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Memórias de um entusiasta

Bons tempos aqueles em que escutávamos o tráfego aéreo e fotografávamos aves raras nos terraços dos aeroportos com o vigor de verdadeiros apaixonados pela aviação


Bons e velhos tempos da aviação, que, ora, nem são tão velhos assim? Idos dos anos 1980, época em que frequentávamos o terraço panorâmico do Aeroporto Internacional de Guarulhos a observar os clássicos. Boeing 707, Douglas DC-8, L-1011 "Tristar", A310. Todos lá. Estacionavam no Box Golf 10, para deleite de quem estivesse fazendo o spotting. Observávamos o tráfego e ouvíamos o ronco dos motores, envolvidos naquela atmosfera de asas.

Ali nasceu a AETA (Associação de Escuta do Tráfego Aéreo). Não porque se escutava o barulho dos aviões, mas porque os integrantes portavam rádios FM transformados para VHF. Alguns poucos associados tinham oportunidade de trazer do exterior os aparelhos digitais. Modernos, era apenas preciso teclar os números das frequências em MHz. Tínhamos até um jornalzinho interno, artesanal, o Runway. Boa parte das cópias era feita nas máquinas de xerox da Tap Air Portugal e da Canadian Airlines.

Visitar um avião no embarque internacional não era difícil. "Eles vão visitar o avião comigo e trago todos de volta aqui", comunicava o gerente da companhia aérea ao delegado da Polícia Federal. Os aficionados, os de verdade, passavam horas e horas junto dos controladores de voo, bebendo informações sobre tráfego aéreo e fraseologia da aviação.

No Rio Grande do Sul, o grupo de entusiastas "Radar" chegava à pista do Aeroporto Salgado Filho de madrugada para filmar pousos e decolagens a poucos metros do ponto de abertura dos reversos dos ruidosos motores Pratt & Whitney JT8 dos Boeing 737-200 e Boeing 727. No Rio de Janeiro, as reuniões do grupo "Asas", no terraço do Galeão, eram frequentes. Os "plantões" eram longos à espera do pouso de mais um widebody. Lá fotografei a frota inteira dos DC-10 da Varig em dois dias. Consegui boas imagens dos Boeing 747 da Pan Am, do Boeing 747SP da Royal Air Maroc e de um Boeing 747 da TWA. "Opa, se não for um 727, é o Interflug pintando aí", anunciava num habitual tom carioquês Daniel Carneiro, do grupo Asas, em uma de nossas peregrinações.

Um dos momentos mais marcantes da época da AETA foi a despedida do L-1011 (foto), da British Airways, que passaria a operar o Boeing 747-200 na rota entre Guarulhos e Londres. Fizemos cartazes com frases de despedida e exibíamos para a tripulação técnica do "Tristar". Chamaram todos tripulantes para vir à cabine de comando. De repente, da abertura da saída de emergência localizada acima do cockpit, uma comissária abriu uma toalha com os dizeres pintados de batom: "Farewell, we love you too" (Adeus, nós amamos vocês também).

Vivíamos em outra época. Cresci debruçado sobre revistas de aviação para aprender um pouco mais sobre tudo. Ainda quando não existia Guarulhos, passava horas e horas do dia em Congonhas. Lá, comprava cartas de navegação e visitava os D.O.s das linhas aéreas para tirar dúvidas com algum comandante. Tempos em que o aeroporto lembrava mais uma pequena cidade do interior. Todos se conheciam. E muitos tinham "aerococus" no sangue. Como Vito Cedrini, que sempre dividiu seu tempo entre o trabalho no aeroporto e o spotting. Este ano, ele comemora 40 anos de serviços prestados à aviação, sem parar de correr pelos corredores e pátios do Galeão sacando a máquina fotográfica para registrar o pouso de uma ave rara.

Por: Robert Zwerdling
Publicado em 22/05/2012, às 08h51 - Atualizado em 27/07/2013, às 18h45


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