Um dos argumentos para questionar a ida da humanidade até à Lua é a tecnologia dá época, mas a realidade é surpreendente
Por Edmundo Ubiratan Publicado em 02/04/2024, às 12h30
Com os avanços derivados da missão Artemis II da Nasa e o lançamento do terceiro Starship, feito pela SpaceX, ressurgiu uma antiga pergunta entre quem acompanha (ou não) o tema. Por que a humanidade não voltou à Lua passados mais de 50 anos desde a primeira e última missão?
A interrogação quase sempre vem seguida da polêmica afirmação “na época mal se tinha tecnologia”. Tirando as inovações em informática, que permitiram à computação chegar à palma da mão com os smartphones e ampliaram a comunicação de massa com a criação da internet, no campo aeroespacial, uma análise mais cuidadosa mostra que as inovações entre os anos 1960 e 1970 estão até hoje em uso, isso para não dizer que regredimos em diversos aspectos.
Nos anos 1960, o mundo assistia à corrida também entre os chamados Supersonic Transport (SST). Havia a promessa de se realizar voos de durações média e longa acima da velocidade do som. O Concorde fez seu primeiro voo em março de 1969, ou seja, quatro meses antes da Apollo 11 chegar à Lua. Hoje, apenas a Boom Supersonic trabalha de forma modesta em um avião supersônico para menos de 60 passageiros e voltado para etapas de no máximo 4.500 milhas náuticas.
Nos anos 1960, o crescimento da necessidade do transporte aéreo era uma realidade nos campos militar e civil. O então peso-pesado C-141 Starlifter não tinha completado cinco anos desde seu primeiro voo quando o C-5 Galaxy decolou pela primeira vez. O C-5 tem um peso vazio superior ao peso máximo de decolagem do C-141 e, hoje, a indústria sequer avalia criar um substituto.
O Boeing 747 é o eterno Jumbo, um avião que chocou o mundo quando foi apresentado em 1968, afinal, tinha quase o dobro do tamanho do 707. O projeto foi tão bem equilibrado que a última entrega ocorreu em 2023. O Airbus A380 era consideravelmente maior, mas quase todo seu conceito seguiu inspirado no rival dos anos 1960.
Pouco menos de cinco anos antes de Neil Armstrong se tornar o primeiro ser humano a caminhar na Lua, o SR-71 Blackbird voava pela primeira vez. O sinistro jato era derivado direto do ultrassecreto A-12, criado pela CIA, que voou pela primeira vez em 1962. Ambos tinham velocidade de cruzeiro operacional de impressionante Mach 3.1. Já o soviético MiG-25 voava acima de Mach 2.8.
Em outubro de 1967, o experimental X-15 atingiu a incrível velocidade máxima de Mach 6.7 (aproximadamente 7.274 km/h), um recorde ainda hoje distante de ser quebrado. Durante o programa X-15, foram realizados 199 voos que avaliaram diversos parâmetros que posteriormente foram usados para projetar aviões supersônicos e naves espaciais. Atualmente, não existe nenhum projeto de aeronave tripulada capaz de superar as marcas do X-15.
Entre os anos 1950 e 1970, diversos aviões superaram a marca dos 80 mil pés de altitude, incluindo o A-12, o SR-71, o X-15 e o U-2. Este último, que voou pela primeira vez em 1955, segue em serviço até hoje. Já o MiG-31, que fez sua estreia em 1975, também está longe de ter um substituto.
O Programa Apollo estava em seu auge de desenvolvimento quando um grupo de pesquisadores da Nasa e da força aérea dos Estados Unidos passaram a trabalhar no projeto de um veículo espacial de grande capacidade e que pudesse ser reutilizado. A Nasa criou o chamado Space Shuttle Task Group em 1968, um ano antes da Apollo 11, dando origem ao famoso Ônibus Espacial.
Até hoje a humanidade não voltou à Lua por uma questão geopolítica. A Corrida Espacial tinha como objetivo apenas uma disputa de reputação entre as duas maiores superpotências mundiais da época: Estados Unidos e União Soviética.
Assim, com a União Soviética desistindo de chegar à Lua e entrando em uma grave crise nos anos 1980, os norte-americanos ficaram sem qualquer razão para manter o interesse pelas viagens lunares. Além disso, se o interesse público e político já era muito baixo na Apollo 12, quase ninguém queria saber da derradeira Apollo 17.
A maioria dos exemplos é de projetos que atenderam a necessidades específicas, mas que romperam paradigmas e ainda hoje são referência tecnológica e da capacidade da engenharia aeroespacial. Isso mostra que havia muita tecnologia nos anos 1960, tanto que a humanidade deu saltos gigantescos, além de alguns passos na Lua.