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Acesso ao paraíso

As peculiaridades do aeroporto de Fernando de Noronha, que deixou de ser uma base de apoio no atlântico para se tornar o destino de milhares de turistas ávidos pelas belezas naturais do arquipélago


Hernani Dippólito

A beleza do conjunto de ilhas que formam Fernando de Noronha, em Pernambuco, torna-se ainda mais impressionante aos olhos de quem pousa e decola do pequeno aeroporto do arquipélago, criado no período entre guerras. Por sua localização estratégica – na rota entre a Europa e a América do Sul, e entre o Nordeste do continente e o Norte da África – Noronha já figurava nos relatos dos antigos navegadores. Chegou a servir de esconderijo para os holandeses no século 17, caiu no domínio francês e foi base aérea militar norte-americana durante a Segunda Guerra Mundial.

Antes mesmo da construção da primeira pista de pouso, a ilha principal já servia como pitstop de aventureiros sob asas. Em 1936, ela se tornou oficialmente a base de apoio no Atlântico da companhia francesa Latecoére/Compagnie Generale Aeropostalee – e a primeira pista recebeu pavimentação. A segunda viria no início da década de 1940, quando a Força Aérea Americana elegeu Fernando de Noronha como base militar durante a Segunda Guerra Mundial (leia box Desbravadores). Em uso até hoje, e recém-restaurada, o comprimento da pista não chega a 1.840 metros, no centro geométrico da ilha. Segundo os pilotos, “é preciso um esforço extra para encontrá-la”.

Hoje, o Aeroporto de Fernando de Noronha é a principal porta de entrada para o turismo no arquipélago. Recebe cerca de 450 visitantes por dia, das 6h às 20h. A estrutura de apenas 680 metros quadrados de área construída permaneceu praticamente a mesma ao longo dos anos. A diferença é que a estação de passageiros, de 200 metros quadrados, agora tem climatização em favor do bem-estar dos turistas, frente ao calor da região.

Luiz Gonzaga
Gol opera 737 em Noronha

O conjunto de ilhas, que fica a 550 quilômetros da costa pernambucana e possui 3.500 habitantes, passou a atrair grande fluxo de turistas nas últimas décadas e se evidenciou na economia do Nordeste.

A Administração do Distrito Estadual de Fernando de Noronha, que controla o terminal aeroportuário, registrou um total de 65.309 visitantes em 2010. Em 2011, porém, o número foi menor: 52.736. A queda demonstra o cumprimento mais rigoroso do controle ecológico na ilha, que restringe a presença de turistas ao número de 450 por dia.

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No terminal de desembarque, as pessoas devem preencher um formulário por meio do qual se comprometem a obedecer às regras de preservação ambiental – exibidas aos turistas em um filme gravado em DVD. É obrigatório o pagamento da Taxa de Preservação Ambiental (TPA), de valor proporcional ao período de estadia. Para permanecer apenas um dia, o valor é de 20 UFIR, ou R$ 40,40. Por três dias, 60 UFIR. E assim por diante.

Apesar de pequeno para o grande fluxo diário de passageiros e de carga, o aeroporto tem condições de atender adequadamente mais de 90% da demanda de brasileiros e estrangeiros que passam por ali. O terminal dispõe de sistema totalmente informatizado e estacionamento com vagas para mais de 50 veículos. Possui, ainda, serviços de correios e de aluguel de automóveis, ônibus, telefone público, internet, lanchonete, lojas de produtos regionais, posto policial, sanitários, acesso a deficientes físicos e balcões de check-in.

TRÁFEGO REGULAR
Duas companhias aéreas operam regularmente, com aeronaves de grande e médio porte: a Trip e a Gol. A Trip atende com exclusividade trechos regionais até Noronha. Dispõe de um moderno jato Embraer 175, de 86 lugares, e o turbo-hélice ATR-72, com 67 assentos.

O ATR-72 voa Salvador (BA), Aracaju (SE), Maceió (AL), Recife (PE), Natal (RN) e Fernando de Noronha. O Embraer 175 parte do Rio de Janeiro (Aeroporto Santos Dumont) com escalas em Belo Horizonte (Aeroporto de Confins), Salvador (BA), Aracaju (SE), Recife (PE) e Fernando de Noronha. O trajeto de retorno é o mesmo. Vale registrar que o fuso horário na ilha é uma hora à frente em relação à Brasília.

A Gol, por sua vez, opera o Boeing 737-700, com capacidade para 130 passageiros. Parte de São Paulo (Guarulhos) rumo a Fernando de Noronha, com escala na capital pernambucana – e volta pelo mesmo caminho. Como os voos sobrevoam o mar, as aeronaves carregam todo o equipamento emergencial de praxe, o que inclui colete salva-vidas, assentos flutuantes e sinais luminosos.

Até alguns anos atrás, o trecho Recife-Fernando de Noronha era exclusividade dos bimotores turbo-hélices ATR-42, de 45 lugares, que levavam uma hora e meia para percorrer a rota. Haviam sido incorporados pela Total Linhas aéreas e entraram em cena em 1997 – dois anos depois, ganhariam as cores da Trip. Em junho de 2006, o ATR-72, de 67 lugares, substituiu-os, cobrindo a mesma distância em uma hora e vinte minutos de voo.

Com a chegada do EMB-175, em 2010, o tempo caiu para apenas 50 minutos. A aeronave esquentou o mercado turístico na ilha. “A entrada do EMB-175 no circuito de voos, partindo do Rio de Janeiro, e da Gol, de São Paulo, foi um presente dos céus”, afirma um representante da rede hoteleira local.

Em tempo: em maio de 1996, a TAF-Linhas Aéreas Regionais, empresa com base em Fortaleza, também passou a operar em Noronha, com o Bandeirante, de 18 lugares, mas não obteve bons resultados e acabou por encerrar o serviço.

A pista de Noronha está a 300 metros de altura, corta longitudinalmente a ilha e tem cabeceira livre

CONTROLE NORONHA
As aeronaves que se dirigem ao arquipélago devem apresentar um documento à Administração do Distrito, que autoriza o pouso. O trâmite inclui o envio de um ofício à direção do Meio Ambiente e Turismo, com informações sobre o tipo da aeronave, número de passageiros, período e local que permanecerão na ilha.

Fernando de Noronha opera VOR/ VHF/NDB e DME, que fornecem ao piloto as coordenadas para voar entre o continente e a ilha. O controle de Noronha faz também o acompanhamento por rádio dos aviões que cruzam o Atlântico e passam por ali. As mensagens captadas seguem para o Centro Operacional Integrado do Cindacta, no Recife.

A pista está a 300 metros de altura, corta longitudinalmente a ilha e tem cabeceira livre. Os inúmeros morros de Noronha podem representar obstáculos próximos, especialmente no caso de pousos em condições meteorológicas desfavoráveis. Com o apoio do Departamento de Proteção ao Voo (DPV), o piloto mantém contato via rádio por 30 minutos antes de chegar à ilha ou depois de deixá-la.

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DESBRAVADORES
Dos hidroaviões aos grandes jatos, as aeronaves que fizeram a história da ilha

Na página oposta, o hidroavião do português Gago Coutinho, na década de 1920; ao lado, o Globe Master C-124, da USAF, que voou de 1957 a 1965 na ilha; abaixo, a partir da primeira de cima, visitante Avro 685 York, Avro da FAB e Boeing 737-500 da Rio-Sul, nos anos 1940

Descoberto em 1500 por Américo Vespúcio, o arquipélago foi doado em forma de capitania hereditária a Fernando de Noronha, ou Fernão de Loronha, nobre português. O início da história da aviação no local foi marcado pelo ano de 1922, com os também portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral. Na tentativa de completar a primeira travessia do Atlântico, perderam o hidroavião Luzitânia ao amerissar nas proximidades dos rochedos de São Pedro e São Paulo. Os destemidos pilotos chegaram à ilha de Fernando de Noronha a bordo de um navio de guerra português que regressaria a Portugal e voltaria ao Brasil com outro hidroavião, semelhante ao acidentado.

Em 1927, os italianos Francisco de Pinedo, Zacchetti e Carlos del Prete também tentaram atravessar o Atlântico, em um hidroavião de madeira, denominado Santa Maria, sem acompanhamento de navio de apoio. No mesmo ano, o famoso hidroavião Jaú, pilotado pelo brasileiro João Ribeiro de Barros e seus dois tripulantes, João Negrão e Vasco Cinquinhe, marcaram presença na ilha, no primeiro raid aéreo pelo Brasil, partindo de Gênova, na Itália.

Ainda em 1927, a primeira companhia francesa de aviação comercial, Latecoére, se transformou na Compagnie Generale Aeropostale, empresa de correios, e escolheu o arquipélago para sediar uma base de apoio no Atlântico. Construída na ponta da ilha principal, a base possuía o mesmo nome do arquipélago. A intensa movimentação da Compagnie exigiu do Departamento de Aeronáutica Civil, em 1934, a construção da primeira pista de pouso, equipada com balizamento diurno e noturno, além de estação de rádio. A segunda pista de pouso e o terminal de passageiros foram edificados entre 1942 e 1945, durante a Segunda Guerra Mundial, pela Força Aérea do Exército dos Estados Unidos, por meio do programa de Desenvolvimento de Aeroportos (American Airport Development Progam, ADP). Como a Marinha de Guerra norte-americana mantinha uma base instalada ali, seus aviões patrulhavam o oceano em vigilância permanente.

Essa pista foi maior e em sentido contrário à anterior e, no final de 1943, recebeu as primeiras aeronaves. Ainda naquele ano, o Esquadrão VP-94, com base em Natal, destacava quatro Catalinas para operarem o posto.

O exército brasileiro também marcou presença na área. Ocupou Fernando de Noronha em 1941, com a chegada dos americanos – preocupado com o ponto estratégico no corredor Natal-Dacar. No início de 1946, o Comando da II Zona Aérea resolveu criar o Destacamento da Força Aérea Brasileira no arquipélago. Hoje, a Força Aérea opera ali, ocasionalmente, cargueiros C-130 Hércules, que voam com restrições de peso máximo.

Apesar de hoje o arquipélago receber com segurança aeronaves do tipo Boeing 737, na década de 1950 o aeroporto já fazia história. O possante avião americano Globe Master voou largamente para Noronha durante a segunda presença dos Estados Unidos na ilha, de 1957 a 1965, no posto de observação de teleguiados. O robusto quadrimotor podia conduzir com facilidade equipamentos de grande porte. Mas foi a partir da década de 70 que se iniciaram os voos comerciais para o arquipélago, sendo a Transbrasil a primeira a obter liberação para operar com aviões Bac One-Eleven, a partir de 1976. Também a Vasp ousou nesse percurso com Boeings, em voos semanais, aos sábados.

Em 2002, a Nordeste Linhas Aéreas passava a operar na rota com o Boeing 737-500, substituídos pelos turbo-hélices Brasília. O Boeing para 117 pessoas possibilitava que a Nordeste iniciasse a operação de uma nova linha ligando São Paulo a Noronha com escala em Campinas (SP). Depois foi a vez da Rio-Sul, que passava a operar com o Brasília para 30 passageiros. O turbo- -hélice foi substituído pelo Boeing 737-500. Em 2006, a Varig entrou na linha, colocando em serviço o Boeing 737-700, mas não obteve êxito.

O movimento aéreo cresceu ao lado de projetos turísticos pensados para o arquipélago e proporcionalmente à permissão de visita de 450 turistas por dia. Hoje, voos regulares em aviões modernos pousam ali diariamente.

Tércio Solano Lopes
Publicado em 23/01/2012, às 14h05 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45


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