Dicas para viajar com uma criança ou adolescente com autismo

Descomplicando a viagem de avião com crianças neurodivergentes: saiba como se preparar

Por Cindi Peeff, de Louisville; e Edmundo Ubiratan Publicado em 27/07/2024, às 08h00

- Aeroporto de Denver

Nos últimos anos, a conscientização sobre neurodivergência e o maior acesso a informações permitiram ampliar o debate sobre o tema na sociedade e, principalmente, facilitar o correto diagnóstico. Ainda assim, pais de crianças e adolescentes com condições neurodivergentes enfrentam diversos desafios em situações sociais, especialmente quando há maior necessidade de interação, como em viagens aéreas.

Crianças e adolescentes com espectro autista (TEA), dislexia, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), síndrome de Tourette, Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) e dispraxia muitas vezes necessitam de atenção e cuidados especiais durante viagens aéreas, sejam em voos domésticos ou internacionais.

Especialmente as crianças neurodivergentes podem enfrentar desafios em áreas como socialização, comunicação e desempenho, com dificuldade para entender normas de segurança, expressar emoções e se adaptar a mudanças na rotina. Além disso, frequentemente enfrentam estigmatização e discriminação devido à falta de compreensão sobre suas condições.

Preparamos um breve guia para ajudar nas viagens aéreas com crianças e adolescentes com condições neurodivergentes.

Planejamento antecipado

O mais importante é planejar a viagem com antecedência, incluindo preparar as malas e separar brinquedos ou itens que possam entreter a criança durante os deslocamentos. Itens como brinquedos simples, cadernos para desenhar e até fones de ouvido podem ser úteis para manter a criança entretida em ambientes com grande fluxo de pessoas e ruído intenso.

Conhecer a nova rotina

Explicar como será a viagem, incluindo mostrar imagens do aeroporto e avião, ou, se possível, visitar previamente o próprio aeroporto, permite que a criança compreenda melhor o que deverá enfrentar. “Criar todas essas rotinas ajuda no preparo da criança que tem, por exemplo, transtorno do espectro autista, a entender uma diferença da rotina diária”, destaca Erasmo Barbante Casella, neurologista infantil do Hospital Albert Einstein.

Contato prévio com a empresa aérea e aeroporto

Embora as grandes empresas aéreas, em geral, tenham conhecimento e procedimentos para lidar com viajantes com condições neurodivergentes, um contato prévio pode garantir acesso a cuidados especiais desde o check-in até o desembarque.

Colar, laudo e embarque prioritário

Entrar em contato com a companhia aérea e informá-la da necessidade de um cartão de deficiência/pré-embarque evita que a criança fique nas filas de embarque, especialmente em viagens na classe econômica. Além disso, o uso de um colar de identificação permite que as equipes de solo tenham maior atenção à família. “Se a criança não aceitar [o uso do colar], os próprios pais podem usar, ou então ter, pelo menos, um laudo de autismo disponível para mostrar, em caso de necessidade”, explica Casella. A criança entrando antes no avião, como prioridade, evita a confusão normal no interior da aeronave, com passageiros buscando seus assentos e bagageiros para as malas. Em viagens na classe econômica, o ideal é levar na bagagem de mão, prioritariamente, itens ligados à criança ou adolescente, incluindo remédios e eventuais receitas que podem ser solicitadas em aeroportos no exterior, especialmente medicamentos líquidos.

Imigração e mudança de portão de embarque

No aeroporto, se possível, brinquedos e passatempos podem ajudar a distrair a criança, assim como fones especiais ou simples com cancelamento de ruído ativo podem amenizar o estresse causado pelo excesso de ruído.

Todavia, especialistas ressaltam a importância de verificar se brinquedos e passatempos poderão passar pelos procedimentos de segurança, assim como se serão viáveis de serem usados no terminal de passageiros e acomodados facilmente na bagagem de mão para o embarque.

Embarque em áreas remotas e mudanças de portão podem ser um fator adicional de sensibilidade para neurodivergentes

Em viagens internacionais, passar pelo sistema de imigração e procedimentos de segurança pode ser desafiador. Muitos países, especialmente aqueles com grande volume de voos, tendem a ter procedimentos focados em agilidade, embora as filas sejam longas e demoradas, e o atendimento nem sempre seja humanizado. Além disso, algumas questões culturais ou de idioma podem ser um contratempo adicional e fator de desconforto para pessoas neurodivergentes. O próprio toque involuntário entre pessoas em filas longas e confinadas, ou o excesso de estímulos, pode fazer com que o paciente com TEA reaja de maneira inesperada, o que eventualmente pode levar a uma revista manual ou maior contato com agentes de segurança e imigração.

“Então você tem que preparar a criança com TEA para que isso pode acontecer, e se acontecer, tentar relevar a situação, porque aí não adianta gritar, chorar, porque vai haver falta de sensibilidade”, alerta Casella.

Pais consultados pela reportagem ainda alertam para a necessidade de estar preparado para troca de portão, muitas vezes em outro terminal, o que exige sair correndo. Por isso, é importante contar com acessórios e brinquedos que possam ser usados em movimento ou que possam ser facilmente guardados. Estar preparado para todas essas possibilidades com antecedência ajuda bastante na viagem.

A bordo

A maioria dos viajantes do mundo viaja em cabine econômica ou classe turística, onde, apesar das melhores tarifas, existe o inconveniente de dividir o espaço com literalmente centenas de outras pessoas. Aviões como os Airbus A350-1000, A380 e Boeing 777-300ER podem acomodar 200 ou mesmo 300 passageiros na classe econômica, o que naturalmente torna o ambiente mais desconfortável do ponto de vista ergonômico e psicológico.

Assentos no meio tendem a ser problemáticos, especialmente para neurodivergentes. Planejar com antecedência e confirmar que a tarifa oferece a opção de escolha de assentos pode ser um diferencial.

Tarifas básicas, com escolha randômica, poderão exigir uma negociação no check-in, que poderá ser aceita ou não pela empresa aérea. O uso do banheiro é outro fator complicador em voos de longa duração. Planejar os horários de menor demanda ou mesmo negociar um eventual uso do banheiro da classe executiva pode ser uma alternativa.

Para quem viaja em classe executiva ou Primeira Classe, o embarque prioritário e com menores filas costuma contribuir para um início de viagem mais tranquilo, assim como as poltronas maiores.

Alguns pais alertam que, independentemente da classe escolhida, ter tato para lidar com os demais passageiros é fundamental. “Não adianta ser agressivo ou fazer drama pedindo consideração ou respeito do outro [passageiro] se não souber explicar o caso”, alertou a mãe de um menino com TEA consultada por AERO Magazine. “Em geral, ao chegar no assento, aviso o passageiro ao lado do meu caso e tento buscar compreensão de todos ao redor. Foram raras as vezes que tive aborrecimento, a maioria das pessoas entende, ainda que algumas se sintam contrariadas.”

O principal em uma viagem aérea com crianças com neurodivergência é estar preparado para tudo o que pode acontecer.

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