Centro de gerenciamento de tráfego está distante mais de 140 km do terminal londrino
Por Marcel Cardoso e Edmundo Ubiratan Publicado em 30/04/2021, às 15h00 - Atualizado às 15h03
Controladores de voo usam câmeras de alta resolução e rede de alta velocidade para acessar imagens do aeroporto
Após a crise sanitária se tornou comum o uso de serviços remotos, em especial reuniões de equipe. O que poucos sabem é que na aviação há vários anos existe em operação torre de controle remota, com os controladores trabalhando dezenas e até centenas de quilômetros do aeroporto.
O aeroporto London City (LCY), localizado na região central da capital inglesa, não contará mais com o apoio presencial de controladores de voo. No início do ano foi entregue o centro remoto de controle de tráfego aéreo, localizado na cidade de Swanwick, distante 144 km de Londres.
Com a inauguração dos serviços o aeroporto de London City se torna o primeiro a operar voos internacionais e não ter uma torre de controle física operacional. A mudança do sistema tem como intuito de melhorar a eficiência e permitir uma suave expansão futura. Antes da pandemia, o aeroporto de London City recebia cerca de cinco milhões de passageiros por ano, sendo a maioria para viagens de negócios.
O novo sistema conta com dezesseis de câmeras de alta resolução, que transmitem dados em tempo real para uma tela panorâmica da torre remota. Além dos dados de radar, os controladores terão acesso panorâmico à pista, por 14 monitores unificados, às câmeras com múltiplas lentes instaladas em um ponto consideravelmente mais alto do que as torres de controle convencionais.
Uma rede de espinhos de metal foi instalada na estrutura para evitar que pássaros pousem no sistema. Além disso, cada câmera é autolimpante, para impedir que insetos e detritos causem qualquer desfoque às lentes. Em caso de perda do sinal de uma das câmeras outra pode assumir a função sem interromper as operações. Todos os dados serão enviados por uma rede de fibra óptica de alta velocidade.
O sistema de torre de controle remota já está em uso há vários anos na Suécia e Noruega, permitindo um único centro de controle ter acesso a diversos aeroportos. A vantagem é redução de custos, aliado a capacidade de gerenciar com maior precisão tráfegos aéreos em aeroportos que antes não necessariamente teriam uma torre de controle, algo comum em terminais com baixa demanda.
Mesmo distantes do aeroporto os controladores têm visão de 360 graus e podem dar zoom em todo espaço
As chamadas RVT (Remote and Virtual Tower) prestam literalmente um serviço de torre realizado de forma remota. Atualmente, as RVT instaladas no mundo já proporcionam serviços de controle do aeroporto e de solo e emergências. Especialistas acreditam que a gama completa de serviços de tráfego aéreo definido no Documento 4444 da ICAO (International Civil Aviation Organization) poderão futuramente estar totalmente integrados a serviços remotos.
O projeto básico foi apresentado em 2002 pela alemã DLR (Deutsches Zentrum für Luft- und Raumfahrt) descrevendo uma sala de controle de tráfego aéreo virtual com imagens geradas por sensores e exibidas em telas de alta definição, ao contrário do modelo tradicional de um edifício instalado no aeroporto onde os controladores observam o movimento através de amplas janelas. Entre as virtudes do sistema virtual está a possibilidade de gerar imagens de alta definição, que podem detalhar (e ampliar) áreas específicas do aeroporto, permitindo ao controlador visualizar com precisão os movimentos. Tal recurso é especialmente útil no controle de solo, uma vez que dá ao controlador condições de acompanhar os detalhes da operação que considerar importantes.
As RVT possuem sistemas idênticos aos existentes em uma torre convencional, ou seja, comunicação de voz, meteorologia, plano de voo e vigilância. O tipo do serviço a ser prestado determina a configuração dos dispositivos instalados. Dependendo da complexidade do aeroporto, considerando a densidades de tráfego e as condições meteorológicas predominantes, pode-se instalar também sistemas A-SMGCS, com radar movimento de superfície (SMR) e LAM (Local Area Multilateration).
Nas bases já existentes uma rede de dados transfere as imagens de alta definição e os sistemas aeroportuários mais relevantes para a posição de trabalho do controlador. Um conjunto de ferramentas permite ao sistema comprimir o vídeo e transferir as imagens em alta definição com reduzido uso tanto de banda de tráfego de dados quanto de energia.
Um dos maiores incentivadores do conceito RVT é a Sesar (Single European Sky ATM Research), uma parceria público-privada europeia que busca o desenvolvimento de um sistema ATM de alto desempenho capaz de melhorar, até 2020, a eficiência dos controles atuais. Estão entre os objetivos uma redução entre oito e 14 minutos do tempo de voo em zonas de terminal, uma economia de 300 kg a 500 kg de combustível e uma diminuição da emissão de até 1.575 kg de CO2.
A NATCA (National Air Traffic Controllers Association) ainda se mostra cética quanto ao modelo remoto e levanta algumas dúvidas em relação ao sistema. Uma das maiores preocupações da entidade diz respeito à capacidade do controlador de notar e observar pequenas aeronaves. Numa torre convencional, além da própria visão humana, o “veterano” binóculo auxilia e torna mais precisa a observação do movimento das aeronaves. No modelo remoto, as câmeras com zoom permitem ampliar dezenas de vezes a imagem de uma área, mas demandam segundos importantes entre o acionamento e a efetiva exibição da cena ampliada na tela. Ademais, sua operação requer alguma perícia, já que será necessário apontar e manter o objeto no centro da tela.
Outra preocupação apontada pelos controladores se refere à capacidade de interpretar com eficiência e segurança as referências exibidas no monitor. Uma aeronave vista na tela será apenas um alvo com sua posição exibida numa determinada área, enquanto numa torre o controlador tem a percepção da posição real do “tráfego” em relação ao aeroporto.