Projetado para substituir os C-130 Hercules, o C-390 da Embraer será fundamental na campanha de vacinação
Por Edmundo Ubiratan Publicado em 04/01/2021, às 12h00 - Atualizado às 13h00
FAB recebeu em dezembro de 2020 a quarta unidade do KC-390
No final de 2020 a Força Aérea Brasileira recebeu da Embraer o seu quarto KC-390, ampliando a frota em um momento em que a logística aérea se torna fundamental na segunda fase do combate à pandemia. Uma provável campanha de vacinação nacional deverá contar com ampla participação dos KC-390 na distribuição do medicamento em todo o território nacional.
Ao longo de um ano de atuação na FAB, os KC-390 Millennium participaram de diversas missões históricas. A mais simbólica tem sido sua ativa atuação na Operação Covid-19, que tem apoiado o transporte de materiais e equipes médicas para o combate ao novo coronavírus.
Outro momento marcante foi a primeira missão internacional do KC-390, que em agosto de 2020 voou para o Líbano, cumprindo a assistência humanitária de suporte aos danos causados pela grave explosão no porto de Beirute. Na ocasião o avião transportou cerca de seis toneladas de medicamentos, alimentos e equipamentos de saúde para o atendimento emergencial às famílias afetadas.
Após 11 anos de desenvolvimento, a Embraer recebeu em outubro de 2018 o certificado de tipo para o avião de transporte multimissão C-390. A etapa foi fundamental para o modelo receber a certificação militar, quando a aeronave atinge sua Capacidade Operacional Final (FOC). O modelo lançado em 2007 ainda como C-390, era na ocasião um derivado da família E-Jet, mas sofreu uma completa reformulação ao longo de seu desenvolvimento. Inclusive sua designação comercial voltou a ser C-390, mas recebendo o nome de Millennium.
Após centenas de horas de estudos com a Força Aérea Brasileira, a Embraer criou uma especificação final para o avião, rebatizado KC-390, que passou a ser apresentado como o substituto ideal para os veteranos C-130 Hercules.
Até o lançamento do C-390, havia poucas opções no mercado, sendo a mais viável, e cara, o C-130J, a versão mais recente do Hercules, lançada em meados dos anos 1990. “Planejamos a aeronave nos moldes solicitados pela FAB. O KC-390 é uma aeronave moderna, de grande capacidade, com custo de ciclo de vida muito mais baixo”, diz Paulo Gastão da Silva, diretor do programa KC-390 pela Embraer.O avião foi criado baseado nas exigências da força aérea, que buscava um modelo capaz de superar em diversos requisitos as missões hoje realizadas pelo Hercules. Para a FAB, a substituição dos C-130H era iminente, pela idade avançada dos modelos em serviço e pela necessidade de ampliar a frota de aeronaves cargueiras táticas.
Durante o roll-out, a missão de conquistar o mercado do Hercules ficou evidente nas palavras do então ministro da Defesa, Celso Amorim, que ressaltou as qualidades do projeto brasileiro em relação ao rival norte-americano. “Tudo aquilo que fazemos com aqueles velhos Hercules que estão se aposentando no mundo inteiro poderemos fazer com o KC-390″, disse.
Excluindo um certo desdém em relação ao veterano turbo-hélice nas falas do ministro, um dos desafios do projeto era justamente oferecer um avião de nova geração com capacidade igual, se não superior, aos Hercules.
Embora seja uma aeronave desenvolvida com foco no mercado militar, as regras atuais exigem a certificação do modelo por uma entidade aeronáutica, o mesmo valendo para aeronaves de combate puras. Assim, a Embraer trabalhou todo o projeto dentro das complexas regras de certificação civil, baseado nas normas Part 25, da FAA, a autoridade aeronáutica norte-americana. Durante o processo de certificação, que inclui inúmeras análises e testes, a Embraer demonstrou que a plataforma básica do modelo EMB390KC, atendia aos níveis previstos no Regulamento Brasileiro de Aviação Civil (RBAC) 25, que corresponde aos padrões utilizados pelos aviões de maior porte utilizados na aviação comercial.
Ao longo da companha de ensaios, o modelo apresentou uma série de aperfeiçoamentos e sofreu alguns incidentes graves, como a quase queda durante uma manobra de rotina. Tempos depois, o primeiro protótipo saiu da pista, sofrendo graves danos estruturais. Analistas afirmam que tais problemas eram esperados, especialmente pela complexidade do programa. “A Embraer jamais tinha criado algo tão complexo, tanto do ponto de vista técnico como de programa de desenvolvimento”, ressalta Olavo Gomes, especialista em defesa. “Foram problemas graves, descobertos justamente na fase de ensaios em voo. Algo comum nesse segmento”.
O objetivo é garantir o cumprimento de rígidas normas de segurança existentes no setor aeronáutico como um todo. Além disso, mesmo não confirmado oficialmente, a Embraer poderá desenvolver uma versão civil do modelo, voltado para o transporte de carga aérea. Com capacidade próxima de modelos como o Boeing 727F e 737-400F, uma das virtudes de um eventual C-390 é sua rampa de cargas, que dispensaria os complexos e caros equipamentos de suporte em solo.
O programa de certificação do C-390 durou sete anos, com a verificação de mais 2.500 requisitos, e envolveu a participação de cerca de 200 profissionais credenciados pela Anac, além de engenheiros e técnicos da agência. “A certificação do KC-390, a maior e mais complexa aeronave desenvolvida ao longo da história da Embraer, expressa o alto nível tecnológico atingido pela empresa”, avalia Paulo Cesar de Souza e Silva, presidente e CEO da Embraer.
Na sequência ao recebimento do certificado, os oficiais-generais da FAB realizaram o primeiro voo na nova aeronave, decolando de Brasília. Embora tenha sido desenvolvido pela Embraer, a FAB é responsável por todo o investimento aportado no C-390, sendo, portanto, a proprietária do projeto, assim como no caso recente do Super Tucano. O C-390 se tornará a espinha dorsal da aviação de transporte tático da fora aérea. Ao todo, 28 unidades foram encomendadas e a entrega está prevista para 2019. “Ano que vem eles estarão operando a todo vapor na Ala 2, em Anápolis”, destaca Gastão da Silva.
O C-390 ainda está em fase de maturação, mas deverá ser capaz de realizar diversas missões, como transporte e lançamento de cargas e tropas, reabastecimento em voo, busca e salvamento e combate a incêndios florestais. Ainda existe a expectativa de o governo brasileiro no futuro adotar o C-390 na Marinha e no Exército. Ainda que no momento seja pouco provável ambas forças ganharem novas asas, o estudo existe e pretende dar maior capacidade logística às forças armadas. O tema ainda é sensível e envolve a consolidação de uma doutrina unificada dentro do Ministério da Defesa.
* Artigo adaptado do original publicado na edição 294 de AERO Magazine