A operação de helicópteros com ventos cruzados, ventos de través ou ventos de cauda exigem dos pilotos o conhecimento de todas as condições aerodinâmicas envolvidas
David Branco Filho Publicado em 20/12/2023, às 15h14
Qualquer piloto de helicóptero precisa conhecer diversas condições aerodinâmicas que afetam o desempenho de seu aparelho. Uma delas recai sobre a influencia do vento relativo.
Helicópteros possuem rotores circulares e, por isso, deveriam teoricamente enxergar o vento relativo da mesma maneira, independente de sua direção. Mas o fato é que a aerodinâmica do aparelho não depende apenas do disco do rotor. Sob este disco, está pendurada uma fuselagem com superfícies aerodinâmicas e com um rotor de cauda, provocando uma série de interações que afetam o desempenho e a controlabilidade.
Existem vários registros de acidentes com helicópteros em que o piloto alega ter perdido comando de rotor de cauda. Na verdade, em muitos casos, os eventos se sucedem não por perda de comando, mas por perda de eficiência aerodinâmica do rotor de cauda, por causa do vento.
Um vento cruzado influencia na tendência de guinada e no empuxo produzido pelo rotor de cauda. Dependendo do desenho da fuselagem, existe uma tendência do nariz do helicóptero guinar em direção ao vento assim que o aparelho deixa o solo, o chamado efeito cata-vento, e deve-se usar pedal o suficiente para contrariar esta guinada.
Mas o vento de través também tem efeito sobre o empuxo produzido pelo rotor de cauda. Para helicópteros cujo rotor principal gira no sentido anti-horário quando vistos de cima, um vento de esquerda atua em oposição ao fluxo de ar induzido pelo rotor de cauda (que vai da direita para a esquerda), causando um aumento do ângulo de ataque local nas pás.
Neste caso, para uma dada posição de pedal, o empuxo do rotor de cauda é maior com o vento e o nariz do helicóptero guina à esquerda, na mesma direção do efeito cata-vento. Isto reduz a necessidade de pedal à esquerda para manter o controle direcional.
O vento de esquerda, embora atenue a necessidade de antitorque, pode trazer uma outra preocupação. Como ele interfere com o fluxo acelerado pelo rotor de cauda, pode conduzir à formação de vórtices no seu disco e afetar seriamente o empuxo lateral.
O vento de direita, por outro lado, também pode impor problemas direcionais. Ele soma-se ao fluxo induzido sobre as pás do rotor de cauda, diminuindo o ângulo de ataque local nas pás. Para uma mesma posição de pedal, o empuxo do rotor de cauda é menor e o nariz guina à direita, na direção do torque do rotor principal. Esta guinada soma-se ao efeito de cata-vento e exige muito mais pedal esquerdo para manter o controle direcional.
Com vento forte de direita e operando em altitude e pesos elevados, onde é grande a necessidade de antitorque, o piloto pode ficar sem curso de pedal esquerdo, podendo perder o controle direcional. Alguns helicópteros trazem no seu manual uma limitação de vento de direita em voo pairado.
Por último, o vento de cauda. Operações de pouso e decolagem com esta condição devem ser realizadas apenas quando não houver alternativa, por causa da controlabilidade. A maioria dos helicópteros tem menos curso de cíclico para trás do que para frente. Com vento de cauda, se por qualquer motivo o piloto tiver que interromper uma decolagem depois de iniciada, pode faltar comando de cíclico para trás a ponto de impossibilitar o pairado.
Um problema mais sério pode acontecer quando ele estiver aproximando para pouso. Com vento soprando pela cauda, a esteira produzida pelo rotor principal é jogada na trajetória de aproximação do helicóptero, gerando a formação de anéis de vórtice no rotor principal e perda do controle da razão de descida, terminando muitas vezes com um pouso duro.
A aproximação com vento de cauda deve ser evitada ao máximo. Quando não houver alternativa, a razão de descida na final deve ser bem pequena para evitar a formação de vórtices.
Quando o vento de cauda for de rajada e com direção variável, pode provocar perda de estabilidade direcional, exigindo movimentos amplos e contínuos de pedal para manter o controle. Ainda quanto à controlabilidade, o vento de cauda forte na aproximação é similar a um deslocamento para trás, provocando o mesmo efeito desestabilizador.
E, da mesma forma que pode ocorrer na decolagem, a falta de comando de cíclico atrás pode dificultar o controle do helicóptero na fase final da aproximação.
*David Branco Filho é piloto e Agente de Segurança de Voo
e tem o canal Branco Aviação, no YouTube.
**Texto publicado originalmente edição 155 de AERO Magazine, de março de 2007.
O texto está na íntegra e foi apenas adaptado para a internet