Em alusão ao vigésimo primeiro aniversário de AERO Magazine, fizemos essa pergunta a empresas de diferentes setores da indústria aeronáutica
Redação Publicado em 16/05/2015, às 00h00
“Temos uma visão de aviação sustentável para as próximas décadas. Um mundo conectado pode ser sustentável. Mais pessoas serão capazes de aproveitar os benefícios das viagens aéreas. Pensamos num modo diferente de voar, como mostra nosso avião conceito, com projeção de imagens paisagísticas em paredes sem janelas, ou fuselagem transparente, e muito mais conforto e interação a bordo. Também acreditamos em um voo mais inteligente, com uma gestão aprimorada do tráfego aéreo (ATM) para diminuir o tempo de voo, a queima de combustível e as emissões de poluentes. Além disso, pensamos em novas fontes de energia, para melhor proteger e preservar o ambiente a nossa volta, que sofre tanto com emissões de CO2 e desmatamentos. A biomimética, que é a engenharia biologicamente inspirada, continuará a prover soluções para um voo mais verde, considerando que a natureza sempre foi uma fonte de ideias para nossa indústria, desde que Leonardo da Vinci iniciou seus desenhos de aeronaves e helicópteros há 500 anos. Finalmente, pensamos nos talentos do futuro. Temos de descobri-los e incentivá-los a nos ajudar a pensar no futuro que querem para si”.
“O cockpit do futuro ainda está evoluindo, mas para solucionar os desafios enfrentados pelos pilotos de hoje. Procuramos ter um olhar abrangente sobre as questões que os pilotos enfrentam enquanto voam. E quando projetamos produtos e tecnologias, fazemos isso com a carga de trabalho, os problemas e a experiência do piloto em mente. A visão para o convés de voo do futuro está centrada em desenvolver a modalidade certa para cada missão. Não enxergamos o cockpit como um ‘modelo que serve para todos’ os cenários, mas como uma mistura de tecnologias que dá ao piloto a informação certa, no momento certo e da maneira certa. Temos uma talentosa equipe de engenheiros focada em pesquisa e desenvolvimento do cockpit do futuro para ver que tipos de insumos (telas sensíveis ao toque, voz, gestos e até mesmo neurotecnologia) podem ser usados para ajudar a aumentar a produtividade e permitir aos pilotos voar com mais segurança. Os principais desafios associados ao desenvolvimento de tecnologias avançadas para a cabine incluem a garantia de funcionamento da tecnologia com vários níveis de ruído, sotaques e idiomas. Além disso, há uma necessidade de abordar a capacidade de resposta global e precisão para garantir que as soluções entregues sejam intuitivas, seguras e produtivas”.
Bob Witwer, vice-presidente de Tecnologia Avançada
“Nossa visão do avião do futuro passa por soluções que estão sendo empregadas nos novos G500 e G600, que entrarão em serviço em 2018 e 2019, respectivamente. Para tanto, continuamos empenhados em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Temos em Savannah, na Georgia (EUA), um vasto centro de pesquisa e desenvolvimento formado por cinco edifícios, com interligações entre áreas de laboratório e escritório. Os novos programas estão incubados neste nosso campus, o RDC (Research & Development Center). Pilotos e projetistas de aeronaves compartilham o espaço – e as informações. Se eles desenvolvem um novo conceito, querem testar imediatamente e podem fazê-lo nos laboratórios. O espaço inclui uma instalação de testes para o G500, assim como a primeira cabine integrada de ensaio dedicado para o novo jato. Além disso, há uma ‘iron bird’, que nos permite testar sistemas hidráulicos, elétricos e outros. Nosso laboratório concentra-se em itens como acústica, ambiente de cabine e entretenimento de bordo, compósitos e aviônicos. Mais de 1.500 engenheiros e especialistas técnicos trabalham no RDC”
“A não ser que surja uma nova descoberta tecnológica em performance de motor ou estruturas, teremos em 21 anos aviões aperfeiçoados em relação ao que temos hoje. Atualmente, já fazemos nossos aviões usando fibras de carbono. Na teoria, podemos evoluir para nanofibras de carbono, ainda mais leves. Porém, descobrir o modo como adaptá-los em aviões comerciais ainda é um grande enigma. Temos dúvidas se será um avião supersônico. É muito difícil desafiar as leis da Física. Estamos limitados a Mach .85-86, então a ideia será de como tornar esse voo mais confortável para os passageiros e manter os custos de operação baixos.
Uma estrutura mais eficiente poderia permitir uma cabine com sensação de altitude similar à do nível do mar, o que tornaria o ambiente muito agradável ao proporcionar mais umidade. Também tentamos fazer os aviões mais eficientes. A única energia que colocamos em uma aeronave é o querosene de aviação e nos esforçamos para conseguir joules de energia de cada libra de combustível.
O tamanho do avião deve permanecer inalterado. Sempre haverá mercado para 150 pessoas que queiram ir de um lugar para o outro algumas vezes ao dia. E sempre haverá mercado para 300 pessoas que queiram ir mais longe. E sempre haverá mercado para um avião de 400 passageiros que queiram dar a volta ao mundo. Então, a questão é de como preencher o mercado com essas aeronaves”
A incessante escalada de incrementos de performances das aeronaves começou logo após Alberto Santos Dumont voar aqueles primeiros 200 pés em Paris, na França, em outubro de 1906. Em 1917, Curtiss Jenny já transportava duas pessoas no ar por duas horas a ofuscantes 75 mph. Em 1935, o Douglas DC-3 cruzava a 10.000 pés com 21 passageiros a bordo. Quando estreou em 1965, nosso Falcon 20 tinha uma cabine para 12 passageiros e alcançava sem escala 2.000 milhas náuticas. Passados 50 anos desde então, nosso atual Falcon 5X em breve levará confortavelmente passageiros a inacreditáveis 5.200 milhas náutica em uma cabine 60% maior do que a do Falcon 20.
As mudanças em células, motores e aviônicos nos últimos anos instigam nossa imaginação sobre o que está por vir, e o que está por trás das inovações. Enquanto um interminável número de boas ideias flutua em torno de nossa indústria, apenas um punhado delas chega à linha de montagem, porque a criatividade representa apenas o ponto de partida do processo. Para ser viável, a ideia tem de oferecer benefício real ao mercado.
Vejamos o caso do novo Falcon 5X da Dassault. Foram anos de pesquisa com cliente, desenvolvimento tecnológico e design criativo. Dezenas de milhares de horas-homem nos trouxeram a este ponto e dezenas de milhares de horas-homem serão necessárias para obtermos a certificação final. A Dassault explorou todos os aspectos do que se sabe sobre a concepção de um projeto. Algo tão simples como um aileron mudou completamente. Ele deixou de ser apenas um aileron para também auxiliar na desaceleração (speed break), dependendo da situação. Antes restritos a aviões militares e comerciais, os chamados ‘flaperons’ aumentam a autoridade de cada piloto e auxiliam em aproximações de perfil íngreme.
Mas como criamos um ambiente propício para projetos inovadores e tecnologia avançada? Resumiria em uma palavra: paixão. Temos alguns dos engenheiros mais apaixonados e inteligentes do mundo, que ainda se beneficiam de nossos programas militares como o caça Rafale e a família de jatos de negócio Falcon, além de um constante encorajamento de atitudes curiosas e criativas”
“Em 21 anos, acredito que teremos aviões de longo alcance, tecnologicamente muito avançados, tanto em relação aos materiais empregados quanto à aviônica e a soluções de entretenimento e comunicação embarcados. Acredito, ainda, que as aeronaves serão mais verdes, haverá melhor otimização do consumo de combustível e menor emissão de carbono. Assim como já ocorre com nossos aviões, eles seguirão o conceito de extensão da casa ou escritório dos operadores e serão ferramentas de mobilidade ainda mais efetivas dentro do seu propósito. Uma coisa é fato: mesmo com todo avanço tecnológico, os pilotos continuarão sendo peça chave na operação de uma aeronave”
Philipe Figueiredo, diretor de Vendas da Líder Aviação, representante das marcas Beechcraft e Bombardier
“A indústria tem crescido para atender às necessidades de um mundo globalizado e o passageiro está no centro das ações. Ao longo das últimas quatro décadas, as viagens aéreas se tornaram mais acessíveis, o custo real da viagem caiu cerca de 60% e o número de viajantes aumentou dez vezes. Olhando para o futuro, podemos ver que em 2050 a aviação vai ter 16 bilhões de passageiros. Avanços globais em tecnologia geral estarão espelhados no setor aéreo, viajar de avião será mais rápido, seguro e transparente. Sem surpresa, a tecnologia móvel disponível para os consumidores de transporte aéreo também influenciará o comportamento quando viajarem. Cabines de informação de passageiros e de transferência serão coisa do passado. Assim como as filas. Os passageiros poderão alterar itinerários como e quando entenderem. Sistemas de entretenimento não estarão mais presentes na maioria das aeronaves, porque os passageiros terão em seus computadores e smartphones todo o entretenimento virtual que precisarem durante o voo e, claro, acesso à internet a bordo. Em 2050, a segurança e a proteção ainda serão as principais prioridades para os passageiros, mas serão preocupações menores, porque a automação e as novas tecnologias continuarão a revolucionar os padrões de segurança, incluindo triagem e monitoramento”.
“Dentre todos os ‘futuros’ possíveis, um elemento central não pode ser medido em números: o aviador nutre uma paixão pela maravilhosa experiência de voar. Enquanto houver um menino ou uma menina com os olhos voltados para o céu, admirando um avião, aeromodelo, helicóptero, ultraleve, asa-delta, parapente ou paraquedista, num campo de pouso qualquer desse imenso país, a chama pela aviação continuará acesa. Essa mesma chama que nasce na infância será alimentada enquanto os amantes da aviação reservarem fins de tardes com amigos, nas portas de hangares, para contar histórias de voos que aconteceram (ou não!), compartilhar novidades e planejar os próximos voos. A aviação é diferente de outras atividades humanas, pois tem na paixão seu combustível indispensável e principal. Ela é que estimula a curiosidade permanente que transforma crianças de hoje, com suas imaginações estimuladas pelo ronronar dos monomotores que tocam e arremetem nas pistas dos mais de 700 aeroportos brasileiros, em futuros engenheiros, aviadores, astronautas, especialistas em materiais, inventores, mecânicos e todo um conjunto de pessoas diferentes, para quem uma aeronave é mais do que uma máquina e um voo é mais do que transportar pessoas de um ponto para outro.
Mas e o futuro? Temos um conjunto infinito de novidades que jogam muita esperança para o setor, a despeito dos enormes desafios. Novos e mais eficientes grupos motopropulsores irão diminuir gastos e aumentar a segurança. Mais precisos e baratos aviônicos já revolucionaram a navegação enquanto a antiga navegação ‘visual’ está se fundindo com a navegação ‘por instrumentos’. Sistemas de comunicação, mapeamento de terreno e proteção contra colisões se difundem velozmente, assim como inúmeras ferramentas de transmissão e recepção de informações meteorológicas em tempo real farão com que velhos riscos de voar sem saber o tempo que se vai enfrentar sejam mesmo coisas do passado. Celulares, tablets e relógios integrados com a internet já estão nas cabines de comando, tornando os voos muito mais precisos e seguros. Simuladores de voo cada vez mais baratos e avançados se espalham pelo mundo, oferecendo para a aviação geral instrumentos de aprendizado avançado e continuado que aumenta a segurança e a proficiência dos aviadores. Equipamentos para a movimentação de aeronaves no solo são cada vez mais úteis e acessíveis, assim como equipamentos de iluminação e sinalização de aeroportos, cada vez melhores e mais baratos. As aeronaves privadas tendem a se tornar ferramentas de uso mais comuns, para pessoas físicas e jurídicas.
Novas formas de aquisição e uso de aeronaves já se difundem e a velha dificuldade de fazer as contas fecharem (usar pouco, ativos que custam muito caro...) vai sendo substituída por arranjos de compartilhamento de propriedade muito mais eficientes. Não há a menor dúvida de que nossa aviação, nos próximos anos, continuará a ter um papel importantíssimo para o desenvolvimento nacional. Se na década de 1950 o Brasil jamais teria se interiorizado sem a aviação, em 2050, tanto mais curto será o nosso caminho para nos transformarmos numa enorme e pujante economia quanto mais soubermos fazer uso dessa mesma aviação que há 70 anos proporcionou a expansão de um país que só existia no litoral e que hoje tem no interior o fiel da balança da sua riqueza. No final das contas, o sonho é que nosso país continue, nos próximos 21 anos, dando espaço para que os jovens amantes da aviação ganhem asas, realizem seus sonhos e com isso consigam continuar a fazer com que a aviação contribua para o desenvolvimento do país”
Humberto Gimenes Branco, vice-presidente da Associação dos Proprietários e Pilotos de Aeronaves (AOPA Brasil)