Vendas aquecidas

Giuliano Agmont E Christian Burgos Publicado em 26/02/2013, às 08h00 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45

Fabrizio Romano, diretor Comercial para América do Sul da AgustaWestland

O novo escritório da AgustaWestland tem uma vista bonita da cidade de São Paulo. Fica na Rua Funchal, no efervescente bairro de Vila Olímpia. O diretor de Vendas da América do Sul, o engenheiro aeronáutico Fabrizio Romano, participa de uma reunião com clientes. Os negócios estão aquecidos. O executivo italiano mora no Brasil há pouco mais de três anos. Chegou ao país no início de 2010, depois de um ano ruim para quase todos os fabricantes, por conta da crise financeira mundial, justamente quando a companhia buscava um novo modelo de negócio. De lá para cá, as vendas melhoraram e as perspectivas revelam-se promissoras, sobretudo depois do anúncio da aproximação entre a AgustaWestland e a Embraer com o propósito de produzir helicópteros no Brasil. Os CEO de ambas as empresas assinaram em janeiro último um memorando de entendimentos para criar uma joint-venture voltada à fabricação e comercialização de aeronaves com asas rotativas. Aos 45 anos de idade, Fabrizio Romano mede as palavras para falar sobre o assunto, mas sabe intimamente que esse pode ser um marco para a indústria aeronáutica tanto do Brasil como da Itália. Na entrevista a seguir, ele se mostra otimista com o mercado brasileiro e diz que o Nordeste e o Centro-Oeste têm grande potencial de vendas.

AERO MAGAZINEO que já é possível dizer sobre a parceria entre AgustaWestland e Embraer?
FABRIZIO ROMANO – A intenção de formar uma joint-venture no Brasil entre ambas as empresas, brevemente, tem como objetivo fortalecer tanto o relacionamento industrial como o comercial entre os dois países (Brasil e Itália). Como anunciado por nosso CEO, Bruno Spagnolini, posso somente confirmar o interesse certo em colaborar na área de helicópteros de tamanho médio para o mercado governamental e comercial, em particular no setor de óleo e gás, e também o alto potencial corporativo. O Brasil tem alta demanda de helicópteros e a AgustaWestland possui grande tradição no Brasil.

Que helicóptero médio poderia ser esse?
Não posso dizer nada além do que já disse. Valores, modelo, prazos são informações ainda por se definir. Temos um objetivo comum com a Embraer e as empresas estão conversando.

O que mudaria no negócio da AgustaWestland no Brasil se passar a fabricar um helicóptero no país?
Repito, esse é um assunto que está sendo tratado pelo CEO da AgustaWestland. O que posso dizer, genericamente, é que muitas vantagens surgiriam com a produção de um novo helicóptero no Brasil. Haveria mais trabalho no país, transferência de tecnologia e fortalecimento do relacionamento de grandes empresas. Isso em um cenário de forte crescimento no setor de asas rotativas brasileiro. Nos próximos anos, o país precisará de mais helicópteros do que tem hoje.

Como está o mercado brasileiro de helicópteros hoje?
Fechamos o ano passado com 17 unidades vendidas no setor corporativo, isso é uma mensagem de que a aviação cresce em paralelo com o desenvolvimento econômico do Brasil, e não somente São Paulo. É um fato concreto que Nordeste e Centro-Oeste do país também precisam de helicópteros.

Quais modelos despontaram?
As vendas se devem muito ao êxito do modelo AW169, que, embora não tenha sido entregue, avança rapidamente para sua certificação. O quarto protótipo acaba de decolar pela primeira vez enquanto os outros três já voaram mais de 150 horas. A primeira entrega do 169 no Brasil acontecerá em 2014, se confirmado seu programa de certificação. Só não posso dizer onde e em que mês. Acredito que 2013 deve consolidar os números positivos de 2012.

Será um ano melhor?
No ano passado, vendemos 21 helicópteros na America do Sul, somando três da Venezuela e um do Chile aos 17 do Brasil.
Nosso objetivo é manter esse resultado. Já crescemos muito nossa taxa de vendas e manter esse crescimento é um objetivo desafiador. Se pudermos vender mais, ótimo, mas a meta é pelo menos manter as vendas.

"Em média, são vendidos no Brasil cerca de 60 a 70 helicópteros, considerando todos os fabricantes, e apenas modelos civis a turbina"

Em média, são vendidos no Brasil cerca de 60 a 70 helicópteros, considerando todos os fabricantes, e apenas modelos civis a turbina
Posso dizer quantos são vendidos, em média. Na parte comercial civil, considerando todos os fabricantes, e apenas modelos a turbina, mono e biturbina, aproximadamente 60 a 70 helicópteros.

Qual é o perfil dos compradores de helicópteros AgustaWestland no Brasil?
A maioria dos bimotores a turbina que se vende no Brasil fica em São Paulo, sobretudo pela questão dos congestionamentos e da segurança. Um VIP não quer esperar muito tempo para mover-se de seu lugar privado para ir a outro lugar privado ou de trabalho. Então, todo o tempo que vai ficar no trânsito, no controle aeroportuário, no ponto de embarque, no ponto de chegada, é tudo um tempo que ele monetiza. E o helicóptero é o único meio que garante que economize tempo. Considerando que o custo médio da hora de voo de helicóptero fica entre 7 mil e 8 mil reais, ele economiza, porque sua hora de trabalho vale mais do que isso. Tem também a questão da insegurança. Há diversos empresários que tomam a decisão de comprar um helicóptero depois que um amigo ou alguém próximo foi assaltado. Eles querem se proteger e proteger a família dos perigos da cidade. Esse é um detalhe importante, o helicóptero não fica apenas para ele, a família também usa. Ele faz o cálculo considerando todas as pessoas e chega à conclusão de que vale a pena viajar em helicóptero. Até porque, a tranquilidade não tem preço.

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Como é a rotina de deslocamento aéreo de um VIP em São Paulo?
Normalmente, o helicóptero fica hangarado em algum centro especializado, como Helipark, Helicidade, Campo de Marte e outros aeroportos privados, e vai buscar o passageiro no heliponto de um prédio perto dele para ir para outro lugar, que pode ser na cidade ou fora dela. Em vez de tomar um táxi, ele vai de helicóptero. Alguns têm a possibilidade de pousar em um heliponto condominial, que é compartilhado por um consórcio de pessoas, isso é muito comum no Brasil.

E quanto aos voos corporativos?
Sim, há os voos puramente corporativos. Um banco importante ou uma empresa farmacêutica com vários escritórios, por exemplo, podem movimentar de um lugar para outro 30 ou 40 gestores durante uma semana de evento e precisam de um meio seguro e rápido para economizar tempo. O helicóptero é essa ferramenta. Um aspecto importante é a questão da meteorologia. Em lugares como São Paulo, o tempo é bastante instável, fecha muito. Por isso os operadores precisam de um helicóptero bimotor, que permita voos por instrumentos. Detemos 60% do mercado de helicópteros biturbina civis leves.

Quais as novidades da Agusta para a Heli-Expo deste ano?
Teremos exposto o novo Koala, o KX, com painel Garmin 1000. Será mostrado pela primeira vez em uma feira internacional. O KX vai ser certificado durante este ano.

Como está o programa do Tilt Rotor?
A AgustaWestland comprou 100% do projeto da Bell e tomou essa decisão porque tem confiança nesse programa. Mas mantemos a parceria com a Bell, que vai produzir as primeiras aeronaves, já que tem um know-how de vários anos de desenvolvimento. Já a parte experimental está na Itália, temos um protótipo que faz continuamente testes, um protótipo militar. Até 2018, essa complexa aeronave deve ficar pronta para o mercado. Mas temos de considerar também a complexidade da certificação. Não se trata somente do projeto da aeronave. Há também as questões normativas, que devem ser igualmente híbridas e incorporar normas de helicóptero e avião. A parte normativa deve estar pronta para o produto, o que requer tempo.

Há mercado no Brasil para essa aeronave?
Essa aeronave terá vantagem ao trabalhar em missões com longas distâncias e dificuldade de pouso. Um objetivo óbvio pode ser o setor óleo e gás, por exemplo, mas as normas desse setor são bem complicadas. Outro setor interessante é o chamado “parapúblico”. Poderá ser útil no monitoramento de territórios, podendo pousar em lugares de difícil acesso. E não estou falando apenas de montanhas. O Brasil tem muitos lugares onde há dificuldade para se pousar um avião. Além desses setores, há o privado, se a pessoa tiver necessidade desse tipo de missão, poderá comprar.

O mercado parapúblico é promissor no Brasil, tendo em vista eventos como a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016?
O Brasil tem muita necessidade de helicópteros parapúblicos, e não somente para a Copa. O país tem extensão territorial continental, precisa de um controle do território e também prover suporte para comunidades distantes. Hoje, se há uma emergência médica nesses locais, é a Polícia Federal que faz o atendimento, não são as instituições privadas. Um sistema aeromédico bem articulado tem no helicóptero um de seus pilares, ele é a ambulância. Países como Itália, Alemanha, Áustria, Suíça e Estados Unidos possuem um sistema aeromédico bem desenvolvido. Acho que esse é um dos setores em que o Brasil mais precisará de helicópteros.

AgustaWestland deve começar a entregar o AW169 no Brasil em 2014

Como está a infraestrutura para operações de helicópteros?
O mercado de São Paulo tem um limite para crescer, não pode se manter como está indefinidamente. Mas o limite depende de vários fatores. Primeiro a infraestrutura. O número de helipontos limita um pouco o crescimento, pois estamos chegando à saturação. Ou seja, não dá para fazer mais do que um número determinado de pousos por dia. Hoje, o número de pousos por dia está acima dos 300, 350. Chega a 400, 420, dependendo do dia. Além da questão da infraestrutura, há o desenvolvimento econômico do país. Se um empresário está ativo, pode pensar em comprar um helicóptero. Caso contrário, ele prorroga sua decisão.

Como têm sido as negociações com os compradores, tendo em vista fatores como condições de pagamento e o câmbio?
É uma dificuldade. Primeiro pela questão do câmbio. Para uma empresa brasileira comprar um helicóptero em dólares, tem uma dificuldade a mais. A AgustaWestland trabalha tanto com dólares quanto euros enquanto empresas norte-americanas vendem diretamente em dólares. Em relação aos financiamentos, sofremos ao não usufruir de linhas de crédito como o Finame (do BNDES). Essa é uma limitação, já que contar com financiamento do próprio país ajuda muito o negócio, agiliza. Essa é mais uma barreira.

Uma barreira que seria resolvida com um contrato com a Embraer...
É o que esperamos.

E quanto à manutenção?
Teremos novidades em breve. Vamos melhorar nossa capacidade de manutenção em termos de tamanho e de ferramentas disponíveis para os operadores. A AgustaWestland conta hoje com um depósito alfandegado de vários milhões de dólares, mas estamos sofrendo um pouco com a falta de espaço. O suporte no país vai melhorar. Estamos fazendo um grande esforço, que vai ajudar nossos clientes.