Novo SR22 Plus, um dos destaques da Labace 2011, chega para consolidar a posição de liderança da cirrus no país entre os monomotores de quatro assentos
Décio Corrêa | Fotos Ricardo Beccari Publicado em 07/11/2011, às 09h59 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45
Fabricante norte-americano desenvolveu uma versão especial para atender às exigências do consumidor brasileiro |
O Cirrus é o monomotor de quatro assentos mais vendido do mundo. Um fenômeno comercial que acaba de ultrapassar a barreira das 5.000 unidades homologadas em pelo menos 60 países na última década. No Brasil, seu distribuidor exclusivo, a Maule, de Jundiaí, no interior de São Paulo, já comercializou cerca de 270 unidades desde maio de 2005, mês da primeira entrega, o que reitera a importância desse pequeno notável na renovação da frota nacional de aeronaves leves. De acordo com dados da Abag (Associação Brasileira de Aviação Geral), de cada dois monomotores a pistão que entraram no país nos últimos cinco anos, um era Cirrus. Tamanho sucesso não impediu o fabricante norte-americano de amargar momentos difíceis depois da eclosão da crise financeira de 2008, a exemplo do restante da indústria aeronáutica. Mas hoje, apesar das previsões pessimistas em relação à economia europeia, a consolidação da fusão com a Caiga (China Aviation Industry General Aircraf) e o anúncio de um cofundador como novo comandante da empresa abrem perspectivas promissoras para a marca. Conheci o atual presidente da Cirrus, Dale Klapmeier, em 1995, durante a feira de Oshkosh. Na ocasião, ele apresentava o mock-up de seu avião construído em material composto, inspirado nos Lancair. Ali tive a certeza de estar diante de um projeto visionário.
A tecnologia embarcada, o design e a performance são características marcantes nos aviões da família Cirrus. Mas o grande segredo desse monomotor talvez seja sua segurança. Ele conta tanto com o revolucionário sistema CAPS, um paraquedas capaz de colocar a aeronave em segurança no solo no caso de emergência, como também com airbags nos cintos de segurança. Intuitivamente, pilotos e passageiros passam a sentir-se como se tivessem o seu próprio paraquedas. Exagero? Não creio. Segundo a Cirrus, 36 vidas já foram salvas por conta da abertura do paraquedas de 16 aeronaves. Além disso, é um avião com custo operacional baixo, capaz de realizar missões por instrumentos, incluindo as noturnas, o que permite a seus proprietários voar mais. "Levantamentos feitos com oficinas de manutenção mostravam um uso médio de um monomotor a pistão por ano em torno de 120 a 150 horas. Com a entrada do Cirrus no mercado, a média subiu para 250 horas voadas por ano", garante o comandante Sergio Beneditti, presidente da Maule do Brasil e responsável pelo lançamento da Cirrus no país.
Material composto garante limpeza aerodinâmica aos modelos da família Cirrus |
De tempos em tempos, a Cirrus apresenta dezenas de pequenas e grandes mudanças em todos os seus sistemas, chegando a desenvolver unidades inteiras, como é o caso do Garmin Perspective, em parceria com a Garmin. O SR22 Plus, apresentado pela primeira vez na Labace 2011, é a mais recente versão desenvolvida pela Cirrus. Nas palavras de Sergio Beneditti, a fábrica idealizou o 22 Plus especialmente para atender à demanda do consumidor brasileiro. "A Cirrus criou uma versão com o conforto e o acabamento que o passageiro daqui exige e o equipamento que o piloto sonha, porém, mantendo uma boa distância do preço do modelo GTS, o top de linha da marca", ele diz. O SR22 Plus vem equipado com todos os aviônicos Garmin Perspective, necessários a uma diminuição do work load (carga de trabalho do piloto na cabine), proporcionando um voo mais confortável e seguro. O avião ostenta, ainda, cartas de saída e aproximação digitais, aviso de proximidade de mau tempo (Stormscope), aviso de proximidade de outras aeronaves (TCAS), aviso de proximidade do terreno (TAWS), visão sintética no display primário de voo e piloto automático completo de última geração.
No quesito conforto, o Plus vem equipado com sistema de ar condicionado, poltronas em couro e acabamento de primeira classe, padrão Cirrus. Na pintura, o comprador poderá exercer a opção em seis cores exclusivas. A Cirrus oferece, ainda, somente para esse modelo e por tempo limitado, três anos de garantia - para a versão standard são dois anos -, quatro fones Bose A-20 de última geração, com conexão para MP3, e um ano de assinatura das cartas Jeppesen. Também acompanham o avião capas internas e externas, tapetes e kit de amarração, além de um kit de estudos do SR22 e um curso de transição prático com 10 horas de voo com um instrutor Cirrus. A diferença entre o SR22 GTS e o Plus é que o primeiro vem com o piloto automático GFC 700 e o segundo, com o S-TEC 55 X. As telas do GTS são de 12 polegadas e as do Plus, de 10 polegadas. O GTS conta ainda com o ESP (Sistema de Proteção de Velocidades), alarmes para altas e baixas velocidades e curvas com demasiada inclinação. O GTS também incorpora o EVS (Visão Infravermelho Noturna) e pintura especial GTS. Pessoalmente, considero a diferença de 90.000 dólares penderem favoravelmente para o Plus.
Os 310 cavalos dão segurança e potência de sobra às operações |
Checklist digital
Chego à sede da Cirrus, em Jundiaí, animado para o ensaio do PP-CIP. Nosso destino será o belíssimo condomínio aeronáutico Fazenda Bonanza, que fica entre as cidades de Sorocaba e São Miguel Arcanjo, no Oeste do estado de São Paulo. Nessa primeira etapa, decolarei com mais três a bordo, o comandante Coppini, instrutor da Cirrus do Brasil, o fotógrafo Ricardo Beccari e o editor de AERO, Giuliano Agmont. A missão envolverá pouso completo na Fazenda Bonanza, desembarque dos passageiros e decolagem para as fotos da aeronave em voo a partir do solo. Não será uma tarefa fácil, pois terei de manobrar o Cirrus em curvas a baixa altura, sempre na objetiva do Beccari. A excelente manobrabilidade dessa máquina fará toda a diferença.
Check externo completo, passageiros e tripulação a bordo e iniciamos os procedimentos para o acionamento. O padrão recomendado pela Cirrus prevê um minucioso checklist para tripulantes e passageiros, especialmente no que diz respeito a emergências, como no caso de necessidade de acionamento do paraquedas. Todos devem estar brifados sobre esses e outros procedimentos - como a evacuação da aeronave, em caso de um capotamento, por exemplo. Pode parecer exagero ou excesso de cautela, porém, essas e outras recomendações são o que fizeram a fama da marca.
Switch de bateria ON, switch de painel e rádios ON e aguardamos que o painel seja energizado. Página do checklist selecionada e iniciamos o nosso procedimento de verificações. O interessante é que na página "Iniciar" o sistema procura identificar o nível de proficiência do piloto, por meio de uma tabela com mínimos de horas voadas no ano e nos últimos 30 dias. Ali começa uma minuciosa lista de verificações com a seleção de cada procedimento. Existem itens que só permitem o prosseguimento do checklist se o piloto cumprir o item anterior. Bem diferente dos antigos checklist de papelão, em que determinadas recomendações importantes podiam ser inadvertidamente saltadas. Várias recomendações, diferentes das usuais, foram incorporadas. Cito, porém, esta, bastante interessante: após o acionamento do motor e o cumprimento de alguns procedimentos, enquanto o propulsor aquece, recomenda-se trocar a seletora do tanque - do direito para o esquerdo ou vice-versa - e prosseguir com o tanque selecionado durante todo o táxi, até o ponto de espera e checklist de cabeceira, no qual o piloto retorna a seletora para a posição inicial do tanque, antes da decolagem. Essa recomendação pode indicar a presença de água no tanque ou a ausência de combustível, por conta de uma verificação visual incorreta ou falha. Caso haja qualquer um desses problemas, o motor irá parar no táxi e não durante ou após a decolagem.
Arranque vigoroso
Checklist completo, autorização de acionamento e táxi concedido, ar-condicionado ligado, temperatura interna agradável e iniciamos o táxi para a cabeceira 18 da pista de Jundiaí. Noto que o táxi e a dirigibilidade no solo estão melhores e mais macios, em razão da substituição dos anéis de borracha do amortecedor de bequilha (tipo Mooney) por amortecedor hidráulico. Mesmo sem os headphones, o nível de ruído interno é quase inexistente. Com os fones Bose A-20 com noise reduction, a comunicação a bordo é perfeita. Verificações e procedimentos before take-off concluídos, seletora girada para o tanque inicial e ingressamos na pista para decolagem sem parada. Aeronave alinhada na faixa central, pedal direito levemente calçado e levo o manete de potência até o batente. Liberados todos os 310 cavalos, o arranque é vigoroso. O balizamento lateral da pista passa por nós numa velocidade impressionante.
Com 80 nós, faço uma leve pressão no manche e o Plus sai do chão. Deixo acelerar para 90 nós e iniciamos uma subida acentuada, ganhando altura. Baixo o nariz, recolho os flaps e continuamos ganhando altura para girar à esquerda e ingressar na perna do vento. Cruzamos por sobre a pista, na proa de Itupeva, mantendo 4.000 pés. Nivelados, reduzo a potência para 75% e a VI (velocidade indicada no instrumento) dispara para 164 nós (304 km/h) e a VS (velocidade no solo) é de impressionantes 187 nós (350 km/h). Passamos o través de Itupeva, de Indaiatuba e em menos de 10 minutos já estamos na vertical da cidade de Itu, onde giramos à esquerda na proa de Sorocaba. O dia está perfeito para o voo, mesmo com uma pequena turbulência em razão da baixa altitude. Somos quatro homens corpulentos, com cerca de 380 quilos de peso, mas o conforto a bordo é total e a temperatura interna gira em torno dos 24 graus.
Cruzamos a rodovia Castello Branco, deixando a cidade de Sorocaba ligeiramente à nossa direita e aproamos a pista da Fazenda Bonanza. Faltando cinco minutos para a vertical da pista, iniciamos uma suave descida, com a nossa velocidade disparando para 180 nós indicada. Como nunca pousei nessa pista, faço uma passagem baixa para verificação e constato que a cabeceira em uso é a Norte, já que estamos com 12 nós de vento de cauda na cabeceira oposta. Para quem não está habituado, o pouso nessa cabeceira é bastante complicado, uma vez que a extensão da pista é muito curta e o primeiro quarto dessa cabeceira, descendente. Para complicar, o alinhamento da reta final passa por sobre um morro, bastante alto, com um reflorestamento de eucaliptos.
Dupla arremetida
Faço uma primeira aproximação curta e, mesmo passando bem baixo por sobre o morro e os eucaliptos, tenho de baixar o nariz para me enquadrar no profile ou rampa de aproximação e não consigo desembalar o Cirrus, apesar de full flaps. Sou obrigado a arremeter porque a velocidade de cruzamento da cabeceira está muito alta para o comprimento da pista. Faço um novo tráfego, um pouco mais longo, e me vejo na mesma situação - velocidade de cruzamento ainda muito alta. Estou preocupado em não baixar muito a velocidade de aproximação porque os dois passageiros mais pesados estão nos bancos traseiros, bem como todo o material fotográfico. Definitivamente, o balanceamento da aeronave não é o ideal. Novo tráfego, dessa vez na distância correta da reta final, reduzo bem a velocidade e mantenho uma reta bastante baixa sobre as árvores. Mergulho um pouco e percebo que essa é a forma correta de pousar nessa cabeceira. A Cirrus recomenda uma pista mínima de 714 metros com obstáculos de 50 pés. Nosso "morrinho", com os eucaliptos, deve ultrapassar fácil 120 pés e a pista chega a 600 metros, isso a 2.500 pés de altitude e com temperatura alta.
Rodamos para o estacionamento gramado e o Beccari aproveita para tirar mais algumas fotos de solo. O lugar é simplesmente maravilhoso, nada deve a condomínios americanos ou europeus. Se tivesse um velho Buecker, Stearman, Fleet ou um Tiger Moth, este seria o meu lugar perfeito. Equipamento fotográfico preparado, motor acionado e rolamos para a cabeceira oposta a que pousamos, apesar do vento de cauda, para que tenhamos um foto do Plus decolando. A valentia da nossa cavalaria nos põe em voo em pouco mais da metade da pista e iniciamos as nossas passagens em curva. Como previa, é uma tarefa bastante desconfortável, que exige muita concentração do piloto e manobrabilidade da máquina. Temos de manter curvas apertadas de 360 graus a não mais de 100 pés constantemente, revertendo as curvas para os dois lados para dar perspectivas e fundos diferenciados ao fotógrafo. Nesse tipo de trabalho delicado é fundamental contar com um companheiro com a experiência do comandante Coppini, que me passa informações sobre velocidades, altura e proas adequadas, além de se comunicar com o fotógrafo.
SR22 Plus manteve linhas externas dos aviões Cirrus |
Fotos encerradas, todos a bordo e nos preparamos para deixar o condomínio. Cumpro o checklist, aciono o motor e rolamos para a cabeceira para a decolagem de retorno. Apesar da reserva de potência do Cirrus, decolar de uma pista curta, nessa altitude e em temperatura alta, torna alguns procedimentos desejáveis. Utilizo os últimos metros disponíveis da cabeceira, alinho na faixa central, com aeronave configurada para flaps take-off, aplico os freios, levo a potência até o batente e aguardo a rotação do motor subir. Quando ela atinge o seu pico, calço o pedal direito, libero os freios e mantenho o manche suavemente picado. Isso para o caso de o compensador não estar configurado em neutro ou a aeronave apresentar alguma tendência em erguer o nariz e elevar o ângulo de ataque das asas antes do tempo. O desejável é que ela não apresente nenhum arrasto antes da rotate (pressão no manche para a decolagem). Iniciamos a corrida e, com pouco mais de meia pista, já temos velocidade para decolar. Mantenho o nariz baixo para ganhar velocidade e iniciamos uma subida suave, "limpando" os flaps após 500 pés. Coppini seleciona proa direta para a cidade de Itupeva e deixamos a cidade de Sorocaba à nossa esquerda.
O melhor pouso é como nos jatos: com um pouco de motor e sem "arredondar"
Depois de desviarmos de uma grande pedreira, por orientação do Coppini, por conta do risco de explosões, cruzamos novamente a rodovia Castello Branco, mantendo agora 3.500 pés, altitude limite para a área, deixando a cidade de São Roque à nossa direita e enfrentando bastante turbulência, em virtude da hora e da porção final da Serra do Japi. Já próximo a Itupeva, aproveito para conferir a performance do nosso pássaro durante os estóis. Com a aeronave limpa, sem flaps e com 12 polegadas no Manifold, conferimos 70 nós. Já na configuração com full flaps, a velocidade cai para 58 nós. Considerando que estamos próximos do peso máximo de decolagem, as velocidades são bastante baixas, obrigando-nos a manter o manche cabrado quase no batente para que ele se entregue. Mesmo assim, os estóis são doces e sem qualquer tendência para queda de asa. A harmonia de comandos melhora a cada novo refinamento aerodinâmico da Cirrus. Na pilotagem manual, sem o auxílio do piloto automático, em condição de turbulência moderada, existe uma tendência em apresentar um ligeiro "galope", com pequenas variações de altitude, motivado pelo posicionamento do CG (centro de gravidade) e da velocidade elevada. Com o piloto automático acionado, não se observa essa tendência. Na verdade, o Cirrus foi desenvolvido para voar no piloto automático, sendo desejável que o piloto pratique o voo manual apenas para manutenção da sensibilidade de pilotagem, durante as operações de pousos e decolagens ou em condição de turbulência severa, onde não se recomenda o uso do PA.
Gostei Não gostei - |
Diferenças imperceptíveis
Avaliação encerrada, aproamos Jundiaí. Somos autorizados a cruzar por sobre a pista e ingressar na perna do vento para a cabeceira 18. Com tráfego à frente, já ingressando na reta final, giramos perna-base, configurando nossa aeronave para o pouso. Flap landing aplicado, velocidade reduzida para 90 nós e giramos para a reta final. Flaps na posição full, velocidade reduzida para 80 nós e cruzamos a cabeceira com 75 nós, trazendo o manete para Idle (manete todo recolhido). Esse não é um bom procedimento de pouso para o Cirrus, exatamente pelo posicionamento do CG e pelo ângulo de ataque da asa. O ideal é que se faça um pouso tipo jato ou turbo-hélice: sempre com um pouco de motor e sem "arredondar". Nesse caso, o toque é suave e sem aquela indesejável flutuada. As diferenças entre o Plus e o GTS são absolutamente imperceptíveis para aqueles que não se guiam pelo preciosismo. Acho que a relação custo-benefício do piloto automático GFC 700, do EVS (Visão Infravermelho Noturna) e da pintura especial GTS não compensa. O mesmo vale para as telas. Não há prejuízo operacional na mudança das versões de 12 polegadas para as de 10 polegadas. Quanto ao sistema de proteção de velocidades e curvas com demasiada inclinação, sugiro um bom curso de familiarização com a aeronave, leitura criteriosa do manual e bom senso na pilotagem.
SR22 Cirrus Plus TRÊS VISTAS IVAN PLAVETZ | |
Fabricante: Cirrus Envergadura: 11,68 m Decolagem: 1.028 pés - 313 metros Mais informações: www.cirrusaircraft.com.br |