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Austeridade operacional

Companhias aéreas e controle de tráfego trabalham juntos para a redução no consumo de combustível, que tem pesado bastante no orçamento dos operadores, mas há limites de segurança a serem respeitados nesse processo


O vilão das companhias aéreas em 2012, mais uma vez, foi o alto valor cobrado pelo combustível de aviação, aponta um relatório divulgado recentemente pela Iata (Associação Internacional do Transporte Aéreo). A entidade calcula que a conta chega a US$ 207 bilhões, o que representa um aumento de US$ 31 bilhões sobre 2011 e cinco vezes mais do que as companhias aéreas pagaram em 2003. Naquele ano, o custo do barril representava 14% do faturamento, ao passo que, em 2012, o combustível pesou mais de 33% no balanço financeiro das companhias. Como resultado, muitas empresas aéreas terminaram o ano no vermelho e adotaram programas internos para redução no consumo de combustível.

A companhia chinesa Cathay Pacific, por exemplo, estuda a possibilidade de retirar os monitores de vídeo nas fileiras de poltronas da primeira classe e classe executiva. Com a redução no peso, a economia no consumo seria bastante significativa. Os estudos mostram que a maioria dos passageiros, pelo menos nos países desenvolvidos, já tem ou pretende adquirir um tablet. E, nesse caso, o melhor que a companhia pode oferecer é um serviço de internet a bordo com alta velocidade e link de acesso para uma página contendo a programação de filmes, jornais e jogos, que normalmente são exibidos nos monitores individuais das poltronas. Do mesmo modo, outras companhias aéreas estão reduzindo peso na aeronave simplificando o serviço de bordo e eliminando parte das seções de galley. Calcula-se que, para cada quilo de peso retirado numa aeronave, a economia gerada seja da ordem de US$ 12 mil ao ano.

Operacionalmente, muitas companhias aéreas têm estabelecido recomendações ao grupo de voo para que, com o mínimo de procedimentos dentro do cockpit, consiga gerar economia de milhares de dólares. Desde que o comprimento de pista não seja um fator limitante, pousar com flape inferior à posição máxima ou utilizar os reversos em marcha lenta trazem um ganho significativo na economia de combustível, por exemplo. No segundo caso, evita-se, ainda, o maior desgaste dos componentes do motor, aumentando o tempo para a troca, com redução nos custos com trabalhos de manutenção. Outro tipo de operação que está se tornando habitual é a de táxi com um motor apenas em funcionamento, para as aeronaves bimotoras. Não prejudica a segurança e também se proporciona um ganho nos contratos de manutenção. Até então, esse tipo de procedimento era bastante utilizado entre os operadores de turboélices, mas, dado o alarmante aumento de custos operacionais atribuídos ao consumo de combustível, as empresas não viram alaternativa melhor senão adotar o mesmo mecanismo para os aviões a jato. Para uma frota considerável, com mais de 100 aeronaves, a economia com o táxi monomotor pode chegar à casa dos US$ 2 milhões anuais. As contas também são parecidas se a companhia adotar uma altitude mais baixa para a redução de potência e recolhimento de flapes após a decolagem.

TRIPULANTES PRESSIONADOS
Dentre as diversas maneiras por meio das quais uma companhia aérea pode reduzir seus gastos com o consumo de combustível, o único que deve ser evitado, sob o risco de comprometer a segurança de voo, é o da pressão psicológica sobre o grupo de voo, avaliando o piloto, por exemplo, pelo seu desempenho ao demandar gastos no abastecimento. O perigo é que esse tipo de política não só leva o tripulante a voar com maior carga de estresse como, também, pode induzir os pilotos a abastecer a aeronave inadequadamente para uma rota na qual uma arremetida ou o voo alternado tendem a ser mais frequentes. Importante lembrar que os aeroportos no mundo inteiro são sucetíveis a fatores ligados à meteorologia, como acontece no Brasil durante o verão, com a chegada das trovoadas, ou no inverno, com a interrupção das operações por teto baixo em decorrência da formação de nevoeiro. Além disso, basta o estouro do pneu de uma pequena aeronave para que o aeroporto suspenda as operações, seja pela falta de outras pistas, ou pela restrição do número de carros do corpo de bombeiros, já que parte do serviço contra incêndio, ou todo seu efetivo, estará atendendo à ocorrência.

A premiação para os pilotos que estiverem consumindo menos combustível em seus voos também pode se transformar em um fator de risco. Lembro-me do caso de uma companhia aérea norte- americana, que lançou esse tipo de campanha e suspendeu a ação pouco tempo depois, porque não foram poucos seus tripulantes que optavam por abastecer a aeronave com volume de combustível abaixo do que estava preestabelecido como mínimo para etapa na navegação preparada pelo despachante operacional de voo (DOV). Resultado: solicitações frequentes de prioridade para aproximação por voos com alerta de combustível muito baixo.

Em junho de 2010, a American Airlines foi parar nos jornais norte- americanos porque teria sugerido a seu grupo de voo que evitasse abastecer além do que estava previsto pela navegação. "A estratégia de economia está sendo colocada em discussão pelos comandantes que sentem sua autoridade de decisão ameaçada e os especialistas discutem o impacto na segurança dos passageiros", publicou o jornal Chicago Tribune. A American, na época, desmentiu e disse que os aviões continuavam pousando com combustível para voar em média mais 93 minutos e que sempre um adicional seria acrescentado em caso de previsão de mau tempo ou se o avião estivesse voando para áreas congestionadas.

O jornal conseguiu uma carta que teria sido direcionada ao grupo de voo pelo chefe de operações, o comandante Bart Roberts, orientando os pilotos a redigirem uma justificativa para o caso de acréscimo de combustível acima do previsto na navegação. Para o porta-voz da companhia, não havia nisso qualquer sinal de que a autoridade do comandante estivesse sendo colocada à prova. Porém, a associação de pilotos da companhia, a Allied Pilots Association, contestou a recomendação. O Chicago Tribune também ouviu o comandante James Ray, da US Airways, que, na época, era o porta-voz da ALPA (Air Line Pilots Association), a maior nos Estados Unidos. Em tom irônico, ele deu a entender que os pilotos teriam condições de manter o abastecimento previsto pela navegação, mas que a companhia teria de lidar com as reclamações por atraso: "Os passageiros não precisam se preocupar. Só terão o inconveniente do atraso, caso o voo prossiga para uma alternativa sem tempo para demanda de longas esperas".

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PROA DIRETA
Qualquer minuto voado a menos contribui não só para a redução nos gastos com o combustível, mas para a diminuição da emissão do dióxido de carbono (CO2) na atmosfera. Por isso, a Iata vem trabalhando em parceria com os órgãos de controle com o intuito de liberar cada vez mais proas diretas para os voos e, assim, reduzir o consumo de querosene de aviação e a poluição da atmosfera.

A despeito da eficiência dos novos aviões, como é o caso do Airbus A380 e do Boeing 787, que consomem apenas três litros de querosene para cada 100 passageiros transportados por quilômetro, resultado melhor do que o desempenho de um carro compacto, e são 20% mais econômicos do que a geração anterior de jatos clássicos, a participação dos controladores de voo é imprescindível. A Iata calcula que, com a incorporação de novas ferramentas para melhoria no gerenciamento do controle de tráfego aéreo, as emissões do CO2 na atmosfera podem cair até 12% e os custos com o consumo de combustível podem ser reduzidos em mais de US$ 1 bilhão ao ano em todo o mundo. Isso tudo com a simples liberação pelos controladores de proas diretas e o realinhamento de rotas. A liberação do sobrevoo em áreas anteriormente restritas à aviação comercial permite, por exemplo, traçados mais curtos nas rotas transpolares.

A melhoria nos procedimentos de saída e de chegada e a racionalização de alguns procedimentos de abatimento de ruído (NADPs) também podem proporcionar economia para a indústria aeronáutica de até US$ 530 milhões ao ano. Trabalhos neste sentido já estão sendo conduzidos nos aeroportos de Hong Kong e Cidade do México. Outra novidade é a adoção do sistema A-CDM (Airport Collaborative Decision Making) em pelo menos 22 aeroportos europeus, sendo que em seis deles - Munique, Frankfurt, Helsinque, Heathrow (Londres), Bruxelas e Charles de Gaulle (Paris) - o módulo já está totalmente implantado. Trata-se da exploração em toda plenitude dos recursos de gerenciamento do tráfego aéreo, que permite aos aeroportos dar agilidade aos procedimentos de partida, táxi e decolagem, com redução significativa dos atrasos, do consumo e da poluição do ar.

Nos Estados Unidos, apesar do corte no orçamento em 2013 imposto pelo governo, o processso para introdução do sistema NextGen deve cumprir a maior parte do cronograma estabelecido pela FAA (Federal Aviation Administration), a agência nacional de aviação civil norte-americana. A sigla de NextGen é a abreviação para Next Generation Air Transportations System, nome dado ao novo sistema de controle do espaço aéreo, que deverá estar em total funcionamento até 2025. Prevê a substituição das antenas como modo primário de captura radar, fazendo com que as imagens das aeronaves apresentadas nos escopes passem a ser atualizadas para o controlador com muito mais rapidez e confiabilidade, já que o NextGen trabalhará com o cruzamento de informações do sistema de posicionamento global (GPS) embarcado nos aviões. Desse modo é possível reduzir a separação entre as aeronaves, permitir rotas mais diretas, e aproximações mais curtas e sem steps. Calcula-se que o consumo anual nos Estados Unidos cairá em até 1,4 bilhão de galões, com redução nas emissões de CO2 em 14 milhões de toneladas, e economia da ordem de US$ 23 bilhões.

Robert Zwerdeling é comandante de aeronaves Airbus A320

| Robert Zwerdling | Fotos | Divulgação
Publicado em 14/05/2013, às 06h13 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45


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