuais. Ter um alarme de quase estol e não perceber é um dos fatores contribuintes para vários acidentes da aviação geral, de acordo com as informações elaboradas pelo Comitê Conjunto de Aviação Geral dos Estados Unidos (Gajsc). O comitê recomendou a instalação e o uso de um indicador de ângulo de ataque em monomotores. “Elaboramos um material de treinamento para o uso desses indicadores e estamos em coordenação com a comunidade de instrução de voo para promover e encorajar o seu uso”, conta Mark Liptak, engenheiro aeroespacial da FAA.
Desde 2013, quase todas as empresas da aviação regular brasileira enviam as informações coletadas pelos gravadores digitais de dados para a Iata, para que o órgão possa retirar sua identificação, agregá-los e apresentá-los para uma análise dentro do Grupo de Monitoramento de Dados de Voo(3), um grupo de trabalho colaborativo que envolve o governo e a indústria, com objetivos voltados exclusivamente para a segurança operacional. O projeto é uma adaptação do que é realizado nos Estados Unidos pelo Cast (Commercial Aviation Safety Team).
A proposta é criar a mesma estratégia para os operadores de helicópteros. Será determinado o método de coleta e análise, bem como definido quais parâmetros serão avaliados e suas métricas, segundo Mark Liptak, iniciativa que criará estratégias de mitigação de risco para fases de voo com alto potencial de acidente.
Os trabalhos do Pegasas estão em seus estágios iniciais e, atualmente, a FAA não dispõe de análises que comprovem o reflexo das iniciativas, mas o trabalho está sendo desenvolvido dentro de seus prazos. Desde 2012, foram criadas mais de 23 iniciativas de segurança operacional somente para casos de perda de controle em voo, o que demonstra uma atitude de preocupação e atenção com a aviação geral.
Essa mesma linha de trabalho pode ser aplicada no Brasil? A resposta é “sim”, pois o que se destaca nesse tipo de processo é o trabalho de parceria, unindo universidades com suas pesquisas, a indústria com as melhores técnicas e os operadores aéreos e suas associações, deixando ao governo a tarefa de suportar e regulamentar o que for necessário.
Por Carlos Eduardo Pellegrino
Publicado em 07/11/2014, às 00h00 - Atualizado em 11/11/2014, às 13h58
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