Asas brasileiras em debate

Subcomissão de Aviação Civil do Senado Federal cria foro técnico para discutir os rumos do transporte aéreo do país e propõe as bases para uma nova política pública para o setor

Georges Ferreira E Paulo Licati*, De Brasília | Fotos Rodrigo Cozzato Publicado em 06/08/2012, às 12h22 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45

Uma iniciativa do Congresso Nacional instaura pela primeira vez no Brasil uma discussão séria e abrangente a respeito do transporte aéreo do país. Criada no início deste ano no âmbito da Comissão de Serviços de Infraestrutura e do Senado Federal, a Subcomissão Temporária da Aviação Civil (CISTAC) vem realizando ciclos de audiências públicas com a intenção de formular propostas para uma nova política para o setor, tendo em vista sua expansão nas próximas décadas. A meta é produzir um relatório interdisciplinar que será encaminhado à presidente Dilma Rousseff , e servirá de base para a reforma do Código Brasileiro de Aeronáutica e da Lei do Aeronauta, principalmente. O ministro Wagner Bittencourt, da Secretaria de Aviação Civil, já recebeu um parecer parcial das audiências.

AERO Magazine tem acompanhado as sessões em Brasília (DF) – foram 15 até agora, restando apenas os temas controle de tráfego aéreo, serviços aéreos especiais e auxiliares, e correlação da aviação com diferentes pastas do governo, como Economia, Planejamento, Cidades, Turismo e Integração – e reproduz nas próximas páginas alguns dos principais tópicos dos debates, que devem prosseguir nos próximos meses em audiências regionais em São Paulo, Belém, Recife, Manaus, Goiânia e Porto Alegre.

BRASIL POSSUI 714 AERÓDROMOS PÚBLICOS, DOS QUAIS APENAS 65 OFERECEM PISTAS COM COMPRIMENTO IGUAL OU MAIOR DO QUE 2.000 METROS E SOMENTE 100 ACEITAM OPERAÇÕES IFR

PLANEJAMENTO E MALHA AEROVIÁRIA
O primeiro grande desafio das autoridades aeronáuticas brasileiras é conseguir planejar o transporte aéreo de forma mais abrangente e consistente. Transcorridos pouco mais de seis anos após a instalação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o país ainda reage mais aos problemas do que planeja sua aviação civil, sobretudo diante do vigoroso crescimento desde meados da última década. A Secretaria de Aviação Civil (SAC), criada em 2011, tem recebido elogios por abrir o diálogo com diferentes interlocutores do setor aeroespacial. Os desafios, porém, ainda são grandes, como destacaram os convidados das duas primeiras audiências da CISTAC. “O país precisa de uma política pública de médio para longo prazo. O planejamento precisa não só deixar de ser pontual como deve englobar todos os segmentos da aviação”, apontou o professor Respício Antônio do Espírito Santo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O presidente da Associação de Pilotos e Proprietários de Aeronaves (Appa), o comandante George William Sucupira, concordou: “É preciso que tomemos as atitudes agora, para evitar que os atuais problemas se tornem ainda mais graves no futuro”.

A terceira audiência abordou o planejamento estratégico para o desenvolvimento da malha aeroviária e aeroportuária. Participaram representantes de Anac, Infraero, IBAC (Conselho Internacional de Aviação Executiva), ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) e Fretax Táxi Aéreo. A principal queixa apresentada na sessão foi a concentração de rotas em poucos aeroportos, além dos preços elevados de tarifas para operações de táxis-aéreos e da aviação geral. Também se discutiu a necessidade tanto de um marco regulatório para o setor como ações mais consistentes nos controles de segurança. Os representantes do governo, por sua vez, atribuíram a maior parte dos atuais problemas da aviação civil brasileira ao crescimento inesperado do tráfego aéreo e à política comercial das empresas aéreas.

De acordo com o professor Claudio Jorge Pinto dos Santos, do ITA, o Brasil possui 714 aeródromos públicos, dos quais 209 oferecem pistas com comprimento igual ou maior do que 1.500 metros, 65 trabalham com pistas com mais de 2.000 metros e apenas 100 contam com pistas homologadas para operação por instrumentos e período noturno. “A expansão dos aeródromos deve ser seriamente considerada, assim como a seleção e a criação de novos sítios aeroportuários”, sustenta o professor.

SEGURANÇA E PREVENÇÃO DE ACIDENTES
A quarta audiência debateu a segurança e a prevenção de acidentes da aviação civil brasileira. Na abertura da sessão, o senador e piloto Vicentinho Alves (PR-TO), presidente da CISTAC, ressaltou que o Brasil já teve mais de 40 ocorrências de acidentes aéreos em 2012. Segundo ele, os números seguem a tendência de 2011, quando foram computadas 156 ocorrências. Já o agente de segurança de voo Ronaldo Jenkins de Lemos recordou que o país registrou 421 ocorrências em 1984 e, naquele ano, teve início um programa de conscientização em aeroclubes, com noções básicas de segurança, o que diminui substancialmente o número de acidentes.

Carlos Eduardo Pellegrino, da Anac, lembrou que a Organização de Aviação Civil Internacional (Icao) aprovou o Brasil em auditoria de 2009 com 87% de adesão aos regulamentos da entidade – a média mundial foi de 58,6%. O chefe da Divisão de Aviação Civil do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), tenente-coronel Frederico Alberto Marcondes Felipe, frisou, ainda, que, como estabelece o artigo 87 do Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), “a prevenção de acidentes aeronáuticos é da responsabilidade de todas as pessoas, naturais ou jurídicas, envolvidas com a fabricação, manutenção, operação e circulação de aeronaves, bem como as atividades de apoio à infraestrutura aeronáutica no território brasileiro” e destacou o papel do Serviço de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SIPAER) nesse processo.

Para alguns observadores, ficou no ar a questão das competências de investigação e prvenção de incidentes e acidentes aeronáuticos, que são regidas pelas Leis Complementares 97/1999 e 136/2010. Eles dizem que elas não são efetivamente claras quanto às atribuições de investigação de prevenção de incidentes e acidentes aeronáuticos.

BRASIL REGISTROU 156 ACIDENTES AERONÁUTICOS EM 2011 E DEVE SEGUIR ESSA TENDÊNCIA EM 2012. ATRIBUIÇÕES DE INVESTIGAÇÕES PRECISAM SER MAIS CLARAS

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AVIAÇÃO GERAL E TÁXIS-AÉREOS
As políticas públicas voltadas para a aviação geral foram debatidas na quinta audiência por representantes de Anac, SAC, Appa e Associação Brasileira de Aviação Geral (Abag). O comandante Sucupira, da Appa, cobrou mais investimentos em infraestrutura especificamente para a aviação geral e criticou as taxas excessivamente elevadas para o setor. “Hoje, as autoridades deixam de atender à aviação geral para se preocupar com a aviação regular, mas ambas são importantes e requerem atenção”. Ricardo Nogueira, da Abag, foi além: “A aviação geral é responsável por formar recursos humanos para toda a cadeia do transporte aéreo e, além disso, tem o papel de integrar regiões brasileiras distantes dos grandes centros”.

Os representantes da SAC, Clarice Rodrigues, e da Anac, Wagner William de Souza, reconheceram os desafios de ambas as instituições para os próximos anos. Eles destacaram a melhoria da infraestrutura dos aeroportos, a formação de recursos humanos para sustentar o crescimento acelerado do fluxo de passageiros e a revisão do marco regulatório do setor.

Os táxis aéreos participaram da sexta audiência pública e foram representados pelo Sindicato Nacional das Empresas de Táxis Aéreos (SNETA) e pela Associação Brasileira de Táxis Aéreos (Abtaer). Anac e SAC também estiveram presentes. O senador Vicentinho Alves enfatizou que as empresa aéreas interligam menos de 130 municípios enquanto o serviço de táxi-aéreo leva passageiros a mais de 3 mil destinos. Para Rogério Coimbra, da SAC, há uma visão equivocada no país em relação a esse setor, identificando o táxi-aéreo como atividade de luxo. “Além de ser uma ferramenta de trabalho para muitas empresas, os táxis-aéreos transportam medicamentos e alimentos para áreas remotas, e levam passageiros e cargas para as plataformas de petróleo”.

Fernando dos Santos, do SNETA, alertou sobre a carência de pilotos frente ao crescimento da frota nacional de aeronaves. Segundo ele, a faixa etária avançada dos comandantes de helicópteros, projetada para 2021, exige decisões imediatas para que se possa reverter esse quadro. “Se nada for feito para incentivar a formação profissional, em dez anos, a falta de pilotos será um problema sério”, defende.

O transporte pirata, lembrou o presidente da ABTAer, o comandante Milton Arantes Costa, é uma prática que precisa ser combatida. A Anac explicou que a fiscalização é dificultada pela conivência entre o responsável pela aeronave TPP (certificada para serviços privados) e os passageiros. Ao serem abordados, informaram os representantes da agência, eles negam ter pagado pelo serviço e dizem se tratar de “transporte entre amigos”. Os participantes da sessão cobraram mais fiscalização sobre o transporte “pirata” e reclamaram da falta de pessoal da Anac para a execução dessa tarefa.

A AVIAÇÃO GERAL INTERLIGA MAIS DE TRÊS MIL MUNICÍPIOS BRASILEIROS , TRANSPORTANDO PASSAGEIROS E AS MAIS DIVERSAS CARGAS, COMO REMÉDIOS E ALIMENTOS. ALÉM DISSO, FORMA MÃO DE OBRA PARA A AVIAÇÃO REGULAR

AVIAÇÃO EXPERIMENTAL
A sétima audiência discutiu políticas públicas para o desenvolvimento da indústria da aviação experimental. O Brasil é um dos maiores produtores de aeronaves dessa categoria no mundo, contando com uma frota de aproximadamente 5 mil unidades e uma cadeia produtiva envolvendo desde montadores amadores até indústrias com dezenas de funcionários, além de vários escritórios de engenharia, empresas importadoras e exportadoras, fornecedores de materiais de alto valor agregado, entre outros.

“Os trabalhos desenvolvidos pelos construtores no Brasil proporcionam divisas e a obtenção de tecnologia própria sem o pagamento de royalties a outras nações”, ressaltou o senador Vicentinho Alves. Segundo os debatedores, o futuro da aviação experimental no Brasil precisa ser revisto, de forma a promover os meios indispensáveis ao contínuo desenvolvimento do setor, sendo necessário aproximar os órgãos responsáveis pela fiscalização e regulação com as entidades que representam a aviação experimental, conforme reconheceu a SAC.

Além de SAC e Anac, participaram dessa rodada de discussões João Amaro, presidente do Museu da TAM; Humberto Peixoto Silveira, da Associação Brasileira de Aviação Experimental (Abraex); Gustavo Albrecht, da Associação Brasileira de Ultraleves (Abul); e Bruno de Oliveira e Souza, da Paradise Indústria Aeronáutica.

BRASIL É UM DOS MAIORES FABRICANTES DE AERONAVES EXPERIMENTAIS NO MUNDO E TEM UMA FROTA DE CERCA DE 5 MIL AERONAVES

AVIAÇÃO REGULAR
A oitava audiência reuniu debatedores para tratar da aviação regular, que é um meio indispensável para a integração nacional. No início da década de 60, mais de 400 localidades eram atendidas por linhas áreas regulares, enquanto hoje esse número caiu para menos de 130 destinos. Entre os principais custos dos operadores está o combustível, que representa quase 40% dos gastos médios das companhias. Tarifas e taxas aeroportuárias vêm sendo realinhadas e a carência de investimentos em infraestrutura afeta os projetos de crescimento.

Ricardo Chaves de Melo Rocha, da SAC, destacou que, em 2008, as duas maiores empresas do mercado detinham mais de 90% do mercado e que esse número vem caindo, já que, atualmente, as duas maiores empresas detêm pouco menos de 80% do mercado: “Essa é uma dinâmica positiva para o mercado”. Ricardo Catanat, da Anac, também ressaltou uma gradual desconcentração do mercado, com o crescimento das novas empresas. “Precisamos promover o crescimento da aviação sem prejuízo à segurança, aumentando a competitividade e diminuindo as barreiras à entrada de novas empresas que venham fomentar a competição”, delineou.

Segundo José Márcio Monsão Mollo, presidente do SNEA (Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias), as empresas aéreas reconhecem que o número de cidades servidas por elas não tem aumentado, mas ressalta que, hoje, há mais opções de rotas que servem essas cidades. As companhias defendem mais investimentos em infraestrutura tanto para a aviação regional quanto para a aviação de grande densidade. Os recursos viriam da União, no caso os aeroportos da Infraero, das melhorias na qualidade de gestão dessa infraestrutura e do Fundo Nacional de Aviação Civil. A privatização seria mais uma solução.

O professor Elton Fernandes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, lembra que o Brasil não é um mercado de alta densidade ao ser comparado com América do Norte, Europa e Ásia. “A grande parcela do transporte aéreo mundial está no corredor do Hemisfério Norte. O Brasil está na ponta de cá, é um fim de linha. Somos hoje um mercado pujante, que está acontecendo e surpreendendo. O problema é que esse crescimento não se reverte em lucro para as empresas aéreas. Oferecer mais é muito bom, mas oferecer mais sem ter uma estabilidade, sem gerar lucro para o operador privado, é um problema, pois você depende de empresas com instabilidades”.

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A jornada dos tripulantes é mais um desafio da aviação regular, como destacou Victor Celestino, do SNEA: “Hoje já há um consenso na própria Icao para que se adote o sistema de gerenciamento de risco de fadiga (o FRMS). Essa ferramenta vem ao encontro até dos interesses dos trabalhadores, na medida em que a remuneração deles também é em função da sua jornada”.

NO INÍCIO DA DÉCADA DE 60, MAIS DE 400 LOCALIDADES ERAM ATENDIDAS POR LINHAS ÁREAS REGULARES, ENQUANTO HOJE ESSE NÚMERO CAIU PARA MENOS DE 130 DESTINOS

SEGURANÇA A BORDO
Se o Brasil quiser garantir a segurança dos passageiros da aviação civil, são necessários aperfeiçoamento da regulação e melhor fiscalização do setor, além de melhorias nas condições de trabalho, salários e capacitação e treinamento dos trabalhadores. Esses foram alguns dos apontamentos da nona audiência no Senado.

O brigadeiro da reserva da Força Aérea Brasileira (FAB) e ex-secretário-geral da Organização da Aviação Civil Internacional (Icao), Renato Cláudio Costa Pereira, acredita que o Brasil “forma” profissionais competentes para a aviação, mas não oferece bom treinamento para as áreas gerenciais e não estimula a criação de cursos que supram essa carência. Ele reclamou que os problemas operacionais dos aeroportos brasileiros “são os mesmos” há mais de vinte anos. “É preciso exigir dos profissionais que ocupam cargos de regulação e fiscalização da aviação civil uma ‘base adequada de conhecimento de transporte aéreo’”.

O secretário regional da Federação Internacional dos Trabalhadores em Transportes (ITF), Antônio Rodriguez Fritz, cobrou das autoridades brasileiras o fomento à “livre concorrência com regras mais claras” e o fortalecimento das empresas aéreas brasileiras antes de abrir os céus do país. “Temos de garantir uma concorrência saudável”. Ele também cobrou condições trabalhistas adequadas e melhor capacitação e treinamento para os trabalhadores aeroviários.

Segundo Carlos Ebner, representante da Iata, nas duas últimas décadas, o preço das passagens aéreas teve significativo decréscimo, em virtude de avanços tecnológicos, melhores treinamentos de pessoal, aperfeiçoamento da área gerencial e aumento da produtividade e da eficiência dos trabalhadores. Ebner também lembrou que os níveis de segurança da aviação melhoraram em todo o mundo nos últimos anos, mas ressalvou que a América Latina ainda não chegou aos níveis de Europa e Estados Unidos.

“O Brasil é a sexta potência econômica mundial e será o quarto maior tráfico doméstico mundial em 2014”, disse o representante da Iata. Para ele, os principais desafios para aumento da taxa de conectividade do Brasil são a segurança operacional, a segurança e a facilitação dos procedimentos dos passageiros e a melhora da fiscalização do transporte de cargas, incluindo das bagagens pessoais. “O Brasil, a propósito, tem desrespeitado alguns tratados e acordos que regulam o tráfego aéreo internacional de passageiros, como é o caso do extravio de uma mala. No Brasil, usa-se o Código de Defesa do Consumidor enquanto existe uma norma internacional para isso”. Ebner lembrou, ainda, que o preço do combustível no país é um dos mais caros do mundo para os voos domésticos.

OS NÍVEIS DE SEGURANÇA DA AVIAÇÃO NA AMÉRICA LATINA AINDA SÃO INFERIORES AOS DA EUROPA E DOS ESTADOS UNIDOS . O BRASIL TERÁ O QUARTO MAIOR TRÁFEGO DOMÉSTICO EM 2014

AERONAUTAS E AEROVIÁRIOS
Na décima audiência, o presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA), o comandante Gelson Dagmar Fochesato, defendeu a execução da Política Nacional de Aviação Civil (PNAC) e criticou o acordo multilateral de céus abertos assinado durante a 19ª Assembleia Latino-Americana de Aviação Civil (CLAC), em novembro de 2010.

Quem também cobrou o cumprimento da PNAC foi a presidente do Sindicato Nacional dos Aeroviários, Selma Balbino. Ela alertou, ainda, que mecânicos de companhias aéreas estão cumprindo jornadas dobradas de serviço, aumentando os riscos de erros em atividades de manutenção por fadiga. Já Marcelo Andrade Silva Schmidt, também do sindicado dos aeroviários, questionou a participação brasileira no acordo de céus abertos: “As empresas aéreas irão falir e a soberania nacional estará em risco”.

João Pedro Leite, presidente da Associação Nacional dos Aeronautas, afirmou que a escala dos aeronautas brasileiros descumpre a legislação e que “40% dos trabalhadores aprendem o que sabem ‘na prática’, não com treinamentos adequados”. Segundo ele, no país, a maior parte dos afastamentos médicos dos aeronautas é motivada por questões psiquiátricas.

Para Carlos Montino, da Associação dos Servidores da Anac, os problemas de fiscalização se devem principalmente por falta de servidores. Ele também defendeu que os cargos de direção da Anac sejam ocupados por servidores de carreira.

A Associação Brasileira dos Pilotos de Aviação Civil (Abrapac) propôs a criação de um Comitê Nacional de Aviação Civil para centralizar as discussões do setor e elogiou o trabalho da CISTAC: “Os pilotos têm muito a contribuir para o crescimento do modal aéreo”. Finalmente, Celso Klafke, da Federação Nacional dos Trabalhadores da Aviação Civil (Fentac), disse que a falta de um planejamento sério para o setor pode piorar a situação das empresas aéreas.

FADIGA CAUSADA POR JORNADAS EXCESSIVAS DE SERVIÇO E A FALTA DE TREINAMENTO ADEQUADO AUMENTAM OS RISCOS DE ERROS HUMANOS NO PAÍS

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A indústria nacional pede redução da burocracia na política de homologação de aeronaves

CENTROS DE SERVIÇO, FORMAÇÃO E INDÚSTRIA
Na décima primeira rodada de debates no Senado, Alessandra Abrão, da Voar/Globo Aviação, chamou a atenção para a importância da segurança jurídica no que diz respeito aos contratos de locação dos espaços dentro dos sítios aeroportuários, especialmente os federais. “As empresas de manutenção precisam dela para administrar sua operação”, ela destacou, chamando a atenção para o aumento das dificuldades em relação à contratação de mecânicos.

Com participação também da Líder Aviação, da Helisul Táxi Aéreo, da Anac e do engenheiro mecânico aeronáutico Celso Faria de Souza, a audiência recebeu, ainda, propostas de criação de uma cadeia tributária mais efi- ciente da categoria e de elevação das oficinas de manutenção à categoria de prestadores de serviços aéreos públicos. Os debatedores apontaram também a necessidade de investimentos na formação e na atualização de engenheiros e mecânicos, pois a aviação vem evoluindo rapidamente.

O foco da décima segunda audiência pública se deu sobre a formação de recursos humanos para o transporte aéreo. A aviação civil é um setor estratégico para o desenvolvimento econômico sustentado e sustentável do país, como reconheceu a secretária de Navegação Aérea Civil da Secretaria de Aviação Civil (SAC) da Presidência da República, Clarice Bertoni Lacerda Rodrigues. Ela disse que a segurança da aviação nacional é prioridade e, por isso, o Estado tem de estar atento à qualidade da formação de recursos humanos: “O governo federal está consolidando uma política nacional de formação para o setor, depois de ouvir empresas aéreas, escolas de preparação, universidades, sindicatos, associações de trabalhadores e inúmeros outros órgãos e entidades relacionados à aviação”.

O professor e coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Goiás, Raul Francé Monteiro, cobrou essa medida: “Precisamos de uma política mais clara, para nortear as diretrizes e o rumo do setor. E o relatório final dessa subcomissão poderá ser uma virada de comportamento e um momento histórico para a aviação civil brasileira”. Segundo ele, profissionais da aviação necessitam de formação diferenciada e especializada, pois há um alto índice de especificidade no setor.

Manoel Pereira da Costa, diretor de Educação e Tecnologia do Sesi/Senai de Goiás – que tem atualmente 170 alunos do curso de técnico de manutenção de aeronaves –, reconheceu que a formação de mão de obra para a aviação civil carece de investimentos pesados: “Garantir a qualidade da capacitação é essencial”.

A análise da indústria aeronáutica brasileira marcou a décima terceira audiência pública sobre aviação civil no Senado. Para o advogado Cairon Ribeiro dos Santos, o setor merece incentivos fiscais e isso pode ser feito com ajuste das alíquotas: “Há espaço para reduzir impostos de maneira setorial, sem afetar a arrecadação geral”. O gerente de Estratégia de Mercado para a Aviação Comercial da Embraer para América Latina e Caribe, Luis Fernando Vicente Lopes, reconheceu a necessidade de melhoria para o setor e lembrou que “a classe C já viaja de avião e teremos muitas demandas para atender a classe D”.

O diretor de Inovação da Helicópteros do Brasil S.A. (Helibras), Vitor Coutinho, defendeu a priorização dos investimentos em infraestrutura em aeroportos de média densidade de tráfego, a flexibilização da regulação de combate a incêndio, a internacionalização de aeroportos regionais e a desoneração da carga tributária de produtos e serviços aéreos. Também cobrou agilidade no processo de retorno de exportação temporária, uma política de pacificação e carga tributária sobre combustível e o fomento ao investimento com capital estrangeiro. “A Anac também poderia reduzir a burocracia em sua política de homologação e padronizar o tratamento dado a aviões e helicópteros”.

AS EMPRESAS DE MANUTENÇÃO PRECISAM DE SEGURANÇA JURÍDICA PARA PERMANECER NOS AEROPORTOS

INFRAESTRUTURA
A décima quarta sessão de debates no Senado foi uma das mais concorridas. Tratou das questões sobre infraestrutura, notadamente o principal gargalo da aviação civil brasileira. Segundo Carlos Álvares da Silva Campos Neto, coordenador de Infraestrutura Econômica da Diretoria de Estudos e Políticas Setoriais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), dificilmente os terminais de passageiros dos principais aeroportos do país estarão prontos a tempo da Copa do Mundo. “Teremos de trabalhar com um plano B, com a construção de terminais temporários, que não podem, no entanto, virar permanentes”.

O técnico do Ipea argumentou que, dos 20 maiores aeroportos do Brasil, 14 operam acima de sua capacidade máxima, dos quais cinco – Galeão (Rio de Janeiro), Confins (Belo Horizonte) e os de Recife, Curitiba e Fortaleza – atuam no limite de sua eficiência operacional. “O governo investiu em infraestrutura aeroportuária menos de 50% dos recursos orçamentários disponíveis. O problema é que, mesmo se todo o orçamento fosse utilizado, ainda assim teria sido insuficiente para adequar o setor à sua crescente demanda”, destacou Campos Neto.

Além disso, continuou ele, “há demora nos processos de transferência da infraestrutura dos aeroportos para a iniciativa privada”. De acordo com o Ipea, dos 13 aeroportos das 12 cidades-sede dos jogos da Copa do Mundo, apenas dois têm situação confortável, o de Recife, onde será apenas construída uma torre de controle, e o de Natal, que já foi privatizado. Dos 11 restantes, só três tiveram o processo de concessão concluído (Brasília, Garulhos e Viracopos) e quatro que estavam com a concessão em fase de projeto tiveram os processos suspensos. “Ainda assim, a possibilidade de que haja lucro nos aeroportos privatizados é pequena, mesmo com reajustes de taxas e tarifas, pelos preços elevados das outorgas”.

Fernando Antônio Ribeiro Soares, ex-diretor da Secretaria de Aviação Civil do Ministério da Defesa, defendeu o Plano Nacional de Aviação, editado em 2009, cujas diretrizes, se aplicadas, poderiam servir de base para as decisões. Ele lembrou que é necessário cuidar da segurança operacional da aviação, regulando e fiscalizando adequadamente seus três eixos: empresas, espaço aéreo e infraestrutura. “Precisamos atualizar o Código Brasileiro de Aeronáutica, editado em 1986, antes da criação de leis importantes, com influência direta no setor aeroportuário, como a Lei de Licitações, de 1993, e o Código de Defesa do Consumidor, de 1990”.

Soares defendeu, ainda, o aumento da participação do capital estrangeiro no setor aéreo, pois os investimentos internacionais ajudariam a aumentar a concorrência do mercado de aviação civil e a desenvolver a aviação regional, um dos pontos cruciais para melhorar a qualidade do serviço de aviação no país e contribuir com o desenvolvimento regional.

Representantes do Tribunal de Contas da União (TCU) também participaram do debate e criticaram o modelo de concessão de aeroportos. Eles defenderam melhorias. Mas Adalberto Santos de Vasconcelos, secretário de Fiscalização de Desestatização e Regulação, e o auditor Carlos Cesar Modena, ambos do TCU, também chamaram a atenção para o quadro de pessoal da Anac. “Os profissionais mais experientes têm cinco anos de agência, com a obrigação de capacitar novos servidores depois de uma redução no quadro. Isso considerando que a Anac hoje possui mais atribuições do que o então DAC (Departamento de Aviação Civil). O maior impacto aconteceu com o encerramento das atividades de inúmeras agências regionais, o que prejudicou a fiscalização e o atendimento aos usuários”, disse Modena, que pediu, ainda, revisão dos serviços de tráfego aéreo, sobretudo para os controladores civis de aeroportos privatizados.

DOS 20 MAIORES AEROPORTOS DO BRASIL, 14 OPERAM ACIMA DE SUA CAPACIDADE MÁXIMA

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COMBUSTÍVEIS AERONÁUTICOS
Uma audiência pública extraordinária tratou do custo dos combustíveis para a aviação brasileira. O presidente-executivo do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes (Sindicom), Alísio Jacques Mendes Vaz, informou que, em 2011, foram consumidos 111 bilhões de litros de combustíveis de aviação, o que representa um aumento de 3% em comparação a 2010.

Segundo Cláudio Ishihara, diretor do Departamento de Combustíveis derivados de Petróleo do Ministério das Minas e Energia, o Brasil não é autossuficiente na produção de combustíveis em geral e teria atingido uma “autossuficiência teórica” na produção de petróleo. O preço do petróleo extraído no Brasil está vinculado ao praticado pelo mercado norte-americano e é reajustado com base no mercado internacional, o que deixaria os preços elevados, segundo o engenheiro e consultor especialista em combustível, Paulus Figueiredo.

Mas, apesar disso, continuou o consultor, o que coloca a gasolina e o querosene de aviação do Brasil entre os mais caros do mundo (correspondendo a 40% dos custos das empresas, contra uma média mundial de 29%) não é a indexação com o preço do mercado norte-americano, tampouco a tributação regional que incide sobre o combustível (o que também ajuda), mas, sim, a maneira como se operacionaliza a compra do petróleo. Durante os debates, ficou demonstrado que, pela atual política para os combustíveis, incidem sobre o petróleo produzido no Brasil impostos de importação, despesas aduaneiras, de capatazia e assim por diante.

AVIAÇÃO DOMÉSTICA BRASILEIRA PAGA PREÇOS ATÉ 60% ACIMA DA MÉDIA INTERNACIONAL PELO COMBUSTÍVEL QUE CONSOME

Nas discussões, Cláudio Ishihara, do Ministério das Minas e Energias, disse que o governo não interfere na formação dos valores dos combustíveis a serem cobrados do consumidor e citou como variáveis da precificação tributos estaduais e federais e custos de transportes. “O governo apenas traça metas para que o próprio setor regule os preços, observando que o mercado de combustíveis é livre no Brasil e, portanto, qualquer empresa pode atuar na exploração, refino, revenda e importação do produto”.

A aviação brasileira paga preços até 60% acima da média internacional pelo combustível que consome. Entre as propostas da CISTAC, está a formulação de uma política mais clara principalmente para a precificação do petróleo destinado ao mercado interno. A redução do ICMS com a criação de uma base isonômica para toda a aviação também seria importante para conter os preços do combustível de aviação.