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Para voar mais longe

Dassault lança o trijato Falcon 8X, o primeiro modelo de ultralongo alcance da família formada ainda pelo consolidado 7X e o novo 5X


Apesar do sucesso do Dassault Falcon 7X, muitos prenunciavam o encerramento da era dos trirreatores entre os jatos executivos. Neste mês, a história comprova que, no fim, o cliente é quem dita os rumos do mercado. AERO viajou para a França para receber em primeira a mão as informações sobre um novo integrante da família Falcon, também com três motores.

O projeto, que caminhou confidencialmente com o nome de M1000 dentro da Dassault, finalmente foi revelado como o que era, o 8X, um trijato que incorpora as características do 7X e as levam além, para concorrer com o Gulfstream 550 e o Global 6000 a um preço que a Dassault não confirma, mas é quase certo de que será 10% maior do que o do 7X (hoje por volta de US$ 45 milhões).

Especialistas vinham dizendo que o 7X perderia espaço para alguns lançamentos esperados para este ano, como o sucessor do Gulfstream 450, pois o lançamento do 9X estaria ainda distante. Talvez por isso a Dassault, uma das mais tradicionais empresas do mercado e especializada em large jets, ousou tocar dois projetos novos ao mesmo tempo (5X e 8X) e apresentá-los em menos de um ano. Em visita às fábricas da ­Dassault, sempre encontramos partes das aeronaves número 1 do 5X e do 8X seguindo lado a lado na linha de montagem. Até então, o prazo médio de novos lançamentos na empresa seguia um ciclo de sete anos (o 7X foi lançado em 2007). Aparentemente, o desafio compensou. Embora a empresa não revele os números, o 5X apresentou o maior volume de vendas após o lançamento na história da companhia e o 8X também teve muito boa receptividade por parte dos clientes que foram apresentados ao projeto.

Cronograma
Primeiro voo – 1º trimestre de 2015
Certificação – 2016
Primeira entrega a cliente – 2º semestre de 2016
Rump up – 3 entregas por mês, inicialmente

Como é o avião?

O 8X está no segmento dos jatos de ultralongo alcance capazes de atender aos usuários do eixo Ásia-América do Norte e Ásia-Europa na medida em que supera em 925 km (500 milhas náuticas) o alcance do 7X. Com isso, a família Falcon compreende um leque de ranges entre 6.200 km (3.350 mn) e 11.945 km (6.450 mn) e ratifica que 7X e 8X vão conviver na linha, o que se deve também aos diferentes nichos nos quais se posicionam – o “veterano” 7X tem um mercado cativo, já que possui uma performance capaz de cumprir tanto missões curtas, como Rio-São Paulo, quanto longas, como São Paulo-Miami, algo raro no segmento.

Além do ganho de alcance, o 8X também estende sua cabine em relação ao 7X. Passa de 11,9 m para 13 m de comprimento e atende à lógica segundo a qual aumentar o alcance implica manter os passageiros mais tempo dentro do avião, exigindo um ambiente mais favorável a isso. Esse ganho de comprimento foi conseguido com a interseção de duas seções de fuselagem adicionais, uma à frente e outra no fim da aeronave.

Todas as opções de cabine contam com três lounges e os lavatórios dispõem de chuveiros. São mais de 30 configurações (chamadas de exóticas), além das três mais prováveis para utilizar o espaço adicional. Aumentando o conforto para os passageiros (shortentryway), aumentando a área da galley e, assim, possibilitando que os tripulantes tenham uma área de descanso com a opção de deitar-se (large entryway) ou um meio termo (middle entryway). De qualquer maneira, a possibilidade de contar com até mais quatro janelas na galley já traz muita diferença para este ambiente que também é o “hall de entrada” da aeronave. Uma preocupação que a Dassault já tinha demonstrado com o inovador e agora famoso skylight do 5X.

O conforto fisiológico dos passageiros também ganha pontos com a excelente luminosidade proporcionada por suas 28 janelas, pela impressionante pressurização equivalente a 1.190 m (3.900 pés) de altitude e pela qualidade do ar 10 vezes melhor que a de um escritório normal, segundo o projeto do avião. 

Falcon 8X
Dimensões (m)
Comprimento: 24,46
Envergadura: 26,29
Altura: 7,94
Motor:  3 x PW 307D
Alcance: 11.945 km (6.450 nm)

Versão estendida ou nova aeronave?

Um grande diferencial nas missões dos trijatos da Dassault sempre foi a combinação de grande alcance com a possibilidade de operar em pistas mais curtas no embate com seus concorrentes diretos (a companhia alega que são 500 aeroportos adicionais de operação só nos EUA em comparação com o G550).

O 7X ficou famoso entre aqueles que têm negócios em Londres por ser a única aeronave capaz de operar no London City Airport e voar de lá direto para Nova York. Essa vantagem é muito utilizada por quem vem do outro lado, como os magnatas russos que viajam de Moscou para Londres ou para os brasileiros que também queiram visitar Londres, Los Angeles e até Moscou partindo de São Paulo.

No cockpit, visão sintética no HUD e sidestick

O fato de ser um avião que pode ser visto como uma versão do 7X é ao mesmo tempo verdadeiro e falso. Verdadeiro e positivo à medida que o projeto foi desenvolvido muito rapidamente com o alongamento da cabine do 7X (o mesmo se espera do 9X, que, especula-se, usará a mesma estratégia, só que baseado no 5X). Outro benefício da estratégia é que o 8X começará a operar antes do 5X graças ao processo mais rápido de certificação.

Podemos também considerá-lo como uma nova aeronave, pois há muitas inovações “invisíveis” para que este jato pudesse ganhar alcance e comprimento de cabine sem comprometer seus diferenciais operacionais.

O desafio

O uso de inovadores softwares e tecnologias de simulações da empresa irmã Dassault Systèmes, cujo maior cliente no segmento aeroespacial é a Boeing e no geral a Toyota, contribuiu para melhorias de projeto, rapidez no desenvolvimento, redesenho do processo produtivo e do processo de manutenção.

A otimização das asas passou por redesign, novas winglets, mudanças na engenharia de fabricação e utilização de compostos e titânio, permitindo que fossem economizados 270 kg (600 lb) de peso ao mesmo tempo em que a geração de mais área livre em sua estrutura interna possibilitasse o armazenamento de mais combustível. Tudo isso mantendo área e envergadura do 7X – na realidade, a envergadura aumentou 10 cm, indo a 26,3 m – e acomodando os novos motores Pratt&Whitney Canadá PW307D, com 5% mais de take of thrust em vcpx em relação ao PW307A.

Outro beneficio é um ganho na eficiência de combustível, favorecendo não só os custos operacionais como seu impacto ambiental. A Dassault atesta que em relação ao 8X o Global 6000 tem 40% a mais de dryweight e consome 30% a mais de combustível.

No cockpit, o que a Dassault adianta é que o 8X vai incorporar novos equipamentos do FlightDeck, que terá SVS + EVS em HUD com mais um opcional, radar 4000 NG FMG e sidestick.


Mais comprido do que o 7X, novo Falcon conta com janelas adicionais na galley e cama para os tripulantes

Frota e serviços

No fim de 2013, a frota de jatos executivos da Dassault contava com mais de 2.000 Falcon voando pelo mundo. Destes, 500 são Falcon 900 e 250, Falcon 7X, cujos proprietários são 59% privados, 36% comerciais e 5% governamentais. Da década de 1980 para cá, houve uma grande mudança no perfil dos compradores refletindo a transformação na economia mundial. Antigamente, os maiores compradores eram corporações e hoje em sua maioria são empreendedores, incluindo mercados como a China, onde as empresas estatais não compram jatos. No âmbito global, Jean Rosanvallon, presidente da Dassault Falcon Jets, revela que gostaria de mais atividade no mercado, sobretudo nos EUA, e que a China poderá ser, em 2014, o maior comprador de Falcon no mundo, pois, “apesar da desaceleração no crescimento, há enorme geração de riqueza e clientes no país”.

Com 41 centros de serviço no mundo, 25% da frota Falcon utiliza o sistema Falcon Broadcast Service para antecipar possíveis AOG sem impacto na privacidade das operações (uma preocupação comum dos clientes, a posição da aeronave nunca é transmitida).

O volume da cabine do novo Falcon será de 43 m³

Por que três motores?

Além da percepção de segurança que gera conforto ao passageiro, os três motores permitem a homologação para operações em pistas mais curtas (very short runaways) e steep aproach, como em London City Airport. Isso ocorre, por exemplo, porque os cálculos de certificação levam em conta a possibilidade de uma pane de motor durante a operação de decolagem. No caso de um bijato se perderia 50% da potência e num trijato, apenas 1/3. Além disso, permite a utilização de rotas mais diretas, sobretudo nos voos transoceânicos, por conta das normas de segurança, o que significa ganho de tempo e consumo de combustível. Evidentemente, o tema é controverso, e o debate entre especialistas costuma ser acalorado.

Para esta matéria, pudemos experimentar a eficiência e a versatilidade do trijato 7X em operar missões de alcances longo e curto. Em dois dias, graças à aeronave, fizemos uma reunião na sede da Dassault, em Paris, e de lá partimos para Le Bourget, iniciando os voos para visitar as fábricas de Biarritz, Martignas, Merignac e, por fim, uma experiência com o steep approach no London City Airport, de onde o time que seguiria na aeronave partiu e chegou a Nova York antes de conseguirmos embarcar no voo comercial para São Paulo em Heatrow.

Por Christian Burgos, de Paris
Publicado em 18/05/2014, às 00h00 - Atualizado às 18h11


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