Série de Tv americana enfoca o auge da Pan American, que moldou a aviação comercial
Pan Am, série dominical da Sony Pictures exibida pela rede de TV americana ABC, estreou nos Estados Unidos dia 25 de setembro. Os primeiros episódios se passam em 1963, quando os pilotos da Pan American World Airways eram heróis, suas aeromoças tinham status de top models e viajar de avião ainda era um luxo. A maior e mais prestigiosa companhia aérea do mundo representava o american way tanto quanto Elvis Presley, a Coca-Cola e o Cadillac Eldorado.
A história real da Pan Am começa com a pequena Pan American Airways e seus dois aviões trimotores servindo de correio aéreo em uma rota de 150 km. entre Key West e Havana. Juan Terry Trippe, o fundador, que vislumbrou um futuro promissor para a aviação comercial, fecha 1928 com um total de 1.100 passageiros transportados entre a Flórida e Cuba.
Conhecida como a companhia dos "firsts" por seu pioneirismo, foi a primeira a cruzar o Pacífico em 1935 com um Martin M130 em um percurso de 13.700 km de San Francisco a Manila em 60 horas. Quatro anos depois, é a primeira a cruzar o Atlântico com um Boeing B314 de Nova York para Lisboa (26 horas). Londres e Paris agora pareciam um pulo. [A essa altura, já tinha rotas para o Rio (1930) e São Paulo (1937)]
Passageiros abastados se encantavam com o tamanho, o alcance e o conforto de seus novos clippers (como eram chamados seus aviões - originalmente, significa "veleiro rápido") equipados com salas de jantar e de repouso. Voar nunca havia sido uma experiência tão sofisticada. Mas a Segunda Guerra freou as ambições de executivos e técnicos, ansiosos por clippers transoceânicos pelo menos três vezes maiores que os existentes.
Do período que vai do ataque japonês a Pearl Harbor ao lançamento das bombas sobre Hiroshima e Nagasaki, a Pan Am funcionou como uma espécie de arma secreta do governo americano. Treinou milhares de pilotos e navegadores, construiu 50 bases aéreas em 15 países, a maioria em regiões remotas e hostis, e transportou militares, munições e suprimentos em 18.000 travessias oceânicas.
#Q#Ao final da guerra, com as operações normalizadas, estava em todos os continentes. Em 1947, seu Lockheed Constellation (Clipper America) voa ao redor do mundo pela primeira vez em 13 dias, 17 pousos e 34.860 km em 102 horas e 50 minutos. A evolução dos Douglas (do DC4 ao DC7), voando a 580 km/h, mexia com o mercado, assim como o Boeing 377 Stratocruiser, favorito dos obcecados por conforto e agilidade.
Seriado enfatiza vida dos tripulantes, com pilotos jovens e respeitados e aeromoças lindas em uniforme azul-celeste
Com Londres a apenas 12 horas de Nova York, criou-se uma classe econômica denominada Arco-Íris, que inseriu a viagem aérea pela primeira vez nos planos do cidadão de classe média e semeou o terreno para a era do jato, marco de um novo estilo de voar que os cenógrafos do seriado retratam em detalhe. Aliás, outro "first": em outubro de 1958, seu Boeing 707 vai literalmente a jato de Nova York para Paris em oito horas.
Em 1965, a Pan Am tinha 2.058 voos semanais sobre o Atlântico, em viagens seguras e com tarifas escalonadas. Enquanto a demanda bombava, a empresa investia no desenvolvimento do Boeing 747, 2,5 vezes maior e muito mais eficiente que tudo o que se conhecia até então. O feitiço de querer voar estava definitivamente implantado na mente humana com o primeiro voo de um 747 da empresa em 1969.
O seriado enfatiza mais a vida dos tripulantes, com pilotos jovens e respeitados e aeromoças solteiras lindas em uniforme azul-celeste passando por checagens como se fossem máquinas: peso, cintura, busto, coxas etc. Da antiga sede na Park Avenue, em Nova York, onde hoje é o prédio da Met Life, helicópteros decolam levando executivos até o refinado terminal (Worldport) da companhia no aeroporto JFK.
Ousadia, prestígio e glamour acabariam vitimados pela competição acirrada e pela má gestão. Em 1991, decreta falência, encabeçando o epitáfio que mais tarde exibiria também outras marcas falecidas. Quanto ao seriado, nesse início ele parece uma salada pop retro, mas já restaurou perguntas como "por que megaempresas imperiais sucumbem sem uma explicação satisfatória?".
* Jornalista, escritor e professor universitário. Autor de Perfis, entre outros livros: www.sergiovilasboas.com.br
Sergio Vilas-Boas
Publicado em 08/11/2011, às 08h23 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45
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