Failure Is Not an Option - Parte II

Há 50 anos a Apollo 13 sofreu uma falha catastrófica que a fez entrar para a história

Por Edmundo Ubiratan Publicado em 15/04/2020, às 17h00 - Atualizado em 16/04/2020, às 19h46

Para ler a primeira parte clique aqui

Momentos após a explosão os tripulantes da Apollo 13 passaram a atuar em conjunto com técnicos da missão em Houston, buscando compreender a falha. Rapidamente ficou claro que a situação poderia ser catastrófica em pouquíssimo tempo.

Após a tripulação da Apollo 13 e o centro de controle em Houston terem uma ideia geral dos danos no módulo de serviço, assim como o que poderia ser feito imediatamente para conter a falha, surgiram dois problemas.

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O primeiro, a única solução possível teria como consequência o fim da missão para a Lua. Não haveria condições dos astronautas Jim Lovell e Fred Haise pisarem na Lua. Para Lovell a Apollo 13 seria a consagração de sua carreira, que estava em sua quarta missão espacial. Além disso, havia sido parte da tripulação da Apollo 8, a primeira a entrar na órbita lunar e a missão que abriu caminho para as demais Apollos chegarem ao satélite natural. Se tudo desse certo Lovell teria a rara oportunidade de ver a Lua ao vivo mais uma vez.

Foto feita logo após o 'alijamento' do módulo de serviço mostra os danos provocados pela explosão

 

Havia um segundo problema, sem oxigênio o sistema elétrico do módulo de comando estava morrendo. Não existia como suprimir a falta de energia. A única opção disponível era desligar imediatamente todos os sistemas e os três astronautas se refugiarem no módulo lunar. Cortando o consumo de energia teriam alguma carga ao final da viagem, quando usariam a eletricidade remanescente para reentrada e abertura dos paraquedas.

O desafio agora era transferir todos os dados de navegação do módulo de comando para o módulo lunar. Além de ser uma tarefa complexa, havia pouco tempo disponível e a dúvida se o computador da nave projetada para pousar na Lua teria condições de assumir a navegação. Pior, uma nova navegação teria de ser inserida nos computadores, afinal, agora a ideia seria repetir a missão Apollo 8, apenas circular a Lua e retornar para casa.

Lua fotografada pelos tripulantes da Apollo 13, que estiveram pouco mais de 100 km de sua superfície 

Como não faltavam problemas, a Nasa sabia que ao desligar o módulo de comando teria de cortar o aquecimento de toda a nave, poupando cada ampere disponível. Isso tornaria o interior das duas capsulas extremamente frio, com a temperatura chegando próximo ao zero grau célsius.

Concluída a transferência dos dados do computador para o módulo lunar os astronautas logo receberam uma nova notícia, pouco animadora como era de esperar. O módulo lunar foi projetado para acomodar dois astronautas por pouco mais de 40 horas, sendo assim, além do pequeno espaço disponível os filtros de gás carbônico não tinham capacidade para filtrar o ar para três pessoas e por mais quatro dias.

A Nasa é uma agência federal, assim sendo seus projetos devem atender uma série de requisitos de interesse público, que vão da transparência em suas atividades até a contratação de fornecedores. O programa Apollo contava com milhares de fornecedores, com os principais fabricantes aeronáuticos da época tendo sido escolhidos para produzir uma parte do foguete e das naves. O módulo de comando e serviço (CSM) foi projetado pela North American, que trabalhou com a especificação da Nasa, mas com soluções de engenharia próprios. O módulo lunar era um projeto da Grumman. A única parte em comum entre ambos era o anel de acoplamento, que manteria as duas naves unidas durante boa parte da missão. 

O filtro de ar no módulo lunar, construído de forma improvisada pelas equipes em solo e o projeto executado a bordo

Esquema de construção e montagem do "novo" filtro de ar

Como tudo no programa Apollo era uma aprendizado em tempo real, as equipes de engenharia da Nasa e dos fabricantes descobriram um “pequeno” problema. O filtro de ar do módulo de comando era um cubo, enquanto do módulo lunar um cilindro. Como encaixar um cubo num cilindro? Em um trabalho que envolveu um pequeno time de técnicos a solução foi utilizar o que havia a bordo como adaptador. Ao final, o cordão umbilical do traje de voo, fita adesiva e sacos plásticos serviram como adaptador. Um projeto artesanal feito em pouquíssimo tempo provou o porquê o nome da Nasa remete a soluções inconcebíveis ao demais.

 

Solucionado o problema do filtro surgiram outros, como manter uma navegação com uma nave não projetada para isso. Por fim, como poderiam religar os sistemas se não havia energia suficiente? Novamente os técnicos do programa tiveram quem improvisar, enquanto os três astronautas vislumbravam a Lua da janela do módulo lunar.

A saída foi relativamente simples e óbvia, dada as condições da missão. Iriam inverter o fluxo de corrente, com o módulo lunar auxiliando o módulo de serviço e comando. A ideia ser simples não queria dizer que era fácil, exigindo assim dezenas de horas de ensaios emergenciais em solo, para comprovar que era possível utilizar o pouco de carga das baterias para religar o módulo de comando e ele realizar uma reentrada correta na atmosfera.

Enquanto isso, Lovell lidava com a navegação, tendo que manobrar o módulo lunar em direção a Terra. Seguido de um problema adicional, a trajetória se mostrava alta, mesmo seguindo estritamente os dados da missão. Faltavam 100 kg no módulo de comando. Afinal, ele deveria ter retornado com milhares de amostras do solo lunar. Novamente foi necessário adaptar a realidade e transferir tudo que fosse possível para o módulo de comando.

Esquema mostra o inédito procedimento de reentrada feito pela Apollo 13

Em solo as equipes da Nasa avaliavam se deveriam realizar o aquecimento do sistema de paraquedas, pois caso entrassem congelados não haveria como acionar o sistema e a nave bateria na água com extrema violência. Enquanto isso os astronautas liberavam o módulo lunar, que faria uma reentrada destrutiva, seguido do módulo de serviço.

Ao passarem pelo módulo de serviço notaram as avarias, que comprometiam praticamente toda a linha longitudinal da nave. Levando a todos ao último problema, o escudo térmico teria sido avariado? Esse era uma falha que simplesmente encerraria da pior forma a missão Apollo 13, não havia plano B para o não funcionamento do escudo. Sem ele a capsula seria incendiada na reentrada.

USS Iwo Jima, que foi utilizado na missão de resgate dos astronautas após o pouso bem sucedido no Pacífico

A única maneira de saber era apostando na sorte. A reentrada ocorreu exatamente no ângulo e posição planejados. Após 4 minutos os astronautas já tinham comunicação com USS Iwo Jima, o navio que liderava o processo de resgate naquele dia.

A Apollo 13 tocou o Oceano Pacífico às 18h07 (UTC) do dia 17 de abril, após 5 dias, 22 horas, 54 minutos, 41 segundos do seu lançamento. A azarada missão entrou para a história e para a cultura popular, além de ter gerado milhões de dados que são utilizados ainda hoje nos programas espaciais.

Os astronautas Lovell (primeiro plano), Swigert (direita) e Haise (esquerda) já a bordo do USS Iwo Jima

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