Por que o preço das ações do terceiro maior fabricante aeronáutico do mundo cai se a companhia apresenta bons resultados de vendas?
Por André Jankavski Publicado em 24/04/2015, às 00h00
Quase nenhum analista se arriscaria a traçar prognósticos desfavoráveis à Embraer no fim de 2014. Muito pelo contrário. A empresa, maior fabricante de aviões do país, vinha de um ano de comemorações, potencializadas pelos festejos dos seus 45 anos de fundação. Sua carteira de pedidos fechava, até setembro, em US$ 22,1 bilhões, um recorde. Além disso, a Embraer estava em fase final de testes para colocar nos ares o protótipo da maior aeronave fabricada no Brasil até hoje, o avião de transportes táticos KC-390. Parecia que o executivo Frederico Curado, CEO da Embraer, tinha acertado a mão no comando da empresa e cruzava em céu de brigadeiro. Para completar o cenário otimista, o dólar fortalecido frente ao real trazia um impacto direto nas vendas da companhia. Todos os fatores somados poderiam ser vistos como catalisadores para a valorização das ações da empresa na bolsa de valores. De janeiro até dezembro, o valor dos papéis da fabricante tinha aumentado 27,3%, ante uma queda anual de 15,5% do Índice Bovespa, o principal do mercado acionário brasileiro. Tudo ia conforme os planos. Mas os ventos de 2015 trouxeram turbulências aos que investiram seu dinheiro na Embraer.
A empresa registrou um crescimento de 9,5% em suas receitas, a R$ 14,93 bilhões. E só. De resto, os números decepcionaram. O Ebitda – número muito utilizado para saber a capacidade real da empresa – despencou 11,9%, para R$ 1,98 bilhão. Para completar, a sua última linha do balanço recuou 2,3%, a R$ 777 milhões. As cifras negativas evidenciaram a exposição da Embraer à turbulenta economia brasileira. Em janeiro, por exemplo, a companhia já havia comunicado ao mercado que poderia ter problemas de caixa. Segundo a empresa, em outras palavras, alguns clientes não haviam saldado as dívidas que deveriam.
O cliente, no caso, era o próprio governo brasileiro. O ministério da Defesa, com o caixa mais apertado devido ao atual período de austeridade comandado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, atrasou os pagamentos do programa KC-390. Resultado: fluxo de caixa negativo da empresa de US$ 400 milhões. “Esse atraso vai impactar diretamente nos resultados dos três primeiros meses desse ano”, afirma Leila Almeida, analista de aviação da Lopes Filho & Associados.
A Embraer também sofreu com outras decisões vindas do Palácio do Planalto. Desta vez, nas relações diplomáticas. Após a execução de pena de morte de dois brasileiros na Indonésia, a presidente Dilma Rousseff recusou as credenciais do embaixador indonésio para começar a trabalhar no Brasil. Uma crise se instaurou. E a Embraer foi usada como instrumento de pressão política pelo vice-presidente indonésio Jusuf Kalla. Após a recusa de Brasília em receber o novo embaixador do país asiático, Kalla ameaçou cancelar um contrato de US$ 150 milhões de dólares para a compra de oito aviões EMB-314 Super Tucano. A decisão continuava em aberto até o fechamento desta edição.
Com todos os problemas somados, o banco americano Citibank reviu para baixo as expectativas que tinha em relação à companhia brasileira. O preço-alvo das ações foi cortado de R$ 29,50 para R$ 25,16. Os analistas do Credit Suisse, da Suíça, mostraram-se decepcionados com as expectativas da Embraer para 2015, ano que a empresa afirmou que será ainda mais complicado. Já o brasileiro BTG diminuiu o valor das ADRs (recibos de ações negociados em Nova York) de US$ 46 para US$ 44, mas manteve a recomendação de compra.
O fabricante brasileiro, no entanto, está longe de estar dentro do olho de um furacão. “O prestígio e a qualidade da empresa, que ascendeu como potência na indústria de aviação de menor porte nos últimos dez anos, reforçaram as encomendas da companhia”, diz Leila, da Lopes Filho. Em 2014, pelo segundo ano consecutivo, o Phenom 300 foi o jato executivo mais entregue do mundo. No mercado de aviação regular, a Embraer acaba de receber uma encomenda de 15 jatos E175 e dois E190 da companhia aérea franco-holandesa Air France/KLM. O contrato pode ser aumentado em mais 17 aeronaves E-jets, alcançando cifras de US$ 1,5 bilhão. E não para por aí. Outros cinco jatos E175 foram contratados pela americana Republic Airways, o que trará mais US$ 222 milhões aos cofres da empresa.
Outras oportunidades, antes impensáveis, também podem representar uma guinada nos resultados da companhia. O possível acordo nuclear com o Irã, que acabará com as sanções internacionais contra o país asiático, seria um novo filão para a Embraer. Segundo estudo realizado pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), o fim dos embargos representaria uma demanda de 400 aviões comerciais para o Irã. Além disso, o próprio aquecimento da economia dos Estados Unidos ajuda na recuperação das margens da empresa – enquanto as sequelas da crise econômica global ainda inibem uma maior contratação por parte de clientes da Europa. Já o jato KC-390 tem potencial para ser um dos grandes acertos dos últimos anos. As parcerias com Portugal, Argentina e República Tcheca no programa podem abrir portas. “No Brasil, a empresa também tem um grande potencial com a implantação de aeroportos para voos regionais”, diz o analista Pedro Galdi, da Independent Research. Com estratégias como essas, a Embraer espera desviar da tempestade que vem se firmando em sua frente e, finalmente, retomar a rota do céu de brigadeiro.
por André Jankavski