Os aviões supersônicos que prometiam revolucionar o transporte aéreo, mas não passaram de estudos ou da prancheta nos anos 1960
Por Edmundo Ubiratan Publicado em 05/10/2020, às 11h00 - Atualizado em 12/07/2023, às 16h00
O futuro dos aviões supersônicos civis parecia próximo da realidade há apenas dois anos, quando os principais fabricantes afirmavam terem resolvido questões de projeto e de problemas operacionais. Contúdo, os altos custos e a realidade dura do transporte aéreo mostra que, mais uma vez, voar acima da velocidade do som não é viável para o mundo civil.
O voo supersônico foi por várias décadas um dos sonhos e desafios da aviação. Até meados da década de 1940, não havia motores com potência suficiente para impulsionar qualquer aeronave a uma velocidade além dos 800 km/h, aliado ao total desconhecimento das ciências aeronáuticas da época sobre perfis de aerofólios capazes de atender tal demanda.
Apenas em 1947, o Bell X-1, impulsionado por um motor foguete, conseguiu romper a barreira de Mach 1. Desde então, a indústria tem sonhado em levar a velocidade superior à do som para a aviação civil. O Concorde, de forma muito limitada, conseguiu tal feito por pouco mais de 30 anos. Mas alguns projetos jamais passaram da fase de estudos, sem sequer terem tido chance de serem construídos. São casos curiosos.
Duas vezes e meia maior do que o Concorde
A Lockheed na década de 1960 já dominava completamente voos acima de Mach 3, mas tinha perdido a referência em aviação comercial. O Constellation não havia deixado herdeiros e o Electra se tornara um problema. Investir no promissor setor de voos supersônicos civis parecia o óbvio naquele tempo em que o homem conquistava o espaço. Assim, concorrendo dentro do programa norte-americano para um SST (Supersonic Transport), a Lockheed passou a trabalhar no conceito do L-2000. O fabricante previa um avião com capacidade para até 250 passageiros, quase duas vezes e meia maior do que Concorde, com alcance de 4.000 nm voando entre Mach 2,7 e 3. Duas variantes foram criadas, o L-2000-7A e o L-2000-7B, que se diferenciavam basicamente em comprimento e peso máximo de decolagem, com o primeiro tendo 83 m e o segundo 89 m. O programa foi encerrado em 1971, após perder a concorrência do STT, que deu preferência ao modelo da Boeing, sem ter construído nenhum protótipo.
Projeto foi o escolhido pelos Estados Unidos, mas não avançou
A Boeing mal conseguia atender a demanda para o 707, 727 e 737 quando se tornou a favorita na competição pelo SST. O nome pouco criativo contrastava com a infinidade de conceitos estudados e apresentados para o supersônico de Seattle. Entre os conceitos apresentados estava uma versão com asa em delta, em uma configuração similar à adotada pelo Concorde, seguida de uma variante com asas de geometria varável. O nariz móvel também tinha uma versão com duas articulações e uma com o bico descendo inteiro, como o adotado pelo rival franco-britânico. Ainda havia um estudo com canards, que o aproximava do Tupolev 144. Por fim, em uma das variantes, batizada Boeing 733, com asas de geometria variável, o bico e posição do cockpit complexos. Em 1971, a Boeing cancelou o projeto.
Variação civil do complexo e problemático XB-70 Valkyrie
Um dos mais curiosos projetos da concorrência para o SST norte-americano foi o NAC-60. A North American havia investido milhões de dólares e anos de estudo no projeto do bombardeiro estratégico supersônico XB-70 Valkyrie. O gigantesco avião era impulsionado por seis motores GE YJ93-GE-3, que geravam nada menos que 28.000 lbf de empuxo unitário, permitindo ao bombardeiro experimental ultrapassar Mach 3. Contudo, o projeto era tão complexo que sua viabilidade era quase nula. Um acidente com um dos protótipos levou ao cancelamento imediato do programa. A proposta inicial da North American foi oferecer um avião derivado do Valkyrie, em uma versão simplificada do projeto, que continuava tão inviável que nem sequer foi levado em frente.
Após a queda do muro de Berlim
Em meados da década de 1990, após o colapso da União Soviética, os russos passaram a buscar parcerias com empresas ocidentais, oferecendo seus amplos centros de pesquisas em troca de parceiros externos. A Gulfstream foi uma das pioneiras em se associar aos russos, em um projeto que buscava viabilizar um avião de negócios supersônico. O programa S-21 prometia um avião capaz de voar a Mach 2 por até 4.600 milhas náuticas, com seis passageiros a bordo. A crise econômica de 2008 inviabilizou a continuidade do programa.
Uma versão ainda maior do que o primeiro
Após o Tu-144 se demonstrar pouco viável, até mesmo para os padrões soviéticos, a Tupolev iniciou estudos para um novo projeto. Em 1979, foi criado um grupo de pesquisas para desenvolver um avião supersônico de grande capacidade e alcance. Estimava-se que a nova aeronave poderia voar a Mach 2.2 por distâncias de até 10.000 quilômetros, com 300 passageiros a bordo. O programa avançava a passos lentos na década de 1980, sentindo os efeitos da mudança de rumo da União Soviética. Em 1993, com o fim do antigo regime comunista, o programa foi encerrado sem gerar nenhum projeto embrionário. Um dos destaques era o uso de câmeras para permitir aproximações para o pouso sem a necessidade de rebater o nariz do avião.
Durante a corrida pelo supersônico norte-americano, outros projetos chegaram a ser cogitados, como um avião da Douglas, mas que não passou da fase preliminar. Além disso, nos últimos anos alguns conceitos foram estudados, todos sendo exibidos apenas em apresentações digitais, sem sequer chegar a virar um projeto avançado.