Segundo executivo da Lufthansa o avanço dos bimotores e a pandemia declararam o fim dos Super Jumbos
Por Edmundo Ubiratan Publicado em 25/08/2020, às 10h00 - Atualizado às 12h07
Os A380 foram desenvolvidos para um cenário previsto nos anos 2000 e que não se confirmou
A aposentadoria prematura do Airbus A380 parece uma certeza para grande parte de seus operadores, com aproximadamente cem aeronaves podendo ser definitivamente retiradas de serviço pelos efeitos da pandemia.
Porém, a covid-19 foi apenas um gatilho antecipado de um movimento que estava em curso, com a substituição dos gigante quadrimotores por aviões bimotores de última geração que oferecem menor consumo de combustível.
A análise é do engenheiro Nico Buchholz, ex-diretor de marketing da Airbus e chefe de compras da Lufthansa. Em entrevista ao Airlineratings, o executivo credita que a curta carreira dos A380 se deve especialmente ao rápido desenvolvimento de aeronave bimotoras de grande capacidade e menores custos operacionais por assento.
Ainda que sejam menores que o A380, modelos como o A350-900 e a família Boeing 787 Dreamliner oferecem maior flexibilidade de operação e custos menores, em alguns casos a diferença supera facilmente a margem dos 30%. “A nova tecnologia de motor do 787 e do A350, além de sua aerodinâmica aprimorada, foram provavelmente fatores decisivos para o atual desaparecimento do A380 e do 747-8”, aponta Nico Buchholz em trecho da entrevista ao Airlineratings.
Segundo Buchholz, quando o A380 foi lançado no início dos anos 2000, a eficiência dos motores ainda não comportava aeronaves bimotoras de grande capacidade e alcance. Na época os futuros super jumbos eram até 14% mais baratos que os 747-400, que reinavam absolutos nas rotas de longo curso.
O 747-8 foi a última versão do lendário Jumbo, mas teve aceitação limitada no transporte de passageiros
A própria Boeing apostou no potencial do mercado de aviões de grande porte com o lançamento do 747-8, a versão alongada e remotorizada derivada do 747-400. Na ocasião, o fabricante norte-americano acreditava em um nicho de mercado especifico, que justificava modernizar o Jumbo, mas não comportava um projeto completamente novo. Um dos motivos era que a própria Boeing havia recém-certificado os 777-300ER, que ofereciam uma capacidade de transporte e alcance próximos das diversas variantes do 747. Além disso, estava previsto para o curto prazo a certificação ETOPS 330.
Em outubro de 2003, o protótipo do 777-300ER completou o então mais longo voo de demonstração monomotor, com o avião voando mais de cinco horas com um de seus dois motores desligado.
O 777-300ER foi um dos carrascos dos quadrimotores, dominando as rotas antes exclusivas do 747 e previstas para o A380
O voo de teste teve duração de aproximadamente 13 horas, voando entre Seattle e Taipei, em Taiwan. Na ocasião os pilotos deliberadamente desligaram um dos motores General Electric GE90-115B e voou com o avião por 330 minutos monomotor. A intenção era validar a capacidade da operação de longo curso mesmo com a falha em um dos motores.
A certificação ETOPS 330 possibilitou os aviões bimotores terem as mesmas vantagens operacionais dos modelos de três e quatro motores, mas com custos consideravelmente menores.
O A380 foi entregue pela primeira vez em 2007, quando a Boeing e a própria Airbus trabalhavam em uma nova geração de bimotores de grande capacidade. A australiana Qantas Airways recentemente passou a cogitar utilizar dois bimotores em voos para os Estados Unidos, no lugar de um único voo com o A380. O estudo mostrava que os custos eram similares, com a vantagem de oferecer mais flexibilidade na malha e mais opções de horários para os passageiros.
No final da década de 1990, o rápido crescimento do transporte aéreo mostrava que haveria no curto prazo a saturação da capacidade dos principais aeroportos do mundo. Grandes hubs, ou seja, aeroportos que centralizam voos, poderiam movimentar milhões de passageiros com a mesma capacidade operacional desde que os voos intercontinentais fossem realizados com aeronaves de grande capacidade. A aposta da Airbus era que o A380, em especial a versão A380-900 com quase mil assentos, fosse a solução lógica para o problema. Com a abertura de novos destinos ao redor do mundo, desafogando a capacidade de aeroportos centrais, o conceito se mostrou pouco promissor por limitar a oferta de horários.
O surgimento do 777-300ER, assim como dos avançados 787 Dreamliner e A350 XWB, comprovaram a viabilidade de voos ponto a ponto, evitando aeroportos congestionados e oferecendo maior opção de destinos. Foi o fim para os quadrimotores, especialmente do A380-900, que sequer chegou a ser produzido.
A Air France foi a primeira empresa aérea no mundo a confirmar a aposentadoria imediata dos A380, o que ocorreu apenas dez anos após sua estreia. Ironicamente a família 787 e os A350-900 também podem ser os carrascos dos 777-9 e A350-1000, que concorrem com seus irmãos maiores justamente em um momento de incerteza do mundo pós-pandemia