Difícil para chegar desde a sua inauguração, o aeroporto internacional do Rio, no Galeão, sofre com a mobilidade precária
Marcel Cardoso Publicado em 14/09/2022, às 09h33 - Atualizado em 31/10/2022, às 00h00
O aeroporto internacional do Rio de Janeiro (GIG), conhecido como Galeão, sofre há vários anos com problemas diversos e desde os anos 1990 perdeu o status de portão de entrada do Brasil.
Quando o Terminal 1 foi inaugurado, em janeiro de 1977, a ideia inicial era oferecer mais conforto ao cada vez mais elevado número de passageiros que passavam pelo então maior aeroporto internacional do Brasil, cujo antigo terminal, aberto 25 anos antes, mostrava claros sinais de saturação e uma estrutura deficiente para atender aviões cada vez maiores.
Porém, antes que estes problemas fossem resolvidos um outro surgiu e sequer foi percebido pelos projetistas do novo terminal e nem pelos gestores do ambicioso projeto: a mobilidade urbana.
Na época que o novo e até entao gigantesco terminal estava sendo erguido, duas novas linhas de metrô estavam sendo construídas no Rio de Janeiro, distante poucos quilômetros da Ilha do Governador, onde está localizado o Galeão. Conectar por trilhos ratificaria, na época, o seu posto de principal aeroporto do país e seria uma evidente necessidade para justificar seu crescimento futuro. Contudo, era um tema invisível aos olhos da classe política nos anos 1970 e por muitos anos além.
Oito anos após o Terminal 1 ter sido entregue, o Galeão começou assistir seu declínio com a gradual transferência de boa parte de seus voos internacionais para o recém-inaugurado aeroporto internacional de São Paulo (GRU), em Guarulhos. Construído para atender de forma direta a demanda do principal centro financeiro do Brasil, o aeroporto de Cumbica, como GRU ainda é conhecido, assumiu o posto de portão de entrada brasileiro. Ao mesmo tempo, a explosão da criminalidade do Rio de Janeiro fez que GIG ganhasse uma vizinhança bastante incômoda, com a eclosão de comunidades dominadas por facções criminosas extremamente violentas.
Na década de 1990, o aeroporto recebeu novos investimentos para a sua expansão, como a inauguração do Terminal 2, em 1999. Na ocasião muitos creditaram a obra como um "elefante branco", visto o baixo número de voos realizados para o Rio de Janeiro, que tinha no aeroporto Santos Dumont (SDU), no centro da cidade, quase a concentração total dos voos domésticos. Outro entrave, a nova obra também não contemplava investimentos em mobilidade urbana, condenando o principal terminal internacional carioca a continuar refém das pouquíssimas linhas de ônibus que operavam ali, além dos táxis, em pequeno número e com tarifas altas.
Já demonstrando sinais de ociosidade por conta da violência e da acessibilidade precária, o que acarretou uma procura maior pelo Santos Dumont, mais bem localizado, as notícias de que o Brasil seria a sede da Copa do Mundo Fifa e que o Rio de Janeiro sediaria a edição 2016 dos Jogos Olímpicos, trouxeram a esperança de dias melhores.
Visando os eventos até então futuros, em novembro de 2013, o governo federal realizou a concessão do GIG e do aeroporto internacional de Belo Horizonte (CNF), até então sob controle integral da estatal Infraero. Um consórcio liderado pela Changi Airports e pela antiga construtora Odebrecht (atual Novonor) arrematou o Galeão por R$ 19 bilhões.
Ao mesmo tempo que corria o certame, um dos principais meios de transporte carioca para a Copa do Mundo de 2014, o Bus Rapid Transit (BRT), estava em construção. Este inicialmente não chegaria ao aeroporto, mas o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes) concedeu um empréstimo à Prefeitura do Rio de Janeiro para que os dois terminais do Galeão pudessem receber as estações, o que foi materializado em junho daquele ano.
Três meses após o fim dos jogos olímpicos, em novembro de 2016, o Terminal 1, que havia recebido investimentos para a Copa do Mundo, dois anos antes, foi desativado por falta de demanda e todas as operações foram transferidas para o Terminal 2 e para o Píer Sul. Assim, uma das estações do corredor exclusivo de ônibus, que atendia o espaço mais antigo do aeroporto, foi fechada, acompanhando o declínio do número de passageiros.
Nos anos seguintes, o sistema de transporte oferecido como solução para o deslocamento entre o Galeão e o resto da cidade foi se tornando um problema. Constantes atos de vandalismo nas estações e nos veículos articulados deterioraram o sistema, deixando o atendimento precário, principalmente para os funcionários do aeroporto, que viram minguar as opções de deslocamento para o trabalho. As já poucas linhas convencionais de ônibus também foram reduzidas.
A pandemia de covid-19 foi a gota d’água para a crise do Galeão. O segundo maior aeroporto internacional do país passou a contar com somente com dois voos diários no auge da crise, justamente para o aeroporto internacional de São Paulo. Conforme o setor aéreo foi aquecendo, o Galeão não dava sinais de que faria o mesmo, com a constante perda de operações para o vizinho Santos Dumont, em um processo similar ao visto nos anos 1990.
Com isso, em fevereiro de 2022, a Changi Airports anunciou a devolução da concessão para o Governo Federal, por desequilíbrio financeiro.
Ao mesmo tempo, o SDU que estava no próximo bloco de concessões aeroportuárias, passou a sofrer pressões de parlamentares cariocas contra o modelo de composição do edital. A alegação principal era que a concessão, dentro da proposta do governo, seria ainda mais prejudicial para o aeroporto internacional, que não teria condições de competir com o Santos Dumont.
Com o imbróglio e a certeza que o modelo proposto realmente seria um problema para o futuro do Galeão, o governo federal decidiu licitar conjuntamente os dois terminais, com o leilão previsto somente para o fim de 2023. Todavia, existe a incerteza da continuidade do processo, visto a eleição que poderá levar a troca de presidentes ou uma mudança na estrutura do atual governo.
A decisão popular nas urnas decidirá o futuro do Galeão, especialmente caso polarização se confirme. Enquanto isso, o maior aeroporto do Rio de Janeiro sofre com o abandono e a ociosidade. Uma irônia. O aeroporto da cidade mais famosa do Brasil, que deveria ser a porta de entrada para o turismo nacional, se tornou irrelevante no plano da maioria das empresas aéreas.