Simuladores para helicópteros

Novos critérios para formação de pilotos somados aos benefícios em relação ao voo real impulsionam treinamentos em cabines virtuais de aeronaves com asas rotativas

Solange Galante | | Fotos Divulgação Publicado em 11/07/2013, às 08h01 - Atualizado em 02/08/2013, às 23h39

A publicação do novo RBAC 61 precipitou nos centros de ensino do Brasil investimentos em simuladores de voo, os chamados Flight Simulator Training Devices (FSTD), ao ampliar as exigências em relação à formação IFR para pilotos comerciais, incluindo aqueles ainda não habilitados para voar por instrumentos. No mercado de asas rotativas, o pacote de mudanças, anunciado em julho de 2012, teve um impacto direto. Pela nova legislação, que passará a valer a partir de 22 de junho de 2014, 10 das 100 horas exigidas para obtenção da licença de Piloto Comercial de Helicóptero (PCH) serão necessárias e obrigatórias para instrução IFR. Para a Anac, esse incremento de instrução IFR, mesmo para os pilotos que voam visualmente, tende a facilitar o compartilhamento do espaço aéreo. Além disso, reconhecem as escolas, os simuladores de voo permitem não apenas o acúmulo de horas de treinamento em voo para qualificação de pilotos e alunos de pilotagem com custos mais baixos como, também, e principalmente, o exercício de determinadas situações de pane com grande realismo e sem risco à vida dos profissionais.

O RBAC 61 foi publicado no ano passado e as exigências seriam cobradas após um ano de sua publicação, ou seja, neste meio de ano, mas, no início de junho último, o prazo foi prorrogado, o que não desfez o movimento das escolas para se enquadrar às novas regras. Mesmo porque, as organizações de ensino que não tiverem um simulador ou um helicóptero para treinamento "sob capota" deixarão de formar PC quando a nova legislação, que vale também para aviões, entrar em vigor.


Simulador AATD da Edra

O CUSTO DE HORA DE VOO EM SIMULADOR É MUITO INFERIOR AO DO HELICÓPTERO REAL

Para formação IFR, o requisito será de 40 horas de voo, das quais 25 poderão ser cumpridas em simulador AATD (entenda as diferente categorias de simuladores no box ao lado) para treinamento básico e avançado. Essas 25 horas substituem 20 das 40 horas necessárias e 20 em ATD enquanto as outras 20 devem ser realizadas em helicóptero equipado e homologado para o treinamento IFR "sob capota" ou, então, serem realizadas 10 horas num BATD e 30 "sob capota". Para o piloto PC, serão necessárias 10 horas em IFR, podendo ser cinco delas em simulador e cinco "sob capota". Nos simuladores, o treinamento é mais exigente do que no voo real e o equipamento permite ao aluno ou piloto fazer o exercício sem se sujeitar às limitações dos aeroportos mais congestionados, como Congonhas, Guarulhos e Viracopos, facilitando o treinamento IFR. Além disso, o simulador permite a realização de manobras de emergência com mais segurança e menor investimento, já que o risco e o custo de se treinar em aeronave real são mais elevados. Rodrigo Scoda, diretor da Edra Aeronáutica compara os valores: "O custo de hora de voo em um helicóptero sob capota na nossa escola é R$ 1.495,00 e, no simulador, US$ 272,00". Nas próximas páginas, mostramos os principais simuladores de helicópteros disponíveis no Brasil, alguns deles com acesso restrito.

BRAVIO

A Bravio Brasil Avionics foi a primeira empresa brasileira a produzir e certificar um simulador de voo para helicópteros, em 2007 - até então, não existia nada de simulação em aeronaves de asas rotativas no Brasil. O primeiro simulador da empresa foi montado usando uma cabine real de helicóptero Esquilo AS350 B2. Em paralelo, foi criado outro para atender ao treinamento de pilotos em Schweizer 300CBi. Mas, como alguns pilotos em treinamento fizeram manobras indevidas - looping e touneau -, que não foram suportadas pelos instrumentos analógicos, provocando muitos defeitos mecânicos, os dois simuladores foram modernizados usando displays no painel e ambos foram certificados pela Anac em setembro do ano passado como AATD. Como a Bravio não é uma escola, os simuladores são operados pela ABC Fly. Ambos foram criados pelo coronel Otacílio Soares de Lima, ex-comandante do Grupamento de Radiopatrulha Aérea da PM paulista. A última criação de Otacílio é o Sky Knight (Cavaleiro do Céu), que não é baseado em nenhum modelo específico de helicóptero e tem o objetivo de proporcionar experiência de voo o mais real possível tanto para pilotos em treinamento quanto para curiosos sem nenhuma hora de voo no currículo. O Sky Knight está prestes a ser certificado para treinamento pela Anac - bastando, para isso, apenas a instalação de um GPS - e dois deles serão instalados em breve para servir como atração no Campo de Marte. A Bravio tem capacidade para produzir quatro simuladores ao mês e, segundo Otacílio, já há escolas interessadas em adquirir o dispositivo para treinamento.

EDRA

A Edra Aeronáutica, de Ipeúna (SP), possui um simulador AATD fabricado pela empresa norte-americana FLYIT. Aproximadamente 50 pilotos já foram formados desde que o simulador, que é específico para helicópteros a pistão (Schweizer e Robinson), foi instalado e certificado. Segundo Rodrigo Scoda, diretor da Edra, o investimento da escola foi de aproximadamente US$ 350 mil. Ele simula não só horas de voo IFR, mas procedimentos como RNAV, arco DME e emergências visuais, incluindo autorrotação.

GO AIR

A Go Air, do Campo de Marte, possui um simulador ATD que atende ao treinamento em equipamentos Robinson R22 e R44, operando desde novembro de 2012. Segundo Thiago Tavares Barreto, auxiliar de coordenação, ele foi homologado só para treinamento IFR, mas já está sendo homologado também para voos visuais. O simulador atende 10 a 20 alunos ao mês e é um dispositivo particularmente vantajoso para quem treina no congestionado Campo de Marte. "Levamos no aeroporto, em média, de seis a 12 minutos, dependendo do dia, para fazer uma decolagem. Com o simulador, o aluno ganha mais na hora de voo que ele paga, não perde tanto tempo aguardando, podendo se dedicar só às manobra", diz Barreto. "Além disso, depois de passar pelo simulador, o aluno sente muito mais facilidade no helicóptero real".

AS DIFERENTES CATEGORIAS

No Brasil, os simuladores precisam ser certificados pela Anac e recebem diferentes designações

- PCATD (Personal Computer based Aviation Training Device)
Representa uma aeronave genérica, ou seja, não é um dispositivo a ser usado para crédito de horas de treinamento em voo para a obtenção de uma habilitação de tipo. Somente conta créditos de horas de treinamento de voo por instrumentos (IFR).

- FSTD (Flight Simulation Training Device), dividida em FTD (Flight Training Device) e FFS (Full Flight Simulator)
FTD pode representar uma aeronave genérica ou ser específico para a obtenção de uma determinada habilitação de tipo. Recebe classificação em níveis de 4 a 7, sendo este último o mais avançado.
FFS é o top de linha em simulação, pois reproduz fielmente um determinado tipo de aeronave. É classificado em níveis de "A" a "D", sendo este último o mais avançado, capaz de realizar todas as manobras e procedimentos necessários à obtenção de uma habilitação de tipo.

- ATD (Aviation Training Device), dividida em BATD (Basic ATD) e AATD (Advanced ATD)
BATD representa uma aeronave genérica e segue o mesmo critério de crédito de horas de voo de um PCATD, ou seja, o acúmulo de horas para treinamento é restrito a 50% das horas que seriam acumuladas em um simulador de voo FFS ou dispositivo de treinamento de voo FTD de uso autorizado pelo RBAC 61 (que trata de licenças, habilitações e certificados para pilotos) ou pelo RBAC 141 (escolas de aviação civil) para o treinamento no curso de IFR. AATD é um dispositivo que cumpre requisitos adicionais em relação ao BATD. Para o crédito de horas, seguem os critérios de um FSTD, ou seja, são consideradas 100% das horas que seriam acumuladas em um FFS ou FTD de uso autorizado para o curso de IFR, dentro dos limites fixados nesses regulamentos.

BHS

A BHS, empresa de táxi-aéreo que opera helicópteros para atender ao mercado de óleo e gás brasileiro, utiliza um Full Flight Simulator terceirizado de última geração, nível "D", da CAE, para os modelos de helicópteros Sikorsky S76C++ e envia os pilotos para o exterior no caso dos modelos Sikorsky S92 e Eurocopter EC225. Mas há um simulador FNTP (Flight Navigation Training Procedures), que é um ATD, na própria empresa, em Macaé (RJ), da marca Elite, modelo Evolution S723. Segundo Rodrigo de Freitas Lima, gerente de Vendas e Contratos da BHS, o FNTP foi adquirido por US$ 270,000.00 e instalado em 2009. "No momento, somente pilotos da própria empresa treinam nele".


O simulador ATD da Go Air é particularmente vantajoso para quem treina no congestionado Campo de Marte

EXÉRCITO

Na área militar, o Exército Brasileiro se destaca no uso de simuladores em treinamento. Em Taubaté, no CIAvEx (Centro de Instrução de Aviação do Exército), há um simulador categoria PCATD a ser certificado em breve pela Anac como AATD para o modelo Esquilo. Em São Paulo, encontra-se outro equipamento, o Shefe (Simulador de Helicóptero Esquilo e Fennec), que é uma versão militar do Esquilo. O Shefe é um FTD nível 4, mas já com previsão de ser homologado no final deste ano como FFS nível B, também atendendo ao Esquilo. No CIAvEx, a simulação teve início no ano de 2002, mas só a partir de agosto de 2008 foram instaladas cinco cabines e um centro de operações que começou a funcionar efetivamente em 2010. Em São Paulo, o equipamento foi instalado a partir desse mesmo ano e começou a ser empregado para instrução em 2012. O Curso de Pilotos de Aeronaves (Curso de Formação Básica de pilotos) de 2012 iniciou pioneiramente a fase de voo no simulador Shefe e tornou-se um marco para a aviação do Exército: pela primeira vez uma turma teve a oportunidade de iniciar a fase de voo em um simulador com movimento.

Hoje, aproximadamente 350 pilotos já passaram pelos simuladores do Exército Brasileiro, que investiu cerca de R$ 4.635.000 no Shefe e cerca de R$ 600.000 no simulador instalado em Taubaté. O coronel Luiz Antônio Carvalho Silva, chefe da divisão de simulação, lista, entre as vantagens do uso do simulador, a economia de recursos - a hora de voo em simulador gira em torno de 10% da hora de voo real -, o incremento da segurança de voo com treinamentos de CRM e LOFT e o aperfeiçoamento dos treinamentos no Curso de Piloto de Combate com o emprego virtual de quatro helicópteros ao mesmo tempo, possibilitado o desenvolvimento das ações de um pelotão ou uma seção de helicópteros nas operações de combate. "Outra característica de suma importância é poder realizar treinamentos sob quaisquer condições meteorológicas e, graças aos simuladores, deixam de ser despejados na atmosfera milhões de metros cúbicos de resíduos de combustível queimado", diz o coronel Carvalho Silva. Os simuladores utilizados pelo Exército já atenderam também a pilotos de diversas policias, civis e militares, incluindo representantes de outros países. Hoje, a CIAvEx está com a missão de criar uma Divisão de Simulação para atender às necessidades da Aviação do Exército e ter, no futuro, simuladores FFS, FTD, PCATD e AATD de aeronaves empregadas pela sua Aviação.

CAE

O mais avançado simulador de voo para helicópteros do Brasil é administrado pela CAE South America e foi instalado em um centro de treinamento próximo ao aeroporto de Congonhas (SP). Trata-se do Full Flight Simulator (FFS) de Sikorsky S-76C++, resultado da joint venture com a Líder Aviação anunciado 2011. A Líder informa que investiu R$ 10 milhões no equipamento. Ela é justamente a maior operadora dos helicópteros S-76 do país e possui mais de 200 pilotos habilitados para operar no setor de petróleo e gás, mas o equipamento também está disponível para outros operadores desse helicóptero, como a BHS. O equipamento foi inaugurado em novembro do ano passado e está certificado na Anac como Nivel D. Existem apenas outros quatro simuladores como esse em todo o mundo: três estão nos Estados Unidos e um na Inglaterra. "O simulador permite que nossos pilotos façam, internamente, treinamentos periódicos, que simulam situações de emergência, sem que seja preciso enviá-los ao exterior. Isso garante maior capacitação e ainda mais segurança para as operações", afirma Junia Hermont, superintendente da Líder Aviação. O simulador disponível na CAE é capaz de operar 5.000 horas por ano e por 20 horas ininterruptas, e tem capacidade de projetar tanto operações em cenários urbanos, quanto voos para plataformas petrolíferas em alto mar. Também possui monitores em alta definição, que incluem representações das chamadas chin windows, que simulam as janelas situadas no assoalho do helicóptero, auxiliando os pilotos no momento do pouso. A Líder informa, ainda, por meio da assessoria de imprensa, que o número de horas utilizadas por mês está em torno de 350 a 400 horas e o simulador está alcançando o resultado esperado para o início da operação, com uma ocupação média de 60%.


A esquerda, o Simulador de Helicóptero Esquilo e Fennec (Shefe) do Exército Brasileiro é um FTD nível 4 que será homologado em breve como FFS nível B. A direita, o simulador PCATD de Taubaté, que será certificado em breve pela Anac como AATD

HELIBRAS

A Helibras anunciou durante a última LAAD, realizada este ano no Rio de Janeiro, os detalhes da construção de um Centro de Treinamento e Simuladores de Voo dos helicópteros EC725 e EC225, que já estão sendo produzidos no novo hangar da empresa, em Itajubá (MG). O novo Centro da Helibras já nasce com a capacidade de receber dois FFS. Atualmente, está em andamento o projeto do primeiro deles. A aquisição e instalação do segundo FFS está em estudos e dependerá das necessidades de treinamento dos operadores brasileiros. O simulador terá duas bases de dados, uma para os operadores militares e outra para os operadores civis, o que permitirá que o treinamento seja o mais próximo possível de cada realidade operacional, seja para os pilotos do mercado de óleo e gás, com o EC225, seja para os pilotos militares que operam o EC725. "A existência de um FFS no Brasil representa custos inferiores, e menos tempo de ausência dos pilotos fora de sua base. O fato de o curso ser ministrado em português também é uma vantagem para brasileiros e para pilotos de países africanos de língua portuguesa", comenta Flávio Pires, vice-presidente de Suporte & Serviços da Helibras. O Rio de Janeiro foi estrategicamente escolhido para a instalação do Centro de Treinamento e Simuladores, que deverá ser inaugurado no último trimestre de 2014, em função da proximidade com operadores militares e de offshore.

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