O espetacular traslado trimotor do superjumbo da Air France preso no Canadá

Conheça os desafios logísticos que os especialistas em manutenção e operações da empresa aérea aérea terão de enfrentar e as soluções criativas necessárias para cumprir o voo

Por Ernesto Klotzel Publicado em 19/10/2017, às 17h05 - Atualizado em 20/10/2017, às 17h56



Imagine o pesadelo que representa trasladar o gigantes superjumbo Airbus A380 de um aeroporto no Canadá - onde nunca pousaria normalmente - até a Europa, mais precisamente Toulouse, na França, sede do fabricante Airbus Industrie. Isso sem poder contar com seu motor 4 (o direito, próximo a extremidade da asa). Pode parecer filme ou seriado de TV, mas não é. Trata-se de uma missão real, que está revelando neste momento.

Ao sobrevoar a Groenlândia, um Airbus A380 da Air France na rota Paris-Los Angeles sofreu uma avaria muito séria na parte frontal do motor #4, que perdeu seu enorme “fan” em voo e, com ele, uma boa parte de componentes fixos e rotativos.

Durante cerca de duas horas, o A380 voou trimotor, enquanto os passageiros do lado direito podiam avaliar visualmente a magnitude do estrago feito: faltavam carenagens da enorme boca de entrada do ar e tudo mais que esta envolvia, além da complexa estrutura do entorno. Em suma, uma deformação impressionante.

O pouso de emergência foi realizado no limitado aerporto isolado de Goose Bay, ainda utilizado pela aviação militar, o primeiro local encontrado pelos pilotos para um pouso seguro. Os passageiros tiveram de esperar a bordo, pois o aeroporto não estava equipado com escadas e veículos de terra para atender ao ilustre visitante. Estes foram socorridos por dois jatos que os levaram a seus destinos.

O resgate 

Começava a fase logística-operacional para dezenas de engenheiros canadenses, americanos e europeus para resgatar a enorme aeronave, sem deixar de lado a necessidade de uma investigação profunda sobre as causas do ocorrido – tratando o incidente como objeto de uma análise séria e profunda.

Um grupo embarcou em um helicóptero, deslocando-se rapidamente para descobrir e colher peças e fragmentos que foram “expelidos” na desintegração do “fan” antes que a neve da Groenlândia as cobrisse.  

Quanto ao A380, ele continua no pequeno aeroporto canadense. A primeira tarefa para os investigadores da BEA, órgão de segurança de voo da França, é providenciar a retirada dos itens avariados – ainda ligados ao motor 4 – que deverão ser removidos cuidadosamente pelas equipes da Air France e Airbus do intradorso da asa.

O motor (que tem mais de 3 metros de diâmetro) será transportado por via aérea para as instalações da General Electric, em Cardiff, País de Gales. Como ele deve ser protegido para exames forenses, não teria sentido transportá-lo ainda montado em sua posição original. Se o motor permanecer montado, ao sabor da forte corrente de ar sua tendência é girar, agravando os danos, explica os especialistas. 

Motor novo inativo

A equipe vai montar um motor novo na posição 4, o que deve ser motivo de curiosidade pois ele não poderá ser utilizado para fazer companhia aos outros três no vôo de regresso à França. O substituto foi requisitado apenas para restabelecer o equilíbrio em torno do eixo longitudinal da aeronave. O plano exato, segundo a BEA, ainda está sendo estudado. É também possível que as equips não queiram fazer o novo motor funcionar durante o voo até que a estrutura da asa tenha sido examinada em detalhes.

Uma troca de motor em local remoto, longe da base principal de manutenção, não é caso tão raro e não deve levar mais de dois dias. A equipe treinada para estas operações pode ter de alugar, localmente, guindastes e outros equipamentos. Não é provável que Goose Bay disponha dos recursos necessários para a troca do motor, principalmente quanto à altura dos mesmos. 

Existe ainda a opção de preparar o motor para o modo “catavento” , ou seja, com o “fan” e compressor/turbina girarem sob ação do ventoo. A desvantagem desta operação é a necessidade constante de lubrificação, o que limitaria o tempo de voo, podendo inviabilizar o voo direto a Paris.

A volta trimotor

A tripulação que vai trasladar o A380 “trimotor” será especialmente treinada em simulador para a operação, que exige um procedimento especial relativo à aceleração dos motores. Há diferenças em relação a uma decolagem normal, por conta da assimetria do empuxo. O peso é mantido mais leve possível e assim nada de passageiros, carga ou mesmo tripulantes de cabine.

A precupação lógica é uma eventual pane de mais um motor, exigindo o voo bimotor que será feito em uma rota planejada para deixar o A380 próximo a um local de pouso totalmente seguro. 

Nessa semana, a desintegração do motor levou o FAA dos Estados Unidos a emitir uma diretiva de emergência ordenando que todas as aéreas que operam este tipo de motor a realizar uma inspeção visual do fan e componentes correlatos, o que inclui cerca de 60% dos A380 (Air France, Emirates, Etihad, Qatar e Korean) em operação.

A despeito das questões em torno do inusitado incidente e seu devido esclarecimento, a Air France deve reparar a aeronave o quanto antes para que possa voltar a operar normalmente e os checks recomendados pelo FAA devem garantir a segurança do restante da frota superjumbo, acreditam os especialistas. 


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