Líder mundial no mercado de LSA, a alemã Flight Design chega ao Brasil com o refinado CTLS, um avião com aerodinâmica moldada no túnel de vento da Mercedes Benz
André Danita | | Fotos Divulgação Publicado em 13/12/2012, às 12h51 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45
Não é difícil distinguir uma aeronave leve de projeto alemão em qualquer pátio de aeroporto do mundo. Na sua maioria carregam uma forte identidade de linhas harmoniosas, aerodinâmica avançada e soluções de alta tecnologia, talvez uma herança dos famosos planadores de alta performance e aviões acrobáticos. E todas essas marcas ficam evidentes nas elegantes aeronaves da Flight Design, uma empresa que teve origem na fabricação de asas-deltas e parapentes (paragliders) na década de 1980, e evoluiu para o mercado das aeronaves esportivas leves. Lançado em 1997, o primeiro CT – sigla para Composite Technology – foi um sucesso de mercado, seguido pelas versões CT2K, que cumpria com os novos requisitos do Reino Unido para esse tipo de aeronave, e a CTSW, de Short Wing, com maiores velocidades de cruzeiro. Em 2008, a versão CTLS foi anunciada, com maior envergadura e várias melhorias de sistemas e aerodinâmica. Com uma invejável marca de mais de 1.800 aeronaves em operação em todo o mundo, a Flight Design hoje detém 23% do mercado de LSA’s, o que a coloca no topo do ranking desta categoria.
CONSTRUÇÃO EM FIBRAS
Desde 2011, a Flight Design tem novo representante exclusivo no Brasil, a Just Fly Aeronáutica, e seu sócio-diretor, Luis Fernando Meyer, convidou AERO Magazine para conhecer uma refinada versão do CTLS recém-chegada ao país. O encontro acontece no Campo de Marte e, enquanto aguardamos pela dissipação de uma névoa úmida de início de manhã, aproveitamos para fazer um detalhado walkaround. O que mais chama a atenção, em um primeiro contato, é a aerodinâmica. Desenvolvido a partir de avançados softwares de design e simulação, o desenho do CTLS foi aprimorado por uma equipe de especialistas no túnel de vento da Mercedes Benz. A construção, toda em fibras de carbono e aramida (Kevlar), faz do CTLS uma aeronave extremamente limpa do ponto de vista aerodinâmico, mas a engenharia alemã foi além, não só embutindo a maioria das hastes de comando na estrutura do avião como também carenando as pernas dos trens de pouso, fabricadas em materiais compostos. As asas cantiléver contêm os tanques de combustível com capacidade total de 130 litros. Dotadas de elegantes winglets, harmonizam eficiência com beleza. Os ailerons são defletidos acompanhando a extensão dos flaps elétricos, funcionando como flaperons. O estabilizador horizontal é do tipo stabilator, ou seja, move-se integralmente respondendo aos comandos de arfagem, e conta com um anti trim tab, para compensação de esforços. O acesso à cabine se dá através de duas grandes portas do tipo “asa de gaivota”, dotadas de amortecedores. O CTLS também conta com janelas laterais traseiras e uma superior, sendo que a visibilidade externa pode ser definida como extraordinária. O fino interior em nada lembra o conceito LSA. Com os acabamentos e revestimentos em couro, o Luis me aponta dois detalhes importantes de conforto: os bancos são posicionados sobre trilhos inclinados, que, inteligentemente, reduzem a altura do assento quando afastados para acomodar ocupantes de maior estatura, e ambos os assentos dispõem de ajuste lombar pneumático. Um luxo!
As asas Cantiléver contêm os tanques de combustível com capacidade total De 130 litros
Há também dois compartimentos de bagagem logo atrás das portas, um em cada lado da aeronave, que têm capacidade para 50 kg e são acessíveis externamente. Ambos comportam bem as mochilas do final de semana, um espaço adequado para o propósito. E o que separa esses dois compartimentos, internamente, é o pequeno mas não menos importante BRS, ou Ballistic Recovery Parachute. O paraquedas balístico é um item de série importantíssimo para a segurança dos ocupantes, e esta parece ser uma das maiores preocupações da Flight Design. A célula de sobrevivência, feita em fibra de carbono e Kevlar, foi dotada de uma complexa rede de componentes estruturais que trabalham para transmitir as forças de impacto e deformação para outras regiões da estrutura, preservando os ocupantes. Ambos os assentos são equipados com cintos de segurança de quatro pontos. Essa engenharia certamente ajudou a Flight Design a alcançar um invejável índice de zero acidente fatal com suas aeronaves nos Estados Unidos, nos últimos doze anos, o que a coloca em destaque entre os fabricantes de modelos LSA. A propósito disso, o Luis explica que o CTLS já pode ter seu casco segurado por corretoras brasileiras, o que representa um grande benefício para os operadores.
#Q#Paraquedas balístico e célula de sobrevivência reduzem riscos de acidentes fatais no CTLS |
Finalmente o teto baixo no Campo de Marte evolui para apenas uma névoa úmida no meio da manhã, e podemos começar nosso voo. Confesso que estou curioso para entender mais sobre a operação do CTLS. Acomodo-me facilmente no cockpit e a ergonomia já surpreende, pois me sinto em uma aeronave de maior porte, com liberdade de movimento e excelente espaço lateral. Guardamos nossos objetos em um prático compartimento no assoalho, logo à frente dos assentos. Para a primeira partida do dia usamos o afogador, e basta um toque no starter para que o Rotax 912ULS seja acionado – o CTLS está disponível também com a versão injetada do motor Rotax, a 912iS. Durante um breve aquecimento a 2.000 RPM de motor, ligamos os aviônicos, e sou novamente surpreendido pelas duas telas Dynon SkyView SV-D1000, de 10 polegadas cada, com direito a syntethic vision e instrumentos de motor digitais. No centro do painel, um GPS Garmin Aera 795 completa a navegação, enquanto o rádio digital SL 40, transponder GTX 327, caixa de áudio GMA 240 com intercom e ELT 406 MHz são equipamentos de série.
Realizamos o táxi do hangar do Aeroclube de São Paulo até a pista 12, e o controle direcional é firme e preciso, exigindo pouco comando de pedais. Um ponto a habituar-se no táxi do CTLS são os freios, atuados igualmente por intermédio de uma alavanca única no console central, ao lado da potência. Apesar de pouco convencional, sua operação é precisa e requer pouca adaptação. Durante o táxi, a tendência do CTLS é acelerar, portanto, minha mão direita atua frequentemente os freios. No ponto de espera da cabeceira 12, procedemos os checks de magnetos a 4.000 RPM, lembrando que uma caixa de redução gira a hélice a uma razão de 1:2.43 em relação ao motor. Ajustamos os flaps para a posição 15°, e com os parâmetros todos na faixa verde mostrados na grande tela Dynon, somos autorizados a alinhar e manter posição após a passagem de uma aeronave que pousava. Admito que, ao tomar posição, a perspectiva da pista me parece pouco familiar, e então me lembro de que estamos a algo em torno de 1,5 metro do solo.
Iniciamos a corrida de decolagem avançando a potência até que o Rotax atinja 5.000 RPM, e logo alcançamos os 55 nós necessários para que o CTLS ganhe os céus. Como em toda aeronave de fuselagem curta, a decolagem acontece praticamente sobre os três pontos, e o CTLS indica firmes 700 pés/minuto na subida para livrar o tráfego de Marte. Às custas de algumas “batidas de asas” me dou conta de que estou a bordo de uma aeronave de menos de 600 kg, de aerodinâmica muito eficiente e comandos de voo efetivos, que exigem muita finesse na pilotagem. Mas logo “visto” a máquina e começo a me deliciar com o visual da cidade de São Paulo através das grandes janelas laterais, e a sensação é de se estar em um helicóptero. Ao recolhermos os flaps para a posição 0°, o CTLS afunda levemente, e logo ganha mais velocidade e razão de subida até os 3.800 pés, que manteremos até a posição “Rodoanel” no corredor “Juliett”.
Painel Dynon Skyview com duas telas de 10 polegadas oferece visão sintética e instrumentos digitais do motor
VISÃO SINTÉTICA
O trabalho de trimagem é muito pouco requerido, pois naturalmente os esforços nos comandos são muito baixos. Já nivelados, o Luis me instrui a ajustar a potência para 4.800 RPM e regula os flaps para a posição -6°, que proporciona melhor atitude e melhor arrasto em cruzeiro. Nesse regime, o PFD Dynon indica 108 nós de velocidade aerodinâmica, enquanto o Fuel Flow se limita a apenas 19 litros por hora. Em contato com o Controle São Paulo, somos autorizados a voar direto à posição “Pirapora”. A atmosfera está calma, e aproveito para explorar alguns dos avançados recursos dos aviônicos, como o piloto automático. Parte integrante do Dynon SkyView, ele comanda dois eixos com bastante suavidade e precisão, e requer apenas a trimagem inicial de acordo com o pedido pela indicação no PFD, mostrando-se um valioso recurso de conforto em navegações prolongadas, afinal o CTLS é capaz de cumprir etapas de incríveis 7 horas de duração. Outro excelente e raro recurso em aeronaves dessa categoria é o synthetic vision, que provê boa consciência situacional, mostrando-me as elevações próximas à cidade paulista de São Roque.
Visão panorâmica a bordo do CTLS dá a sensação de se estar em um helicóptero |
Em pouco tempo, aproximamo-nos de Sorocaba, e rumamos para o setor oeste do aeródromo para experimentar algumas manobras. Começo com curvas de grande inclinação, e o CTLS é facilmente mantido nivelado com pouco esforço de arfagem, mas requer uma boa coordenação ailerons-leme para manter a “bolinha” no centro. Ao final da segunda curva, reintercepto a esteira de turbulência por mim deixada no início da manobra, um raro sinal de constância na trajetória. Parto então para alguns estóis. O primeiro, com flaps 0°, acontece sem potência logo abaixo dos 50 nós indicados, com um leve buffeting e fácil controlabilidade. Experimento o segundo, configurado para pouso, com flaps na posição 30°, e mantenho potência aplicada até que o buffeting se pronuncie ao redor de 40 nós indicados, com boa autoridade de comandos. Desta vez, porém, o CTLS exige mais comando de pedais para manter a reta durante a recuperação.
A apenas 6 milhas do aeródromo de Sorocaba, decido reduzir o motor e testar o planeio da máquina. Estabeleço a descida a 65 nós, e o CTLS plana muito bem para uma aeronave de baixa inércia (o manual fala em 8.5:1). Encaixo-me, em seguida, à perna do vento da pista 36. Decido pousar com flaps na posição 15°, já que as térmicas já começam a aparecer e esta configuração proporciona melhor manobrabilidade. Mantenho 60 nós na final, reduzindo para 55 na curtíssima, e é preciso apenas quebrar o ângulo levemente antes do toque, sob a pena de fazer a máquina flutuar além do ponto ideal. Adiciono potência para a arremetida, e novamente o CTLS sai do chão sozinho. Novo tráfego, desta vez em uma rampa mais baixa, mantenho o motor levemente “calçado” até pouco antes do toque e sou mais modesto no arredondamento. O toque é firme, e o Luis me conta que o segredo de um pouso macio é trabalhar mais continuamente a cabrada do flare, e assim faço na terceira vez, com melhores resultados.
Na arremetida rumamos para o corredor “Charlie”, subindo para 5.000 pés, e concluo que o CTLS é uma aeronave extremamente equilibrada em todos os eixos de comando, com reações previsíveis, corroborando com a velha máxima de que “avião bonito voa bem”. Considerações técnicas à parte, o conforto a bordo, juntamente com seus equipamentos standard e opcionais, fazem do CTLS um LSA diferenciado, isso aliado a um baixíssimo custo operacional direto.
Com um suporte de manutenção estruturado junto à Ultratécnica, de São Pedro (SP), completo estoque de peças de reposição e linha de financiamento facilitada por grandes bancos, a Flight Design e seu representante brasileiro entram “pra valer” no mercado desta categoria, que hoje experimenta franca expansão, e se mostram dispostos a repetir por aqui o mesmo sucesso da máquina no exterior.
GOSTEI
Aerodinâmica, aviônicos, ergonomia, acabamento e visibilidade
NÃO GOSTEI
Leveza de comandos
CTLS-LSA | |
Fabricante | Flight Design GmbH |
Preço básico (nacionalizado) | 140.000,00 euros |
Motor | Rotax 912 ULS |
Potência | 100 hp |
Capacidade | 1 tripulante + 1 passageiro |
Certificação | Aeronave Leve Esportiva (ALE) |
Comprimento | 6,61 m |
Envergadura | 8,60 m |
Altura | 2,34 m |
Peso vazio (típico) | 326 kg |
Peso máximo de decolagem | 600 kg |
Carga útil (típico) | 274 kg |
Capacidade de combustível (utilizável) | 128 litros |
Alcance (com 30 minutos de reserva) | 1.800 km |
Velocidade máxima de cruzeiro | 127 nós |
Teto de serviço | 12.150 pés (3.703 m) |
Distância de decolagem* | 280 m |
Distância de pouso* | 380 m |
Mais informações: Just Fly Aeronautica Ltda - (11) 3876-0936 |