Companhias internacionais estão recrutando pilotos prejudicados pela crise nas empresas aéreas brasileiras
Por Robert Zwerdlings Publicado em 03/09/2013, às 00h00 - Atualizado às 22h35
A aviação comercial brasileira atravessa mais uma vez um período de baixa, com queda no movimento de passageiros e redução na oferta de assentos. Não é exatamente uma novidade, já que esse mercado, pelo menos no Brasil, obedece a ciclos. E o país está na trajetória descendente. Mas essa situação preocupante não deve durar por muito tempo. A realização da Copa do Mundo de 2014, as privatizações de aeroportos e os novos investimentos em aeródromos regionais, além da própria recuperação na economia mundial, mesmo que lenta, devem trazer de volta o aumento na demanda por passagens aéreas nos próximos 12 ou 18 meses. É claro que a situação econômica das companhias aéreas brasileiras poderia estar um pouco melhor se não fosse o chamado “Custo Brasil”, que dilapida mais de 40% do faturamento para pagamento de combustível, taxas e impostos – nos Estados Unidos, esse custo costuma ser inferior a 30% –, e a desvalorização cambial que vem pesando bastante no orçamento por uma série de fatores. São feitos em dólares os pagamentos de peças de reposição e fornecedores. O custo do combustível também sofre interferência da moeda norte-americana, considerando que o barril de petróleo atingiu a faixa de US$ 110. A expectativa de analistas de mercado é a de que o dólar feche 2013 com cotação mais alta do que a atual. Não há orçamento que resista.
Sem demanda ou qualquer sinal de reaquecimento, muitos voos estão sendo reprogramados. Onde antes existiam três voos partindo no período da manhã, reduz-se para uma única operação em aeronave de maior capacidade ou se cancela a operação onde há prejuízos significativos. Além da redução da oferta, a reformulação da malha também vem implicando na redução no número de horas voadas, com reflexos nos quadros de funcionários das linhas aéreas e dispensa de pilotos e comissários de voo. Alguns aderiram a programas para demissão voluntária ou licença sem vencimento, com possibilidade de retorno assim que a crise for superada.
Para os que ficam fora do voo, uma opção, especialmente para os aviadores que tenham inglês no nível ICAO e menos de 50 anos de idade, é buscar vagas em companhias aéreas estrangeiras, que já estão no Brasil para convocar os candidatos. A burocracia não é muita e os primeiros testes são agendados em curto espaço de tempo. Além da possibilidade de melhorar o inglês, voando no exterior, os pilotos terão contato com novos tipos de cultura, com ganho em qualidade de vida, segurança e boa remuneração, além de outros bônus, como direito a passagens com reservas para a família. O trabalho é duro, mas há o retorno financeiro e profissional.
Reinaldo Menegoli, comandante de Boeing 737-800 na FlyDubai, do grupo Emirates, diz que o padrão operacional da Varig foi fundamental para o sucesso dos brasileiros no exterior. “Os brasileiros são considerados bons pilotos em relação à habilidade, à segurança de voo, à padronização operacional, ao CRM, entre outros itens”, acredita. Segundo o piloto, as empresas aéreas da região oferecem pacotes que incluem o auxílio moradia, escola para os filhos de tripulantes, plano de saúde e transporte, além do pagamento de horas extras, mínimo de oito folgas por mês, mais férias de 42 dias por ano, que podem ser divididos a critério do tripulante. “Também há liberação de passagens aéreas com desconto, além de pelo menos uma passagem confirmada para o tripulante e seus familiares todo ano”.
No exterior, os pilotos terão contato com novos tipos de cultura, com ganho em qualidade de vida, segurança e boa remuneração
No caso da Korean Airlines, os pilotos estrangeiros possuem um tipo de contrato chamado de comuting contract, ou seja, trabalha-se por um período e folga-se no outro. Rafael Santos, comandante de Boeing 777 na KAL, explica que os pilotos fazem isso todo mês: “Trabalhamos em torno de 16 dias e o resto do período utilizamos para o deslocamento para o país ou cidade que escolhemos para morar, além das folgas. Não há necessidade de se morar em Seul, a capital coreana. O piloto só precisa informar aos funcionários da escala de voos o local que pretende sair e para onde deseja voltar”.
Rafael Santos diz que os coreanos são extremamente padronizados, ordeiros e estudiosos, e os desvios são pouco tolerados, não existe o “jeitinho”. Na Coréia a formalidade também não pode ser esquecida, conta o brasileiro. “Não é o copiloto ‘fulano’ ou ‘beltrano’, mas Mr. Lee ou Mr. Kim”. Em compensação, a política de passagens aéreas da empresa é convidativa. “A companhia fornece passagens de cortesia para a família, com direito a reserva para todos, e não precisa entrar em listas de espera, pedir algum tipo de favor ou depender da sorte”. E o salário? “Maior do que o de qualquer aviador executivo top no Brasil”.
O piloto interessado em voar no exterior deve visitar as páginas eletrônicas das companhias aéreas para preencher o “application” (cv online) e aguardar a chamada. Também há diversas empresas que se especializam no trabalho de intermediação entre o aviador e a linha aérea. Resolvem mais rápido os trâmites burocráticos, sem falar nos chamados “roadshows” que são marcados com frequência no Brasil para convocação direta de tripulantes.
Mais uma dica: todas as companhias estrangeiras pedem o registro das últimas horas voadas em padrão internacional. Para acelerar esse processo, vale uma visita à página da MCC Pilot Logbook para baixar um programa que, em questão de minutos, prepara o material de acordo com a exigência de cada país.
Robert Zwerdling é comandante de Airbus A320