Um dos mais intrigantes crimes já registrados nos Estados Unidos segue até hoje em aberto
Por Edmundo Ubiratan Publicado em 24/11/2021, às 13h00 - Atualizado às 16h01
Há 50 anos a aviação comercial assistiu um dos mais impressionantes roubos de sua história. Uma ação digna de filmes de ação, que parte do roteiro parece inverossímil, mas que passado cinco décadas continua sem uma solução.
Era véspera de Ação de Graças, tarde do dia 24 de novembro de 1971, quando um senhor de meia-idade se aproximou do balcão de check-in da Northwest Airlines. Seu nome era Dan Cooper e seu destino, Seattle, Washington, no voo 305.
Cooper trajava capa de chuva preta, terno escuro, mocassim, camisa de colarinho branco bem passada, gravata preta e alfinete de gravata de madrepérola. Parecia ser mais um dos homens de negócio do Oregon. Às 14h30, o Boeing 727, de matrícula N467US, que cumpria o voo 305 decolou de Portland.
Com apenas 37 assentos ocupados, o Boeing seguia viagem sem contratempos. Pouco mais de 20 minutos após a decolagem, Cooper entregou um bilhete escrito com letras maiúsculas à comissária Florence Schaffner, que estava próxima à porta traseira da aeronave.
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Parecia ser mais uma cantada de um solitário executivo, o que levou Schaffner a colocar o bilhete na bolsa sem dar importância. Cooper insistiu. Inclinou-se e sussurrou: “Senhorita, melhor olhar aquele bilhete”. Sem muita pretensão, Schaffner desdobrou o papel e leu a mensagem: “Tenho uma bomba em minha maleta. Vou usá-la se necessário. Quero que se sente a meu lado. Você está sendo sequestrada”. Ainda em dúvida em relação à ameaça, a comissária sentou-se ao lado de Cooper e pediu para ver a bomba. Ele abriu a maleta exibindo oito cilindros vermelhos presos em fios com isolamento ligados numa grande bateria cilíndrica.
Ele exigia duzentos mil em moeda negociável, quatro paraquedas e um caminhão em Seattle pronto para reabastecer o avião. Após escutar atentamente as exigências, Schaffner se dirigiu à cabine de comando e transmitiu a mensagem. O comandante William Scott imediatamente alertou as autoridades do Aeroporto Internacional de Seattle-Tacoma sobre o sequestro. Naqueles anos, sequestros aéreos haviam se tornado uma rotina nos EUA. No auge dos ataques, o país chegou a registrar um sequestro por semana. Contudo, os sequestradores em geral eram criminosos enfurecidos com a justiça, cidadãos revoltados, outros tantos protestavam contra a guerra no Vietnã e alguns poucos dissidentes políticos achavam que o sequestro de um avião era a forma mais econômica de viajar até Cuba. Cooper não se enquadrava nesse padrão.
De acordo com Schaffner, ele era um homem educado, culto e bastante calmo. A comissária Tina Mucklow também contou ao FBI que ele ainda pediu uísque e água, pagando pela bebida e insistindo para Schaffner ficar com o troco. Em voo, ainda garantiu que pediria alimentação para a tripulação assim que estivessem no solo.
As autoridades solicitaram ao comandante para avisar aos passageiros que sua chegada a Seattle seria atrasada por causa de problemas mecânicos, o que daria tempo para atender às exigências do sequestrador sem alarmar os passageiros e demais membros do aeroporto.
Ao mesmo tempo, Donald Nyrop, presidente da Northwest, autorizou o pagamento do resgate, optando por utilizar dólares americanos. Sua ordem era a de que todos deveriam cooperar com o sequestrador. Durante quase duas horas, o Boeing voou em círculos sobre Puget Sound, enquanto o FBI se preparava para lidar com o sequestrador e as demais autoridades recolhiam o dinheiro e providenciavam os paraquedas.
O pedido foi considerado atípico pelo FBI, que acreditava que os paraquedas podiam ser apenas um modo de ganhar tempo, com um possível blefe de jogar algum passageiro para fora ou mesmo saltar do avião após receber o dinheiro. O fato de optar por quatro paraquedas ainda levantava a suspeita de que Cooper pensasse realmente em fugir após uma nova decolagem, provavelmente levando como refém algum membro da tripulação. Isso dificultaria qualquer sabotagem prévia ao paraquedas.
Às 17h24 (horário local), a tripulação informou que as exigências haviam sido cumpridas, e 15 minutos depois o 727 pousou em Seattle. Cooper instruiu o comandante a taxiar até uma área remota e bastante iluminada, após o corte dos motores todas as luzes a bordo deveriam ser mantidas apagadas. Provavelmente Cooper estava querendo evitar a ação de atiradores de elite. O gerente de operações de Northwest Al Lee se aproximou da aeronave e entregou uma mochila com o dinheiro e os quatro paraquedas. Cooper, no entanto, recusou os paraquedas militares, exigindo um modelo civil, o que foi obtido com uma escola de paraquedismo local. Assim que a entrega foi finalizada, Cooper autorizou o desembarque de todos os passageiros e das comissárias Schaffner e Alice Hancock. Durante o tempo em que esteve em solo, Cooper transmitiu à tripulação o plano: decolar, manter o trem de pouso baixado, flap 15, voando a no máximo 100 nós e 3.000 pés de altitude, despressurizado e com proa da Cidade do México. Ele ainda solicitou que o avião decolasse com a escada ventral aberta, o que foi prontamente negado pela tripulação, já que isso poderia comprometer a segurança na decolagem. O copiloto William Rataczak informou que, com essa configuração, o alcance ficava restrito a 1.600 km, o que exigia uma escala para reabastecimento. Sem muita demora, Cooper concordou com um pouso em Reno, Nevada.
Em amarelo a rota realizada pelo Boeing 727, em vermelho a grande área estimada como local de pouso do sequestrador
Às 19h40, o Boeing decolou com destino a Reno. Imediatamente, dois Convair F-106 Delta Dart decolaram da base aérea de McChord para acompanhar a certa distância o voo. Aproximadamente 20 minutos depois, com o 727 já mantendo 3.000 pés, um alerta de abertura da escada ventral acendeu na cabine. O avião iniciou um pequeno movimento ascendente, exigindo uma correção dos pilotos para manter a altitude de voo. A tripulação, em seguida, notou uma mudança súbita no fluxo de ar, confirmando a abertura da porta. Imediatamente, entenderam o plano de Cooper, simplesmente saltar do Boeing em voo. A velocidade e a configuração do avião permitiam um salto seguro. A altitude era perfeita para uma queda rápida em meio ao dia que escurecia. Cooper saltou com seus US$ 200.000 na mochila.
O Boeing pousou em Reno com a porta traseira baixada, já que os pilotos não tinham como garantir que Cooper havia saltado. Uma equipe da polícia entrou no avião, vasculhando toda a cabine, sem encontrar qualquer rastro do sequestrador. Acharam apenas dois paraquedas, ambos com os cordéis cortados, a gravata preta e o alfinete de madrepérola. Outras 66 impressões digitais desconhecidas foram colhidas.
Até a presente data, o FBI não tem qualquer pista sobre o paradeiro ou a identidade de Dan Cooper, que se tornou o único sequestrador não identificado na história da aviação americana. O FBI afirmou na época que Cooper provavelmente morreu na queda, mas, em 1980, algumas das notas do resgate foram encontradas num pequeno esconderijo, contrariando a teoria da morte. O caso ainda está em aberto. Por um equívoco na divulgação dos dados, o sequestrador ficou conhecido como D.B. Cooper. O cinema produziu um filme com a história, estrelando Treat Williams no papel de Cooper.