Helibras entrega para a Marinha do Brasil primeiro EC725 a cumprir todas as etapas de produção na sede da empresa, em Minas Gerais
A Helibras entregou oficialmente a primeira unidade do helicóptero EC725 totalmente produzido no Brasil. O exemplar é o 12º do contrato de 50 firmado pelo governo federal e será destinada à Marinha. Trata-se do primeiro modelo a cumprir todas as etapas de produção na sede da empresa, em Itajubá, interior de Minas Gerais, o que inclui as fases de montagem, pacote de missão, pista e entrega. O processo representa a quarta etapa de transferência de tecnologia e nacionalização de conteúdo, realizado no Brasil.
O programa EC725 remonta ao período de estudos da Força Aérea Brasileira para uma aeronave de asas rotativas média-pesada, dentro do programa H-XBR. O projeto buscava um helicóptero multiemprego, capaz de operar em diversas regiões do país, oferecendo suporte a uma vasta gama de missões.
O fato chamou a atenção da Helibras, subsidiária da Airbus Group, na época EADS, que tomou a iniciativa de apresentar a proposta para o Ministério da Defesa, oferecendo ao país uma solução combinada que pudesse atender às necessidades das três forças. Até porque, na mesma época, a Marinha do Brasil e o Exército Brasileiro tinham estudos para aquisição de novas aeronaves, com parâmetros próximos aos requisitos básicos da FAB.
O contrato para o fornecimento de 50 unidades do EC725 foi firmado em dezembro de 2008, no valor de € 1,9 bilhão, contemplando pela primeira vez uma aquisição conjunta das três Forças Armadas. O acordo incluía, ainda, a exigência de nacionalização de parte do programa.
Contratualmente, a Helibras se comprometeu a produzir, no Brasil, 50% do conteúdo agregado, incorporando, assim, os conceitos estabelecidos pela END (Estratégia Nacional de Defesa), que, além de capacitar os órgãos e empresas de defesa brasileiros, exige o domínio das tecnologias envolvidas e oferece incentivos para o desenvolvimento da indústria nacional.
O projeto EC725 representou a padronização dos meios entre as três forças armadas
Para o país, o projeto EC725 representou a padronização dos meios entre as três forças, algo há tempos desejado pelo Ministério da Defesa, mas que contava com objeção de alguns militares, que contestam o uso de um mesmo modelo para diferentes missões, do transporte tropas na Amazônia pelo Exército ao lançamento de míssil antinavio pela Marinha até a condução do presidente em missão VIP, na FAB.
Historicamente, cada uma das forças segue filosofias próprias, com pouco ou nenhuma integração entre elas. A quebra de paradigmas foi o primeiro destaque do projeto, que, apesar das críticas, pela primeira vez, permitiu à Defesa padronizar os meios e buscar uma solução integrada. O segundo ponto fundamental foi permitir ao Brasil, também pela primeira vez, especificar, projetar e construir uma plataforma militar destinada às três forças. Embora o EC725 seja um projeto criado pela Eurocopter (hoje Airbus Helicopter), a versão destinada ao Brasil foi completamente desenvolvida para atender aos requisitos operacionais locais.
“O que o Brasil tem de pensar é que um meio militar é uma ferramenta de guerra e também um elo estratégico para o país”, pondera Olavo Gomes, consultor aeronáutico. “Evidente que cada força terá de ceder, mas em todas as forças modernas se busca uma integração dos meios. É assim na França com o Rafale, que opera na marinha e na força aérea. E está sendo assim nos Estados Unidos com o F-35, que voará pela força aérea, marinha e fuzileiros navais”.
Na prática, não eram apenas três versões do EC725, mas, sim, seis, o que levou a Helibras a ter seis produtos na mesma linha de desenvolvimento e produção. “Esse é um dos desafios mais interessantes do projeto. Temos desde a versão de emprego naval até a destinada ao transporte do presidente”, pontua Eduardo Marson Ferreira, presidente da Helibras. O projeto tinha como objetivo também alavancar a indústria nacional, em diversos processos da cadeia de produção, que inclui desde soluções simples até a integração de sistemas de missão dedicados.
“Este é um programa que atende aos interesses do governo de adquirir helicópteros personalizados com domínio da tecnologia e incentivo à indústria nacional”, resume Eduardo Marson. “Já o consórcio Helibras/Airbus se capacita para produzir aeronaves mais complexas por meio da demanda gerada pelo atual contrato, além de incentivar a indústria aeronáutica local, que vai se desenvolver beneficiando uma importante cadeia de fornecedores”.
Para atender ao contrato, a Helibras investiu R$ 420 milhões na construção de uma nova linha de produção em sua unidade de Itajubá, dedicada ao EC725 e também à versão civil da mesma aeronave, o EC225, utilizada no transporte entre o continente e as plataformas de exploração de petróleo em alto-mar.
No que diz respeito à cadeia de fornecedores, a Helibras já contratou 14 empresas brasileiras para produzir diversas partes do projeto, que inclui estruturas, peças e serviços. Tudo com o acompanhamento de representantes das três Forças Armadas, garantindo a efetiva transferência de tecnologia exigida pelo governo brasileiro para esse programa.
Um fato curioso é que esse é o primeiro projeto da COPAC (Comissão Coordenadora do Programa de Aeronaves de Combate), subordinada à FAB, que tem conduzido um projeto para a Marinha e o Exército, tendo em seus meios oficiais das duas forças. Já a campanha de certificação tem sido conduzida em conjunto com o DCTA (Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial) em seu IFI (Instituto de Fomento e Coordenação Industrial).
Marinha 06 é o primeiro nacionalizado
Outra inovação é a integração de diversos sistemas-chave no Brasil. Embora itens de caixa-preta (como são popularmente chamados os sistemas críticos de uma aeronave) raramente sejam produzidos fora do país de origem, o Brasil tem importante participação no programa EC725. O projeto de integração do sistema de contramedidas Chaff & Flare foi desenvolvido pelo Centro de Engenharia da Helibras, sob a direção do engenheiro Walter Filho. Esse sistema de autoproteção de aplicação militar é utilizado para detectar e identificar ameaças contra a aeronave e são capazes de enganar mísseis guiados por calor ou radar. Os ensaios executados também são inéditos no país.
Foram realizados seis voos no helicóptero protótipo BRA05 para execução de uma ampla variedade de testes dos sistemas integrados, que comprovaram a separação segura dos cartuchos de pirotécnicos em todo o envelope de operação do helicóptero. Os voos do EC725 foram comandados por uma tripulação brasileira da Helibras, composta pelo piloto de provas Patrik Correa e pelo engenheiro de ensaios em voo Dreyfus Silva.
Os voos de ensaio ocorreram na área de ensaios SBR 309 (Área Restinga) da Base Aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, no início do mês de agosto de 2013, graças à coordenação do GAC-HB/COPAC, por meio de sua Gerência Técnica, com a colaboração da FAB, que cedeu as instalações da base aérea para a campanha, e da Marinha do Brasil, que forneceu um helicóptero Super Puma AS332 L1 como aeronave paquera na função de acompanhamento e verificação da segurança dos testes.
A participação do Brasil no projeto ganhou tamanho destaque que a Airbus Helicopters concedeu autorização para a Helibras assinar os “certificados de conformidade” para a montagem das caixas de transmissão principal (CTP) do EC725/225, o que significa que as equipes formadas por técnicos brasileiros assumem a responsabilidade total deste processo, antes realizado apenas nas instalações do grupo em Marignane, na França.
Isso libera os técnicos brasileiros a realizarem montagens, análises, controles, validação e liberação das caixas para que sejam acopladas aos helicópteros da Linha de Montagem do EC725 e, futuramente, do EC225. A Helibras também é a única empresa, fora da França, a ser autorizada a realizar o recall da frota de EC225 atualmente em serviço no mundo. “Esse fato eleva a importância da Helibras, pois ser reconhecida e autorizada a realizar uma intervenção de grande complexidade significa dominar uma tecnologia sensível e estratégica em toda a indústria aeronáutica”, avalia Richard Marelli, vice-presidente Industrial da Helibras.
Os técnicos brasileiros já tinham conquistado, em junho de 2013, a qualificação técnica para a montagem das caixas de transmissão no país, após supervisão direta da então Eurocopter, que, desde o ano passado, vinha acompanhando a equipe na montagem dessas unidades.
O reconhecimento de cooperação industrial também teve um aspecto importante para a Helibras, que recebeu mais de € 66 milhões por conta dos vários processos cumpridos durante o programa. Foram reconhecidas atividades como as de conclusão do primeiro kit de cablagens elétricas para o cone de cauda, desenvolvimento de sistemas de missão do EC725 produzidos na planta de Itajubá, intercâmbio de funcionários, planejamento de recursos empresariais e treinamentos na matriz Airbus Helicopters para capacitação do Centro de Engenharia da empresa na modernização de aeronaves militares.
O novo Termo de Reconhecimento de Créditos de Cooperação Industrial foi emitido pelo Ministério da Defesa por meio da COPAC, depois de auditoria conduzida pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. O valor do reconhecimento significa que a Helibras trouxe para o país a quantia de mais de € 66 milhões em termos de investimento, transferência de tecnologia, know-how e geração de empregos.
O programa EC725 tem auxiliado a alavancar a indústria aeronáutica brasileira. Desde sua implantação, mais de 600 profissionais foram contratados pela Helibras e o cronograma de atividades estabelecidos em contrato encontra-se rigorosamente dentro do prazo e do orçamento previsto, o que pode auxiliar o país a realizar um antigo sonho, de desenvolver e produzir um helicóptero brasileiro, a partir de 2020.
Alguns analistas acreditam que o aprendizado do programa EC725 será fundamental para os acordos a serem firmados entre o Brasil e a Suécia, no projeto F-X2. Parte dos processos de certificação de novos fornecedores poderá ser simplificado e melhorado, baseado na experiência atual. “O Brasil está no estágio de desenvolver ferramentas estratégicas, que permitam ao país se consolidar como um importante player global. A fase de meros operadores de recursos de prateleira é coisa do passado”, acredita o consultor Olavo Gomes.
Por Edmundo Ubiratan, de Itajubá
Publicado em 14/07/2014, às 00h00
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