Bloqueios econômicos contra Moscou refletem em grave crise para as empresas aéreas russas
Com os embargos econômicos a Rússia passou a enfrentar uma série de desafios inéditos, como a incapacidade de manter sua frota de aviões comerciais operando. O bloqueio econômico tornou impossível as empresas aéreas russas voarem para fora do país, especialmente após serem impedidas de realizar transações financeiras em dólar e euro, o que impacta também no pagamento dos contratos de locação das aeronaves.
O primeiro problema que será enfrentado pelas maiores empresas aéreas da Rússia, sobretudo do grupo Aeroflot e da S7 Airlines é a incapacidade de manter seus aviões operando. Sem acesso a financiamento externo as companhias aéreas ficam impossibilitadas de comprar qualquer item de manutenção, desde peças até manuais e serviços especializados. Além disso, os três maiores fabricantes do mundo, Airbus, Boeing e Embraer, anunciaram o rompimento unilateral de qualquer prestação de serviço para as empresas com sede na Rússia. A reação foi uma pressão dos governos da Europa, Estados Unidos e Suíça para isolar o governo Vladmir Putin, mas que atinge a base da frota das companhias aéreas, formada majoritariamente por aviões Ocidentais.
Um levantamento feito pela AERO Magazine aponta que ao menos 360 aviões da Airbus, Boeing e Embraer voam nas duas maiores empresas aéreas da Rússia. Sem suporte e manutenção os aviões ficam impedidos de voar.
Recentemente as ilhas Bermudas anunciaram o cancelamento dos certificados de aeronavegabilidade dos aviões comerciais russos registrados no país. Com isso, as aeronaves não podem, em teoria, voar nem mesmo na Rússia. Ainda assim, mesmo que o governo autorize os voos, após a nacionalização da frota, será impossível voar para além do próprio território, já que nenhum país pode autorizar o voo de aviões com certificados de aeronavegabilidade expirados ou cancelados. Exceções são para casos de repatriação de aeronaves com certificados suspensos ou vencidos, mas destinados uma operação e com diversas restrições, entre elas a ausência de carga ou passageiros.
Por uma série de questões, inclusive de seguro, as empresas aéreas russas registravam seus aviões em outros países, sobretudo nas Bermudas. Entre os benefícios estava menores taxas, maior facilidade na obtenção de apólices de seguro mais baratas e confiabilidade por parte dos bancos nos processos de manutenção e inspeção Ocidentais.
Um avião registrado na Rússia, com a matrícula RU- teria maiores dificuldades de obter esses requisitos legais pela baixa confiabilidade do mercado na agência de aviação civil russa. Um dos temores era repetir os trágicos acidentes registrados no país durante os primeiros anos após o fim do regime soviético. A falta de padronização em treinamento, manutenção e gestão de cabine foram responsáveis por diversas tragédias, fazendo as empresas especializadas em locação de aviões exigirem o registro em países com agencias reguladoras consideradas mais seguras.
Com o país isolado as empresas aéreas da Rússia já acumulam perdas bilionárias e assistem o esvaziamento de seus voos. O aeroporto de Sheremetyevo, nos arredores de Moscou, vai manter apenas dois terminais em funcionamento.
A Rússia trabalhava para desenvolver um avião comercial de classe global para competir com a família A320neo e 737 MAX, contando com mais da metade de seus itens fornecidos por empresas Ocidentais. O objetivo era seguir o mesmo padrão de projeto, operação e manutenção existente no mundo, mas os embargos colocam o MS-21 em uma situação de absoluto isolamento e incapacidade até mesmo de ser produzidos. A indústria aeroespacial da Rússia não conta com grande parte das tecnologias usadas no avião, e seu desenvolvimento local levaria ao menos uma década. O regional Sukhoi SSJ100 Superjet estava passando por um processo de nacionalização de quase todos os seus sistemas, prevendo justamente um embargo comercial, mas além de sua capacidade limitada em praticamente 100 lugares, a produção do avião é limitada.
A aviação comercial da Rússia deverá ser uma das maiores vítimas das sanções Ocidentais contra Moscou, com a indústria aeroespacial sendo outra. A expectativa de analistas é que, caso os embargos sejam suspensos no curto prazo, as empresas aéreas possam retomar suas atividades dentro de um perfil de recuperação de médio prazo. A Aeroflot e S7 Airlines vinham se destacando globalmente pela excelência de seus serviços e por contarem com uma das frotas mais novas e modernas do mundo. Mas, sem acesso ao mercado financeiro internacional e sem peças, as aeronaves terão pouca ou nenhuma serventia já nas próximas semanas.
Por Edmundo Ubiratan
Publicado em 16/03/2022, às 16h37
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