Gigante de 105 toneladas, jatos nas pás e parafuso voador são alguns exemplos
Por Edmundo Ubiratan Publicado em 29/09/2020, às 14h00 - Atualizado às 17h22
Ingleses, soviéticos e norte-americanos testaram os mais diferentes conceitos de helicópteros. Na foto o Ka-22 Vintokryl
A indústria aeronáutica cria projetos bastante estranhos, muitos desenvolvidos para testar conceitos ou tecnologias. O segmento de asas rotativas, vez ou outra, disputa palmo a palmo com o de asas fixas o título de projeto mais heterodoxo, feio ou mesmo bizarro. Listamos aqui algumas ideias e soluções bastante esquisitas, embora alguns estudos tenham rendido oluções aplicadas em modelos de série.
Os britânicos nunca foram famosos pela estética de aviões, carros e, menos ainda, helicópteros. Mesmo assim, o Percival P.74, desenvolvido na década de 1950, deu um passo além. Criado como um demonstrador de tecnologia, o protótipo empregava o tip jet como forma principal de propulsão. Em resumo, pequenos motores a jato instalados nas pontas das pás forneciam a energia cinética para o giro do rotor. A ideia dos jatos nem era das mais bizarras na época, o Hiller XHOE-1 Hornet adotava a mesma solução, mas o formato da fuselagem, que lembrava o de um ovo com um pequeno rotor de cauda, somado as janelas redondas como em um submarino civil, dava um aspecto nada agradável ao modelo. Apenas um protótipo foi desenvolvido e o projeto acabou cancelado em 1956.
Menos de um ano após o P.74 ser abandonado, a Fairey Aviation apresentou o Rotodyne, um dos primeiros projetos que demonstraram a viabilidade técnica de unir decolagem e pouso verticais com voo horizontal na velocidade de turbo-hélices. O programa esperava conceber um meio de transporte civil que pudesse voar etapas curtas e médias, a partir de locais centrais em grandes cidades. Com capacidade para até 40 passageiros, o Rotodyne empregava dois motores Napier Eland de 2.800 cavalos de potência no eixo (shp) cada e quatro rotores tip jets de 1.000 libras-força cada. A velocidade era de 160 nós e alcance de 391 milhas náuticas. Um projeto interessante, mas pouco viável para a tecnologia da época, e mesmo de hoje. Apenas um protótipo foi construído e desmontado em meados de 1963. A Revell lançou na ocasião um modelo em plástico para montar, a esperança que no século 21 tal tecnologia fosse usual. A Uber teria agradecido.
Como aviador, Howard Hughes se tornou lendário por seus feitos, enquanto o empresário ficou famoso por seus investimentos pouco rentáveis, sem contar a personalidade bastante controversa e a vida conturbada. Assim, não é de surpreender que o XH-17 Flying Crane da Hughes Aircraft fosse uma união de todas as características de seu fundador. O projeto era notável por sua inovação, um enorme guindaste aéreo que podia transportar mais de 19 toneladas por 65 quilômetros de distância. O estranho aparelho utilizou o cockpit de um Waco CG-15, rodas dianteiras do trem de pouso principal do B-25 Mitchell, trem de pouso principal do C-54 Skymaster, tanque principal adaptado do bombbay do B-29 Superfortress, rotor de cauda do H-19 Chickasaw e, óbvio, como todo projeto da década de 1950, empregava tips jets. A escala descomunal desse verdadeiro Frankenstein exigiu um rotor com 39,62 metros de diâmetro, mas os engenheiros optaram por um bipá, com pás construídas em liga metálica. Em comparação, o rotor de cauda era minúsculo, já que era de um helicóptero muito menor. Resultado, era um projeto ineficiente em todos os aspectos, com manobrabilidade terrível e ineficiente até como demonstrador de tecnologia. Os militares dos Estados Unidos não se surpreenderam com o gigantismo e falta de utilidade do aparelho, algo comum a muitas das ideias de Hughes. O primeiro voo ocorreu em 1952 e apenas três anos depois o projeto foi cancelado e o estranho aparelho, desmontado.
Os camaradas soviéticos não tinham pudores em ultrapassar os limites da aerodinâmica e nem dos exageros. Assim como seus rivais ocidentais, eles estudavam nos anos 1950 soluções que permitissem unir decolagem e pouso verticais com um voo horizontal em alta velocidade. A Kamov, famosa por seus projetos estranhos, mas extremamente eficientes, criou o Ka-22 Vintokryl, literalmente uma “rosca voadora”. O projeto era similar ao do Rotordyne, porém, com um toque da Kamov. Cada rotor tinha quatro pás, acopladas a um motor Soloviev D-25VK, de 5.424 shp (cada), que tinham área total de 795,2 metros quadrados. Abaixo ficava um conjunto quadripá, que a perturbação aerodinâmica no rotor principal não aprecia ser uma preocupação. O estranho parafuso voador tinha peso máximo de decolagem de impressionantes 42.500 quilos, com alcance de 450 quilômetros e velocidade máxima de 200 nós. Como todos os projetos do tipo, o maior problema era o controle em caso de perda de um dos motores. Em 1964, um acidente por perda de controle destruiu um dos protótipos. Os demais foram sucateados após o programa ser cancelado em 1964.
O Ka-22 não era grande o bastante para os padrões russos, então, em 1967 decolou pela primeira vez o Mil V-12, que ainda detém o título de maior aeronave de asas rotativas da história. Com 37 metros de comprimento, 67 metros de envergadura e 12,5 metros de altura, o gigante podia acomodar até 196 passageiros em sua versão civil. A carga paga era de 40 mil quilos e peso máximo de decolagem de 105 mil quilos. O conceito era único, com parte da sustentação gerada pelas asas fixas, que em suas pontas tinham enormes rotores de cinco pás com 35 metros de diâmetro e área total de 962 metros quadrados. A velocidade máxima era de 140 nós e o alcance, de 270 milhas náuticas. Em 1968, o projeto foi cancelado após demonstrar uma série de problemas, que superavam suas dimensões. Ainda assim, os dois protótipos foram preservados: o segundo, mais famoso, pode ser visto no museu de Monino, nos arredores de Moscou.